Entrevista do Século

Fragmento

Abimael Guzmán

28 de julho de 1988


Primeira edição: El Diario, n.º 490, ano IX, Lima (Peru), 24 de julho de 1988.

Fonte: Servir ao Povo.

Tradução: Servir ao Povo.

HTML: Lucas Schweppenstette.


Nota do Servir ao Povo

Publicamos, a seguir, a Entrevista do Século, tomada pelo jornal democrático peruano El Diario, em 1988, com o Presidente Gonzalo — chefe do Partido Comunista do Peru e da Revolução Peruana. A entrevista foi publicada em plena guerra popular e desde a clandestinidade, quando a revolução armada completava 8 anos de marcha vitoriosa. A edição que trouxe a entrevista com o chefe revolucionário foi vendida em tempo recorde em todo o país. Publicamos a seguir uma tradução não oficial da versão em espanhol disponível em vários sites da internet. A entrevista é um dos materiais políticos e ideológicos de maior importância para a nova geração de revolucionários que despontam na luta contra a exploração, a opressão e todo o sistema de esmagamento das massas populares.

El Diario: Bem. Por que você, Presidente Gonzalo, anima-se a dar esta entrevista? Por que decidiu falar depois de um prolongado silêncio? Por que escolheu El Diario para concretizar esta entrevista?

Presidente Gonzalo: Queremos dizer-lhes que o Partido Comunista do Peru, que dirige a guerra popular há mais de oito anos, expressa-se há algum tempo através de diferentes documentos que são de conhecimento público. Temos considerado sempre que era muito mais importante o pronunciamento do próprio Partido para que assim fique nítido e claro que é o PCP que atreveu-se a iniciar a guerra popular, a dirigi-la e a levá-la adiante.

Quanto a razão de falarmos nesta ocasião pessoalmente, em uma entrevista como esta — que é a primeira vez que temos o prazer de conceder e, precisamente, a vocês — tem a ver com o Congresso. Nosso Partido cumpriu uma tarefa histórica pendente: o concretizar seu Congresso. Durante décadas brigamos por consegui-lo, porém só a guerra popular tivemos as condições para consolidá-lo. Assim nós dizemos: o Primeiro Congresso é filho de dois grandes pais, são o Partido e a Guerra Popular. Este Congresso é um marco, um marco de vitória, pois nele nosso Partido fez um balanço do longo caminho percorrido; estabeleceu sua Base de Unidade Partidária, em seus três elementos: a ideologia, isto é, o marxismo-leninismo-maoismo, pensamento Gonzalo, o programa e a linha política geral; e, ademais, esse Congresso também estabeleceu sólidas bases para marchar para a conquista do Poder em perspectiva. O Congresso, pois, é uma grande vitória e é esta a principal razão pela qual damos essa entrevista. Também tem a ver com a situação que vive nosso país, a profunda crise; tem a ver com o desenvolvimento cada vez mais crescente e poderoso da luta de classes das massas; e, com a situação internacional, em como a revolução no mundo é a tendência principal.

Quanto a porque damos esta entrevista a El Diario, uma simples e pura razão: porque é uma trincheira de combate e hoje a única tribuna que realmente serve ao povo. Cremos que ainda que nós pudéssemos conceder essa entrevista a outros, inclusive estrangeiros, é mais conveniente e de acordo com nossos princípios entrevistar-nos precisamente com um jornal como El Diario que realmente briga todos os dias em condições difíceis para servir ao povo, à revolução. Essa é a razão.

El Diario: Presidente Gonzalo, você pesou a implicação que pode ter esta entrevista? Eu lhe faço uma pergunta,:você não corre nenhum risco ao falar publicamente nesta oportunidade?

Presidente Gonzalo: Nós, comunistas, sendo-o, não temos medo de nada. Além disso, o Partido nos forjou para enfrentar a morte e levar a vida na ponta dos dedos para entregá-la no momento que a revolução nos demande.

Entendemos que essa entrevista tem maior importância, tem transcendência: serve a nosso Partido, serve à revolução, serve a nosso povo, serve à nossa classe e serve também — por que não dizê-lo? — ao proletariado internacional e aos povos do mundo, à revolução mundial. Qualquer risco assim não é nada, principalmente — reitero — se estamos formados como o Partido nos fez.

I — Questões de ideologia

El Diario: Presidente, agora falemos de uma das fundamentações ideológicas do PCP: o maoismo. Por que vocês consideram que o maoismo é a terceira etapa do marxismo?

Presidente Gonzalo: Este é um ponto de vista vital e de imensa transcendência. Para nós, o marxismo é um processo de desenvolvimento e este grandioso processo nos deu uma nova, terceira e superior etapa. Por que dizemos que estamos frente a uma nova, terceira e superior etapa, que é o maoismo? Dizemos isto porque vendo as três partes integrantes do marxismo é claramente evidente que o Presidente Mao Tsetung desenvolveu cada uma destas três partes. Assim, simplesmente para enumerar: na filosofia marxista ninguém pode negar seu grandioso desenvolvimento na dialética, centralmente na lei da contradição, estabelecendo que ela é a única lei fundamental; se vermos o problema da economia política, podemos dizer que neste campo basta destacar duas coisas: uma, para nós de importância imediata e concreta, a tese do capitalismo burocrático e, dois, o desenvolvimento da economia política do socialismo, pois, em síntese, poderíamos dizer que é ele quem realmente estabeleceu e desenvolveu a economia política do socialismo. Quanto ao socialismo científico, bastaria destacar a guerra popular, pois é com o Presidente Mao Tsetung que o proletariado internacional alcança uma teoria militar cabal, desenvolvida, e nos dá assim a teoria militar da classe, do proletariado, com aplicação em todas as partes. Acreditamos que estas três questões nos demonstram que há um desenvolvimento de caráter universal. Visto o problema desta maneira, então estamos frente a uma nova etapa e a chamamos terceira porque o marxismo tem duas etapas precedentes: a de Marx e a de Lenin, daí que falemos de marxismo-leninismo. No pertinente a superior, assim dizemos porque no maoismo a ideologia do proletariado universal alcança o mais alto desenvolvimento adquirido até hoje, seu mais alto cume, porém entendendo que o marxismo é uma — desculpem a reiteração — unidade dialética que dá grandes saltos e esses grandes saltos são os que geram etapas. Assim, para nós, o que existe no mundo hoje é marxismo-leninismo-maoismo, principalmente maoismo.

Consideramos que na atualidade ser marxistas, ser comunistas, nos exige necessariamente ser marxista-leninista-maoistas, principalmente maoistas; de outra maneira não poderíamos ser comunistas verdadeiros. Quero ainda destacar uma situação que é pouco levada em conta e que merece ser estudada a fundo na atualidade: refiro-me ao desenvolvimento que fez o Presidente Mao Tsetung da grande tese de Lênin sobre o imperialismo. Isto é de suma importância hoje e na perspectiva histórica na qual nos desenvolvemos. No mesmo plano, simplesmente enumerativo, poderíamos destacar o seguinte: o Presidente Mao estabeleceu a lei do imperialismo quando nos coloca que este cria distúrbios e fracassa para voltar a gerar distúrbios e fracassar, assim até sua ruína final. Também especificou que estamos em um momento dentro do processo de desenvolvimento do imperialismo, o que ele chamou “os próximos 50 a 100 anos” sem igual na Terra e nos quais, entendemos, varreremos o imperialismo e a reação da face do globo. Também nos determinou um período que não podemos esquivar hoje mais do que nunca, ele nos disse: “se abriu um período de luta contra o imperialismo norte-americano e o social-imperialismo soviético”; ademais todos conhecemos sua grande tese estratégica de que “o imperialismo e todos os reacionários são tigres de papel”, tese de extraordinária importância e devemos ter muito presente que o Presidente Mao aplicou essa mesma tese ao imperialismo norte-americano e ao social-imperialismo soviético a quem não há que temer-se.

Porém também devemos insistir em que se tome em conta como conceber o desenvolvimento da guerra, seguindo precisamente o que Lenin defendera sobre a era de guerras que se havia aberto no mundo: o Presidente nos ensinou que um país, uma nação, um povo, ainda pequenos, se assim o forem, podem vencer ao mais poderoso explorador e dominante da Terra se atreverem-se a tomar as armas. Nos ensinou ademais como entender o processo da guerra e como não cair nunca sob a chantagem nuclear. Creio que essas são algumas questões que deveríamos ter em conta para compreender como o Presidente Mao Tsetung desenvolveu a grande tese de Lenin sobre o imperialismo. E, por que insisto nisso? Porque nós entendemos que assim como Lenin levanta-se sobre a grande obra de Marx, o desenvolvimento feito pelo Presidente Mao Tsetung levanta-se sobre a grandiosa obra de Marx e de Lenin, sobre o marxismo-leninismo. Não poderíamos nunca entender maoismo sem marxismo-leninismo. Consideramos que essas coisas são de muita importância hoje e para nós foi decisivo chegar a compreender na teoria e na prática o maoismo como uma terceira, nova e superior etapa.

El Diario: Presidente Gonzalo, você considera que se José Carlos Mariátegui estivesse vivo assumiria as contribuições e as teses do Presidente Mao?

Presidente Gonzalo: Em síntese, Mariátegui era marxista-leninista. E mais: nele, em Mariátegui, no fundador do Partido, encontramos teses similares às que o Presidente Mao estabeleceu no plano universal. Em consequência, para mim concretamente, Mariátegui seria hoje marxista-leninista-maoista; e isto não é especulação, é simplesmente produto da compreensão da vida e obra de José Carlos Mariátegui.

El Diario: Bom, passando a outra pergunta. O que é a ideologia do proletariado e qual papel cumpre nos processos sociais do mundo atual? Que significado têm os clássicos Marx, Lenin e Mao para o PCP?

Presidente Gonzalo: Hoje, amanhã e nestas tormentosas décadas que estamos vivendo, vemos a grandiosa importância e transcendência que tem a ideologia do proletariado. Primeiro — ainda que repisemos em coisas conhecidas — é a teoria e a prática da última classe da história, a ideologia do proletariado é o produto da luta do proletariado internacional; também encerra o estudo e a compreensão de todo o processo histórico da luta de classes antes do proletariado, da luta do campesinato, particularmente deste pelas grandes façanhas que travou, a compreensão e o estudo do mais alto que a ciência produziu.

Em síntese, a ideologia do proletariado, a grande criação de Marx, é a mais alta concepção que a Terra viu e verá. É a concepção, é a ideologia científica que pela primeira vez dotou os homens, a classe — principalmente — e os povos de um instrumento teórico e prático para transformar o mundo. E tudo o que ele previu vemos como vem se cumprindo. O marxismo vem se desenvolvendo, deveio(1) em marxismo-leninismo e hoje em marxismo-leninismo-maoismo e vemos como essa ideologia é a única capaz de transformar o mundo e fazer a revolução e de levar-nos à meta inabalável: o comunismo. Sua importância é extraordinária. Quero ressaltar de passagem isto: é ideologia, porém científica. Entretanto, deveríamos compreender muito bem que não podemos fazer concessão alguma às posições burguesas que querem reduzir a ideologia do proletariado a um simples método, pois, dessa maneira, ela é prostituída, é negada. Para nós a ideologia do proletariado — desculpem a insistência, porém o Presidente Mao disse “não basta dizer uma vez senão cem vezes, não basta dizer a poucos senão a muitos”, amparando-me nisto digo — a ideologia do proletariado, o marxismo-leninismo-maoismo e, hoje, principalmente o maoismo, é a única ideologia todopoderosa porque é verdadeira e os feitos históricos estão demonstrando-o. É produto, ao lado do dito anteriormente, do extraordinário labor de figuras históricas extraordinárias como Marx, Engels, Lenin, Stálin e o Presidente Mao Tsetung, para destacar notáveis cumes; porém entre eles ressaltamos três: Marx, Lenin e o Presidente Mao Tsetung como as três bandeiras que se concretizam, uma vez mais, em marxismo-leninismo-maoismo e principalmente maoismo. E nosso problema hoje qual é precisamente? É desfraldá-lo, defendê-lo e aplicá-lo e brigar esforçadamente servindo para que seja mando e guia da revolução mundial. Sem ideologia do proletariado não há revolução, sem ideologia do proletariado não há perspectiva para a classe e o povo, sem ideologia do proletariado não há comunismo.

El Diario: Falando de ideologia, por que Pensamento Gonzalo?

Presidente Gonzalo: O marxismo sempre nos ensinou que o problema está na aplicação da verdade universal. O Presidente Mao Tsetung foi sumamente insistente neste ponto. Se o marxismo-leninismo-maoismo não se aplica a uma realidade concreta não será possível dirigir uma revolução, não será possível transformar a velha ordem, nem destruí-la nem criar uma ordem nova. É a aplicação do marxismo-leninismo-maoismo à revolução peruana o que gerou o Pensamento Gonzalo, na luta de classes de nosso povo, do proletariado principalmente, das incessantes lutas do campesinato e no grande marco estremecedor da revolução mundial. É em meio a todo este fragor, aplicando da maneira mais fiel possível a verdade universal às condições concretas de nosso país, como se consolidou o Pensamento Gonzalo. Este foi antes denominado pensamento guia, e se hoje o Partido no Congresso sancionou Pensamento Gonzalo é porque se produziu um salto nesse pensamento guia, precisamente no desenvolvimento da Guerra Popular. Em síntese, o pensamento Gonzalo não é senão a aplicação do marxismo-leninismo-maoismo à nossa realidade concreta. Isto nos leva a que especificamente é principal para nosso Partido, para a guerra popular e para a revolução em nosso país, sublinho especificamente principal. Porém, para nós, vendo a ideologia em termos universais o principal é o maoismo reiterando-o uma vez mais.

El Diario: Como atua o revisionismo e como vocês o combatem?

Presidente Gonzalo: Primeiramente queremos recordar que o marxismo não deu um passo na vida senão em meio à luta; e nesse processo de desenvolvimento do marxismo, surgiu o velho revisionismo que se afundou na I Guerra Mundial. Porém logo nós, comunistas, confrntamos um novo revisionismo, o revisionismo contemporâneo que começou a desenvolver-se com Kruchov e seus sequazes e atualmente desata uma nova ofensiva contra o marxismo tendo como centros mais importantes a União Soviética e a China. O revisionismo insurgiu apregoando uma negação completa do marxismo, o revisionismo contemporâneo voltou a fazer o mesmo, como sempre apontando contra a filosofia marxista para substituí-la por uma filosofia burguesa; indo contra a economia política, particularmente para negar a pauperização crescente e a inevitabilidade do afundamento do imperialismo; esforçando-se por falsear e torcer o socialismo científico para opor-se à luta de classes e à revolução, apregoar o cretinismo parlamentar e o pacifismo. Todas essas situações foram desenvolvidas pelos revisionistas e assim apontaram e apontam para a restauração do capitalismo, para impedir e abalar a revolução mundial, para negar a invicta concepção da classe. Porém aqui merece precisar alguns pontos para concretizar: o revisionismo atua como qualquer imperialismo. Por exemplo a União Soviética, o social-imperialismo soviético predica e aplica o cretinismo parlamentar, monta e maneja ações armadas em função de conquistar hegemonia mundial, gera agressões, contrapõe povos contra povos, lança massas contra massas, divide a classe e o povo; o revisionismo soviético combate de mil e uma maneiras tudo o que é verdadeiramente marxista e serve à revolução. Nós somos um exemplo disso. Assim o social-imperialismo da URSS no mundo desenvolve um protervo plano para converter-se em superpotência hegemônica usando todos os meios a seu alcance, dentre os quais há que destacar a manutenção de falsos partidos comunistas de aparência, “partidos operários burgueses”, como dizia Engels. E de igual maneira atua o revisionismo chinês e todo o revisionismo, segundo suas condições e o bastão de mando que seguem. Assim, para nós, o problema é combater o revisionismo e combatê-lo implacavelmente. Há que recordar, nos foi ensinado que não se pode combater o imperialismo sem combater o revisionismo, e nosso Congresso diz há que combater o imperialismo, o revisionismo e a reação mundial inseparável e implacavelmente. Como combatê-lo? Em todos os planos, partindo dos três planos clássicos: no ideológico, no econômico e no político. Nos três planos temos que combatê-los. Se nós não cumpríssemos o combate o revisionismo não seríamos comunistas. Um comunista tem a obrigação de combater o revisionismo, incansável e implacavelmente. Nós o temos combatido. Sim, o temos combatido e desde seus começos; temos tido a sorte de poder contribuir aqui, em nosso país, a expulsá-lo do Partido no ano de 1964, realidade que sempre se quer ocultar. Deve ficar bem claro que a imensa maioria do Partido Comunista se uniu tomando as bandeiras da luta contra o revisionismo que o Presidente Mao Tsetung havia desfraldado. Que se apontou e se golpeou o revisionismo nas fileiras do Partido Comunista de então até expulsar Del Prado e sua pandilha. Daí até hoje seguimos combatendo o revisionismo e não somente aqui mas também no estrangeiro. O combatemos internacionalmente, combatemos o social-imperialismo soviético de Gorbachov, o revisionismo chinês desse protervo Teng Siao-ping, o revisionismo albanês de Ramiz Alia, esse seguidor do revisionista Hoxha; como combatemos a todos os revisionistas que seguem o bastão de mando do social-imperialismo ou do revisionismo albanês ou de quem for.

