A Constituição Iugoslava

Étienne Fajon(1)


Fonte: Problemas - Revista Mensal de Cultura Política, nº 3, outubro 1947.
Transcrição e HTML: Fernando A. S. Araújo.
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Transformações Econômicas e Sociais na Iugoslávia

A Constituição iugoslava reflete as profundas transformações operadas no curso dos últimos anos na estrutura econômica e social do país.

Estas transformações não significam, contrariamente às afirmações de uma propaganda interessada, a instauração do socialismo na Iugoslávia. Essencialmente, resultam de duas ordens de medidas — o castigo da traição e a reforma agrária.

Antes da guerra, os postos de comando da indústria e do crédito na Iugoslávia estavam na mão dos capitalistas estrangeiros. Os capitalistas alemães ocupavam o primeiro lugar nesta colonização da economia iugoslava; depois da ocupação do país pelo Exército hitlerista, estenderam eles a sua dominação a todas as empresas essenciais.

Quanto aos grandes capitalistas do país, formaram, na maioria, por interesse de classe, a base social da traição e da colaboração com o inimigo; sustentaram, financeiramente e por todos os outros meios, o pseudogoverno de Nedic (o Quisling sérvio), os bandos do traidor Mihajlovic, os ustachi de Pavelic na Croácia, etc.

Desde a libertação do seu país, os iugoslavos tiraram consequências desta situação. No mesmo espírito que inspirara, na França, o Conselho Nacional da Resistência, quando inscreveu no seu programa "o confisco dos bens dos traidores", as autoridades provisórias surgidas da luta de libertação na Iugoslávia decidiram efetivamente, a 21 de novembro de 1944, confiscar e pôr nas mãos do Estado os bens e empresas pertencentes aos alemães, aos criminosos de guerra iugoslavos e aos seus cúmplices. Esta decisão levava à nacionalização de 82% da indústria do país.

A reforma agrária, realizada de acordo com uma lei votada em agosto de 1945 pela Assembleia Popular provisória, trouxe modificações não menos profundas às relações sociais na Iugoslávia.

O regime agrário desse país, onde os camponeses constituem 80% da população, lembrava, no essencial, até então, o regime em vigor na França antes da Revolução de 1789. Caracterizava-se pela força da grande propriedade rural. O exame das estatísticas demonstrava, por exemplo, que 200 grandes proprietários rurais dispunham de quase tanta terra quanto 300.000 explorações camponesas pobres. Entre esses grandes proprietários rurais figuravam muitos estrangeiros e a Igreja Católica.

A lei de reforma agrária, liquidando os vestígios feudais na Iugoslávia, confisca sem indenização os domínios dos grandes proprietários rurais e os reparte entre os camponeses sem terra ou rendeiros.

Fixa um máximo legal à propriedade rural (25 a 35 hectares de terra arável). As terras dos cultivadores ricos, que ultrapassem o máximo legal, são transmitidas igualmente aos trabalhadores do campo, com indenização dos interessados. A reforma faz passar às mãos dos trabalhadores do campo 95% das terras cultivadas.

Tais são as duas transformações democráticas essenciais na ordem econômica e social. A primeira (nacionalização, especialmente dos monopólios) é a base de um profundo melhoramento da legislação sociais. A segunda (reforma agrária) deu nascimento a um desenvolvimento considerável do movimente cooperativo no campo e, em particular, à criação de cooperativas de produção, fundadas sobre o princípio da livre adesão e equipadas em virtude do confisco do material dos grandes proprietários rurais.

A Constituição iugoslava não podia deixar de registrar estas transformações econômicas e sociais que são o alicerce mesmo das novas instituições.

A Organização Social e Econômica na Constituição

O capítulo IV da Constituição fixa os princípios da organização social e econômica da nova Iugoslávia.

Esses princípios são os seguintes:

1. — Garantia da propriedade privada:

"A propriedade privada e a iniciativa privada são garantidas.

"A herança da propriedade privada é garantia..." (art. 18).

2. — Consagração da abolição dos monopólios:

"...Ficam interditas as organizações privadas monopolizadas, como cartéis, sindicatos, trustes e organizações semelhantes criadas com o fim de ditar preços, monopolizar mercados e atentar contra os interesses da economia nacional..." (art. 18).

3. — Consagração da reforma agrária:

"A terra pertence aos que a trabalham.

". . .O máximo de propriedade privada em terras é fixado pela lei.

"O Estado protege e auxilia particularmente o camponês pobre e o camponês médio. . ." (art. 19).

4. — Consagração da nova legislação social e proteção ao trabalhador assalariado (art. 20).

5. — Auxílio às cooperativas (art.- 17).

