Uma Lei sobre a Imprensa Brasileira

Otávio Brandão

28 de Dezembro de 1923


Primeira Edição: "A Correspondência Internacional, Nº. 95- Ano III - 28 de dezembro de 1923". Carta escrita por Otávio Brandão relatando sobre o Decreto N.4743, a lei de imprensa no ano de 1923.

Fonte: Centro de Documentação e Memória Fundação Maurício Grabois

Transcrição e HTML: Fernando Araújo.

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As Republicas Sul-americanas ainda passam – Europa! - por ter tradições de liberdade!

A imprensa européia não prestou atenção, que nós saibamos, do decreto nº. 4743 que entrou em vigor no Brasil há alguns meses. No entanto, o decreto nº. 4743 é uma obra prima no gênero. Ele é chamado também de lei de imprensa, uma lei sobre a imprensa.

O Congresso, sediado no Rio de Janeiro, aprovou-o depois de prolongados debates, nos quais tomou parte importante o senador Irina Nachade (burguês liberal); o decreto foi sancionado pelo presidente da republica a 31 de outubro.

Suas finalidades são:

  1. Reforçar a legislação contra alguns crimes (calunias, injurias, insuficientemente punidos no Código Penal).
  2. Combater as propagandas subversivas (anarquista e comunista)
  3. Tornar impossível, de fato, qualquer critica à administração ou às suas autoridades...

E aí está a novidade. A administração passa a ser tabu. O governo, sagrado.

Este monstro é fruto dos esforços conjuntos do semifeudal estado de São Paulo e do católico de Minas Gerais.

O artigo 3 está assim redigido:

“Qualquer ofensa ao Presidente da República, no exercício ou não de suas funções; a qualquer estrangeiro ou a qualquer representante diplomático, se não tiver o caráter de injuria ou calunia, será punido com de 3 a 9 meses de prisão celular e uma multa de 4.000 a 20.000 réis”.

Os outros artigos punem a publicação de segredos de Estado, informações sobre forças militares e outros; ofensas feitas às estrangeiras; atentado à moral pública e aos bons costumes; propaganda médica não aprovada pela Direção da Saúde Publica. Esta salada brasileira – é perfeita!

A critica só será permitida se “tiver por objetivo preparar a opinião publica para reformas em prol do bem publico e sendo formulada em linguagem moderada, leal e respeitosa”.

São declarados sucessivamente responsáveis o autor, o editor, o impressor, o vendedor ou distribuidor. Qualquer publicação deve levar os nome do diretor e do gerente e os endereços da administração e da impressora.

As clausulas sobre a responsabilidade “sucessiva” desfecham um golpe bastante rude contra a imprensa pobre, quer dizer, a revolucionária, obrigado a recorrer aos serviços de impressora particulares, quase sempre burgueses, que para evitar a responsabilidade legal, naturalmente se recusam a nos imprimir.

As dificuldades de propaganda comunista aqui, são assim, grandemente aumentadas pela nova lei. Dois impressores já nos recusaram seus serviços. Nosso próprio material tipográfico foi aprendido ou destruído durante a campanha policial de maio-junho. Nossa ação pela luta de classes revolucionária não diminuirá. Mas que os operários europeus saibam o que valem no Brasil as liberdades democráticas.


Inclusão 08/03/2019