El Diario: Presidente. No caso peruano qual seria a expressão mais elevada do revisionismo? Refiro-me a seus expoentes.

Presidente Gonzalo: O chamado, como etiqueta, “Partido Comunista Peruano” — esse que publica ou publicava Unidad [Unidade], quinta coluna do revisionismo soviético, esse que encabeça o calejado revisionista Jorge Del Prado, a quem alguns consideram um “consagrado revolucionário”. E, em segundo lugar, Patria Roja [Pátria Vermelha], essa agência do revisionismo chinês com seus caudilhos adoradores de Teng.

El Diario: Você crê que a influência do revisionismo nas massas populares do país cria situações adversas para a revolução?

Presidente Gonzalo: Se tomamos em conta o que o próprio Lenin nos ensinou e o Presidente Mao voltou a reiterá-lo desenvolvendo-o, entendemos que o revisionismo é uma ofensiva da burguesia nas fileiras do proletariado e daí deriva o que cinde, divide o movimento comunista e os partidos comunistas; daí deriva o que cinde, divide o movimento sindical; cinde, divide o movimento popular. O revisionismo obviamente é um câncer, um câncer que tem que ser implacavelmente varrido, de outra forma não poderemos avançar na revolução. E recorde-se o que disse Lenin, sinteticamente: é necessário forjar em duas questões, ou seja, forjar na violência revolucionária e forjar na luta implacável contra o oportunismo, contra o revisionismo. Em nosso país creio que é preciso ver não somente esta questão para considerar a situação das massas. Há que ver também o problema do que Engels chamou o “colossal monte de lixo”, ele nos ensinou que um movimento que tem décadas, como o tem o movimento do proletariado em nosso país e mais ainda do povo em geral, gera lixo que tem que ir sendo varrido parte por parte. Isto também há que considerar; pensamos que é uma necessidade. Quanto pode influenciar nas massas? Nas massas o que fazem os revisionistas é servir à capitulação ante a reação interna, concretamente, ante a grande burguesia e os latifundiários, ante a ditadura latifundiário-burocrática que é o atual Estado peruano. Internacionalmente, capitulam ante o imperialismo e servem à hegemonia do social-imperialismo ou aos afãs de potências entre as quais hoje a atual China está desenvolvendo-se. Cremos que conforme a revolução, com a guerra popular, desenvolve-se, e conforme a luta de classes agudiza-se o povo e o proletariado vão compreendendo mais e mais cada vez. E, por outro lado, necessariamente, conforme veem atuarem os revisionistas e os oportunistas de toda laia traindo cada dia e os verão mais amanhã, terão o proletariado e o povo que cumprir com sua missão de varrê-los de todos os rincões, porque lamentavelmente não se pode acabar de uma só vez com eles, segundo nos ensinou Engels, pois são parte do “colossal monte de lixo”.

El Diario: Você consideraria que o revisionismo está sendo derrotado no país definitivamente?

Presidente Gonzalo: Reiterando o ensinado pelos fundadores do marxismo: conforme eles atuam participando no Estado reacionário, as massas compreenderão seu trabalho nefasto; conforme os veem atuar, conforme todo o povo e a classe os veem atuar não podem menos que ir compreendendo cada vez mais seu nocivo papel, sua condição de traficantes, de vende-operários, de oportunistas e traidores. O revisionismo já começou a perder a partida faz um bom tempo, não é só com a Guerra Popular; o revisionismo já começou a perder a partida quando foi expulso das fileiras do Partido, porque aí começou a formar-se uma outra fornada de consequentes comunistas que são os que depois deviram nestes que hoje, sob o Partido Comunista do Peru, dirigem a Guerra Popular. E, pensamos que as massas, com esse instinto de classe do qual falava Mariátegui, cada vez mais rápido compreenderão como já estão compreendendo. O revisionismo já perdeu a partida, o resto é tempo; o problema está definido, o lixo já começou a ser varrido, incendiado; reitero, o problema é tempo. Já começaram a perder a partida há muitos anos. E se fôssemos mais além, aos princípios, perderam a partida desde que se converteram em revisionistas, pois a partida se perde desde quando os princípios são abandonados, a partir daí. O resto é como a luta de classes desenvolve-se e como um Partido como o nosso é capaz de cumprir seu papel e como as massas o sustentam, o apoiam e levam adiante, como vão compreendendo que é seu Partido, que defende seus interesses. E são as próprias massas as que darão boa conta e justa sanção aos que por decênios têm traficado e seguem traficando, e também condenarão os que queiram traficar ou os que comecem a fazê-lo.

El Diario: Qual a sua opinião sobre a Nova Evangelização defendida pelo Papa?

Presidente Gonzalo: Marx nos ensinou “a religião é o ópio do povo”, é uma tese marxista plenamente válida hoje e amanhã seguirá sendo. A religião é um fenômeno social produto da exploração e irá extinguindo-se, conforme a exploração for sendo varrida e uma nova sociedade surgindo. Estes são princípios que não podemos desprezar e que devemos ter sempre presentes. Ligado ao anterior está recordar também que o povo tem religiosidade, o que jamais foi e nem será obstáculo para que ele lute por seus profundos interesses de classe servindo à revolução e, concretamente, à guerra popular. Deve ficar sumamente claro que essa religiosidade é por nós respeitada como um problema de liberdade de consciência religiosa, como reconhece o programa sancionado pelo Congresso. Assim que a questão colocada [sobre a estrutura da igreja] tem a ver, em nosso juízo, com a hierarquia eclesiástica, com o Papado, com essa velha teocracia. Essa velha teocracia soube organizar-se e devir em um poderoso instrumento já na época romana, depois ajustar-se às condições da feudalidade e adquire um imenso poder, maior ainda. Em cada circunstância sofreou a luta popular e defendeu os interesses dos opressores e exploradores, ideologicamente como um escudo reacionário, para depois de mudadas as condições adaptar-se à nova situação. Isto podemos ver claramente se pensamos na relação entre a Igreja e a revolução burguesa, a velha revolução burguesa, refiro-me à da França por exemplo. A igreja defendeu tenazmente a feudalidade, depois, através de muitas contendas e depois da feudalidade ter sido derrotada — reitero: através de muitas contendas —, a igreja foi-se ajustando à ordem burguesa e outra vez passou a ser um instrumento a serviço dos novos exploradores e opressores.

Na situação atual então o que vemos? Há uma perspectiva histórica irrefreável, a revolução proletária mundial, a nova era iniciada em 1917; é o problema de como o proletariado dirige revoluções para mudar a ordem caduca e gerar uma nova e verdadeira sociedade, o comunismo. Pois bem, frente a isto, como atua a Igreja? Atua com a experiência anterior: quer buscar sobreviver. Daí a celebração do Concílio Vaticano II onde a Igreja busca condições que lhe permitam, primeiro, defender a velha ordem como sempre o fez e, depois, ajustar-se e acomodar-se para servir a novos exploradores, para seguir sobrevivendo. Isso é o que busca e isso é, em essência, o Vaticano II.

O problema da “nova evangelização” refere-se expressamente a como veem os hierarcas eclesiásticos, o Papado concretamente, o papel da América Latina. Como eles mesmos dizem, a metade dos católicos do mundo estão na América Latina — assim dizia já o atual Papa no ano de 1984. Em consequência, estão buscando utilizar o meio milênio do descobrimento da América para levar adiante um chamado movimento de “nova evangelização”. Em síntese o que eles pensam é isto: com o descobrimento da América iniciou-se a evangelização no ano de 1494, oficialmente. Pois bem, ao cumprir-se este novo centenário querem desenvolver uma “nova evangelização” em função de defender o bastão, a metade de sua paróquia, a metade do bastão que sustenta seu poder, isso é o que buscam. Assim, os hierarcas, o Papado apontam para defender suas posições na América e servir ao imperialismo norte-americano que é quem domina principalmente na América Latina. Porém é necessário entender este plano dentro de uma campanha e um plano mundiais, ligado às relações com a União Soviética por motivo do milênio de sua cristianização, ou os vínculos com o revisionismo chinês, as ações da Igreja na Polônia, na Ucrânia, etc.. É um plano mundial, dentro disso joga a “nova evangelização”. Pretendem, como sempre, defender a ordem social existente, ser seu escudo ideológico porque a ideologia da reação, a ideologia do imperialismo caducou e, depois, acomodar-se e seguir sobrevivendo. Mas a perspectiva será diferente, não como foi antes, se seguirá a lei que Marx estabeleceu: a religião irá se dissolvendo conforme for sendo destruída e dissolvida a exploração e a opressão, e como eles servem às classes exploradoras — e a classe que dominará não é uma classe exploradora — então o Papado não poderá sobreviver, e a religiosidade terá que ir-se dissolvendo. Entretanto, há que reconhecer a liberdade de consciência religiosa até que os homens, avançando em novas condições objetivas, possam ter uma consciência clara, científica e transformadora do mundo.

Para nós, em consequência, teria que ver, em síntese, a “nova evangelização” dentro desse plano da Igreja por sobreviver nas novas condições de uma transformação que sabe que vem necessariamente.

El Diario: De acordo com a definição que você faz, Presidente, poderia concluir-se — ou você poderia apontar isto — de que as contínuas visitas do Papa ao país têm alguma relação com a guerra popular e o apoio que este estaria dando ao regime de García Pérez?

Presidente Gonzalo: Eu creio que é correto, realmente é assim. Generalizando, suas visitas à América têm a ver com a importância que a América Latina tem e suas visitas ao Peru têm a ver até, inclusive, em pressionar-nos a depor as armas, uma vez que bendiz as armas genocidas, como o fez em reiteradas ocasiões, nas duas vezes que veio ao Peru.

El Diario: Agora, Presidente, qual seria a atitude do PCP em relação à teocracia religiosa quando este Partido assumir o Poder do Estado no país?

Presidente Gonzalo: O marxismo nos ensinou separar Igreja de Estado, é o primeiro que faremos; e, em segundo lugar, reitero, o que fazemos é respeitar a liberdade de consciência religiosa das pessoas, aplicando o princípio plenamente: a liberdade de crer como também a liberdade de não crer, a de ser ateu. Dessa maneira.

II — Sobre o Partido

El Diario: E passando a outro tema tão importante nesta entrevista que é o Partido, que lições você considera as mais importantes do processo do PCP?

Presidente Gonzalo: Sobre o processo do Partido e suas lições. Nós compreendemos a história do Partido em três partes correlatas com os três momentos da sociedade peruana contemporânea. O primeiro momento, a primeira parte, a Constituição do Partido. Nela tivemos a sorte de contar com José Carlos Mariátegui, um marxista-leninista integral, porém Mariátegui, como tinha que ser, foi combatido em vida, foi negado, se abandonou sua linha e nunca se cumpriu o Congresso de Constituição que ele deixara como tarefa pendente, pois o congresso que chamam “de constituição” aprovou — como bem sabemos — a chamada linha de “unidade nacional” totalmente oposta à tese de Mariátegui. Assim o Partido vai precipitando-se no oportunismo, sofre a influência do browderismo ao qual Del Prado está ligado e depois a do revisionismo contemporâneo. Todo este processo vai levar-nos a um segundo momento, o da Reconstituição do Partido: esta é uma luta em síntese contra o revisionismo, é um período que começa a desenvolver-se a partir do começo dos anos 1960 de forma já mais clara e mais intensa; este processo leva as bases do Partido a unir-se contra essa direção revisionista e, como dissera antes, a expulsá-la na IV Conferência de janeiro de 1964. O processo de Reconstituição vai desenvolver-se no Partido até o ano 1978–79; por volta desses anos vai terminar este período e vai-se entrar num terceiro momento, o momento da Direção da guerra popular que é no qual estamos vivendo. Que lições poderíamos tirar? A primeira lição, a importância da base de unidade partidária e sua relação com a luta de duas linhas; sem esta base e seus três elementos [1) marxismo-leninismo-maoismo, pensamento Gonzalo, 2) programa e 3) linha política geral] não há sustentação para a construção ideológico-política do Partido; porém sem luta de duas linhas não há base de unidade partidária. Sem uma firme e sagaz luta de duas linhas no Partido não se pode apreender firmemente a ideologia, não pode-se estabelecer o programa nem a linha política geral assim como tampouco defendê-los, aplicá-los e menos desenvolvê-los. A luta de duas linhas para nós é fundamental e tem a ver com conceber o Partido como uma contradição em concordância com o caráter universal da lei da contradição. Uma segunda lição, a importância da guerra popular: um Partido Comunista tem como tarefa central a conquista do Poder para a classe e o povo; um Partido uma vez constituído e considerando as condições concretas tem que brigar por consolidar essa conquista e somente pode fazê-lo mediante a guerra popular. Terceira lição importante é a forja de uma direção, a direção é chave; e, uma direção não se improvisa, requer longo tempo, dura briga, árdua luta para forjar uma direção, particularmente para que seja uma direção da guerra popular. Uma quarta lição que poderíamos tirar é a necessidade de construir a conquista do Poder, porque assim como se faz a guerra popular para conquistar o Poder, há que também construir essa conquista do Poder. O que queremos dizer? Que há que gerar organismos superiores aos da reação. Cremos que estas são importantes lições. Uma final é o internacionalismo proletário, desenvolver-se sempre como parte do proletariado internacional, sempre conceber a revolução como parte da revolução mundial, desenvolver a guerra popular — como diz a palavra de ordem partidária — servindo à revolução mundial. E por quê? Porque um Partido Comunista, ao fim e ao cabo, tem uma meta final insubstituível: o comunismo, e nele, como foi estabelecido, entramos todos ou não entra ninguém. Cremos que estas são as mais relevantes lições que poderíamos colocar.

El Diario: Presidente, qual significado tem José Carlos Mariátegui para o Partido Comunista do Peru?

