Contribuição para o Estudo da Questão Agrária

Álvaro Cunhal

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A Grandeza dos Contrastes (continuação)


3. Distrito de Beja— A situação revela-se nos números seguintes:

Explorações Número Percentagem Hectares Percentagem
Com menos de 100 ha 17.857 93,1 271.544 30,8
Com mais de 100 h 1.325 6,9 609.150 69,2
Total 19.182 100,0 880.694 100,0
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Vê-se que 1.325 explorações, no total de 19.182, isto é, apenas 7 % das explorações, abarcam 609.150 ha do total de 880.694, ou seja, 69 % da área total de cultura arvense. Essas 1.325 explorações têm mais do dobro da terra do que as restantes 17.857. Têm tanta terra de cultura arvense como o total da superfície dos distritos de Coimbra e Viana do Castelo, onde existem quase 2 milhões de prédios rústicos e 115.000 explorações agrícolas.

O estudo mais pormenorizado das maiores explorações salienta o contraste:

Explorações Número Hectares Percentagem
Com 500 - 1.000 ha 157 117.750 13,4
Com 1.000 - 2.500 ha 95 166.250 18,9
Com 2.500 - 5.000 ha 15 56.250 6,3
Com mais de 5.000 ha 2 22.500 2,6
Total 269 362.750 41,2

As 269 explorações com mais de 500 ha, correspondendo a menos de 2 % do número de explorações, detêm quase metade da área de cultura arvense, e 112 com mais de 1.000 ha detêm quase tanta terra como 17.857 explorações com menos de 100 ha. Esta desproporção torna-se ainda mais viva, comparando as maiores com as mais pequenas:

Explorações Número Hectares
Com menos de 5 ha 7.561 16.294
Com 2.500 - 5.000 ha 15 56.250
Com mais de 5.000 ha 2 22.500

Vê-se que as 17 explorações com mais de 2500 ha têm cinco vezes mais terra que as 7561 com menos de 5 ha; as 2 de mais de 5000 ha, 50 % mais.

Com ligeiras diferenças, os concelhos do distrito apresentam panorama semelhante ao observado nos distritos de Portalegre e Évora. Nos concelhos de Alvito, Barrancos, Beja, Castro Verde, Cuba e Ferreira, um pequeno número de explorações com mais de 500 ha, representando de 2 % a 6 % do número de explorações, detém mais de metade da terra (no de Barrancos mais de quatro quintos). Nos de Aljustrel, Almodôvar, Mértola, Moura, Ourique, Serpa e Vidi-gueira coisa semelhante se verifica com as explorações com mais de 100 ha. No concelho de Ode-mira, único em que nem uma coisa nem outra sucede, aparecem, entretanto, 158 explorações de mais de 100 ha, representando 4 % das explorações, que abarcam 43 % da terra de cultura arvense.

Quanto à quota das maiores explorações, alguns concelhos destacam-se. Com explorações de mais de 1000 ha, o de Beja, onde 36 explorações, representando 2 % do total, detêm 47 % da terra. Com explorações de mais de 500 ha, os de Castro Verde, Ferreira e Moura, onde um número reduzido, representando 1 % a 2 %, detém 40 % da terra de cultura arvense.

Em mais nenhum distrito se observa tão notável concentração em todos os concelhos. Mas nalguns outros, como a seguir se verá, há concelhos onde os contrastes são tanto ou mais fortes que os apontados.

4. Distrito de Setúbal — A situação revela-se nos seguintes números:

Explorações Número Percentagem Hectares Percentagem
Com menos de 100 ha 11.972 97,6 78.109 34,1
Com mais de 100 ha 291 2,4 150.650 65,9
Total 12.263 100,0 228.759 100,0

Estes números revelam, no conjunto do distrito de Setúbal, uma situação semelhante à dos três distritos alentejanos. Vê-se que 291 explorações, no total de 12 263, isto é, menos de 3 % das explorações, atingem 150 650 no total de 228 759 ha, ou seja, 66 % da área total de cultura arvense. Essas 291 explorações têm cerca do dobro da terra das restantes 11 972.

O contraste aparece ainda mais vivo ao ver-se o número e extensão das maiores explorações e ao confrontá-los com os das mais pequenas:

Explorações Número Hectares Percentagem
Com menos de 5 ha 8.859 15.172 6,6
Com 500 - 1.000 ha 46 34.500 15,1
Com 1.000 - 2.500 ha 25 43.750 19,1
Com mais de 2.500 ha 6 22.500 9,8

As 77 explorações de mais de 500 ha ocupam mais terra do que as 11.972 de menos de 100 ha e sete vezes mais do que as 8.859 de menos de 5 ha. As 31 de mais de 1.000 ha ocupam quatro vezes mais terra do que essas 8859 e mesmo as 6 explorações de mais de 2500 ha ainda as ultrapassam! Cada uma das 6 maiores tem mais que cada 2000 das mais pequenas.

