Trabalhadores e camponeses

Antonio Gramsci

3 de janeiro de 1920


Primeira Edição: L'ordine nuovo, 3 Janeiro 1920

Tradução: Elita de Medeiros - da versão disponível em https://www.marxists.org/archive/gramsci/1920/01/workers-peasants.htm

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A produção industrial deve ser controlada diretamente pelos trabalhadores organizados pela empresa; a atividade de controle deve ser unificada e coordenada através de organismos sindicais puramente de trabalhadores; os trabalhadores e socialistas não podem considerar útil aos seus interesses e aspirações um controle da indústria exercido pelos funcionários (corruptos, venais, irresponsáveis) do estado capitalista, o que só pode significar um ressurgimento dos comitês de mobilização industrial, que são úteis apenas para parasitismo capitalista.

O slogan a terra para os camponeses deve ser entendido no sentido de que as empresas agrícolas e as fazendas modernas devem ser controladas por trabalhadores agrícolas organizados por empresa agrícola e por fazenda, deve significar que as terras de cultivo extensivo devem ser administradas por conselhos de pobres camponeses das aldeias e distritos agrícolas; os trabalhadores agrícolas, os camponeses revolucionários pobres e os socialistas conscientes não podem considerar úteis para seus fins de educação proletária, indispensáveis para uma república comunista, a propaganda para as terras não cultivadas ou mal cultivadas. Essa propaganda só pode ter como resultado uma monstruosa difamação do socialismo. O que um pobre camponês obtém invadindo terras não cultivadas ou mal cultivadas? Sem maquinário, sem moradia no local de trabalho, sem crédito para durar até a colheita, sem instituições cooperativas para comprar a própria colheita (isso se o camponês chega à colheita antes de se enforcar no arbusto mais forte do matagal, ou no figo selvagem mais fraco, na terra não cultivada!) ou para salvá-lo dos usurários, o que pode um pobre camponês ganha com a invasão? Essa invasão satisfaz, em um momento, seus instintos como proprietário, sacia sua ganância primitiva por terra; mas em um Segundo momento, quando ele percebe que seus braços não são suficientes para trabalhar determinada que só a dinamite surtiria efeito, quando ele percebe que sementes, fertilizantes e ferramentas são necessárias, e pensa que ninguém lhe dará essas coisas indispensáveis, pensa na futura série de dias e noites a serem passados em terra sem casa, sem água e com malária, o camponês sente sua impotência, sua solidão, sua condição desesperadora e se torna um bandido, não um revolucionário, torna-se um assassino dos mestres, e não um lutador pelo comunismo.

Assim, os operários e camponeses revolucionários e os socialistas conscientes não viram um reflexo de seus interesses ou aspirações nas iniciativas parlamentares para o controle da indústria e por terras não cultivadas ou mal cultivadas; eles viram nessas iniciativas apenas o cretinismo parlamentar, a ilusão reformista e oportunista, viram a contrarrevolução. No entanto, a ação parlamentar poderia ter sido útil: poderia ter servido para informar todos os trabalhadores e camponeses dos termos exatos do problema industrial e agrícola e dos meios necessários e suficientes para resolvê-lo. Poderia ter servido para explicar à grande massa de camponeses de toda a Itália que a solução do problema agrícola só pode ser trazida pelos trabalhadores urbanos do norte da Itália, só pode ser conseguida pela ditadura do proletariado.

A burguesia do norte subjugou o sul da Itália e as ilhas, e as reduziu a colônias a serem exploradas; o proletariado do norte, emancipando-se da escravidão capitalista, emancipará as massas camponesas do sul submetidas ao banco e ao parasitismo industrial do Norte. A regeneração econômica e política dos camponeses não deve ser buscada na divisão das terras não cultivadas ou mal cultivadas, mas na solidariedade do proletariado industrial, que tem necessidade, por sua vez, da solidariedade dos camponeses, cujos interesses são que o capitalismo não renasça da propriedade da terra, e que o sul da Itália e as ilhas não se tornem uma base militar da contrarrevolução capitalista. Impondo o controle operário à indústria, o proletariado transformará a indústria em produção de máquinas agrícolas para os camponeses, de roupas e sapatos para os camponeses, de luz elétrica para os camponeses, e impedirá que a indústria e o banco explorem os camponeses e lhes subjugue como escravos em os cofres. Rompendo a autocracia da fábrica, rompendo o aparato opressor do estado capitalista, instalando o estado operário que submete os capitalistas à lei do trabalho útil, os trabalhadores romperão as cadeias de sua pobreza, de seu desespero; instalando a ditadura operária, tendo em suas mãos a indústria e os bancos, o proletariado direcionará o enorme potencial da organização do Estado para sustentar os camponeses em sua luta contra os proprietários e contra a natureza e contra a pobreza; dará crédito aos camponeses, instituirá cooperativas, garantirá a segurança de pessoas e bens contra os saqueadores, iniciará obras públicas de restauração e irrigação. Tudo isto porque é do seu interesse aumentar a produção agrícola, porque é do seu interesse orientar a produção industrial para um trabalho útil de paz e fraternidade entre a cidade e o campo, entre o norte e o sul.

Nesse sentido, os trabalhadores e camponeses conscientes devem buscar uma ação parlamentar socialista avançada: realizar trabalho de educação revolucionária entre as grandes massas, unificar os sentimentos e aspirações das grandes massas na compreensão do programa comunista, difundir incessantemente a convicção de que os atuais problemas da economia industrial e agrícola só podem ser resolvidos fora do parlamento, contra parlamento, pelo estado dos trabalhadores.


Inclusão: 28/09/2021