Presidente Gonzalo: Para o PCP Mariátegui é seu fundador, construiu o Partido sobre claras bases marxista-leninistas, dotou-o em consequência de uma posição ideológica clara. Para ele o marxismo-leninismo era o marxismo de sua época, de seu momento; dotou o Partido de uma linha política geral. Mariátegui, o maior marxista que a América deu até hoje, nos deixou sua maior obra na conformação do Partido Comunista do Peru. Nós compreendemos muito bem o que implicou para o Partido sua perda, porém deve ficar claro que ele deu sua própria vida por solidificar sua grande obra; fundar o Partido levou-lhe a vida, é o que queremos dizer. Porém ele não teve tempo para consolidar e desenvolver o Partido — recorde-se que ele morreu a menos de 2 anos de constituí-lo — e um Partido requer tempo para consolidar, desenvolver e para poder cumprir sua tarefa histórica. Queremos precisar algo: já no ano de 1966 defendemos que nunca se deveria abandonar o caminho de Mariátegui e que o problema era retomar seu caminho e desenvolvê-lo, sublinho, desenvolvê-lo. Por quê? Porque em nível mundial o marxismo já havia entrado em uma nova etapa, a de hoje maoismo, e em nosso próprio país havia desenvolvido particularmente o capitalismo burocrático, isto ao lado da inesgotável luta do proletariado e do povo peruanos que nunca deixaram de lutar. Por isso propusemos retomar Mariátegui e desenvolvê-lo. Temos servido a redescobrir Mariátegui e sua vigência quanto a leis gerais porque são as mesmas leis só que especificadas em uma nova circunstância nacional e internacional, como acabo de dizer; temos servido a isso. Poderíamos dizer muitas coisas, porém vale mais ressaltar, creio, algumas. No ano de 1975 publicou-se “Retomar Mariátegui e reconstituir seu Partido”, nesse breve documento demonstramos, frente à negação de muitos que hoje se dizem mariateguistas, que Mariátegui era marxista-leninista “convicto e confesso”, como ele mesmo com justeza e razão dissera; temos defendido os cinco elementos constitutivos de sua linha política geral. Temos feito ver que em Mariátegui encontram-se teses similares às do Presidente Mao, basta recordar questões referentes à frente única ou ao importante problema da violência. Mariátegui diz: “o Poder se conquista com a violência e se defende com a ditadura”, “a revolução é o parto sangrento do presente” e ao longo de muitos anos de sua gloriosa vida reiterou persistentemente o papel da violência revolucionária e da ditadura; também dizia que por mais maioria que se pudesse ter em um parlamento poderia servir para afastar um gabinete, porém nunca a classe burguesa, sumamente claro. Também devemos destacar porque é chave em seu pensamento: Mariátegui era anti-revisionista. Pois bem, temos lutado, em síntese, por retomar e desenvolver o caminho de Mariátegui. Porém permita-me dizer algo mais: seria bom perguntar a alguns que hoje se dizem mariateguistas que pensavam de Mariátegui. O negavam, clara e concretamente; me refiro aos do hoje PUM [Partido Unido Mariateguista], sim, a esses provindos da chamada “nova esquerda” que apregoavam a caducidade de Mariátegui, pois era “coisa do passado”, assim era estritamente sua argumentação em essência.

Porém mais importante é ainda perguntar, estes e outros são realmente mariateguistas? Suponhamos Barrantes Lingán, o que tem de mariateguista se é a negação completa das claras teses marxistas-leninistas que em seu momento Mariátegui sustentou com firmeza e decisão? Mariátegui nunca foi eleitoreiro, defendia utilizar as eleições como campanha de propaganda e agitação; foram revisionistas como Acosta que sustentaram em 1945 que essa tese já havia caducado e que o problema era ganhar curules(2); e isso é o que fazem hoje os falsos mariateguistas, impostores impenitentes do cretinismo parlamentar. Nós, em síntese, pensamos assim: Mariátegui é o fundador do Partido, seu papel está definido na história, ninguém o poderá negar jamais e sua obra é imortal. Porém, era uma necessidade continuá-la, desenvolvê-la precisamente prosseguindo seu caminho. O prosseguimento de um fundador marxista-leninista como era Mariátegui em cujo pensamento há teses — reitero — similares às do Presidente Mao, é logicamente ser marxistas-leninistas-maoistas como nós somos, os membros do Partido Comunista do Peru. Nós pensamos que a figura do fundador é um grandioso exemplo e temos gravado de orgulho o haver sido fundados por ele.

El Diario: Presidente, qual influência teve José Carlos Mariátegui no desenvolvimento classista dos trabalhadores peruanos?

Presidente Gonzalo: Mariátegui cumpriu uma grande tarefa em meio a uma intensa luta — e desculpem que abuse de sua pergunta para agregar outras coisas. Ele já era marxista antes de ir à Europa, primeira coisa que queríamos, nos permitam, insistir pois sempre se diz que ali deveio-se marxista; que ali desenvolveu-se, isso é outra coisa, obviamente a experiência européia foi-lhe sumamente importante. Mariátegui travou uma luta muito importante no plano ideológico; uma luta pelo que ele chamava socialismo, termo que ele usava, segundo explicou, porque aqui não estava vulgarizado nem prostituído como na Europa, porém o que ele difundia e sustentava era o marxismo-leninismo. Travou uma luta política de grande transcendência pela conformação do Partido e isto tem a ver com um problema que hoje em dia está sendo levado e trazido e distorcido arteira e grosseiramente, o problema do debate entre Mariátegui e Haya de la Torre. A questão, em síntese, é bem clara: Mariátegui defendeu a formação de um Partido Comunista, de um Partido do proletariado; Haya de la Torre a formação de uma frente similar ao Kuomintang, pois alegava que o proletariado no Peru era minúsculo e imaturo para poder gerar um Partido Comunista, essas eram argúcias, nada mais. É bom tê-lo em conta, porém ademais o Apra quando fundado no Peru o faz à semelhança do Kuomintang de Chiang Kai-shek, isto é, do verdugo da revolução chinesa que deu o golpe contrarrevolucionário do ano 1927, isto devemos ter muito presente. Por que ressalto este problema? Porque agora nos está sendo falado de um haya-mariateguismo, até de um haya-leninismo. Absurdo! Mariátegui sim foi marxista-leninista. Haya nunca foi nem marxista nem leninista, nunca! Se opôs sempre às teses de Lenin. Isto é necessário destacar porque não se pode consentir estas infâmias que ao fim e ao cabo não são senão um enredo, um artifício para fomentar uma aliança da IU [Isquierda Unida] com o Apra na atualidade, esse é o fundo, o resto embustes bastardos. Bem, porém vou à sua pergunta. Tudo isto o fez Mariátegui ligado à massa, ao proletariado, ao campesinato; ele está teórica e praticamente ligado à conformação da CGTP que é produto de seu trabalho, principalmente, porém da CGTP que ele fundou, dessa da parte final dos anos 20, não da atual CGTP que é a negação completa do que Mariátegui defendera. Desenvolveu também trabalho com o campesinato; o problema camponês nele é substantivo, é o problema da terra e em essência é o do índio como muito bem dissera. Também desenvolveu trabalho com intelectuais, como com mulheres e jovens. Mariátegui desenvolveu pois seu trabalho ligado às massas dando-lhes caminho, estabelecendo suas formas orgânicas e atuando decisivamente para o desenvolvimento orgânico do proletariado e do povo no Peru.

El Diario: Seguimos com o mesmo tema. Por que o PCP dá tanta importância à fração, aquela fração que reconstituiu o Partido?

Presidente Gonzalo: É um tema importante e pouco conhecido fora das fileiras do Partido. Comecemos por isto: Lenin nos colocou o problema da fração concebendo-a como o conjunto de homens solidamente coesionados para atuar aplicando os princípios em sua forma mais pura, e que uma fração deveria defender abertamente suas posições políticas para levar a luta e desenvolver o Partido. É este conceito leninista que tomamos para formar a fração. A fração começa a formar-se nos inícios dos anos 1960 e está ligada à luta entre marxismo e revisionismo em nível mundial que obviamente repercutiu em nosso país. A fração começa a colocar-se o problema de como desenvolver a revolução no Peru e vai encontrar estas questões nas obras do Presidente Mao Tsetung que por aquele tempo começavam a chegar. Que questões levantamos? Levantamos que a revolução no Peru necessitava de um Partido bem sustentado ideológica e politicamente, que o campesinato era a força principal em nossa sociedade enquanto que o proletariado era a classe dirigente e que o caminho que tínhamos que seguir era do campo à cidade; assim temos nos desenvolvido. A fração serviu à luta contra o revisionismo de Del Prado e somos parte de todos aqueles que nos unimos para varrer das fileiras do Partido e expulsar a camarilha de Del Prado. A fração vai seguir desenvolvendo-se em uma circunstância em que no Partido se dão várias frações, uma fração encabeçada por Paredes e outras duas frações que atuavam encobertamente, não aplicando os critérios leninistas de fração e sim atuando como um partido dentro de outro — refiro-me a Patria Roja [Pátria Vermelha], com seu chamado “grupo Ching-kang”, e o autodenominado “grupo bolchevique” — e a nossa fração cujo centro era a região de Ayacucho. A fração se unificou em colocar como — já tendo definido linha na V Conferência do ano de 1965 — deveria ver-se o problema dos três instrumentos da revolução; isto vai atiçar uma luta interna e mal conduzida, órfãos de suficiente coesão o Partido vai rachar. Assim, primeiro vai sair Patria Roja; porém saiu expulsa do Partido por seguir uma linha oportunista de direita, por negar o Presidente Mao Tsetung, por negar a Mariátegui, por negar a existência da situação revolucionária no Peru. Ficaram três frações. Logo, na VI Conferência do ano de 1969, acordou-se a base de unidade partidária e a Reconstituição do Partido, dois problemas que a fração havia defendido, assim como no ano de 1967 havia defendido questões fundamentais em uma reunião da comissão política ampliada daquela época. Paredes e seu grupo não estavam de acordo com a Reconstituição do Partido nem com a base de unidade partidária e montaram um plano para rachar o Partido, pois não podiam controlá-lo, esse foi seu plano sinistro. Travou-se uma dura luta contra esse liquidacionismo de direita. Desta forma vão ficar duas frações: a nossa e a do autodenominado “grupo bolchevique”, este vai desenvolver um liquidacionismo de esquerda, defendendo posições tais como de que havia estabilidade e em consequência não havia situação revolucionária, que o fascismo destruía tudo, que não podia-se fazer trabalho de massas, que havia que formar militância em seminários, etc. Esta luta levou a que a fração assuma sozinha a Reconstituição do Partido. Lenin disse que chegado a um momento uma fração que é a mais consequente tem que reconstruir o Partido; essa foi a tarefa que a fração assumiu. Aqui caberia perguntar-se: por que a fração assumiu a Reconstituição do Partido, por que não se fundou outro como era a moda e segue sendo hoje? A primeira razão, porque o Partido foi fundado em 1928 sobre claras bases marxistas-leninistas e tinha então uma grande experiência, experiência que está feita de lições positivas e negativas, de ambas. Porém há algo mais: Lenin nos disse que quando alguém está em um Partido que se desvia, se desnorteia ou cai no oportunismo, tem a obrigação de brigar por recolocá-lo no rumo e não fazê-lo é um crime político. Assim, a fração tem a importância de haver cumprido esse papel, de haver servido à Reconstituição do Partido a partir de sua construção ideológico-política, baseando-se no maoismo, que então chamávamos pensamento Mao Tsetung e no estabelecimento de uma linha política geral. A fração tem o grande mérito de haver reconstituído o Partido e tendo-o feito tinha já o instrumento, o “heróico combatente”, o Partido Comunista de novo tipo, marxista-leninista-maoista, a vanguarda política organizada — e não a “organização político-militar” como erroneamente costumam dizer —, o Partido necessário para lançar-se à conquista do Poder com as armas na mão através da guerra popular.

El Diario: Quais mudanças se produziram no Partido com a guerra popular?

Presidente Gonzalo: A primeira, principal, com base no trabalho anterior à guerra popular nos serviu para chegar a compreender o maoismo como uma nova, terceira e superior etapa do marxismo; nos serviu para desenvolver a militarização do Partido e sua construção concêntrica. A Guerra Popular serviu para forjar um Exército Guerrilheiro Popular, pois este forjou-se e formou-se recentemente no ano de 1983. O Exército Guerrilheiro Popular é importante, é a forma principal de organização correspondente a que a guerra popular é a forma principal de luta; o Exército Guerrilheiro Popular que fundamos, e que desenvolve-se pujante, está feito à luz das teses do Presidente Mao Tsetung e de uma muito importante de Lenin sobre a milícia popular: nos diz que o exército pode ser usurpado e ser manejado para gerar uma restauração, por isso ele propôs a milícia popular a qual devia assumir funções de Exército, de polícia e de administração, uma grande tese que se bem não tenha chegado a consolidá-la por circunstâncias históricas não quer dizer que não seja importante e válida, e tão válida é que o próprio Presidente Mao preocupou-se bastante pelo problema de desenvolver a milícia popular. Então nosso exército sai com essas características, está feito tendo em conta essas experiências, porém tem sua peculiaridade. Nós temos uma conformação de três forças: uma força principal, uma força local e uma força de base, não temos uma milícia independente e sim uma que está na base mesma do Exército, está feito com esse critério. Também poderíamos dizer que não podia fazer-se o Exército Guerrilheiro Popular de outra maneira em nossas condições concretas, porém realmente foram os princípios os que nos guiaram. Este exército, não obstante essas características, tem podido atuar em toda situação e pode ter os reajustes e reorganizações que sejam necessários. Outra questão derivada da guerra popular, sua principal conquista é o Novo Poder. O problema do Novo Poder o vemos ligado ao problema da frente, baseando-nos no que disse o Presidente Mao em sua obra “Sobre a Nova Democracia”. Temos levado em conta ademais a longa e apodrecida experiência do frentismo no Peru onde traficou-se e segue-se traficando com a frente única, ontem com a chamada “Frente de Libertação Nacional” e, hoje, principalmente com a autodenominada Esquerda Unida e outros monstrengos em formação como a cacarejada “Convergência Socialista”. Ou seja, sempre temos em conta os princípios e as condições concretas de nossa realidade. Por isso, não entendemos porque nos chamam de dogmáticos… enfim, o papel aceita tudo. Isto nos levou a formar a Frente Revolucionária de Defesa do Povo. Aqui tem outra coisa: fomos nós que criamos a primeira frente de defesa do povo em Ayacucho, exemplo que depois, como criação heróica, deformando-o, apropriou-se Patria Roja para fazer seus “FEDIP”(3) cujo próprio nome é errado, pois se é uma frente de defesa do povo, como poderia não defender os interesses do povo? Construímos a Frente Revolucionária de Defesa do Povo somente no campo e a concretizamos como Poder, como comitê popular e esses comitês populares em uma área conformam uma base de apoio e o conjunto das bases de apoio é o que chamamos de República Popular de Nova Democracia em formação. Este problema nas cidades o propomos mediante a conformação do Movimento Revolucionário de Defesa do Povo que serve também para travar a guerra popular na cidade, para nuclear forças, abalar a ordem reacionária e a desenvolver-se a aglutinação das classes em função da futura insurreição. Outras mudanças têm a ver com a forja da militância. Obviamente a guerra forja de outra maneira, tempera, nos permite encarnar mais profundamente a ideologia, gerar uma militância mais férrea com o critério de desafio à morte ou com o de arrancar da morte os louros da vitória. Também poderíamos dizer que outra mudança no Partido, já em outro plano ou outra repercussão, melhor direi, tem a ver com a revolução mundial. A guerra popular tem permitido ao Partido mostrar claramente como tomando-se do marxismo-leninismo-maoismo podemos desenvolver uma guerra popular sem estar sujeitos a nenhum bastão de mando, a nenhuma superpotência nem potência alguma; a mostrar como é factível, apoiando-nos em nossos próprios esforços, levar adiante a guerra popular. Tudo isto deu ao Partido um prestígio em nível internacional como nunca teve antes e não é nenhuma afirmação orgulhosa, longe de nós a vaidade, é um simples fato, e nos permite também servir como nunca antes ao desenvolvimento da revolução mundial. Dessa maneira o Partido através da guerra popular está cumprindo seu papel de Partido Comunista do Peru.