Como atrás se sublinhou, existem, no distrito de Setúbal, grandes diferenças entre os vários concelhos. Aproximando-se a sua situação global da dos três distritos alentejanos, isso pressupõe uma elevadíssima concentração em alguns concelhos. Assim é de facto. No de Alcácer do Sal, 17 explorações com mais de 1.000 ha, representando apenas 5 % das explorações, detêm 51 % da área total de cultura arvense. No de Montijo, 4 explorações de mais de 1.000 ha, no total de 1991 explorações, representando, portanto, apenas 0,2 %, detêm 52 % da área, ou seja, mais terra de cultura arvense do que as restantes 1.987! Seguem-se Grândola e Santiago do Cacem, onde, no conjunto, 28 explorações de mais de 500 ha, representando menos de 1 % do número, detêm 30 % da área e 171 de mais de 100 ha, representando 4 % do número, detêm 59 % da área. No concelho de Sines, 15 explorações com mais de 100 ha (4 %) abarcam 36 % da área de cultura arvense.

Além destes concelhos — todos, com excepção do Montijo, pertencentes ao Alentejo —, em nenhum outro as explorações com mais de 100 ha têm qualquer lugar importante. Mais precisamente: existem ao todo, nos restantes oito concelhos, apenas 5 explorações com mais de 100 ha de cultura arvense. Entretanto, tomando outras medidas para as maiores explorações, os contrastes (gritantes nuns casos, mais atenuados noutros) não deixam de evidenciar-se. Tomando as explorações de mais de 50 ha, nos concelhos de Palmeia e Setúbal, menos de 1 % das explorações detêm, respectivamente, 47 % e 56 % da área. Tomando as de mais de 10 ha, nos concelhos de Alcochete, Almada, Barreiro, Seixal e Sesimbra, 3 % a 11 % das explorações têm de 28 % a 47 % da área. E até no concelho de Moita, onde aparecem apenas 3 explorações com mais de 50 ha de cultura arvense e apenas 17 com mais de 10 ha, o mesmo fenómeno transparece, embora noutra escala: 42 explorações de mais de 5 ha, representando 8 % das explorações, detêm mais de metade da área de cultura arvense.

5. Distrito de Lisboa — No distrito de Lisboa, tomado no seu conjunto, não são tão significativos, como nos distritos que acabámos de estudar, os números referentes às explorações com mais de 100 ha de cultura arvense. Alguma coisa dizem, entretanto: 76 explorações, no total de 42.569, isto é, 0,2%, detêm 29.400 ha no total de 114.034 ha, ou seja, 26 % da área. Os contrastes evidenciam-se comparando as maiores explorações com as mais pequenas:

Explorações Número Hectares
Com menos de 1 ha 22,900 10.341
Com 100-500 ha 66 15.900
Com mais de 500 ha 10 13.500

As 76 explorações de mais de 100 ha possuem cerca de três vezes mais terra do que as 22.900 de menos de 1 ha e estas têm ainda menos do que as 10 maiores explorações.

Além do que esta comparação indica, pode-se ter uma ideia global da situação no distrito tomando, como limite entre as maiores e as menores explorações, não os 100 ha, nem mesmo os 50 ou os 10, os 5 ha. A situação apresenta-se, então, assim:

 

Explorações Número Percentagem Hectares Percentagem
Com menos de 5 ha 39.877 93,7 50.793 44,5
Com mais de 5 ha 2.692 6,3 63.243 55,5
Total 42.569 100,0 114.036 100,0

Vê-se que 6 % das explorações abrangem mais de metade da, terra, o que mostra o mesmo contraste, embora sem o predomínio de muito grandes explorações.

A diferença entre Os vários concelhos do distrito são, como atrás se notou, muito acentuadas, aparecendo apenas em dois concelhos o predomínio das explorações com mais de 100 e 500 ha. No de Vila Franca (próximo, pelos contrastes, dos alentejanos), 7 explorações com mais de 500 ha, representando menos de 0,5 % das explorações, detêm 52 % da terra de cultura arvense e 28 com mais de 100 ha, representando menos de 2 % do número, detêm 75 % da área. No de Oeiras, 2 explorações com mais de 500 ha, 2 % do número, detêm 25 % da terra e 12 com mais de 100 ha, 10 % do número, detêm 70 % da terra.

Noutros concelhos, tomando-se como medida das maiores explorações não os 500 ou 100 ha, mas os 50 ou os 10 ha, a situação não é menos nítida. Assim, tomando as explorações com mais de 50 ha nos concelhos de Azambuja e Cascais menos de 1 % do número abarcam respectivamente 53 % e 44 % da área. Tomando as com mais de 10 ha, no de Azambuja, 2 % do número abarcam 63 % da área, no de Cascais, respectivamente 5 % e 63 %; no de Alenquer, 3 % e 43 %; no de Loures, 4 % e 54 %; no de Sintra, 3 % e 39 %. No concelho de Azambuja, as 16 maiores explorações têm quatro vezes mais terra do que as 1737 mais pequenas (com menos de 1 ha de cultura arvense).