Os artigos do capítulo IV constitucionalizam a existência de três formas de propriedade: a propriedade do povo (nas mãos do Estado, de que é "o apoio essencial no desenvolvimento da economia nacional"), a propriedade cooperativa e a propriedade privada.

Acrescentemos que a importância do setor econômico que fica sob a direção do povo e do seu Estado permite introduzir na Constituição, não como uma fórmula vazia, o princípio do plano econômico geral (art. 15).

Em suma, a organização social e econômica inscrita na Constituição iugoslava reflete a transferência, para o povo, do antigo poder dor trustes e da grande propriedade rural. Esta organização é a base da nova democracia popular, que os operários, os camponeses, os intelectuais, numa palavra, o povo, têm papel decisivo.

A Iugoslávia na Luta Contra o Fascismo

A Iugoslávia não recebeu a democracia como um presente do exterior. Conquistou-a numa luta heróica e vitoriosa pela sua libertação nacional. Inteiramente ocupada pelos Exércitos inimigos na primavera de 1941, a Iugoslávia os expulsou com as suas próprias forças.

A resistência iugoslava, que aumentou e venceu sob a prestigioso direção do Marechal Tito, foi a princípio obra de destacamentos minúsculos de partisans, que não dispunham de armas. Esses destacamentos se tornaram fortes unidades armando-se às custas do inimigo. No outono de 1942, foram constituídos em Exército regular. O Exército Popular de Libertação iugoslavo nasceu; deveria contar 250.000 homens nos fins de 1943.

Mas a luta do povo e do Exército surgido do seu seio contra o ocupante hitlerista era ao mesmo tempo a luta contra a monarquia iugoslava e o seu aparelho de Estado.

Não podia ser, aliás, de outro modo. O Estado monárquico, com efeito, exprimia a ditadura de uma camarilha de reacionários pan- sérvios sobre os povos da Iugoslávia; para se manter no Poder, antes da guerra, não bastava a esses elementos recorrer a processos de governo como a dissolução do Parlamento, o terror militar, o arbítrio, a supressão do Partido Comunista e outros partidos democráticos. A camarilha dirigente devia, além disso — e não deixava de fazê-lo, — apoiar-se nos círculos reacionários estrangeiros, especialmente alemães e italianos.

Não é de surpreender, em consequência, que a ocupação da Iugoslávia pelos hitleristas tenha sido facilitada pela traição no seio do Estado Maior, que o aparelho de Estado tenha sido logo posto por um Nedic às ordens do inimigo (ao mesmo tempo que os capitalistas punham à sua disposição as suas empresas). Não é de surpreender que o rei Pedro II e o seu "governo", refugiados no estrangeiro, tenham sustentado ardentemente a traição de Mihajlovic e dos seus bandos.

Nestas condições, mesmo fazendo abstração das aspirações populares pela liberdade, a questão que se apresentava aos combatentes iugoslavos, à medida que obtinham a libertação da sua pátria, não podia ser a restauração das instituições antigas, monárquicas, reacionárias. A questão que se apresentava era a criação de novas instituições, democráticas, populares.

Foi assim que os Comités Populares, nascidos durante a luta, a princípio em território libertado, depois em território ocupado, se transformaram, desde os fins de 1942, num verdadeiro poder unificado. Fez-se, em seguida, a convocação da Assembleia Antifascista de Libertação Nacional, base de um novo Estado, depois a criação do Comité de Libertação Nacional, primeira forma do governo democrático, depois a Assembleia Popular provisória. No curso desta luta, um aparelho de Estado inteiramente novo, fundado sobre os Comités Populares, sobre a Assembleia Popular, sobre a extirpação de todas as raízes do fascismo da vida política e administrativa, tinha sido criado e aperfeiçoado.

Tais eram as condições no momento das eleições para a Assembleia Constituinte, a 1 1 de novembro de 1945.

Estas eleições, cujo caráter democrático foi contestado na ocasião pela imprensa reacionária, foram as primeiras eleições livres na história da Iugoslávia. Os observadores estrangeiros puderam constatar a liberdade de propaganda, garantida durante a campanha eleitoral a todos os partidos e agrupamentos, inclusive os da oposição, que, sabendo-se derrotados,- preconizaram a abstenção. Os observadores puderam constatar o caráter estritamente secreto do escrutínio.

Sabe-se o resultado — 90% dos sufrágios foram dados aos candidatos da Frente Nacional, isto é, ao bloco coeso de todos os partidos e forças democráticas do país. A 29 de novembro, a Constituinte inaugurava os seus trabalhos com uma decisão histórica: abolição da monarquia e proclamação da República.