El Diario: Como participam os operários e camponeses no Exército Guerrilheiro Popular?

Presidente Gonzalo: Participa principalmente o campesinato, pobre em especial, como combatentes e mandos nos diferentes níveis; dessa maneira participam. Os operários de igual forma, ainda que o percentual que agora temos seja insuficiente.

El Diario: Presidente, onde se desenvolve mais o Novo Poder, no campo ou na cidade?

Presidente Gonzalo: Somente desenvolvemos o Novo Poder no campo, nas cidades se dará na parte final da revolução. É problema do processo da guerra popular; creio falaremos mais em “guerra popular”, aí se pode tratar um pouco mais este ponto.

El Diario: Presidente, mudando um pouco: nos documentos do Partido Comunista se defende que você é o chefe do Partido e da revolução. Que implicação tem e como se opõe à tese revisionista do culto à personalidade?

Presidente Gonzalo: Aqui temos que recordar a tese de Lenin sobre o problema da relação massas-classes-Partidos-chefes. Consideramos que a revolução, o Partido e a classe geram chefes, geram um grupo de chefes. Em toda revolução tem sido assim. Se pensamos, por exemplo, na Revolução de Outubro, temos Lenin, Stálin, Sverdlov e uns quantos nomes mais, um pequeno grupo. O mesmo passou-se na Revolução Chinesa, também temos um pequeno grupo de chefes: o Presidente Mao Tsetung e os camaradas Kang Sheng, Chiang Ching, Chan Chung-chao, entre outros. Toda revolução é assim, então isto também se dá na nossa revolução. Não poderíamos ser exceção — aqui não vale que “toda regra tem exceção”, aqui trata-se do cumprimento de leis. Todo processo, pois, tem chefes, porém tem um chefe que se sobressai sobre os demais ou que encabeça aos demais, segundo as condições porque não poderíamos ver a todos os chefes com igual dimensão: Marx é Marx, Lenin é Lenin, o Presidente Mao é o Presidente Mao, e nenhum deles se repete e ninguém é igual a eles. Em nosso Partido, revolução e guerra popular, o proletariado gerou também um conjunto de chefes por necessidade e casualidade históricas, no sentido de Engels. É uma necessidade que se gerem chefes e um chefe, porém quem será concretamente o chefe é resultado da casualidade, ou seja, o conjunto de condições específicas que se concretizam em um lugar e momento determinados. Assim também, em nosso caso, gerou-se uma Chefatura. Primeiro essa chefatura foi reconhecida no Partido, na Conferência Nacional Ampliada de 1979, porém esta questão encerra uma questão básica inevitável que merece destacar: não há Chefatura que não se sustente em um pensamento, qualquer que seja o grau de desenvolvimento que o mesmo tenha. O que tenha se convertido em chefe do Partido e da revolução, como dizem as resoluções, tem a ver com a necessidade e a casualidade históricas e, obviamente, com o pensamento Gonzalo. Ninguém sabe o que a revolução e o Partido podem fazer com cada um de nós, e quando tal coisa se especifica a única que resta é assumir a responsabilidade. Temos nos movido dentro da tese de Lenin que é justa e correta: o problema do culto à personalidade é uma posição revisionista. Lenin já nos advertiu contra o problema da negação dos chefes, assim como destacou a necessidade de que a classe, o Partido e a revolução promovam seus próprios dirigentes, mais dirigentes a chefes e a Chefatura. Há uma diferença que vale ressaltar: dirigente é um cargo orgânico enquanto que chefes e Chefatura nós entendemos como reconhecimento de autoridade partidária e revolucionária, adquirida e provada em longa briga, dos que na teoria e na prática demonstram que são capazes de encabeçar-nos e guiar-nos até o avanço e a vitória na consecução de nossos ideais de classe. Kruschov levantou o problema do culto à personalidade para combater o camarada Stálin, porém esse foi um pretexto como sabemos todos, no fundo era para combater a ditadura do proletariado. Hoje mesmo Gorbachov volta a desfraldar o culto à personalidade, como também o fizeram os revisionistas chineses Liu Shao-chi e Teng Siao-ping. É por consequência uma tese revisionista que aponta essencialmente contra a ditadura do proletariado e contra as chefaturas e chefes do processo revolucionário geral para descabeçá-lo. Em nosso caso aponta concretamente a descabeçar a guerra popular, pois nós não temos ainda ditadura do proletariado e sim um Novo Poder que se desenvolve segundo normas de nova democracia, ou de ditadura conjunta de operários, camponeses e progressistas. Em nosso caso aponta pois, principalmente, a descabeçar; e bem sabe a reação e seus serventes porque dedicar-se a nos descabeçar, sabem que não é fácil gerar chefes e chefatura. E uma guerra popular, assim como se desenvolve no país, necessita de chefes e de uma Chefatura, de alguém que a represente e a encabece e de um grupo capaz de comandá-la de maneira inquebrantável. Em síntese, o culto à personalidade é uma tese revisionista sinistra que não tem nada a ver com nossa concepção sobre chefes que cinge-se ao leninismo.

El Diario: Qual significado tem para você e seu Partido a celebração do I Congresso do Partido Comunista do Peru?

Presidente Gonzalo: Voltando a isto, queríamos aprofundar algumas questões. Reiteramos que é um marco de vitória, é cumprir com uma dívida pendente que inclusive o próprio fundador estabelecera. Celebramos o Primeiro Congresso do Partido Comunista do Peru. O que implica isto? Reafirmamos que nenhum dos 4 congressos havidos até 62, época na qual nos desenvolvíamos dentro do Partido de então, nenhum desses é um congresso marxista, nenhum desses se cingiu estritamente à concepção do proletariado. Por isso nosso Congresso é marxista para ressaltar o que acabo de dizer, porém desenvolvendo-nos no momento histórico em que estamos, o Congresso é marxista-leninista-maoista, porque o maoismo é a terceira, nova e superior etapa, e é, ao fim e ao cabo, a principal das três. Porém, também é pensamento Gonzalo porque o Congresso sustenta-se nesse pensamento que foi gerado no processo de aplicação da verdade universal, do marxismo-leninismo-maoismo à situação concreta de nossa realidade. Por tudo isto é um “Congresso marxista, Congresso marxista-leninista-maoista, pensamento Gonzalo”. Este Congresso nos permitiu fazer um balanço de todo o processo seguido e tirar as lições positivas e negativas. Este Congresso nos permitiu sancionar a base de unidade partidária conformada com seus três elementos: 1) a ideologia, o marxismo-leninismo-maoismo, pensamento Gonzalo, 2) o programa e 3) a linha política geral, com seu centro a linha militar. O Congresso também conseguiu sentar sólidas bases para a conquista do poder em perspectiva — reitero, em perspectiva. Somente pudemos cumprir o Congresso em meio à guerra popular, e dizemos isto porque já em 1967 nós propusemos realizar o quinto congresso, e em 1976 nos propusemos fazer o Congresso da reconstituição. Durante vários anos fizemos intentos, entretanto não pudemos consolidar. Por quê? Expressa o que se viu em muitos partidos, que quando se preparam para ingressar na luta armada, a tomar as armas, engalfinham-se em grandes lutas intestinas que levam a divisões e rachas. E assim frustra-se o desenvolver a conquista do Poder com as armas nas mãos. Isto nos levou no ano de 1978 a adiar o congresso para realizá-lo quando estivéssemos em plena guerra popular. Fizemos um raciocínio puro e simples, estando em guerra quem ia opor-se à guerra popular? Um congresso e um partido com as armas nas mãos, com uma guerra popular pujante, como poderia haver quem se opusesse a desenvolver a guerra popular? Já não poderiam gerar-nos nenhum dano. O Congresso desenvolveu outras situações, fez ver e compreender mais profundamente o processo da guerra popular, e particularmente a ver e compreender mais profundamente a necessidade de construir a conquista do Poder. Também o Congresso deu um salto na luta e isso é bom; e é necessário dizê-lo com clareza, ainda que alguns o queiram entender mal, porém enfim, estamos curados de más interpretações, de elementos estranhos e não revolucionários. No Congresso definiu-se que a luta de duas linhas no Partido desenvolve-se contra o revisionismo como perigo principal. Isto merece uma pequena explicação. No Partido não há uma linha oportunista de direita. Nestes momentos da ausência de uma linha de direita, se dão somente atitudes, ideias, critérios e até posições de direita isolados. Porém precisamente aprofundando o problema, o Congresso concluiu que propor-nos combater o revisionismo como perigo principal é a melhor forma de o Partido prevenir-se e conjurar uma linha oportunista de direita que seria revisionista. O Presidente Mao demandou preocupar-se sempre com o revisionismo, porque esse é o perigo principal que tem a revolução no mundo. Desta maneira também nos ajustamos com a situação fora de nossas fileiras, pois toda expressão que possa dar-se no Partido de atitudes, idéias, critérios e posições de corte direitista têm a ver com a dinâmica ideológica, com a repercussão da luta de classes, das campanhas do Estado reacionário com a própria ação do revisionismo no país, com as atividades contrarrevolucionárias do imperialismo, especialmente com a contenda entre as duas superpotências e o trabalho sinistro do revisionismo em nível mundial. Desta maneira o Partido nos vacina, nos prepara e elevamos a guarda, e assim, aplicando uma firme e sagaz luta de duas linhas no seio do povo — porque, reitero, não há linha oportunista de direita — podemos evitar que se apresente uma linha revisionista. O dito pode ser mal interpretado, porém há que dizer as coisas e ensinar ao povo. A nós o Congresso arma-nos e manda-nos “Cuidar-se do revisionismo”! E “Combatê-lo implacavelmente”! Onde quer que se apresente, começando por conjurar e combater qualquer expressão que se possa dar no próprio Partido. E assim estamos melhor armados para combater o revisionismo fora de nossas fileiras e em nível mundial. Este é um dos pontos mais importantes do Congresso. O Congresso nos deu uma grande unanimidade. Sim, unanimidade, pois nos cingimos ao que exigia Lenin: um partido para enfrentar situações complexas e difíceis, como as que enfrentamos diariamente, mais ainda nos momentos decisivos dentro dos quais estamos nos desenvolvendo e nos desenvolveremos, deve ter unanimidade. Há que desatar luta para ter uma linha clara, definida, e igual compreensão, para ter unidade férrea e golpear contundentemente. Isso nos deu o Congresso também, unanimidade porém alcançada, insisto, através da luta de duas linhas. Assim é como atuamos. E por que é assim? Reitero uma vez mais: o Partido é uma contradição e a contradição tem dois aspectos em luta, assim é e disso ninguém pode escapar. Nosso Partido então está hoje mais unido do que nunca, e mais unido pelas altas tarefas que tem que empreender com resolução e firmeza. Em outro plano, o Congresso, obviamente, elegeu o Comitê Central, e se é o Primeiro Congresso temos o Primeiro Comitê Central. O Congresso nos deu todas estas coisas e, finalmente, como bem sabemos todos, é o nível supremo de um partido, o que aí sancionou-se ficou convalidado no nível orgânico mais elevado. Hoje em dia tudo nos torna mais fortes, mais unidos, mais decididos, mais resolutos, porém há algo que vale destacar novamente: o Congresso é filho do Partido e da guerra, sem a guerra popular não se teria cumprido essa tarefa histórica pendente quase 60 anos desde a fundação em 1928, porém o importante está em que o Congresso potencializa o desenvolvimento da guerra popular, devolve a guerra popular multiplicando o que fez por sua consolidação. A guerra popular agora é mais forte e se potencializará muito mais que ontem. Por tudo isto o Congresso para nós, membros do Partido Comunista do Peru, é um marco imortal de vitória e estamos seguros que ficará estampado em nossa história partidária. Esperamos dele grandes resultados que sirvam ao proletariado do Peru e ao povo peruano, que sirvam ao proletariado internacional, às nações oprimidas e aos povos do mundo.

El Diario: Alguns assinalam que a realização do Primeiro Congresso do PCP, pelas próprias condições em que realizou-se, de intensa guerra popular, significou um duro golpe para as forças reacionárias. O que nos diz disto?

Presidente Gonzalo: Parece-nos que essa é uma opinião acertada que demonstra como há neste país uma classe e um povo que entendem o que estamos fazendo, o que o Partido está fazendo. Para nós é um grande reconhecimento que leva-nos a esforçar-nos mais por ser merecedores dessa confiança, dessa esperança.

El Diario: O Partido Comunista do Peru se depurou antes da realização do Congresso?

Presidente Gonzalo: Não, em nosso caso a forte depuração que tivemos foi para iniciar a guerra popular, no IX Pleno de 1979. Aí travamos dura luta contra uma linha oportunista de direita que opunha-se a iniciar a guerra popular, foi aí que produziram-se expulsões e uma depuração do Partido. Porém, como está bem estabelecido, a depuração fortalece e nos fortalecemos, e a prova é que ingressamos na guerra popular e já estamos levando-a há oito anos. No Congresso não houve tal depuração.

El Diario: Muitos se perguntam e não entendem de onde radica a força e decisão do militante do PCP. Será acaso sua sólida formação ideológica? Como se dá este processo na militância?

Presidente Gonzalo: A força dos militantes do Partido realmente sustenta-se na formação ideológica e política, sustenta-se em que os militantes abraçam a ideologia do proletariado e sua especificação, o marxismo-leninismo-maoismo, pensamento Gonzalo, o programa e a linha política geral, e seu centro, a linha militar. A partir disto desenvolve-se a força da militância. Uma coisa que nos preocupou bastante para o início da guerra popular foi a militância. Na preparação da guerra popular nos colocamos como temperar a militância e nos impusemos altas exigências: romper com a velha sociedade, dedicação cabal e completa à revolução e dar nossa vida. É muito expressivo recordar o Pleno do Comitê Central do ano de 1980 e a Escola Militar, ao término destes eventos toda a militância fez um compromisso, todos assumimos ser iniciadores da guerra popular, foi um compromisso solene que logo se fez em todo o Partido. Como se dá este processo? Parte primeiro de como se vai forjando cada um dos futuros militantes, antes de sê-lo, na luta de classes. Cada um vai participando na luta de classes, vai avançando, vai trabalhando mais proximamente de nós, até que chega o momento em que a pessoa individualmente toma a grande decisão de pedir seu ingresso no Partido. O Partido analisa suas condições, seus méritos, também avalia suas limitações — porque todos nós temos — e lhe outorga a militância se a merece. No Partido começa já a formação ideológica sistemática. É nele que nós vamos nos tornando comunistas, é ele que nos vai tornando comunistas. A circunstância dos últimos anos tem como característica que a militância se tempera na guerra, e mais: os que ingressam o fazem num Partido que dirige a guerra, portanto, se ingressam no Partido é para desenvolver-se como comunistas primeiro e principalmente, como combatentes do Exército Guerrilheiro Popular e como administradores nos níveis do Novo Estado que organizamos. Então a guerra popular é outro elemento de muita importância que auxilia a forja da militância. Sintetizando, se partirmos do ideológico-político, a própria guerra vai forjando o militante, nessa ardorosa frágua, e o Partido nos vai modelando, e assim avançando todos nós e vamos servindo. Entretanto, sempre temos uma contradição entre a linha vermelha que prima em nossa cabeça e a linha contrária, dão-se as duas, pois não há comunista cem por cento, e em nossa mente trava-se a luta de duas linhas e esta luta é chave também para a forja da militância, apontando a que sempre prime em nós a linha vermelha. Isso é o que buscamos. Assim está forjando-se a militância; e os fatos mostram o grau de heroísmo revolucionário de que são capazes de chegar os militantes, assim como outros filhos do povo.