Apesar de que, em todos os concelhos do distrito, o grande número de explorações médias (de 1 a 5 ha de cultura arvense) reduz os contrastes, estes são suficientemente nítidos, como se acaba de ver, na maior parte dos concelhos. E mesmo nos restantes (Arruda dos Vinhos, Cadaval, Lourinhã, Mafra, Sobral e T. Vedras), embora haja maior equilíbrio do tamanho das explorações no que respeita a cultura arvense (para um panorama mais preciso seria necessário incluir a vinha), importantes diferenças se podem notar. Assim, por exemplo, na Arruda, as explorações com menos de 1 ha, sendo 52 % do número, têm apenas 14 % da área.

6. Distrito de Santarém — Tal como no distrito de Lisboa, também no de Santarém, tomado globalmente, não são dominantes as posições das explorações com mais de 500 ou de 100 ha. No entanto, 195 explorações com mais de 100 ha, no total de 60.494 explorações, ou seja, 0,3 %, detêm 77.050 no total de 214.730 ha de cultura arvense, isto é, 36 %. O contraste torna-se mais nítido comparando as maiores explorações com as mais pequenas:

Explorações Número Hectares
Com menos de 1 ha 34.719 15.576
Com 100-500 ha 161 37.550
Com mais de 500 ha 34 39.500

As 195 explorações com mais de 100 ha têm cinco vezes mais terra do que as 34.719 com menos de 1 ha e estas têm ainda menos de metade do que que as 34 maiores.

Pode ter-se uma ideia global da situação no distrito, tomando os 10 ha como limite entre as maiores e as mais pequenas. A situação apresenta-se então assim:

Explorações Número Percentagem Hectares Percentagem
Com menos de 10 ha 58.405 96,5 84.410 39,3
Com mais de 10 ha 2.089 3,5 130.320 60,7
Total 60.494 100,0 214.730 100,0

Vê-se que menos de 4 % das explorações abarcam pouco menos de dois terços da terra de cultura arvense, o que, embora noutra escala, oferece um contraste não menos nítido do que no distrito de Beja, por exemplo.

Quanto às diferenças entre os concelhos do distrito, em alguns predominam nitidamente as grandes explorações. É o caso de Abrantes, Benavente, Chamusca, Coruche e Golegã, onde as explorações com mais de 100 ha, representando de 0,5 % a 3% do número total de explorações, detêm mais de metade da área de cultura arvense. No conjunto destes cinco concelhos, 108 explorações no total de 10.569, ou seja, 1% das explorações, detêm 48.400 no total de 86.585 ha, isto é, 56% da área de cultura arvense. No concelho de Abrantes, 34 explorações possuem quase dez vezes mais terra do que as 4.531 explorações mais pequenas! Nestes concelhos, as explorações com mais de 500 ha, embora não abarcando metade da terra, não deixam de ocupar importante lugar: no conjunto dos cinco concelhos, 23 explorações detêm nada menos de um terço da área de cultura arvense.

Seguem-se os concelhos de Almeirim, Alpiarça, Cartaxo, Constância, Salvaterra e Santarém, em qualquer dos quais um reduzido número de explorações com mais de 50 ha, representando cerca de 1% do número, abarca pouco menos de metade da área. Tomando as explorações de mais de 10 ha (nestes concelhos como no do Entroncamento, T. Novas e V. N. da Barquinha), 2% a 8% do número abrangem 51% a 71% da terra.

Quanto aos restantes concelhos (Alcanena, Rio Maior, Sardoal, Tomar, F. do Zêzere, Mação e V. N. de Ourém), apenas nos quatro primeiros pesam alguma coisa as explorações de mais de 10 ha, com 1% a 2% das explorações detendo de 20% a 40% da área de cultura arvense. Nos outros três a sua importância é quase nula, sobretudo nos de Mação e V. N. de Ourem, onde não ocupam mais que, respectivamente, 3 % e 1 % da área. Entretanto, embora predominando a pequena propriedade (no que respeita à cultura arvense) não se deixam de notar visíveis contrastes. No conjunto dos sete concelhos, enquanto 883 explorações com mais de 5 ha detêm 30 % da terra, 18.480 explorações com menos de 1 ha detêm apenas 18%.

