Mao Tsé-tung na Revolução Chinesa

Chen Po-ta


China Moderna: centro de numerosas contradições no Oriente


Durante 100 anos e, especialmente, no fim do século XIX, a China foi o centro de numerosas contradições no Oriente. Em primeiro lugar, a China era uma semi-colônia das potências imperialistas do mundo que a saqueavam, considerada por estes como a maior e mais suculenta maçã da discórdia entre elas.

Em 1916, no Imperialismo, fase superior do Capitalismo, Lenin anotava:

"É natural que a luta por estes países semi-dependentes tenha chegado a ser particularmente feroz durante o período do capital financeiro, quando a partilha do mundo já estava concluída".(1)

A partilha da China é somente o começo, e a luta entre Japão, Estados Unidos, etc., devido a isto, irá se agudizar continuamente.(2)

Stalin escreveu em 1927:

"A China é uma nacionalidade compacta com uma população de várias centenas de milhões de habitantes que constituem um dos mercados de venda e exportação de capitais mais importantes do mundo. O imperialismo necessita golpear o corpo vivo da China nacional, despedaçá-lo e despojá-lo de províncias inteiras, para suas velhas posições serem preservadas, ou pelo menos reter algumas delas.(3)

Devido ao fato das potências imperialistas considerem então a China como seu campo de exploração, em muitas ocasiões formaram uma aliança para enfrentar a Revolução Chinesa. Por exemplo, em 1900, as forças aliadas de oito potências imperialistas invadiram Pequim e massacraram as forças patrióticas do movimento Yi Ho Tuan. Já no ano de 1927, os países imperialistas se opuseram em conjunto a grande Revolução Chinesa(4). Em outras oportunidades atuaram em conluio para repartir a China entre eles. Contudo, a ambição destas potências imperialistas para apoderar-se desta valiosa pilhagem, ou conquistar o controle exclusivo da China, conduziu a profundas contradições entre elas. Concluindo, tal como Mao Tsé-tung havia demonstrado, em “conflitos inter-imperialistas na China”.

Isto significou que, como resultado das contradições existentes entre os vários países imperialistas e seu desejo comum de repartir a China, suas forças presentes no país permaneciam mais divididas do que unidas. Em segundo lugar, as contradições e as lutas entre os imperialistas tiveram o efeito de agravar e agudizar as contradições e as lutas entre as velhas classes dominantes na China - os senhores feudais, a burguesia compradora -levando a contínuos e intermináveis conflitos entre os senhores da guerra.

Mao Tsé-tung disse em 1928:

“Uma característica essencial da China semicolonial era a existência prolongada e ininterrupta - desde o primeiro ano da República, em 1912 — de contínuas guerras empenhadas pelas diversas camarilhas dos velhos e novos senhores da guerra apoiados pelos imperialistas a partir do estrangeiro e pela burguesia compradora e os grandes latifundiários residentes no país... Este fenômeno se devia a duas razões: primeira, a fragmentação do país em regiões isoladas com sua própria economia agrícola [A China não possuía uma economia capitalista unificada]; segunda, a política imperialista de divisão e exploração da China, para que fosse partilhada em zonas de influência”.(5)

Ou seja, uma vez que as classes feudais e a burguesia compradora chinesas serviam as diferentes potências imperialistas e representavam os interesses de diferentes forças feudais locais, as hierarquias destas castas dominantes permaneciam também mais divididas que unidas.

Em terceiro lugar, a opressão exercida em conjunto pelo imperialismo e pelo feudalismo causaram ao povo chinês terríveis sofrimentos. Porém, desde a Guerra do Ópio no ano de 1840, o povo chinês sempre desencadeou inflexíveis e repetidas lutas contra o imperialismo e o feudalismo. Se houve intervalos nestas lutas, foram de curta duração. Por outra parte, considerando a China como uma grande país com uma enorme população, o número de pessoas mobilizadas, em cada um daqueles combates, era colossal.

O povo chinês lutou contra todas e cada uma das potências imperialistas que invadiram a China, e se recusou a ser submetido a qualquer um dos regimes contrarrevolucionários impostos pelos imperialistas.

A China estava comprometida em uma prolongada revolução.

Isto é, as contradições existentes entre o povo chinês, por um lado, e o imperialismo e o feudalismo, por outro, eram totalmente irreconciliáveis.

No curso de sua luta contra os imperialistas e os senhores feudais, o povo chinês chegou a converter-se, gradualmente, em uma força unificada, extremamente poderosa.