El Diario: Você considera que uma das expressões mais elevadas do heroísmo da militância do PCP tenha ocorrido nas prisões no dia 19 de junho de 1986?

Presidente Gonzalo: É uma alta expressão, sim, porém consideramos que o mais alto heroísmo revolucionário transbordado aos borbotões expressou-se ao enfrentar o genocídio dos anos 1983 e 1984, quando enfrentamos as Forças Armadas que recém ingressavam na guerra. Esse foi até hoje o maior genocídio massivo, e nele deram-se grandiosos exemplos de combatividade popular — o que é vital e principal — e, ademais, se dá uma expressão massiva de heroísmo, de entrega, de dar a vida e não somente dos comunistas, e sim de camponeses, de operários, de intelectuais, de filhos do povo. Aí deu-se a maior mostra de heroísmo revolucionário massivo e nossa maior forja também. Então poderiam perguntar-nos: por que tomamos o 19 de junho como “Dia da Heroicidade”? O dia 19 é uma data que mostra perante nosso povo e o mundo o que são capazes de fazer comunistas firmes e revolucionários consequentes, porque não somente mataram comunistas, a maior parte foram revolucionários. Daí que deriva como símbolo, porque há uma data específica, enquanto que o genocídio geral são dois anos, são muitos fatos dispersos. O dia 19 é um só fato de grande repercussão e exemplo que estremeceu o Peru e o mundo. Por isso tomamos o 19 de junho como “Dia da Heroicidade”.

El Diario: Presidente, como o PCP pode sustentar materialmente o gigantesco aparato partidário, incluindo o Exército Guerrilheiro Popular?

Presidente Gonzalo: Creio que isto merece algumas precisões. Sobre o Partido, o Presidente Mao nos ensina como ensinaram sempre Marx, Lenin e os grandes marxistas, ensinaram que o partido não é partido de massas, que o partido tem sim caráter de massas; caráter de massas, no entanto, sendo o partido uma organização selecionada, uma seleção dos melhores, dos provados, dos que têm madeira — como dizia Stálin —, sendo poucos numericamente em proporção à imensa massa. O partido defende os interesses do proletariado, assume o interesse de classe do proletariado, portanto assume a emancipação do proletariado que somente chegará com o comunismo. Porém, como na revolução atuam outras classes que conformam o povo, o partido também defende seus interesses em consonância com que o proletariado somente pode emancipar-se emancipando aos demais oprimidos, de outra forma não pode emancipar-se. Por isso o partido tem caráter de massas, porém o partido não é de massas. O partido de massas do qual tanto se está falando hoje não é senão expressão, uma vez mais, das apodrecidas posições revisionistas. São esses partidos de aderentes, de funcionários, essas máquinas organizativas. Nosso Partido é um partido de militantes, de dirigentes, uma máquina de guerra tal como demandara o próprio Lenin. Bem, creio que reforçando isto podemos pensar quantos bolcheviques havia quando triunfou a revolução de outubro: 80 mil em um país de 150 milhões de habitantes. O partido é um sistema de organizações e obviamente tem necessidades. A formação de um exército que é numericamente muito maior, mais amplo, também tem necessidades. Como resolver o problema? O marxismo nos ensinou e o Presidente Mao em especial. O PCCh, por instrução do Presidente Mao Tsetung, concluiu que o apoio econômico que se dava aos partidos era um corrosivo e que era um critério revisionista porque um partido deve apoiar-se nas próprias forças; isto é o que temos seguido, apoiar-nos nas próprias forças. Apoiar-nos nas próprias forças tem a ver com as necessidades econômicas porém principalmente, no nosso entender, tem a ver com como orientar-se ideológica e politicamente, e partindo disso é que podemos ver como assumir as necessidades econômicas que sempre se apresentam; seria errôneo dizer que não existem. Pois bem, baseando-nos nestes critérios resolvemos o problema e o seguiremos resolvendo apoiando-nos nas massas. São as massas de nosso povo, é o proletariado, nossa classe — porque essa é nossa classe, a ela devemos, a ela servimos —, é nosso campesinato principalmente pobre, é a intelectualidade, a pequena burguesia, os avançados, os revolucionários, os que querem a transformação radical, a revolução em uma palavra, são esses que sustentam o Partido, principalmente o campesinato e o proletariado, eles são os que sustentam. E se vamos mais além, o campesinato pobre principalmente é quem tira um pedaço de pão da boca para nos dar, o que nos dá um pedaço de sua manta, o que nos dá um lugarzinho em sua choça, é esse o que nos sustenta, nos apoia e nos dá até seu próprio sangue, como também dá o proletariado, como também fazem os intelectuais. Assim é como estamos nos desenvolvendo. Nos baseamos nisso. Este problema nos leva às seguintes questões. Partir deste fundamento nos permite ter independência, não depender de bastão de mando algum porque no comunismo internacional acostumou-se a bastão de mando. Kruschov era um campeão do bastão de mando, como o é hoje Gorbachov e como o é Teng, esse personagem sinistro; independência porque cada Partido Comunista tem que decidir ele mesmo porque é responsável por sua revolução, o que não implica desligar-se da revolução mundial e sim precisamente para servi-la. Isto nos permite autodecisão, o decidir por nós mesmos. O Presidente Mao dizia assim: muitos conselhos nos deram, alguns bons e alguns maus, os bons aceitávamos, os maus rechaçávamos; porém se houvéssemos aceitado um princípio errôneo a responsabilidade não teria sido de quem nos deu e sim de nós mesmos. Por quê? Porque temos autodecisão, relaciona-se com a independência e isso nos leva à autossustentação, a ter que basear-nos em nossas próprias forças. Quer dizer isto que desconhecemos o internacionalismo proletário? Não, pelo contrário, somos praticantes fervorosos e consequentes do internacionalismo proletário, e estamos convencidos do apoio que nos brindam o proletariado internacional, as nações oprimidas, os povos do mundo, os próprios partidos ou organizações que se mantêm fiéis ao marxismo seja qual for seu grau de desenvolvimento, e reconhecemos que o primeiro que nos dão, seu primeiro apoio é sua própria luta. A propaganda ou as celebrações que fazem de apoio a nós é algo vai ganhando opinião pública e assim se vai expressando o internacionalismo proletário; também está nos conselhos que nos dão, nas opiniões que vertem, porém, insisto, somos nós que temos que decidir se aceitamos ou não; se são justos, bem-vindos, obviamente, porque entre partidos temos obrigação de ajudar-nos, ainda mais nestes tempos difíceis e complexos. Então, reiterando, toda a luta que o proletariado, as nações oprimidas, os povos do mundo, os partidos e organizações firmes e fiéis ao marxismo travam, toda essa luta é a primeira grande ajuda concreta do internacionalismo proletário. Entretanto, a maior ajuda que temos é o imarcescível marxismo-leninismo-maoismo, a ideologia do proletariado internacional, o que gerou a classe operária em longos decênios e milhares de combates em todo o mundo. Essa é a mais grandiosa ajuda que recebemos porque é a luz, sem essa luz nossos olhos não veriam nada, porém com essa luz nossos olhos podem ver e nossas mãos atuar. Assim vemos este problema e assim avançamos.

El Diario: Presidente, poderia ser demais fazer-lhe esta pergunta, porém queríamos saber sua opinião a respeito dos partidos revisionistas que vivem das fundações internacionais e das grandes potências imperialistas e do social-imperialismo.

Presidente Gonzalo: Eu digo que traíram a revolução mundial e traem a revolução em cada país, a classe e o povo, porque servir a superpotências ou potências imperialistas, servir ao revisionismo especialmente ao social-imperialismo, ir atrás de bastão de mando, ser peças de xadrez no jogo pelo domínio do mundo é trair a revolução.

III. Guerra Popular

El Diario: Presidente, agora falemos da guerra popular. O que significa a violência para o Presidente Gonzalo?

Presidente Gonzalo: Sobre a violência, nós partimos de um princípio estabelecido pelo Presidente Mao Tsetung: a violência é uma lei universal sem exceção alguma, quero dizer, a violência revolucionária; essa violência é a que nos permite resolver as contradições fundamentais com um Exército e através da guerra popular. Por que partimos da tese do Presidente Mao? Porque cremos que com ele o marxismo se reafirmou e chegou a estabelecer que não há exceção alguma. Marx já defendera a violência como parteira da história que segue sendo plenamente válida e grandiosa, Lenin defendeu a violência, e nos falou do panegírico da violência revolucionária feito por Engels; porém foi o Presidente quem nos disse que é uma lei universal sem exceção alguma, por isso partimos dessa tese. É uma questão substantiva do marxismo porque sem violência revolucionária não se pode substituir uma classe por outra, não se pode derrubar uma velha ordem para criar uma nova — nova ordem que hoje deve ser dirigida pelo proletariado através de partidos comunistas. O problema da violência revolucionária é uma questão que cada vez mais se põe sob tapete, assim nós comunistas e revolucionários temos que reafirmar-nos em nossos princípios. O problema da violência revolucionária é como concretizamos a guerra popular; para nós a questão é que o Presidente Mao Tsetung, ao estabelecer a guerra popular, dotou o proletariado de sua linha militar, de sua teoria e prática militar de validade universal, portanto, aplicável em todas as partes, segundo as condições concretas. O problema da guerra nós vemos assim: a guerra tem dois aspectos, um de destruição e outro de construção, principal é o de construção, e não ver dessa maneira é abalar a revolução, debilitá-la. Por outro lado, desde que o povo toma as armas para derrubar a velha ordem, desde esse momento a reação busca esmagá-lo, destruí-lo, aniquilá-lo e usa todos os meios disponíveis em suas mãos, chegando ao genocídio. Em nosso país temos isso, e estamos vendo e veremos ainda mais até demolir o caduco Estado peruano. Quanto à chamada guerra suja, preferiria simplesmente dizer que é atribuída a nós a guerra suja, e dizem que a força armada reacionária aprendeu conosco a tal guerra suja; essa imputação é uma clara expressão de não entender o que é uma revolução, é não entender o que é uma guerra popular. A reação aplica, através de suas forças armadas e repressivas em geral, uma grande violência, busca varrer-nos e desaparecer-nos. E por qual razão? Porque nós queremos o mesmo para eles, varrê-los e desaparecê-los como classe. Já Mariátegui dizia que somente destruindo e demolindo a velha ordem se podia gerar uma nova ordem social. Nós avaliamos, em última instância, estes problemas à luz do princípio básico da guerra estabelecido pelo Presidente Mao: o princípio de aniquilar as forças do inimigo e preservar as próprias, e sabemos muito bem que a reação aplicou, aplica e aplicará o genocídio, disso estamos sumamente claros. E, consequentemente, está colocado o problema da cota: a questão de que para aniquilar o inimigo e preservar as próprias forças — e mais ainda desenvolvê-las — há que pagar um custo de guerra, um custo de sangue, a necessidade do sacrifício de uma parte para o triunfo da guerra popular. Quanto ao terrorismo: nos acusam de terroristas, somente quero responder desta maneira para que todos reflitamos. Foi ou não o imperialismo ianque e, particularmente, Reagan, que tachou de terrorismo todo movimento revolucionário? Sim ou não? Assim se pretende desprestigiar e isolar para esmagar, é o que sonham. Porém, não só o imperialismo ianque e as demais potências imperialistas combatem o chamado terrorismo, também assim fazem o social-imperialismo, o revisionismo e, hoje, o próprio Gorbachov defende unir-se para lutar contra o terrorismo. E não é simples coincidência que no VIII Congresso do Partido do Trabalho da Albânia, Ramiz Alía se dedique também a combatê-lo. Porém será muito útil que todos recordemos o que Lenin escreveu: “Vivam os iniciadores do Exército Popular revolucionário! Isto já não é um complot contra um personagem qualquer odiado, não é um ato de vingança, não é uma saída provocada pelo desespero, não é um simples ato de ‘amedrontamento’, não: isto é o começo, bem meditado e preparado, calculado desde o ponto de vista da correlação de forças, é o começo das ações dos destacamentos do exército revolucionário”. “Afortunadamente, passaram os tempos em que por falta de um povo revolucionário ‘faziam’ a revolução terroristas revolucionários isolados. A bomba deixou de ser a arma do ‘petardista’ individual e passou a ser elemento necessário do armamento do povo”. Lenin já nos ensinava que os tempos haviam mudado, que a bomba passou a ser arma de combate da classe, do povo, que já não era uma conjura, uma ação individual isolada, e sim a ação de um Partido, com um plano, com um sistema, com um Exército. Assim são as coisas. Onde está o imputado “terrorismo”? Infâmia pura. Finalmente, deve ter-se muito presente que na guerra contemporânea, em especial, é precisamente a reação quem usa o terrorismo como um de seus meios de luta e o é, como está provado à saciedade, uma quotidiana forma de luta das forças armadas do Estado peruano. Visto o anterior podemos concluir que os que julgam desesperados porque a terra treme sob seus pés, querem imputar terrorismo para ocultar a guerra popular, porém esta é tão estremecedora que eles mesmos reconhecem que a guerra popular tem dimensão nacional e que tornou-se no problema principal que o Estado peruano enfrenta. Nenhum terrorismo é assim, nenhum. E, mais ainda, já não podem negar que um Partido Comunista dirige a guerra popular. Porém nestes momentos há os que começam a refletir; não há que pôr cruzes antecipadas a ninguém, há os que podem avançar. Outros como Del Prado, jamais.

El Diario: Quais são as particularidades da guerra popular no Peru e como se diferencia de outras lutas do mundo, na América Latina e o MRTA?