7. Distrito de Castelo Branco — Dadas as grandes diferenças entre os vários concelhos do distrito, os números globais referentes às maiores explorações apresentam-se muito semelhantes aos do distrito de Santarém: 179 explorações, com mais de 100 ha, no total de 43.715 explorações, ou seja, 0,4%, detêm 64.050 no total de 187.016 ha, ou seja, 35%. O contraste torna-se mais nítido comparando as maiores explorações com as mais pequenas:

Explorações Número Hectares
Com menos de 1 ha 26.570 10.256
Com 100-500 ha 156 34.800
Com mais de 500 ha 23 25.250

As 179 explorações de mais de 100 ha possuem seis vezes mais terra de cultura arvense do que as 26.570 de menos de 1 ha e estas não alcançam sequer metade daquilo que possuem as 23 maiores.

Para se ter uma ideia global da situação do distrito podem tomar-se os 10 ha (tal como se fez para Santarém) como limite entre as maiores e as mais pequenas. Teremos então:

Explorações Número Percentagem Hectares Percentagem
Com menos de 10 ha 41.052 93,9 56.266 30,1
Com mais de 10 ha 2.663 6,1 130.750 69,9
Total 43.715 100,0 187.016 100,0

Vê-se que 6% das explorações abarcam mais de dois terços da terra. Estudada a situação nos concelhos, um se destaca pelo predomínio das grandes explorações: o de Idanha-a-Nova, onde 114 com mais de 100 ha, representando apenas 4 % das explorações, possuem 60 % da terra de cultura arvense, e onde 20 com mais de 500 ha representando menos de 1 % do número abarcam 28 % da área. Segue-se o de Castelo Branco, onde 23 explorações com mais de 100 ha, menos de 0,5 % do número, detêm cerca de um terço da área e onde as com mais de 10 ha, representando 6 % do número, detêm 69 % da área. No concelho de Penamacor, os contrastes são esbatidos pela elevada percentagem de explorações com mais de 10 ha; mostra-se, porém, que as de mais de 50 ha, sendo 1 % do número, detêm 21 % da área. Nos concelhos de Belmonte, Covilhã, Fundão, Vila Velha de Ródão, as explorações de mais de 10 ha, representando de 2 % a 6 % do número, detêm de 39 % a 51 % da área.

Nos restantes concelhos (Oleiros, Proença, Sertã e Vila do Rei) rareiam as explorações com mais de 10 ha de cultura arvense (em Vila do Rei não aparece nenhuma com mais de 5 ha) e esbatem-se ainda mais os contrastes, que se revelariam, sem dúvida, se pudéssemos estudar a divisão da propriedade dos pinhais que predominam nestes concelhos. Não se mostra, todavia, um nivelamento. No conjunto dos quatro concelhos, as explorações com menos de 1 ha de cultura arvense, representando 79 % do número, ocupam apenas 37 % da área.

8. Distrito de Faro — Considerando o distrito no seu conjunto, os números são menos significativos que nos distritos que acabamos de estudar. O confronto das maiores explorações com as mais pequenas não deixa, porém, de oferecer um nítido contraste:

Explorações Número Hectares
Com menos de 1 ha 11.920 5.486
Com 50-100 ha 143 10.725
Com mais de 100 ha 41 10.150

11.920 explorações no total de 36.112, ou seja, 33 % das explorações, possuem 5.486 no total de 191.106 ha, ou seja, apenas 3 % da terra de cultura arvense. As 184 explorações com mais de 50 ha possuem cerca de quatro vezes mais terra que as citadas 11.920. E as 41 com mais de 100 ha possuem, também, quase o dobro destas.

Apesar da área de cultura arvense relativamente pouco extensa que cabe às explorações de mais de 50 ha no conjunto do distrito (11 % do total), nalguns concelhos um número reduzido de explorações com tal dimensão abarca parte considerável da terra. Nos concelhos de Alcoutim, Algezur, Faro, Lagoa, Portimão, Vila do Bispo e V. R. de Santo António, 97 explorações, representando apenas 1 % do número, detêm um quinto da área. Essas 97 explorações possuem mais do dobro da terra de cultura arvense que as 11.920 com menos de 1 ha existentes em todo o distrito.

Noutros concelhos, as explorações com mais de 10 ha, em número relativamente reduzido, detêm um terço, dois quintos e mais da terra de cultura arvense. É o caso de Loulé, Monchique, Albufeira e Lagos, onde elas representam de 5 % a 12 % do número e detêm de 36 % a 45 % da área.

Nos demais concelhos são mais apagados os contrastes, seja porque, como no caso de Castro Marim, Silves e Tavira, as explorações de mais de 10 ha, abarcando embora dois terços ou três quartos da terra, correspondem, também, a uma elevada quota do número total das explorações; seja porque, como no caso de Alportel e Olhão, não são indicadas explorações com essas dimensões. Nestes dois últimos concelhos verifica-se, entretanto, que as explorações com mais de 5 ha, representando 10 % do número, detêm 40 % da área.