De tudo dito acima, pode-se deduzir que quando dizemos que a China moderna foi o ponto central das contradições no Oriente, queremos demonstrar brevemente que a China foi antes de tudo, o centro da agressiva luta entre os países imperialistas e, em segundo lugar, o centro da feroz luta entre a revolução e a contrarrevolução.

Obviamente, somente a vitória da revolução do povo chinês poderia resolver estas contradições, e a partir da China, romper as cadeiras do imperialismo no Oriente - o povo chinês teve a força para fazê-lo. Mas, foi somente sob a direção do proletariado que pode se organizar em uma poderosa força capaz de realizar a vitória.

A notável militância desenvolvida pela classe operária chinesa se deu principalmente por três razões. Em primeiro lugar: a classe operária estava submetida à opressão das três forças dominantes: o imperialismo estrangeiro, o feudalismo doméstico e o capitalismo. Em segundo lugar: se encontrava altamente concentrada. Ainda que a indústria chinesa fosse subdesenvolvida, concentrava uma grande parte de trabalhadores industriais que se ocupavam em modernas empresas, cada uma das quais empregava mais de 500 operários. Em terceiro lugar: ainda que os trabalhadores industriais fossem minoria em relação ao total da população, o número de proletários e semiproletários de diferentes camadas era gigantesco. Se incluirmos os semiproletários do campo - os trabalhadores pobres - com os proletários e semiproletários, em conjunto, constituíam mais da metade da população. A opressão tirânica do qual estavam submetidos era extremamente desumana. Por tais razões, a classe operária revolucionária desenvolveu uma poderosa força combativa, formou seu próprio partido político - o Partido Comunista - e liderou todas as classes revolucionárias chinesas.

A China, um extenso país empenhado em uma longa guerra revolucionária, exerceu a determinação que levou a um final feliz sua poderosa classe operária revolucionária, convertendo-se na liderança das amplas massas de camponeses bastante combativos e, por conseguinte, no líder real de todas as forças revolucionárias. Também porque no contexto internacional foi época da revolução proletária, a época na qual o socialismo triunfou pela primeira vez na Rússia, recebendo assim a Revolução Chinesa um excelente apoio inter-nacionalista. Estas coisas explicam porque era inevitável a vitória da revolução do povo chinês e o fracasso do imperialismo e seus lacaios - a classe feudal e a burguesia compradora. Stalin pontuou em 1927:

(...) “na China a luta contra o imperialismo deve assumir um conteúdo popular e um caráter claramente nacional, e irá se aprofundar passo a passo, desenvolver-se dentro de encarniçados combates contra o imperialismo até sacudir suas pilastras no mundo”.(6)

Este é o curso que os acontecimentos tomaram.

Naturalmente, não se deve supor que a vitória da revolução seria conquistada facilmente em um país tão vasto que anteriormente fora a maçã da discórdia entre os países imperialistas, e onde o feudalismo permanecera vivo durante séculos. Não, não foi fácil o caminho percorrido. Em um artigo escrito em agosto de 1949, Mao Tsé-tung descreveu o processo do triunfo:

“Eles lutaram, fracassaram, lutaram novamente, fracassaram de novo, voltaram a lutar, acumularam uma experiência de 109 anos, de centenas de lutas, grandes e pequenas, militares e políticas, econômicas e culturais, com ou sem derramamento de sangue e somente então obtiveram a vitória fundamental atual”.(7)

O processo da Revolução Chinesa foi extremamente tortuoso, intricado e cruel. Foi esta situação que levou a classe operária e ao povo chinês adquirir um temperamento heroico, e igualmente permitiu ao partido da classe operária chinesa - o Partido Comunista da China - fortalecer-se completamente. Além disso, as grandes experiências revolucionárias, que constituíram, precisamente, o tesouro da classe operária chinesa, enriqueceram inevitavelmente a teoria marxista-leninista.

As ricas experiências revolucionárias da China, foram cristalizadas no pensamento e nas obras de Mao Tsé-tung.