Presidente Gonzalo: É uma boa pergunta. Agradeço-lhes porque serve para ver uma vez mais o suposto “dogmatismo”. Há inclusive os que dizem que aplicamos mal o Presidente Mao numa época em que já não corresponde; enfim, tanto tagarelam que cabe perguntar se saberão do que falam, entre outros o condecorado senador “especialista em violência”. A Guerra Popular se aplica universalmente, segundo o caráter da revolução e se especifica em cada país, de outra maneira não pode fazer-se. Em nosso caso, as particularidades são muito claras. É uma luta que se trava no campo e cidade, assim foi estabelecido já no ano de 1968, no esquema para a guerra popular. Ali temos uma diferença, uma particularidade, é no campo e na cidade. Cremos que tem a ver com situações específicas nossas. A América Latina, por exemplo, tem cidades proporcionalmente maiores que as que têm outros continentes. É uma realidade da América Latina que não se pode desconhecer, basta ver a capital do Peru, que tem uma alta porcentagem populacional. Assim, para nós, a cidade não podia ser deixada de lado e também tinha que desenvolver-se a guerra nela, porém o principal é a luta no campo, a da cidade é complemento necessário. Aí temos já uma particularidade, mas há outra. Nós, ao ingressar na guerra popular, vamos enfrentar as forças policiais, essa foi a realidade, porque recentemente, no ano de 1982, em dezembro, ingressam as Forças Armadas; não quer dizer que antes não tenham estado cumprindo um papel de apoio, eles estão fazendo, ao lado de estudar o processo que desenvolvíamos. É uma particularidade, porque geramos vazio no campo e tivemos que criar Novo Poder sem haver derrotado grandes Forças Armadas, porque estas não haviam ingressado e, se o fizeram, se ingressaram, foi porque criamos o Poder Popular. Essa foi a situação política concreta que se deu no país. Se não houvéssemos feito aplicando a rajatabla(4), o que diz o Presidente Mao Tsetung, estaríamos sentados esperando que as Forças Armadas ingressassem. Nos teríamos paralisado. Outra particularidade foi a conformação do Exército ao qual já me referi. Todas estas são particularidades. Já nos referimos a campo e cidade, a como fazer a guerra, ao Exército, a como se dá o Novo Poder e, o próprio Partido militarizado é outra particularidade. São situações específicas que correspondem à nossa realidade, à aplicação do marxismo-leninismo-maoismo, da teoria do Presidente Mao sobre a guerra popular, às condições de nosso país. Isto nos diferencia de outras lutas, sim. Por que nos diferenciamos de outros? Porque fazemos a guerra popular, isso nos diferencia de outras lutas da América Latina. Em Cuba não se fez guerra popular, porém também teve suas particularidades que foram esquecidas intencionalmente; antes disseram que foi um caso excepcional — disse Guevara — o não ingresso do imperialismo norte-americano e depois o esqueceram. Ao lado de que aí não teve Partido Comunista que dirigira; são questões do cubanismo e suas cinco características de: insuficiente diferenciação de classes que demandava redentores para redimir os oprimidos, revolução socialista ou caricatura de revolução, frente única porém sem burguesia nacional, não necessidade de base de apoio e a já citada não necessidade de Partido — o que hoje estamos vendo na América Latina não é senão um desenvolvimento dessas mesmas posições, só que cada vez mais a serviço do social-imperialismo e sua contenda com o imperialismo ianque pela hegemonia mundial, América Central o demonstra claramente. O MRTA, do pouco que conhecemos, está dentro desses critérios. Finalmente, outra questão que nos diferencia, e desculpem que insista, é independência, autodecisão e autossustentação; outros não o têm por isso são peças de xadrez, nós não. E uma transcendental diferença, nos sujeitamos ao marxismo-leninismo-maoismo, outros não. Em síntese, a grande diferença, a diferença fundamental está no ponto de partida, na ideologia da qual partimos. Nós partimos do marxismo-leninismo-maoismo, principalmente maoismo aplicado às condições específicas de nosso país, e insisto: eis aí uma vez mais, com claras particularidades que demonstram a falsidade do suposto dogmatismo que nos imputam e, inclusive, o fazem por ordem de seus amos.

El Diario: Presidente, então o MRTA estaria jogando um papel contrarrevolucionário no país?

Presidente Gonzalo: O MRTA tem posições que devem fazer pensar. Por exemplo, a trégua que deu ao Apra que duraria, segundo disseram, até que este golpeasse o povo; porém todos sabemos que no mesmo dia em que Garcia Pérez assumiu a presidência ele reprimiu as massas na própria capital da república. Em outubro de 1985, houve o genocídio em Lurigancho. Era o povo golpeado ou não? E quanto tempo esperaram para terminar sua trégua? São coisas que as pessoas têm que perguntar-se.

El Diario: Sendo tão importante a Base de Apoio, como esta se constrói no país? Que pensa você da insurreição e como preparam as cidades?

Presidente Gonzalo: A base de apoio é a medula da guerra popular, sem ela não pode desenvolver-se a guerra popular. Me referi antes a qual foi a circunstância específica que se apresentou a nós na segunda metade do ano de 1982. Desenvolvemos a parte final da campanha de expandir, apontamos para destruir relações semifeudais de exploração, apontamos contra o gamonalismo(5) que é a base do poder do Estado e seguirá sendo enquanto não o varrermos; seguimos golpeando e causamos contundentes e humilhantes derrotas às forças policiais — isto não digo eu, quem disse foram os jornalistas do Expresso, por exemplo, creio que inimputáveis de posição revolucionária. Então, havendo gerado vazio de Poder no campo, se nos colocou o problema de que fazer? E resolvemos criar comitês populares, ou seja, ditaduras conjuntas, um Novo Poder; defendemos fazê-los clandestinos, porque depois necessariamente entraria as Forças Armadas, isso já sabíamos. Esses Comitês Populares se centuplicaram, os que estão em uma área formam uma base de apoio, e o conjunto destas formam a República Popular de Nova Democracia (RPND) em formação. É desta maneira que surgiram os comitês, as bases e assim está em formação a RPND. Quando entraram as Força Armada, tivemos que desenvolver uma dura luta: eles aplicaram o restabelecimento do velho poder, nós aplicamos o contrarrestabelecimento para voltar a levantar o Novo Poder. Produziu-se um genocídio altamente cruento e sem misericórdia: temos lutado ardorosamente. A reação e as Forças Armadas, concretamente, acreditavam que em 1984 já haviam derrotado-nos. Me remeto a documentos que eles conhecem muito bem porque são seus, e neles se dizia inclusive que já não éramos perigo, e sim que o perigo era o MRTA. Porém o resultado qual tem sido? Que os comitês populares e as bases de apoio se multiplicaram, isso nos levou posteriormente já a desenvolver as bases, é nisso que estamos hoje.

Quanto à insurreição, creio que é um problema sumamente importante. No caso de um país como o nosso, a situação revolucionária em desenvolvimento permitiu iniciar a guerra popular, tendo já Partido reconstituído e uma ideologia clara; o próprio desenvolvimento das bases, o desenvolvimento do Exército Guerrilheiro Popular e da guerra popular vão gerando o impulso e desenvolvimento maior da situação revolucionária. Assim, tendo em conta o que diz o Presidente Mao, tudo isto leva ao que ele denomina “auge”, o que em termos de Lenin é a crise revolucionária. Chegados a esses momentos é que se produz a insurreição. Essa é a teoria da guerra popular e é na qual estamos incursos e desenvolvendo-nos. Pois bem, então, nosso processo da guerra popular tem que levar-nos ao auge, em consequência, temos que preparar a insurreição que vem a ser, em síntese, a tomada das cidades. Nós pensamos e preparamos a insurreição porque é uma necessidade, senão não poderíamos triunfar em todo o país.

O problema da cidade, o que nos coloca? Temos desenvolvido trabalho nas cidades e no campo, sim, há muitos anos o temos feito. Houve uma virada e uma mudança com a guerra popular, certo. A nossa situação agora nos leva a como ir preparando a cidade ou as cidades para generalizar. Isto tem a ver com desenvolver o trabalho de massas, porém desenvolvê-lo na e para a guerra popular; o temos feito e o seguimos fazendo, a questão está que agora começamos a desenvolvê-lo mais. Pensamos que nossa ação nas cidades é indispensável e tem que impulsionar-se cada vez mais e mais, porque aí está concentrado o proletariado e não podemos deixá-lo nas mãos do revisionismo e nem do oportunismo. Nas cidades, existem as favelas, as imensas massas faveladas. Nós, desde o ano de 1976, temos uma diretriz para o trabalho nas cidades. Tomar bairros e favelas como base e proletariado como dirigente, essa é nossa diretriz e a seguiremos praticando, agora em condições de guerra popular. Para quais massas nós apontamos claramente se vê. Do que foi dito anteriormente se deriva nitidamente que as imensas massas de bairros e favelas são como cinturões de ferro que vão cercar o inimigo e que retêm as forças reacionárias.

Temos que ir ganhando a classe operária mais e mais, até que ela e o povo nos reconheçam. Temos uma ideia clara de que se requer tempo e reiterados fatos para que a classe veja, compreenda e se reafirme em que tal partido é a sua vanguarda, em que o povo veja que tem um centro que o dirige. Eles têm esse direito, por tudo quanto têm estafado as massas! Ao proletariado, aos favelados, à pequena burguesia, à intelectualidade, quanta esperança frustrada! Há que pensar que também têm direito de exigir, claro que o têm, e nós a obrigação de trabalhar e fazer-lhes ver e demonstrar-lhes que somos realmente sua vanguarda e que nos reconheçam. Nós distinguimos o que é ser simplesmente vanguarda e ser vanguarda reconhecida. A classe tem esse direito e ninguém pode negá-lo, o povo tem esse direito e ninguém pode negá-lo. Assim pensamos. Não cremos que da noite para o dia o proletariado e o povo vão nos reconhecer como sua vanguarda e único centro, porque isso é o que temos que ser para cumprir a revolução como corresponde. Então temos que fazer um trabalho persistente e imprimir no trabalho de massas formas diferentes, formas distintas, que aprendam da própria guerra popular, que aprendam o valor da arma, a importância do fuzil. O Presidente Mao nos diz que o campesinato tem que aprender a importância do fuzil, é uma realidade; então trabalhamos dessa maneira, cumprimos novas formas e assim vamos desenvolvendo o trabalho de massas na e para a guerra popular. Tem a ver também com outra circunstância, outra situação, com o Movimento Revolucionário de Defesa do Povo, porque a chave do mesmo é o Centro de Resistência, dizemos com toda clareza. São outras formas orgânicas, outras formas de luta as que correspondem a uma guerra popular, não podem ser as usuais, não podem ser, são de outra maneira, isso é o concreto. Desenvolvemos, como consequência, o Partido, o Exército Guerrilheiro Popular e o Movimento Revolucionário de Defesa do Povo, assim como organismos gerados para as diversas frentes do trabalho.

Necessitamos estimular a combatividade, que se expresse a potencialidade da massa, a potencialidade da classe. Vejamos uma questão: hoje temos grandes aumentos de preços. Por que não há um protesto popular? Quem ata as massas? Lenin nos dizia: a marcha faz tremer a reação, quando a classe marcha nas ruas a reação treme, isso é o que nós queremos aplicar, o que nos ensina o marxismo-leninismo-maoismo. A classe nasce e se desenvolve combatendo e o povo igualmente; o que necessitamos é ir sintetizando as próprias experiências da massa, do povo, ir estabelecendo suas formas orgânicas, suas formas de luta e que vão colhendo em suas mãos formas cada vez mais desenvolvidas e crescentes de luta na cidade, assim se vão formando.

Pensamos que a coisa é clara: o centro está no campo, porém, para a insurreição, se muda o centro, o centro passa a ser a cidade e, para isso, inclusive assim como no começo se desloca combatentes e comunistas das cidades ao campo, depois há que deslocar do campo para a cidade. Também se dá e assim vamos transferindo o peso e preparando a insurreição. Temos que ir vendo condições para que convirjam a ação do Exército Guerrilheiro Popular com a ação insurrecional nas cidades, ou em uma ou em várias. Isso é o que necessitamos. A insurreição aponta à captura das cidades para arrematar a guerra popular em todo o país. Porém tem que buscar a preservação dos meios produtivos que a reação buscará destruir, proteger os revolucionários prisioneiros de guerra ou revolucionários conhecidos que eles queiram aniquilar, assim como também caçar os inimigos para colocá-los sob custódia, e isso é o que nos foi ensinado e é uma insurreição. Lenin nos ensinou como se armava uma insurreição e o Presidente Mao nos ensinou como é a insurreição na guerra popular, assim é como a vemos e a preparamos. É o caminho que temos que seguir e que estamos seguindo. Uma coisa há que ter bem claro: a insurreição não é uma simples explosão espontânea, não, isso seria perigoso, entretanto pode ocorrer, por isso é que temos que preocupar-nos desde agora com a insurreição e o fazemos. Pensamos que há os que podem querer usar a guerra popular em seu benefício. Já analisamos em um evento do Comitê Central, há um bom tempo, possibilidades e uma delas é que o revisionismo ou outros gerem “insurreições” ou para fazer abortar o processo de desenvolvimento ou para ganhar posições e servir a seu amo social-imperialista ou a qualquer potência que os mande porque muitos centros poderiam querer utilizar-nos.

El Diario: Presidente, que faria o Partido nessas circunstâncias?

Presidente Gonzalo: Nessas circunstâncias deve-se fazer o que fez Lenin: dizer às massas que não é o momento, porém se as massas se lançam deve-se lutar com elas, para juntos poder fazê-las recuar adequadamente e para que sofram o menos possível, e se morrermos com elas soldamos mais nosso sangue. Isso foi o que Lenin nos ensinou nas famosas lutas de julho de 1917, porque não podemos dizer às massas que estão mal e que os fatos as façam entender. Não, não podemos dizer isso, a massa é a massa, a classe é a classe e se não estão bem orientadas e as condições as desesperam e as lançam a situações, ou inclusive há os que as lançam de má fé, temos que estar com elas para juntos fazer-lhes ver a inoportunidade, porém, combatendo com elas, ajudar-lhes a recuar da melhor forma possível, e então verão que estamos com elas nas boas e nas más situações e será a melhor maneira para que entendam, compreendam e se convençam mais que somos seu Partido. Assim atuaríamos.

El Diario: Presidente, uma pergunta. Quando você fala das formas de luta na cidade, que papel aponta para os sindicatos?

Presidente Gonzalo: O que apontou Marx em “Passado, presente e futuro dos sindicatos”. Marx nos dizia no século passado que os sindicatos no começo foram simples agremiações para defender-se economicamente, esse é seu passado; seu presente é já organizar-se mais e desenvolver-se politicamente; e seu futuro é servir à conquista do Poder. Isso já nos disse Marx; então o problema é como combinamos as duas lutas. A luta pela reivindicação — que é uma guerra de guerrilhas, como nos disse o próprio Marx —, a luta pelo salário, pela jornada, pelas condições de trabalho e outros direitos que a classe desenvolve. Nela o proletariado e o povo se lançam a uma greve, que é uma guerra de guerrilhas na qual não somente luta por uma questão concreta econômica ou política, se é de interesse geral, senão que se está preparando para os grandes momentos por vir e essa é sua essência histórica fundamental. Então o nosso problema é combinar a luta reivindicativa com a conquista do Poder, a isso chamamos desenvolver o trabalho de massas na e para a guerra popular.

El Diario: Presidente, você falou da crise revolucionária. Você crê que a curto prazo se vislumbra esta situação?

Presidente Gonzalo: A questão é o triunfo da guerra popular e tem a ver, principalmente, com quanto mais e melhor lutemos. E a insurreição, como já disse, é o arremate que devemos preparar e o estamos fazendo seriamente, prever possibilidades de que outros queiram traficar com ela, tudo isso é algo que temos que pensar. Porém o problema principal é a oportunidade da insurreição, calcular o momento oportuno.

El Diario: Por que o Partido Comunista do Peru iniciou a guerra popular em 1980? Qual é a explicação militar e histórica deste fato? Qual foi a análise social, econômica e política que fez o PCP para iniciar esta guerra?