Estudados os distritos que se situam total ou parcialmente em regiões de grande propriedade, restam aqueles onde predominam as explorações agrícolas de pequena ou moderada extensão. Nesses distritos é difícil fazer uma correcta ideia da divisão da propriedade, pois seria necessário considerar também, não só outras culturas, como o facto de haver quem tenha mesmo de "conta própria" mais de uma exploração ou, arrendadas, numerosas pequenas explorações. Mesmo, porém, sem se tomarem em conta esses factores, a simples estimativa, na mesma base da feita para os distritos já citados, mostra estar-se longe, nos chamados distritos de pequena propriedade, de uma equitativa distribuição da terra. Comecemos o seu estudo pelo extremo nordeste transmontano.

9. Distrito de Bragança — O predomínio das explorações com 1-5 ha de cultura arvense apaga, em larga medida, os contrastes. As explorações com mais de 5 ha ocupam, é certo, 77 % da área de cultura arvense, mas correspondem também a uma elevada quota (36%) do número total de explorações. Entretanto, o confronto das maiores com as mais pequenas não deixa de ser significativo:

Explorações Número Percentagem Hectares Percentagem
Com menos de 1 ha 6.505 18,6 2.801 1,4
Com 10-50 ha 4.750 13,5 90.020 44,1
Com mais de 50 ha 92 0,3 7.850 3,8

Salta à vista a desigualdade. As 4.842 de mais de 10 ha (com a média de 20 ha de cultura arvense) têm 35 vezes mais terra que as 6.505 de menos de 1 ha (média: 0,4 ha). As 92 maiores explorações têm quase três vezes mais terra que as 6.505 mais pequenas.

Os concelhos do distrito não oferecem grandes diferenças entre si, correspondento todos, nas suas linhas gerais, à situação do distrito no seu conjunto. É, todavia, de notar que onde os contrastes são mais visíveis é precisamente no concelho onde são menos numerosas as explorações com mais de 5 ha: Car-razeda de Ansiães. Em todos os outros concelhos, as áreas de cultura arvense que cabem a tais explorações sobem, é certo, a mais de metade da área total e, em cinco, a mais de 80 %; mas também o seu número vai de 20 % a 60 %. Em Carrazeda, embora representando apenas 5 % do número, elas detêm 33 % da área. Este exemplo mostra como a nitidez dos contrastes nem sequer coincide com o predomínio das explorações de grande extensão. A verificação tem importância para o estudo do problema nas regiões de pequena propriedade.

10. Distrito de Vila Real— Ao contrário do de Bragança, no distrito de Vila Real os números globais do distrito são bastante significativos: 3526 explorações com mais de 5 ha, representando 8 % das explorações, detêm 38 430 no total de 88 314 ha, ou seja, 44 % da área de cultura arvense. O contraste torna-se mais nítido comparando as maiores explorações com as mais pequenas:

Explorações Número Hectares
Com menos de 1 ha 23.422 9.420
Com mais de 10 ha 932 18.975

As 932 maiores explorações, apesar da sua moderada extensão, possuem o dobro da terra de cultura arvense do que as 23.422 mais pequenas.

As diferenças entre os concelhos do distrito são muito acentuadas. Nos de Boticas, Montalegre, Murça e Valpaços, um número restrito de explorações com mais de 10 ha, representando de 2 % a 10 % do número total, detêm parte importante da terra (de 18 % a 43%). Nos de Alijó, Chaves e Vila Pouca de Aguiar, o mesmo sucede com as explorações de mais de 5 ha, pois cerca de 3 % do número detêm de 18 % a 33 % da área. Nos restantes concelhos (Ribeira de Pena, Mondim de Basto, Régua, Mesão Frio, Sabrosa, Santa Marta de Penaguião) cabe uma quota reduzida da área de cultura arvense às explorações com mais de 5 ha. Isto deve-se, em grande parte, a ser a cultura arvense nesses concelhos muito reduzida, especialmente nos quatro últimos, em pleno Alto Douro, onde impera a vinha. Segundo a nossa estimativa, em nenhum destes seis concelhos a cultura arvense chega a ocupar 10 % da superfície territorial. Os contrastes haveria que estudá-los em relação à vinha, mas isso não pode fazê-lo a presente estimativa.

11. Distrito de Viária do Castelo — Dado o predomínio das explorações de 1 a 3 ha e o reduzido numero daquelas que têm mais de 5 ha de cultura arvense (apenas 225 no total de 43 883, não abrangendo mais de 5% da terra), os contrastes são muito atenuados. Da medida da desigualdade pode, entretanto, fazer-se uma ideia pelo confronto das maiores com as mais pequenas explorações: enquanto 15 912 explorações com menos de 0,5 ha, representando 36 % do total, têm apenas 4056 ha, 1267 explorações com mais de 3 ha têm 6431 ha.