Em novembro de 1919, Lenin dizia aos comunistas no Oriente:

“Vocês têm diante de si uma tarefa que até agora os comunistas ainda não haviam enfrentado em nenhuma parte do mundo: se apoiando na teoria e na prática do comunismo, vocês tiveram que adaptá-las a condições particulares inexistentes nos países europeus e tornar-se capazes de aplicar teoria e prática às condições específicas, nas quais a maioria da população é formada por camponeses, e nas quais a tarefa é a luta não apenas contra o capitalismo, mas também contra os resquícios da Idade Média”.(8)

E novamente:

“Vocês têm que encontrar formas específicas para esta aliança dos primeiros proletários do mundo com as massas trabalhadoras e exploradas do Oriente, cujas condições de vida são, em muitos casos, medievais”.(9)

Lenin também anotou:

“A tarefa é despertar as massas trabalhadoras para a ação revolucionária, para a ação independente e para a organização, no nível que se encontram; traduzir a verdade da doutrina do comunismo para a linguagem de cada povo, tal como o fizeram os comunistas dos países mais avançados; cumprir tarefas práticas que devem realizar-se de imediato e se unir na luta dos proletários de todos os países. Este é um problema cuja solução vocês não encontrarão em nenhum manual comunista, mas que encontrarão na luta comum que a Rússia iniciou. Terão que abordar este problema e resolvê-lo por vossa própria experiência”.(10)

Como é amplamente conhecido, por meio dos seus escritos, os camaradas Lenin e Stalin resolveram os princípios básicos dos problemas anteriormente indicados por Lenin. Stalin também nos ofereceu importantes contribuições teóricas sobre a questão chinesa. A tarefa de Mao Tsé-tung, líder do Partido Comunista da China, foi a de continuar a obra de Lenin e Stalin, estudar de forma incessante a experiência chinesa e integrar a teoria geral e a prática do comunista com a prática concreta da Revolução Chinesa. A tradução da verdade da doutrina comunista, como foi realizada pelos comunistas dos países mais avançados, à linguagem do povo chinês, completou tal doutrina à luz das condições da China e a transformou na teoria e na prática da Revolução Chinesa. Assim, inspirou a centenas de milhares de seres humanos a unir-se à luta mundial contra o imperialismo, aliar-se com a URSS, com a classe operária e as camadas progressistas de outros países, com as nações oprimidas em todo o mundo. Com o cumprimento desta tarefa, o poder do imperialismo e seus lacaios foi demolido nas grandes terras da China.


Notas de rodapé:

(1) V. I. Lenin, "Obras Completas", edição inglesa, Edições Internacionais, Nova York, 1942, vol. XIX, página 153. (retornar ao texto)

(2) Ibid., página 167. (retornar ao texto)

(3) J. V. Stalin, “Obras”, edição inglesa, Edições em Línguas Estrangeiras, Moscou, 1954, vol. IX, página 262. (retornar ao texto)

(4) A luta revolucionária anti-imperialista e antifeudal sustentada pelo povo chinês sob a direção do Partido Comunista da China, pode ser dividida principalmente em quatro períodos: primeiro, o período da Grande Revolução ou o período da Guerra Expedicionária do Norte. Durante este, o Partido Comunista da China e o Kuomintang trabalhavam em cooperação e travaram uma luta revolucionária anti-imperialista e antifeudal que tomou a forma de uma Guerra Expedicionária ao norte do país contra os senhores da guerra da região. Mais tarde, a camarilha revolucionária do Kuomintang encabeçada por Chiang Kai-shek, que representava os interesses dos grandes senhores feudais e da grande burguesia, traiu a revolução; o segundo, o período da Segunda Guerra Civil Revolucionária (1927-1937), comumente chamada de Guerra Civil dos Dez Anos, ou o período da reforma agrária. As principais lutas durante este período foram estabelecer e expandir o poder político vermelho, realizar a reforma agrária e oferecer uma resistência armada ao governo reacionário do Kuomintang; o terceiro, o período da Guerra de Resistência Antijaponesa (1937-1945); o quarto, da Terceira Guerra Civil Revolucionária (desde o final da Guerra de Resistência em 1945 até a fundação da República Popular da China em 1949), também chamado de Guerra de Libertação do Povo Chinês. (retornar ao texto)

(5) Mao Tsé-tung, "Obras Escolhidas", Londres, vol. I, página 65. (retornar ao texto)

(6) J. V. Stalin, Obra citada, página 262-263. (retornar ao texto)

(7) Mao Tse-tung, “Obras Escolhidas”, Pequim, vol. IV, página 442. (retornar ao texto)

(8) V. I. Lenin, “Diretiva ao Segundo Congresso de Toda Rússia, das Organizações Comunistas dos Povos do Oriente”, Edições em Línguas Estrangeiras, Moscou, 1954, página 24. (retornar ao texto)

(9) Ibid., página 25. (retornar ao texto)

(10) Ibid., página 26. (retornar ao texto)

Inclusão 26/07/2019