Presidente Gonzalo: Temos investigado o país, e o temos estudado particularmente da II guerra mundial em diante e vimos que o processo da sociedade peruana entrava em situações complexas. As próprias análises estatais mostravam que a década de 1980 tinha questões críticas. No Peru vê-se que a cada 10 anos ocorre uma crise na segunda metade da década, e cada crise é pior que a anterior. Logo analisamos o capitalismo burocrático: este amadurece a revolução, as condições da revolução. No ano 1980 o Exército tinha que passar o governo através de eleições, isso ia requerer mais ou menos entre um ano e meio a dois anos para que o novo governo pudesse armar o manejo do Estado. Assim concluímos: o capitalismo burocrático havia amadurecido a revolução, se apresentava a difícil década de 1980, a crise, um governo por eleições, etc. e tudo dava uma conjuntura muito favorável para iniciar a guerra popular e que desmente o critério de que não se pode iniciar luta armada — ou, em nosso caso, guerra popular — quando há um novo governo. Os fatos demonstraram a falsidade dessa posição. Isso foi o que calculamos, assim como a situação em que entrava o novo governo, que os militares saíam depois de 12 anos e não poderiam facilmente assumir uma luta imediata conosco, nem poderiam de imediato retomar o timão do Estado, porque se haviam desgastado politicamente e se desprestigiado; eram fatos concretos, uma realidade. Nós já havíamos defendido desde antes que a participação na Constituinte era incorreta; que só cabia o boicote, porque participar na Constituinte era simplesmente servir à reestruturação do Estado peruano e a que se desse uma constituição como a que temos; e tudo isso era previsível, não havia nada que não se pudesse prever neste caso; portanto nos propusemos já desde antes sentar bases para o início, arrancar antes de que começasse o novo governo e assim o fizemos, posto que começamos em 17 de maio, um dia antes das eleições. Como o fizemos, pensamos que nessas condições poderíamos desenvolver nossa ação e chegar até expandi-la e avançar o máximo possível pensando que na segunda parte do decênio ocorreria uma crise mais grave que a anterior e, portanto, melhores condições ainda para avançar. Sobre estas considerações se planificou o início da guerra popular, porém dizem que não pensamos e sim aplicamos dogmaticamente. Em quê? Há os que falam em dogmas sendo “beatos que comulgan com ruedas de molino(6) Por isso escolhemos esse momento, os fatos nos confirmaram; era óbvio que Belaúnde, e também o ventilamos, teria um temor: o golpe de Estado e, portanto, restringiria as Forças Armadas. Era difícil de prever? Não, pela experiência que teve o ano de 1968; eram coisas calculáveis e se nos foi ensinado calcular, analisar, sopesar, assim nos ensinaram. O Presidente foi muito exigente nesses problemas, sobretudo quanto ao que se refere a preparação. Cremos que os fatos nos confirmaram. Dois anos e não puderam entrar as Forças Armadas. Foi assim ou não? Hoje em dia estão dizendo que haviam queimado a informação de Inteligência que tinham, enfim, o novo governo tinha problemas para armar sua administração e os fatos o demonstraram. Logo veio a crise, entraram os militares com contingentes maiores cada vez e combatendo com eles vários anos estamos mais pujantes, vigorosos e em desenvolvimento. Essas foram as razões do iniciar em 1980 e os fatos demonstram que não erramos ou, pelo menos, não erramos nos grandes lineamentos que é onde não há que errar.

El Diario: Tendo em conta que na guerra são duas as estratégias que se enfrentam, poderia você explicar como se especificou o processo de desenvolvimento de seus planos militares, conquistas e que problemas tiveram?

Presidente Gonzalo: Nós partimos de uma constatação. Cada classe gera sua forma específica de guerra e, portanto, sua estratégia. O proletariado criou a sua: a guerra popular, e é uma estratégia superior. A burguesia nunca poderá ter uma estratégia superior a essa, e mais: não haverá estratégia mais desenvolvida que a do proletariado. É um problema de comprovação do processo militar do mundo, cada classe sempre gerou sua forma de fazer a guerra e sua estratégia, e sempre a estratégia superior venceu a inferior; a nova classe sempre tem a estratégia superior e a guerra popular a é, as provas demonstram. Há tratadistas militares que dizem assim: os comunistas, quando aplicaram seus princípios, nunca perderam uma guerra, somente perderam quando não aplicaram seus princípios. Portanto, partimos disso, que temos uma estratégia superior como teoria provada universalmente, nosso problema era como fazer a nossa, aí está o problema, então se dá a margem de erro.

O primeiro que nos propusemos foi isso, a não aplicação mecânica da guerra popular porque o Presidente Mao Tsetung nos advertiu que a aplicação mecânica leva ao oportunismo e leva à derrota. No ano de 1980 que foi quando decidimos iniciar, nos propusemos no Comitê Central do Partido ter muito presente a aplicação específica, não ao dogmatismo, não ao mecanicismo, essas foram as proposições, disso partimos. Bem, aqui podemos ressaltar o primeiro problema que tivemos; o primeiro problema que tivemos foi a luta antagônica contra uma linha oportunista de direita que se opunha a iniciar a guerra popular, esse é o primeiro problema que tivemos; o arrematamos em sua parte fundamental no IX Pleno e seus restos os varremos cabalmente no Pleno de fevereiro de 1980. Esse foi o primeiro problema que tivemos, daí pois que se deu esta depuração da qual falávamos antes, e tivemos que podar fortemente o próprio Comitê Central, assim é, porém foi como nos fortalecemos e pudemos ingressar e iniciar. Já tínhamos o esquema para travar uma guerra no campo e cidade. O primeiro plano que nos propusemos foi o do Início. O Birô Político foi encomendado de definir como desenvolver as ações armadas e foi o organismo que apresentou o plano partindo de destacamentos quanto à forma militar. Esse plano cumprimos em 1980, porém devemos dizer que duas semanas antes de iniciar houve uma reunião do Birô Político ampliado para analisar como havíamos começado e se concluiu que o novo havia nascido e o novo era a guerra popular, eram as ações armadas, eram os destacamentos. Logo desenvolvemos o plano de Expandir, este plano foi mais longo, abarcou dois anos, porém se cumpriu em várias campanhas, e é ao término do mesmo que se concretizam as novas formas de Poder, surgem os Comitês Populares. Em finais de 1982 ingressam as Forças Armadas; já com antecipação de mais de um ano, o Comitê Central havia estudado o ingresso das Forças Armadas e definiu que ele se daria de modo progressivo, até substituir as forças policiais que passariam a segundo plano e assim aconteceu, de outra maneira não podia ser nessa situação. Havíamos nos preparado e, apesar disto, vamos ter um segundo problema, resultado da repercussão do ingresso das Forças Armadas. Eles entraram aplicando genocídio desde o começo, formando mesnadas(7) e usando massas pressionadas, colocando-as à frente como parapeito(8), isto deve dizer-se com clareza, aí se vê não somente a política de usar massas contra massas, uma velha política reacionária já vista por Marx, mas o covarde uso das massas: colocá-las à frente deles. As Forças Armadas não têm do que vangloriar-se, por isso com razão lhe chamamos de especialistas em derrotas e destra em cevar-se na massa desarmada, essas são as Forças Armadas do Peru. Frente a isto tivemos uma sessão ampliada do CC, muito ampla em comparecimento e tempo, foi uma das mais longas, e nela se estabelece o Plano de Conquistar Bases, se criou o Exército Guerrilheiro Popular para responder a uma força que obviamente tinha mais nível que a policial; aí foi que nos colocamos também o problema da Frente-Estado, entre outros. Assim surge um segundo problema, o problema de enfrentar o genocídio, são os genocídios dos anos 1983 e 1984, estão registrados nos documentos do Partido, não será necessário acrescentar, porém sim queremos ressaltar que foi um genocídio bárbaro e sem misericórdia. Acreditaram que assim iam nos “varrer do mapa” e, de tão certos, começaram nos finais de 1984 a distribuir, entre seus oficiais, sua documentação sobre o nosso aniquilamento. A luta foi intensa, dura, foram momentos complexos e difíceis. Frente ao uso de mesnadas e a ação militar reacionária respondemos contundentemente com uma ação: Lucanamarca. Nem eles e nem nós a esquecemos, claro, porque aí viram uma resposta que não imaginaram. Lá foram aniquilados mais de 80, isso é o real, e há que dizer, ali houve excesso, como se analisou no ano 1983, porém toda coisa na vida tem dois aspectos: nosso problema era um golpe contundente para sofreá-los, para fazer-lhes compreender que a coisa não era tão fácil. Em algumas ocasiões, como nessa, foi a própria Direção Central que planificou a ação e dispôs as coisas, assim foi. Aí o principal é que demos um golpe contundente e os sofreamos e entenderam que estavam com outro tipo de combatentes do povo, que não éramos os que eles haviam combatido, isso é o que entenderam. O excesso é o aspecto negativo. Entendendo a guerra e baseando-nos no que disse Lenin, tendo em conta a Clausewitz, na guerra a massa, em meio ao combate, pode exceder e expressar todo o seu ódio, o profundo sentimento de ódio de classe, de repúdio, de condenação que tem, essa foi a raiz; isto foi explicado por Lenin, bem claramente explicado. Podem cometer-se excessos, o problema é chegar até um ponto e não passá-lo, porque se o ultrapassas te desvias; é como um ângulo, até certo grau pode-se abrir, e não pode abrir mais do que aquilo. Se vamos dar às massas um conjunto de restrições, exigências e proibições, no fundo não queremos que as águas transbordem; e o que necessitávamos era que as águas transbordassem, que o huayco entrasse, seguros de que quando entra arrasa, porém logo volta ao seu leito. Reitero, isto está explicado por Lenin perfeitamente; e assim é como entendemos esse excesso. Porém, insisto, aí o principal foi fazer-lhes entender que éramos um osso duro de roer, e que estávamos dispostos a tudo, a tudo. Marx nos ensinou: não se brinca de insurreição, não se brinca de revolução; porém quando se desfralda a insurreição, quando se toma as armas, não se arria a bandeira, mantém-na vitoriosa até o triunfo, sem arriá-la jamais; assim nos ensinou e não importa quanto nos custe! Bem, Marx nos armou, assim como Lenin e, principalmente, o Presidente Mao Tsetung nos ensina o que é cota, o que é aniquilar para preservar, o que é manter a bandeira alta, aconteça o que acontecer. E, dizemos, assim, com essa decisão, ultrapassamos este trágico, vil, covarde e bárbaro genocídio; porque alguém — esse que finge de presidente — fala de barbárie sem corar, quando é um aspirante a Átila, brincando com sangue alheio. Temos passado por momentos difíceis? Sim. Porém o que demonstrou a realidade? Que se persistimos, se mantemos a política no comando, se mantemos a estratégia política, se somos capazes de enfrentar qualquer banho de sangue (para o banho de sangue começamos a nos preparar desde o ano de 1981, porque tinha que vir; assim que já estávamos preparados ideologicamente, isso é o principal). Tudo isto levou a que crescessem nossas forças e se multiplicassem. Esse foi o resultado; se cumpre o que disse o Presidente: a reação sonha quando quer afogar em sangue a revolução, fique sabendo que assim só faz regá-la, e é uma lei inexorável. Então isto mesmo nos reafirma como temos que ser cada vez mais fiéis, firmes, resolutos nos princípios e ter sempre confiança inalterável nas massas. Assim, saímos fortalecidos com um Exército maior, com mais Comitês Populares e Bases de Apoio e com mais Partido; tudo ao contrário do que imaginaram. Já falamos, creio, dos sonhos de sangue da reação, não são senão isso, sonhos de sangue que, ao fim e ao cabo, terminam sendo pesadelos. Porém, insisto, persistindo nos princípios e combatendo com o apoio das massas, principalmente do campesinato pobre, é que temos podido enfrentar essa situação. É aí quando se expressou esse heroísmo do qual falei antes, esse heroísmo massivo. Posteriormente vamos desenvolver um novo plano, o Plano de Desenvolver Bases, no qual estamos. Que podemos dizer? Se a gente vê estes problemas, creio que devemos ter em conta uma lição: todo plano se aprova, se aplica e se faz seu balanço em meio de luta de duas linhas e essa luta é mais intensa quando tem que aprovar-se um novo plano; essa é uma realidade, é uma lição, a temos muito em conta e nos doutrinou bastante e nos tem ensinado muito, assim é. Ao fim e ao cabo, a guerra popular gera um altíssimo grau de unidade, porém em meio de intensa luta. Sim, porque em que pese enfrentar problemas, situações complexas e difíceis, em que pese os reflexos externos, a dinâmica ideológica, os que estão empenhados na guerra popular têm sua vida dada à revolução, e um comunista tem sua vida dedicada ao comunismo ainda que não o veja, porque realmente não o veremos — eu, pelo menos, não hei de vê-lo —, porém esse não é o problema, não ver a meta pela qual brigamos somente nos leva a uma reflexão, tomar os grandiosos exemplos que nos deu o marxismo. Em tempos de Marx ele sabia que não veria o triunfo da revolução e a que o levou? A redobrar mais seu esforço para o avanço da revolução. São lições que temos tirado e nos temos guiado por esses grandiosos exemplos. Insisto uma vez mais, não implica comparação alguma, é só tomar as estrelas polares sempre como rumo, como guia. Bem, se pensamos na luta armada, na guerra popular, podemos dizer que o início nos permitiu desenvolver a guerrilha porque no início passamos de destacamento a pelotão e assim abrimos as guerrilhas; o plano de Expandir nos deu os Comitês Populares; o de Conquistar Bases nos deu Bases de Apoio e um amplo espaço, é bom recordar: tomamos como coluna vertebral para desenvolver a guerra e conquistar o Poder em todo o país a serrania, sim, a Serra de nossa pátria e cobrimos um espaço que vai de uma fronteira a outra, do Equador à Bolívia e ao Chile. Porém também temos desenvolvido o trabalho no extremo da Selva, nas cabeceiras da Costa e, por sua vez, nas cidades. Hoje podemos dizer que temos centenas de Comitês Populares e múltiplas Bases; claro que há uma principal e em cada zona também. Finalmente, dos planos cabia dizer: temos aprendido como manejar a guerra com um plano estratégico único aplicando o princípio de centralização estratégica e descentralização tática. Nós manjamos a guerra mediante um plano único com partes, por campanhas, com planos estratégico-operativos, planos táticos e planos concretos para cada ação. Porém a chave de tudo é o plano estratégico único, é o que permite manejar a guerra como uma unidade e isso é chave na direção da guerra popular. Creio que isso é que poderia dizer.

El Diario: Presidente, nestes oito anos de guerra popular, que resultado obteve a estratégia anti-subversva e quais são seus problemas atuais?

Presidente Gonzalo: É uma pergunta que preferiria respondê-la desta maneira, em síntese, a própria reação diz que fracassam e seguem fracassando, eles o sabem muito bem. “A confissão de parte, dispensa provas”, utilizando um termo de advogados.

El Diario: Quando você crê que o Exército Guerrilheiro Popular estará em condições de desenvolver guerra convencional, de defesa de posições territoriais e de um aberto enfrentamento com as Forças Armadas? Está este tipo de luta nos planos do PCP?

Presidente Gonzalo: Sobre estes problemas temos meditado, discutido e estabelecido lineamentos partidariamente, já tratamos sobre isto desde o ano de 1981, o fizemos também em outras ocasiões. Partimos de como o Presidente Mao Tsetung concebe a guerra popular a partir da contradição, são dois aspectos que contendem: um deles, parte débil, e outro, transitoriamente forte, e para mudar isto tem que transcorrer um tempo de defensiva estratégica, um segundo de equilíbrio estratégico e um terceiro de ofensiva estratégica. Nós ainda nos desenvolvemos dentro da defensiva estratégica e, nessas condições a guerra de guerrilhas segue sendo nossa forma principal, uma guerra de guerrilhas generalizada, ampla tanto no campo quanto na cidade, sendo o campo o principal e a cidade complemento, e combatemos quase em todo o país. Isto quanto ao momento em que estamos. A guerra de movimentos, dentro dos termos do Presidente Mao Tsetung, estamos começando a desenvolver e se desenvolverá mais, conforme a reação necessariamente tenha que levar uma guerra contra-subversiva mais desenvolvida; porém ainda nesse caso teremos que seguir travando a guerra de guerrilhas como a principal e uma guerra de movimentos como complemento e, nela sim, cabem algumas modalidades específicas de guerra de posições como está escrito em “Sobre a Guerra Prolongada”. Pensamos que ao potencializar-se a guerra popular tem que dar-se necessariamente uma elevação da guerra contra-subversiva e vai ter como centro o genocídio, e isto nos vai levar em perspectiva ao equilíbrio estratégico, no entendimento, é claro, de persistamos em uma linha ideológica e política justas e corretas e ter, consequentemente, uma linha militar justa e correta e nós temos. Assim, persistindo em tudo isto, somados os planos sinistros que eles estão elaborando e que levarão ao genocídio no qual querem comprometer o povo peruano porque se sentem impotentes, povo que não poderá segui-los porque não pode ir contra seus interesses de classe, vão levar ao equilíbrio estratégico, insisto, no entendimento de manter a correção e a justeza no ideológico, no político, no militar e todas suas derivações. É aí onde temos que colocar o problema de como desenvolver a guerra popular para a tomada de cidades e preparar a parte referente à ofensiva estratégica. Mais do que isso, hoje, não poderíamos pleitear.