Visto assim o panorama do distrito, tem-se uma ideia daquele que cada concelho oferece, pois nenhum apresenta a este respeito particularidade merecedora de atenção.

12. Distrito de Braga — Embora, no distrito de Braga, escasseiem as explorações com mais de 50 ha de cultura arvense (apenas 15) os contrastes são mais nítidos que no de Viana do Castelo. De facto, 4.042 explorações com mais de 5 ha, no total de 48.068 explorações, ou seja, 8 % do número, detêm 36.860 no total de 98.058 ha, ou seja, 38 % da área. A comparação das maiores explorações com as mais pequenas dá uma ideia mais precisa da situação:

Explorações Número Hectares
Com menos de 1 ha 23.329 9.526
Com 5 - 10 ha 3.470 26.025
Com mais de 10 ha 572 10.835

Vê-se que 4.042 explorações têm cerca de quatro vezes mais terra que as 23.329 mais pequenas e que estas têm menos ainda que as 572 com mais de 10 ha.

Os concelhos oferecem diferenças a notar. Nos de Braga, Guimarães, Vila Verde e Famalicão, às explorações com mais de 10 ha de cultura arvense, representando de 1 % a 4 % do número, cabem de 15 % a 27 % da área — o que representa parcela de certa importância. Noutros (Amares, Barcelos, Bs-posende, Fafe, Póvoa de Lanhoso) sucede coisa semelhante com as explorações cora mais de 5 ha: 5 % a 8 % das explorações abarcam de 20 % a 32 % da terra. Nos restantes (Cabeceiras e Celorico de Basto, Terras do Bouro e Vieira), as explorações com mais de 5 ha de cultura arvense são em pequeníssimo número, menos de 2 % do total, e não lhes cabe mais de 1 % a 8 % da área.

13. Distrito do Porto — No distrito do Porto são ainda mais raras que no de Braga as explorações com mais de 50 ha (apenas 7). No entanto, aquelas com mais de 10 ha, representando apenas 2 % das explorações, detêm um quinto da terra de cultura arvense e 5492 com mais de 5 ha no total de 54 570, representando pois 10 % do número, detêm 52 558 no total de 11 922 ha, ou seja, 47 % da área. A comparação das maiores explorações com as mais pequenas dá uma ideia mais precisa da situação:

Explorações Número Hectares
Com menos de 1 ha 29.922 9.770
Com 5 - 10 ha 4.331 32.483
Com mais de 10 ha 1.161 20.075

Vê-se que 5492 explorações têm mais de cinco vezes mais terra de cultura arvense que as 29 922 mais pequenas e que estas (representando 55 % do número total de explorações e detendo apenas 9 % da terra) têm ainda menos de metade que as 1161 com mais de 10 ha.

A situação nos concelhos é desigual quanto à extensão das explorações, mas semelhante quanto ao aspecto dos contrastes. Nalguns concelhos, as explorações com mais de 10 ha, representando uma mínima parte das explorações, possuem importante quota da terra: nos de Amarante, Maia, Matosinhos, Santo Tirso, Vila do Conde e Lousada representam 2 % a 15 % do número e detêm de 20 % a 49 % da área. Noutros sucede o mesmo com as explorações de mais de 5 ha: nos de Baião, Felgueiras, Gondomar, Marco, Paredes, Penafiel, Porto, Póvoa e V. N. de Gaia representam de 2 % a 12 % do número e detêm de 21 % a 44 % da área.

Nalguns concelhos o predomínio das explorações de 1 a 5 ha (particularmente de 1 a 3 ha) atenua muito os contrastes. O estudo das explorações mais pequenas permite contudo avivá-los. Assim, tomando explorações com menos de 1 ha: em Amarante elas representam 48 % do número e possuem 7 % da área; em Baião, respectivamente 54% e 14 %; no Marco, 51 % e 10 %; em Paços de Ferreira, 61 % e 18 %. Tomando explorações com menos de 0,5 ha: em Felgueiras, representam 57 % do número e possuem apenas 7 % da área; no Porto, respectivamente 48 % e 10 %; em V. N. de Gaia, 60 % e 12 %. Finalmente, tomando explorações com menos de um quarto de hectare: na Maia representam 64 % do número e possuem apenas 6 % da área; em Matosinhos, respectivamente 63 % e 6 %. Vê-se, com toda a clareza, a situação de nítido desfavor das mais pequenas explorações.

14. Distrito de Aveiro — Praticamente inexistentes as explorações com mais de 50 ha de cultura arvense (apenas 3), predominantes em alguns concelhos as explorações de 1 a 5 ha, os contrastes são pouco nítidos. Entretanto, as explorações com mais de 5 ha, representando 5 % das explorações, detêm 25 % da terra de cultura arvense. A sua comparação com as explorações mais pequenas esclarece melhor a situação:

Explorações Número Percentagem Hectares Percentagem
Com menos de 1 ha 31.650 52,1 14.642 14.1
Com mais de 5 ha 3.003 4,9 25.905 24.9

Vê-se que 3.003 explorações com mais de 5 ha detêm quase o dobro da terra do que as 31.650 com menos de 1 ha, as quais, representando embora mais de metade do número, possuem apenas 14 % da área.