Algumas Características das Noas Instituições

As instituições da República iugoslava consagram as conquistas da grande luta popular que acabamos de traçar rapidamente. Os organismos surgidos da iniciativa popular são especialmente constitucionalizados. O art. 6.°, um dos mais importantes da Constituição, é característico neste particular:

"Na República Federativa Popular da Iugoslávia, todo o Poder emana do povo e pertence ao povo.

"O povo exerce o seu poder por meio dos órgãos representativos das autoridades populares livremente eleitas e dos Comités Populares que, desde os Comités Populares regionais até as Assembleias das Repúblicas Populares e a Assembleia Popular da República Federativa Popular da Iugoslávia, nasceram e se desenvolveram no combate de libertação contra o fascismo e a reação e que são as conquistas fundamentais dessa luta."

Nesta base se edificou uma organização profundamente democrática dos poderes públicos.

A Constituição estabelece a eletividade de todos os órgãos representativos pelo sufrágio universal igual, direto e secreto. Proclama o princípio democrático da responsabilidade dos eleitos perante os seus eleitores e do direito dos eleitores de destituir os eleitos antes do expiração do seu mandato. Esse princípio tende, como, aliás, a manutenção dos Comités Populares, a assegurar a participação das massas na solução dos problemas políticos.

A soberania popular (para o conjunto das populações iugoslavas) é representada pela Assembleia Popular da República Federativa Po> pular da Iugoslávia, eleita por quatro anos por sufrágio universal. Esta Assembleia se compõe de duas Câmaras, o Conselho Federal e o Conselho dos Povos. Não se trata, de modo algum, de uma aplicação das concepções bicamerais (Câmara moderadora) que recentemente conhecemos e combatemos na França. Trata-se duma simples consequência do caráter federal do Estado iugoslavo, caráter sobre que nos deteremos mais adiante.

Um dos traços típicos da Constituição iugoslava é a dependência do todos os órgãos do Poder (em escala federal) em relação à Assembleia Popular, depositária da soberania do povo. Tal dependência é característica .da democracia real. É assim que os poderes ordinários do chefe de Estado, exercidos na França, por exemplo, pelo presidente da República, são atribuídos a um órgão coletivo, o Presidium da Assembleia Popular, por ela eleito, responsável perante ela, revogável individual e coletivamente por ela.

O governo, órgão executivo e administrativo supremo da República Federativa, cujas importantes atribuições são enumeradas pela Constituição, é nomeado pela Assembleia, responsável perante ela (ou perante o seu Presidium, nos intervalos das sessões) e dissolvido por ela.

Os juízes da Corte Suprema, órgão federal da justiça, são eleitos pela Assembleia; ela eventualmente os exonera das suas funções. O ministério público é o órgão da Assembleia que nomeia o Procurador Geral da República Federativa, assim como os seus substitutos, e que os destitui, conforme o caso.

O Presidium da Assembleia Popular tem o direito de anular ou de suprimir os atos do governo, "se não se conformarem com a Constituição e com as leis federais". A revisão da Constituição e as emendas ao seu texto são prerrogativas da Assembleia, por maioria absoluta do número total dos deputados de cada Câmara. A Assembleia pode decidir a sua própria dissolução antes da expiração do seu mandato, sendo o único outro caso de dissolução um desacordo entre as duas Câmaras, se se tornar inconciliável depois do processo de coordenação previsto no art. 64.

Além das prerrogativas comuns das Assembleias Legislativas (iniciativa e aprovação das leis), as duas Câmaras da Assembleia têm poderes de inquérito os mais extensos sobre todas as questões. Notemos, enfim, que os órgãos do poder local, na escala de aldeias, distritos, agrupamentos urbanos, cidades, departamentos e regiões são os Comités Populares eleitos por sufrágio universal, obrigados pela Constituição a se apoiarem na iniciativa das massas e nas organizações do povo trabalhador, obrigados também a prestar contas periodicamente à Assembleia de Eleitores local, uma Assembleia cujos direitos e obrigações são fixados em lei.

Os Direitos e Deveres dos Cidadãos

Concebe-se facilmente a garantia que, para os direitos do cidadão inscritos na Constituição, representa o quadro econômico, social e político que acabamos de descrever.

Esses direitos são os mesmos proclamados por qualquer Constituição verdadeiramente democrática: a igualdade diante da lei; o direito de voto e a elegibilidade; a igualdade do homem e da mulher; a liberdade de consciência, de religião e de culto; a liberdade de expressão, de associação e de manifestação; a inviolabilidade da pessoa, do domicílio e da correspondência; o direito de acesso a todas as funções públicas; o direito à instrução, etc.

