Conceitos Fundamentais de O Capital
Manual de Economia Política

I. Lapidus e K. V. Ostrovitianov


Livro quinto: O capital comercial e o lucro comercial
Capítulo IX - O capital comercial e o lucro comercial na economia capitalista
44. O trabalho dos empregados no comércio


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Exigindo o período da realização das mercadorias um determinado capital, o capitalista comerciante deve dispender este capital. Sabemos que o objetivo de todo capitalista que coloca seu capital na indústria ou no comércio é obter lucro. A mais-valia é a origem deste lucro. É, no entanto, o trabalho dos empregados no comércio criador de valor e de mais-valia?

Observemos com atenção as diferentes formas de trabalho consagradas à circulação comercial. Pode-se dividi-las em duas categorias: o trabalho dedicado à circulação comercial propriamente dita e o trabalho consagrado ao transporte, à embalagem, à marcação das mercadorias e à guarda dos stocks e lojas.

Nem todas as mercadorias necessitam, contudo, de transporte, embalagem, vigilância. Um imóvel, por exemplo, pode ser vendido e revendido grande número de vezes, ou, em outros termos, participar da circulação comercial, sem mudar de lugar nem ser objeto de nenhuma das operações mencionadas acima. O comércio de imóveis não terá, portanto, necessidade senão do trabalho que serve o processo da circulação comercial propriamente dita — compra e venda — isto é, do trabalho dos empregados de escritório e de um tabelião, bem como de gastos de publicidade, comissões, etc. Este exemplo bem mostra que podemos fazer distinção, no comércio, entre o trabalho diretamente consagrado à circulação de mercadoria e qualquer outro trabalho. Temos necessidade desta distinção porque o trabalho diretamente consagrado à circulação das mercadorias não pode criar nem valor nem mais-valia. Já tentamos explicar a criação da mais-valia pela circulação das mercadorias e verificamos a impossibilidade desta explicação.

O exemplo a seguir, completará as razões que já demos. Um capitalista ocupa-se, ao mesmo tempo, da produção e da venda de mercadorias. Tanto mais ele ocupa operários na produção, dispondo naturalmente de um maquinário apropriado e de matérias primas, maior será a quantidade de mercadorias produzidas e de maior será o seu lucro. Mas é completamente diferente com os empregados no comércio. O aumento do número destes não aumentará jamais a quantidade de mercadorias. É, pelo contrário, a quantidade de mercadorias a vender que determina o número de empregados e caixeiros. Igualmente, o capitalista interessado, nos limites de seu maquinário e dos stocks de matérias primas, em aumentar o número de operários, está também completamente interessado em diminuir tanto quanto possível o número de seus empregados.

É preciso, além disso, tomar em consideração que sempre se observa no comércio uma enorme desproporção entre a quantidade de empregados do capital comercial e a soma dos lucros deste capital. A produção de mercadorias exige muito mais trabalho do que sua venda. Considerando duas empresas de capitais iguais, uma industrial — uma mina de ouro, por exemplo — e outra comercial, por exemplo uma loja de venda de objetos de ouro, veremos que o número dos empregados ocupados na loja é insignificante em comparação com o de operários ocupados na produção de ouro.

A produção de ouro elevou-se, na Rússia, em 1910, a 2.618 puds de ouro (um pud vale 16 kg. 380 gr.) para 84.021 operários. A produção de um operário, num ano. foi, portanto, um pouco superior a 400 gramas. Não é difícil de se perceber que um empregado de loja pode vender, no mesmo período, muito mais ouro.

Mas o capitalista comerciante, ainda que não empregue senão um pessoal insignificante, recebe, como veremos, para capitais iguais ao de um industrial, um lucro igual. Se admitirmos que o trabalho dos empregados no comércio é a fonte de lucro comercial, seremos levados a reconhecer nestes empregados a capacidade de produzir uma soma de valor colossal com a qual não se poderia comparar a produção de nenhum operário qualificado. Mas nós não temos nenhuma razão para admitir esta hipótese. Sabemos que somente um trabalho mais complexo, mais qualificado, pode produzir mais valor do que o trabalho médio, porque exige mais gasto antecipado de trabalho (preparação e aprendizagem). O trabalho dos empregados no comércio exige, é verdade, uma certa preparação, uma certa aprendizagem, mas bem menor do que os estudos de professor, de engenheiro ou mesmo de um operário altamente qualificado. Ora, nem o trabalho do professor, nem o do engenheiro, nem em geral o trabalho mais qualificado, pode produzir uma soma de valor tão grande como a que deveria produzir o trabalho dos empregados no comércio se nele se visse a origem do lucro comercial.

Tudo isto nos permite concluir que o trabalho despendido na circulação das mercadorias não pode ser, nem a fonte de valor, nem de mais-valia. Eis-nos, pois, obrigados a procurar uma outra explicação para o lucro comercial.

Resta-nos examinar as outras formas de trabalho que servem ao comércio, transporte, embalagem, marcação e guarda das mercadorias. Estas variadas formas do trabalho não se prendem imediatamente à circulação comercial. Na sociedade comunista, em que a repartição dos produtos se fará sem compra e venda, sem troca de espécie alguma, onde todos os gastos comerciais serão suprimidos, as despesas do trabalho ocasionadas pelo transporte, embalagem, marcação e guarda dos produtos não serão menos necessárias: portanto, estas despesas não são inerentes unicamente à economia mercantil. Estão aí as razões para concluir que o trabalho necessário para estas operações não deve fazer parte das despesas da circulação comercial, mas sim das despesas de produção necessárias á circulação dos produtos.


Inclusão 21/09/2018