Observada a situação nos diversos concelhos, apenas no de Albergaria-a-Velha as explorações com mais de 10 ha de cultura arvense ocupam importante parte da área: 89, representando 3 % do número, possuem 21 % da área, enquanto 1433, com menos de 1 ha, representando 48 % do número, possuem apenas 9 % da área. Seguem-se os concelhos de Águeda, Aveiro, Estarreja, Feira, Ílhavo, Murtosa, Oliveira de Azeméis, Oliveira do Bairro, Ovar e Vagos, onde as explorações com mais de 5 ha, embora em número reduzido, ocupam uma quota da área relativamente importante. Nos de Aveiro e Murtosa representam 7 % do número e possuem 31 % da área, enquanto as com menos de 1 ha representam respectivamente 42 % e 56 % do número e possuem apenas 9 % e 14 % da área; no de Ovar, representam 6 % do número e possuem 28 % da área, enquanto as com menos de 1 ha representam 48 % do número e possuem apenas 12 % da área. Apesar de região das mais características de pequena propriedade, está-se longe de um nivelamento.

Nos restantes concelhos, as explorações com mais de 5 ha pouco representam, não chegando a ter 10 % da área de cultura arvense nos concelhos de Arouca, Espinho e Mealhada, e nem sequer 1 % nos de Sever do Vouga e Vale de Cambra.

15. Distrito de Viseu — Salvo Viana do Castelo e Leiria, em nenhum outro distrito as explorações com mais de 5 ha de cultura arvense ocupam tão modesto lugar como no de Viseu: 3 % do número, 19 % da terra. O confronto das maiores com as menores não deixa contudo de ser esclarecedor: enquanto 8520 com mais de 3 ha, representando 10 % do número, possuem 48.390 ha, correspondentes a 36 % da área, 45.850 com menos de 1 ha, representando 53 % do número, possuem apenas 21.963 ha, correspondentes a 16 % da área. Um décimo das explorações possui assim mais do dobro da terra que mais de metade das mesmas.

Se a situação, no conjunto do distrito, não oferece mais nítidos contrastes, outro tanto não sucede em alguns concelhos. No de Penalva do Castelo, as explorações de mais de 10 ha representam 3 % do número e detêm 32 % da área e as de mais de 5 ha, representando 8 % do número, detêm 45 % da área; em confronto com estas, as de menos de 1 ha representam 43 % do número e detêm apenas 9 % da terra. No de Penedono, as de mais de 10 ha representam 5 % do número e detêm 32 % da terra, enquanto as de menos de 1 ha representam 33 % do número e detêm apenas 6 % da terra.

Noutros concelhos (Moimenta, Mortágua, Resende, S. João da Pesqueira, S. Pedro do Sul, Sernan-celhe, Tabuaço e V. N. de Paiva) observa-se situação semelhante em relação às explorações de mais de 5 ha: 4 % a 14 % das explorações, possuindo de 20 % a 48 % da terra, enquanto as explorações de menos de 1 ha, representando de 33 % a 57 % do número, possuem apenas de 6 % a 15 % da área.

Nos restantes 14 concelhos, o peso das explorações de mais de 5 ha é muito reduzido, havendo 10 concelhos onde não chegam a possuir 10 % da área. Nesses, os contrastes são necessariamente mais atenuados.

16. Distrito da Guarda — Apesar do reduzido número das explorações com mais de 50 ha de cultura arvense (apenas 72 detendo 3 % da área), os contrastes são nítidos: 3.867 explorações de mais de 10 ha, no total de 52.356, abarcam 80.310 no total de 189.264 ha. É esclarecedora a comparação das maiores explorações com as mais pequenas:

Explorações Número Percentagem Hectares Percentagem
Com menos de 1 ha 21.386 40,8 9.014 4,8
Com mais de 10 ha 3.867 7,4 80.310 42,4

Vê-se que as 3.867 maiores explorações detêm quase nove vezes mais terra que as 21.386 mais pequenas. As primeiras, representando apenas 7 % das explorações, possuem 42 % da terra; as últimas, representando 41 % das explorações, possuem apenas 5 % da terra. O contraste é flagrante.