Certos direitos são formulados com mais ousadia do que em outras Constituições, por exemplo na da França; é o caso dos direitos civis, reconhecidos integralmente a todo cidadão a partir dos 18 anos; é o caso do direito das crianças, que comporta a igualdade absoluta entre o filho natural e o filho legítimo.

Mas o traço mais notável dos direitos proclamados pela Constituição iugoslava é, como em toda democracia popular, a sua garantia, tento pela própria Constituição como pelo sistema econômico, social e político em que se exercem. Assim como garante os direitos do homem, esse sistema confere caráter profundamente sério aos deveres que lhes prescreve a Constituição, em particular os deveres para com o trabalho, o imposto, a lei e a pátria.

Uma Federação Livre e Fraternal de Povos Iguais

Resta-nos examinar a Constituição iugoslava do ponto de vista das relações que institui entre os povos que compõem a Iugoslávia. Esta é, com efeito, um Estado multinacional, reunindo povos diferentes, entre outros os sérvios, os croatas, os eslovenos, os macedônios.

A monarquia de antes da guerra não era apenas o instrumento de dominação de um punhado de feudais e de monopolistas sobre a população; era também o instrumento da hegemonia pansérvia sobre os povos da Iugoslávia, submetidos à mais cruel das opressões nacionais.

A luta para libertar a Iugoslávia dos ocupantes e dos seus lacaios não somente livrou os homens do jugo feudal e reacionário, mas também livrou os povos da opressão nacional. Os Comités Populares, o Exército Popular de Libertação, a Frente Nacional Iugoslava ignoraram sempre as desigualdades e as oposições retrógradas de ordem nacional ou racial; mais exatamente, só as conheceram para denunciá- las e eliminá-las.

Desde o primeiro dia, a Assembleia Antifascista de Libertação Nacional se compôs de representantes de todos os povos da Iugoslávia. Instaurou com efeito a igualdade entre esses povos, de então por diante ligados por uma indefectível e fraternal amizade. A Constituição iugoslava codifica esta conquista. Estabelece entre os povos relações fundadas sobre a igualdade absoluta ao mesmo tempo que sobre o respeito à sua liberdade e à sua soberania nacional. Oferece um notável exemplo de solução constitucional da questão nacional, um exemplo do mais alto interesse para um país como a França, a quem se apresenta, aliás em termos sensivelmente diferentes, a questão das suas relações futuras com os povos de ultramar agrupados na União Francesa.

Desde o seu art. 1.°, a Constituição estabelece os três princípios essenciais que regem as relações entre povos diferentes num Estado realmente democrático: a igualdade dos direitos, a adesão livremente consentida e o direito de separação.

"A República Federativa Popular da Iugoslávia é um Estado federal popular de forma republicana, uma comunidade de povos iguais em direitos que, em virtude do direito dos povos de disporem de si mesmos, inclusive o direito de livre separação, exprimiram a sua vontade de viver unidos no Estado federativo."

A Constituição reconhece a existência, no seio da República Federativa, de cinco Repúblicas Populares diferentes — da Sérvia, da Croácia, da Eslovênia, da Bósnia e Herzegóvina, do Montenegro, — e reconhece, no seio da República Popular da Sérvia, a existência de uma província autônoma (a Voivodina) e de uma região autônoma (Kossovo e Metchia).

Os direitos fundamentais dos diferentes povos e Repúblicas são objeto de um capítulo especial da Constituição. Esse capítulo institui a soberania própria de cada República, sem outros limites senão os direitos reconhecidos pela Constituição à própria República Federativo. Condena como anticonstitucional todo ato dirigido contra a soberania, a igualdade e a liberdade nacional dos povos e. das Repúblicas. Confere a cada República o direito de estabelecer a sua própria Constituição no quadro da Constituição geral. Proclama, para as diversas minorias nacionais, o direito de desenvolver a sua cultura e o livre uso da sua língua .

No mesmo domínio, encontramos no capítulo V (direitos e deveres dos cidadãos) as disposições que garantem a igualdade dos cidadãos perante a lei, sem distinção de nacionalidade, de raça e de crença, e que punem com a lei atos e medidas que incitem o ódio e a discórdia nacionais, raciais ou religiosas.

As Relações entre a República Federativa e as Repúblicas Populares

Cada República exerce os seus direitos soberanos através de uma Assembleia Popular da República, eleita por sufrágio universal. Esta Assembleia nomeia e dissolve o governo da República, responsável perante ela. No que diz respeito às províncias e regiões autônomas, têm também o seu órgão supremo eleito (Assembleia Popular da província ou Comité Popular regional) e o seu órgão executivo e administrativo.