El Diario: Para potencializar a guerra, como você refere, é necessário potencializar o armamento do Exército Guerrilheiro Popular? Como pensam resolver em isto?

Presidente Gonzalo: Sim, este é um elemento. Permita-nos partir de uma questão, nos acostumamos sempre e persistimos em partir de nossos princípios, assim é como iluminados por eles podemos resolver nossos problemas concretos. O Presidente Mao Tsetung nos diz que o principal é o homem, a arma é útil; então, nosso problema especialmente aponta para o homem, ao fortalecimento ideológico e político, à construção ideológico-política do Exército neste caso, assim como à sua construção militar. Daí partimos. Quanto ao referente às armas, o Presidente nos dizia que as armas o inimigo as tem, consequentemente o problema é arrancá-las e, isso é o principal; e as armas modernas são necessárias, porém funcionam segundo a ideologia do homem que as maneja, isso já nos ensinou Lênin. Podemos afirmar que estamos desenvolvendo as emboscadas e as Forças Armadas sabem muito bem como estão se desenvolvendo e os duros golpes que sofreram. Me refiro somente a uma relacionada com Cayara, a emboscada de Erusco, são 25 soldados aniquilados, só um se salvou ferido. Por isso sua bárbara resposta genocida; os fatos não são como o estão pintando e conste que moveram grandes forças e não puderam caçar-nos, e conste também que levamos as armas; e, eles sabem muito bem, nós não explodimos um carro só e sim dois carros, porque foi minado um quilômetro de estrada e não tinham escapatória possível; o que nos apresentou na televisão e jornal esse que finge de presidente e os que foram nessa chamada “Comissão” são, como se diz, “marionetes”, “pequenos desenhos na água”(9). Em consequência, há tempos já começou a crescente transferência de armas deles para nós e eles têm a obrigação de nos trazê-las, é sua obrigação e nos trazê-las onde estejamos e há que reconhecer, começam a cumprir. Por que colocamos assim? Porque temos dispersado-los, temo-los aberto em diversos pontos e temos feito assentarem-se passivamente, estão como um elefante chafurdado num lodaçal, portanto mais facilmente golpeáveis, isto deve pensá-lo seriamente o Exército, as Forças Armadas em geral. O que estou dizendo não é senão aplicação do que o Presidente Mao ensinou quando disse que ao término da guerra deveria ser dado um prêmio a Chiang Kai-shek por haver se portado como um bom furriel(10), como um bom portador das armas. Isso já começou e as Forças Armadas sabem muito bem; e o plano que tramam, tudo o que maquinam, a grande ofensiva que querem levar adiante, bem vinda seja, pois não impedirão a transferência de armas e fracassarão porque não vão conseguir mover o povo peruano contra seus próprios interesses, e eles são a reação mais negra e podre hoje manejada por este governo aprista, fascista e corporativo encabeçado por um genocida vil e miserável. O povo peruano, demonstrou a história, não segue o fascismo e não se deixa corporativizar, isso já foi estabelecido e o problema não é de hoje, tem décadas no Peru. Então, as armas do inimigo, arrancando-as, são nossa principal fonte. A humilde dinamite, ademais, seguirá cumprindo um bom papel e as minas são as armas do povo e nós, por princípio, buscamos as armas mais simples que toda a massa possa manejar, porque a nossa guerra é massiva senão não é popular e a nossa é.

Bem, isto leva a uma segunda questão, a elaboração de meios; estamos esforçando-nos por avançar na confecção de meios e eles já conhecem muito bem, as notificações diretas no Palácio do Governo, lançadas com morteiros feitos com nossas próprias mãos, com as mãos do povo, não o dizem, porém sabemos. O outro meio usual é o da compra, porque são três as formas: a principal arrancá-las do inimigo, a segunda confeccioná-las e a terceira comprá-las. Nisto se tem problemas pelo alto custo das armas e nós levamos adiante a guerra popular mais econômica da Terra, assim é porque temos meios muito escassos que são as massas que nos provêm. Reitero uma vez mais. Como resolver o problema? Lenin dizia que tem que conquistar-se armas em grandes quantidades, seja qual for o custo que tal coisa demande e já falei do que o Presidente Mao nos ensinou. Isto é o que nós aplicamos.

El Diario: Você prevê que com o triunfo e avanço da revolução que você dirige se desencadeará uma invasão militar norte-americana? Que faria o PCP nesse momento?

PRESIDENTE GONZALO: O imperialismo ianque já está intervindo, concretamente devemos dizer isto sobre a pergunta. O Estados Unidos pode mobilizar países vizinhos, não esqueçamos que inclusive há pendentes reclamações territoriais e problemas fronteiriços, apesar de que se calam, insisto; e, bem sabemos o papel que tem cabido ao Brasil; pode por sua vez intervir diretamente, com suas próprias tropas e já têm gente treinando aqui. Há tempos decidimos no Comitê Central que seja qual for o inimigo que venha a pisar estas terras enfrentaremos e derrotaremos; nessas circunstâncias mudará a contradição, entraria a desenvolver-se como principal a contradição: nação-imperialismo e isso nos daria mais amplas margens para aglutinar nosso povo.

El Diario: A reação e o revisionismo e o oportunismo da IU, dizem que vocês estão isolados das massas. Que pode dizer a respeito?

Presidente Gonzalo: Creio que de tudo o que estamos dizendo se vê que há apoio das massas; aos que dizem tal coisa, a esses revisionistas e oportunistas lhes faríamos uma pergunta: como explicar a existência de um movimento que desenvolve uma guerra popular durante oito anos sem ajuda internacional se não tivesse apoio das massas?

El Diario: Durante oito anos os grupos de direita do revisionismo, do oportunismo e de toda a reação disseram e gritaram que o PCP é uma organização “demencial”, “messiânica”, “sanguinária”, “polpotiana”, “dogmática”, “sectária”, “narcoterrorista”; o PUM acrescenta que o PCP põe o campesinato entre dois fogos, que são militaristas e, ultimamente, Villanueva disse que vocês são “terroristas genocidas” e outros qualificativos. Que diria você destas qualificações? E para onde estão dirigidas essas qualificações?

Presidente Gonzalo: Para mim são insinuações(11) e incapacidade de compreender uma guerra popular e eu os entendo, os inimigos da revolução nunca poderão entendê-la. Quanto a que colocamos os camponeses entre dois fogos, essa é uma elucubração, porque é precisamente o campesinato a parte imensamente majoritária que conforma o Exército Guerrilheiro Popular; o problema está em entender que o Estado Peruano com suas forças armadas e repressivas quer afogar a revolução em sangue. Isso é nosso entendimento e recomendaríamos a estes senhores que estudem um pouco sobre a guerra em geral, a guerra revolucionária e principalmente sobre a guerra popular e o maoismo, ainda que duvido que o entendam porque para fazê-lo há que ter posição de classe. Quanto ao que disse o Sr. Villanueva de “terroristas genocidas” me parece que é um arremedo grosseiro e plágio querer aplicar-nos o termo de genocidas que neles serve como anel no dedo; frente ao país e frente ao mundo está claramente visto, quem são os genocidas; são eles, é o governo aprista que dirige este Estado reacionário, é a Força Armada reacionária, são as forças repressivas, são eles os vis genocidas; os palavrórios nunca mudarão os fatos, a história já está escrita, amanhã será confirmada. Ademais, quanto tempo durará Villanueva? E qual será seu futuro? Seria melhor que pensasse nisso.

El Diario: Que mudanças você considera que se produziram na política peruana, na base econômica da sociedade e nas massas como consequência de oito anos de Guerra Popular?

Presidente Gonzalo: A primeira questão que se produziu é o desenvolvimento de uma guerra popular que avança irrefreável, o que implica que a revolução democrática passou a fazer-se realmente pela primeira vez neste país, isso mudou todos os termos da política peruana. Daí que a própria reação, seus cupinchas começando pelos revisionistas e seus apoiadores de turno ou o que sejam, concluem que o primeiro e principal problema que o Estado peruano tem é a guerra popular. Assim estamos mudando o mundo neste país e se deriva o mais importante e principal que temos logrado, o surgimento e desenvolvimento de um Novo Poder em marcha que terminará estendendo-se em todo o país. Na base econômica, no Novo Poder estamos estabelecendo novas relações de produção, uma mostra concreta desta é a forma como aplicamos a política de terras, utilizando o trabalho coletivo e a organização da vida social com uma nova realidade, com uma ditadura conjunta, onde pela primeira vez mandam operários, camponeses e progressistas, entendendo por tais os que queiram transformar este país da única maneira como pode fazer-se, com a guerra popular. Quanto a eles, os reacionários, sem recordar-lhes prejuízo econômico que implica a guerra popular e combatê-la, estamos afundando o capitalismo burocrático e há tempos abalando a base gamonal das relações semifeudais que sustentam toda esta armação, ao mesmo tempo golpeando o imperialismo. Para as massas de nosso povo, essas heroicas massas, principalmente para o proletariado, classe dirigente que sempre reconheceremos, pela primeira vez assumem o Poder e têm começado a saborear o mel nos lábios, não ficarão aí, quererão tudo e o terão.

El Diario: Como vê a situação atual e a perspectiva da Guerra Popular no Peru? Que destino se apresenta ao povo peruano [no caso] de não triunfar a curto prazo a revolução que você vem dirigindo há mais de oito anos? Você crê que este governo ou outro tenha alguma saída para esta grave crise? O PCP, no documento “Bases de Discussão” destacou que entramos em anos decisivos, em que o Apra segue sem um plano estratégico. Acaso estaríamos às portas do triunfo da revolução e da tomada do Poder pelo PCP?

Presidente Gonzalo: O povo peruano cada vez se mobiliza mais e se agudiza a luta de classes, isso está diretamente ligado à guerra popular, porque não somos senão continuadores da luta de classes com as armas na mão. Que destino lhe apresenta? Eu creio que o heroico destino de destruir o velho Estado e o glorioso de começar a construir uma nova sociedade, será um grandioso esforço, serão tempos de sacrifícios e dificuldades; porém o povo sairá vitorioso e, ao fim e ao cabo, bastaria recordar, sem a guerra popular deixarão de morrer 60.000 crianças sem chegar a um ano de idade, como está ocorrendo hoje no Peru? Não, portanto o povo seguirá fazendo todo o esforço e atravessará dificuldades, porém cada dia mais consciente pagará o custo necessário, pois sabe que vai vencer. Saída? Consideramos que não têm saída. Nossa interpretação do processo da sociedade peruana contemporânea pleiteia que a partir de 1980 o capitalismo burocrático entrou em destruição e como consequência vem abaixo todo o sistema e não têm saída. E se vemos as coisas, há uma grave crise, porém se lhes juntou duas décadas, a de 1980 e a de 1990, ambas críticas, não têm saída alguma. Quanto a anos decisivos, entendemos por tais mais uma violenta tempestade entre guerra popular e guerra contrarrevolucionária, e cremos, reitero, que daí vai derivar o equilíbrio estratégico. Sobre o tempo [para triunfar a guerra], o Presidente Mao dizia que será necessário menos tempo quanto mais e melhor combatamos; de nossa parte é nossa obrigação fazê-lo, o fazemos e o faremos, porém temos condições objetivas extraordinárias. As condições de crise geral em que entrou o caduco sistema da sociedade peruana nos coloca que estes anos decisivos podem acelerar e de fato vão acelerar poderosamente as condições e desenvolver a situação revolucionária. Nosso problema hoje qual seria? Em síntese, mais guerra popular, mais Poder Novo, mais Exército, mais incorporação da massa e assim cremos que o triunfo em perspectiva é nosso.

El Diario: Finalmente, pode desenvolver sua posição a respeito da guerra popular mundial? No caso de uma guerra mundial entre as superpotências quais seriam os resultados para a humanidade?

Presidente Gonzalo: Pode haver uma guerra mundial? Sim, pode havê-la; as condições existirão enquanto não varramos sua raiz. As superpotências preparam a guerra e fazem grandes planos, é evidente, porém cremos que os comunistas e os revolucionários, as massas, o povo, os homens já não podemos consentir que tenha tanta iniquidade no mundo, temos que apontar a centrar nossa atenção, não na guerra entre as superpotências (porque dela não vai derivar nossa libertação, porque seria uma guerra de rapina para uma nova repartição do mundo). A guerra mundial das potências é pela hegemonia, nada mais que isso. Delas que poderíamos esperar? Grandes matanças, grandes genocídios, centenas de milhares de mortos, porém, seguramente a imensa maioria da humanidade subsistirá. Não podemos aceitar as ideias sinistras levantando hoje as armas atômicas e todas as armas sofisticadas que exibem, nem podemos aceitar que as usem como uma chantagem para paralisar-nos. Muitas vezes no mundo se falou pelos reacionários de armas decisivas e definitivas, de desaparecimento da humanidade, porém sempre foi para aquietar, para conter, para manter seu velho domínio. Nós, por isso, pensamos que o problema está em centrar a atenção, nosso esforço, nossa paixão, nossa vontade em desenvolver a guerra popular, porque dela sim devirá a emancipação do povo e do proletariado que é a definitiva e verdadeira emancipação. Pensamos que uma guerra popular mundial é a resposta a uma guerra mundial imperialista, pensamos que o problema é prepará-la e a concebemos de forma que os que já estão em guerra popular a desenvolvamos mais, os que não a iniciaram comecem a desenvolvê-la e assim iremos demolindo o domínio imperialista, o domínio da reação e os iremos varrendo da face do mundo. Não concebemos a guerra popular mundial como um fato que se dê simultaneamente em um dia e hora exatos, a concebemos como a projeção em perspectiva, ligada aos 50 a 100 anos que estabelecera o Presidente Mao Tsetung, a concebemos como grandes ondas de guerra popular até que ao fim convirjam todas elas como legiões de ferro de um grande exército vermelho mundial, como dissera o próprio Lênin. Assim é como concebemos, cremos que esse é o único caminho a seguir; o problema, insisto, está em que a guerra mundial é um risco e será uma imensa matança, porém dela somente virá miséria, iniquidade, dor, morte, porém mais razões para acabar com eles e a solução só é uma, consequentemente, a guerra popular que concebida nessas ondas leve a essa guerra popular mundial e a essa convergência das legiões de ferro do proletariado internacional, dos povos que, ao fim e ao cabo, cumpriremos com a missão histórica que nos correspondeu em grande sorte, viver estes decênios nos quais o imperialismo e a reação serão varridos, porque o que o Presidente Mao previu se cumprirá. Se não vermos nós, verão os que continuem porque as legiões se incrementam mais e mais. O problema onde estaria? A chave qual seria? Pôr no comando o marxismo-leninismo-maoismo e com o maoismo principalmente assumir a guerra popular aplicável universalmente, considerando o caráter de cada revolução e as condições específicas de cada país.

Nota do Arquivo Marxista na Internet

A parte traduzida se encerra aqui. Há mais seções no original.