Guarda oferece o aspecto particular de serem mais nítidos os contrastes no distrito considerado em globo do que nos seus concelhos considerados separadamente. Entretanto, em alguns, a posição das maiores explorações é igualmente clara. Tomando as explorações com mais de 10 ha: em Celorico da Beira representam 4 % do número e detêm 30 % da área; na Guarda, respectivamente 11 % e 54 %; em Meda, 8 % e 34 %; em Pinhel, 11 % e 46 %; no Sabugal, 8 % e 37 %; em Trancoso e V. N. de Foz Côa, 4 % e 27 %. Tomando as com mais de 5 ha: em Fornos de Algodres, 6 % e 29 %; em Gouveia, 3 % e 27 %; em Manteigas, 3 % e 22 %; em Trancoso, 13 % e 53 %. Nos restantes concelhos, a situação aparece menos clara, dois havendo (Aguiar da Beira e Seia) onde as explorações de mais de 5 ha ocupam modesto lugar.

17. Distrito de Coimbra — Às explorações com mais de 10 ha de cultura arvense, representando menos de 1 % das explorações, cabem 10 % da área. Às com mais de 5 ha (3.799 no total de 73.821, ou seja 5 %) cabem 36.743 no total de 127.324 ha, ou seja, 29 %. O confronto com as mais pequenas dá uma ideia mais nítida da situação:

Explorações Número Percentagem Hectares Percentagem
Com menos de 1 ha 40.452 54,8 19.547 15,3
Com mais de 5 ha 3.799 5,1 36.743 28,9

Vê-se que 3.799 explorações de mais de 5 ha detêm quase o dobro da terra das 40.452 menores, que, embora correspondendo a mais de metade das explorações, possuem apenas 15 % da terra de cultura arvense.

Os concelhos do distrito oferecem diferenças muito sensíveis. No da Figueira da Foz, as explorações com mais de 10 ha, representando 2 % do número, possuem 21 % da área, as com mais de 5 ha, representando 11 % do número, possuem 47% da área, e as com menos de 1 ha, embora representando 45% do número, possuem apenas 8 % da área. No concelho de Montemor-o-Velho, as com mais de 10 ha, representando 3 % do número, possuem 19 % da área, as com mais de 5 ha, representando 15 % do número, possuem 50 % da área e as com menos de 1 ha, embora representando 36 % do número, apenas possuem 6 % da área. São estes os dois concelhos onde se notam mais nítidos contrastes. Entretanto, também noutros são claros: no de Coimbra, enquanto as explorações com mais de 5 ha representam 2 % do número e 17 % da área, as com menos de 1 ha representam respectivamente 67 % e 24 %. Também no de Soure as de mais de 5 ha, representando 6 % do total das explorações, detêm 29 % da terra de cultura arvense.

Nos restantes concelhos, as explorações com mais de 5 ha, ou ocupam muito modesto lugar (menos de 5 % da área de cultura arvense nos concelhos de Góis, Pampilhosa da Serra, Penacova, Penela, Poia-res), ou, embora abrangendo parte importante da área, correspondem também a elevada quota do número de explorações (Mira: 14 % do número e 31 % da área). Nesses concelhos, os contrastes são necessariamente mais esbatidos.

18. Distrito de Leiria — Depois de Viana do Castelo, é Leiria o distrito onde as explorações com mais de 5 ha de cultura arvense ocupam mais modesto lugar: 2 % do número, 14 % da terra. O confronto das maiores com as mais pequenas não deixa, porém, de ser esclarecedor: enquanto 4.396 com mais de 3 ha (7 %) possuem 24.628 ha (30 %), 40.374 com menos de 1 ha (63 %) possuem apenas 18.786 ha (23 %). As maiores, apenas 7 %, possuem mais terra do que as mais pequenas, que constituem, entretanto, 63 % do total.

Os concelhos apresentam um panorama semelhante ao do distrito no seu conjunto. Deve, no entanto, salientar-se o concelho de Óbidos, onde 15 explorações de mais de 10 ha (menos de 1 % das explorações), detêm 16 % da terra, e 92 de mais de 5 ha (4 %) detêm 28 % da terra. Em mais nenhum concelho as explorações com mais de 5 ha de cultura arvense chegam a ocupar 20 % da área, e 6 há (Alvaiázere, Bombarral, Castanheira de Pêra, Figueiró dos Vinhos, Pedrógão Grande e Porto de Mós) onde não ocupam sequer 10 %. Daí a atenuação dos contrastes. Porém, em Alcobaça, Caldas da Rainha, Leiria e Nazaré a posição das maiores explorações apresenta-se destacada: representando 2 % e 3 % do número, possuem de 16 % a 19 % da área.

Assim terminamos o estudo de todos os distritos do continente. A estimativa feita ajuda a formar uma ideia mais exacta do regime da propriedade. Confirma a divisão do País em duas grandes zonas — onde predomina a grande e onde predomina a pequena propriedade—, confirma e acentua os monstruosos contrastes nas regiões de grande propriedade e (embora de forma insuficiente) revela — julgamos que pela primeira vez — a real importância dos contrastes nas regiões de pequena propriedade.


Inclusão 24/07/2006