As características essenciais das relações entre os órgãos do Poder federal e os órgãos do Poder em cada República são as seguintes:

1. Coesão da Federação — A Assembleia Popular de cada República age em conformidade, não somente com a própria Constituição da República, mas com a Constituição federal; o governo de cada República age em virtude das leis particulares da República, mas também das leis federais e dos atos do governo federal. Em caso de divergência entre as- leis federais e as leis da República, prevalecem as primeiras.

2. Delimitação dos problemas de competência da República Federativa e dos de competência de cada República — O art. 14 da Constituição enumera longamente as questões que são da competência de República Federativa; citaremos como exemplo as relações internacionais, a defesa nacional, as comunicações. As questões não mencionadas no art. 14 são da competência das diversas Repúblicas Populares, que as regulamentam independentemente.

Esta delimitação explica a existência de duas espécies de ministérios no governo iugoslavo (como, aliás, no governo de cada República). Temos de nos limitar a uma visão sumária desse sistema (art. 86).

Os ministérios federais são essencialmente os que tratam dos negócios de competência federal (Ministérios dos Negócios Estrangeiros, da Defesa Nacional, das Comunicações, da Marinha, dos Correios, do Comércio Exterior). A sua autoridade se exerce, como regra geral, diretamente sobre todo o território iugoslavo.

Os ministérios federais-republicanos, pelo contrário, tratam dos seus negócios indiretamente, por meio dos ministérios correspondentes nas Repúblicas Populares (Ministérios das Finanças, do Interior, da Justiça, da Indústria, da Agricultura, do Trabalho, etc.).

3. Representação das Repúblicas Populares e das províncias ou regiões autônomas no seio da Assembleia Popular da República Federativa. — Dissemos, mais acima, que a Assembleia Popular da República Federativa se compunha de duas Câmaras. Uma destas Câmaras, o Conselho Federal, é eleito por sufrágio universal pelo conjunto dos cidadãos, à razão de um deputado por 50.000 habitantes. A outra, o Conselho dos Povos, igual em direitos ao primeiro, é eleito por sufrágio universal pelas Repúblicas, as províncias autônomas e as regiões autônomas, à razão de 30 deputados para cada República, 20 para cada província autônoma e 16 para cada região autônoma.

Notemos, para terminar, que a Constituição organiza concreta- mente o livre uso das línguas nacionais (promulgação das leis e regulamentos federais nas línguas das diversas Repúblicas, processo judiciário na língua local, etc.) e que institui uma nacionalidade federei comum, pois os problemas da alçada de cada República são ao mesmo tempo da alçada da República Federativa.

Continua a Luta Contra as Forças da Reação

A Constituição consagra as vitórias grandiosas, obtidas no curso dos últimos anos pelas forças da democracia contra as forças da reação na Iugoslávia. Seria um erro, porém, considerar que o conflito entre essas forças chegou ao seu termo. É numa encarniçada luta contra a reação que a nova Iugoslávia prossegue o seu caminho.

A reação dispõe ainda de certas bases no país; apoia-se sobre os antigos grandes proprietários e colaboracionistas destituídos dos seus bens, sobre alguns agrupamentos políticos de oposição, sobre parte ao alto clero católico, até mesmo sobre certos elementos que aderiram à Frente Nacional depois da libertação do país. Tenta sabotar a reconstrução, organizar a especulação e o mercado negro, criar inimizades entre operários e camponeses colocando homens seus nos Sindicatos e nas Cooperativas.

Esta atividade da reação é, aliás, inspirada de fora do país. O rei decaído encontra auxílio nos círculos reacionários do estrangeiro entre outros do Vaticano. O ódio dos trustes internacionais contra a jovem República teve, em muitas ocasiões, reflexo na atitude dos governos de Londres e de Washington, atitude inamistosa para com a democracia iugoslava, estimulante para com as forças de reação no país.

Mas a democracia iugoslava tem por si o apoio ativo das grandes massas, da imensa maioria do país. A solidariedade de todas as forças de progresso no mundo já é uma aquisição sua, e não lhe faltará. Isto basta para que possa olhar com otimismo a realização, no entusiasmo geral, da reconstrução do país, terrivelmente atingido pela guerra, como prelúdio a novo esplendor.


Notas de rodapé:

(1) Deputado comunista pelo Sena (Paris) (retornar ao texto)

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“O principal perigo para a classe operária consiste na subestimação de suas próprias forças e na sobrestimação das forças do campo imperialista”.

(Da “Declaração sobre a situação Internacional” firmada pelos nove principais Partidos Comunistas da Europa)

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Inclusão 07/03/2015