Conceitos Fundamentais de O Capital
Manual de Economia Política

I. Lapidus e K. V. Ostrovitianov


Livro sexto: O capital emprestado e o crédito. Moeda e crédito e papel moeda
Capítulo XIII - Moeda de Crédito e Papel Moeda
70. Resumo e conclusões


capa

Resumamos:

1. O papel-moeda é emitido pelo Estado para cobrir as suas despesas. É favorecido pelo curso forçado. Não é geralmente trocado por ouro (embora essa troca se possa fazer se o curso do papel-moeda é firme).

2. O papel-moeda não pode substituir a moeda de valor integral a não ser no processo da circulação, ao passo que o dinheiro, não parando para se transformar em tesouro, passa de mão em mão e constitui somente um índice momentâneo da circulação de mercadorias.

3. Se o valor nominal do papel-moeda em circulação não ultrapassa o valor da circulação expresso em ouro, o poder aquisitivo do papel-moeda coincide com o da moeda-ouro; se, por outro lado, o valor da circulação é inferior ao valor nominal do papel-moeda, o poder aquisitivo deste é na mesma medida, inferior ao do ouro.

Podemos tirar daqui em diante as conclusões seguintes:

1. Seria falso crer que o papel-moeda só circula porque o Estado obriga os cidadãos a recebê-lo. A emissão de um excedente de papel-moeda tem, a despeito da pressão exercida pelo Estado, como consequência, a baixa do poder aquisitivo, As leis econômicas o sobrepõem, assim, em regime capitalista, à vontade do Estado.

2. Seria igualmente erro crer que o papel-moeda pode existir sem relação com a moeda-ouro e que só importam a quantidade de papel-moeda emitida e a quantidade de mercadorias em circulação.

Sem relação (ao menos distante) com a moeda-ouro, não se concebe o papel-moeda, porque ele não pode preencher a sua função de medida do valor. Essa função só pode ser preenchida por uma mercadoria que tenha ela própria valor. O papel-moeda não tem valor próprio: o trabalho necessário para sua produção é praticamente insignificante e não desempenha nenhuma função apreciável na determinação do seu poder aquisitivo. O valor da circulação, que determina o curso do papel-moeda, depende antes de tudo do valor das mercadorias em circulação. E o que caracteriza precisamente o valor é que ele não pode ser expresso diretamente em horas de trabalho, mas deve sê-lo através de uma outra mercadoria. Como seria expresso o valor das mercadorias em circulação se o papel-moeda não tivesse valor próprio? Evidentemente, com a ajuda da moeda-ouro de um valor igual, servindo de medida comum do valor. Quando nós falamos do poder aquisitivo do papel-moeda, é sempre em comparação com o do ouro, e nós dizemos, por exemplo, que ele está ao par do ouro ou abaixo do par. Se não houvesse ouro (ou outra moeda de um valor integral), o padrão que permitisse determinar o valor da circulação e, portanto, o poder aquisitivo do papel-moeda, faria falta.

É essa teoria confirmada pelos fatos?

O papel-moeda tem sempre relação com a moeda-ouro?

Desde o começo da guerra, o papel-moeda não foi mais trocado por ouro em diversos países beligerantes. Mas a sua ligação com a moeda-ouro subsistia, pois que subsistiam francos e rublos ouro, que determinavam o curso dos francos e dos rublos papel. Mas, que pensar dos países que não tinham antes unidade monetária metálica própria e que, desde a sua organização em Estados, só tiveram papel-moeda? É o caso da Polônia que, tornada independente, começou a emitir papel-moeda, marcos inicialmente, zloti depois. É o caso da Lituânia, da Letônia e de diversos outros Estados de formação recente. A sua moeda-papel sofreu, apesar de tudo, a influência direta do ouro: o poder aquisitivo do marco polonês foi determinado de começo pelo curso do marco ouro alemão(1). A moeda letoniana foi estabelecida em relação ao rublo russo. Depois da queda rápida do poder aquisitivo do papel-moeda, em diversos países, e a separação desse papel da moeda-ouro, o curso do papel-moeda foi (e é ainda) determinado em diversos países em relação ao dólar americano.

Esses fatos mostram como o papel-moeda é impotente para substituir por completo o dinheiro de valor integral e que a sua função se reduz à de um meio de circulação. Ele não pode servir de padrão de valor.

3. Resta-nos apresentar uma observação sobre a moeda metálica divisionária de valor incompleto que, à diferença do papel-moeda, possui um valor real, mas inferior ao seu valor nominal. Tais são as moedas de prata, de cobre, de níquel, etc. Sob o antigo regime, na Rússia, o rublo de prata representava apenas 70 copeks de metal e tinha, entretanto, curso ao par do ouro. O valor das moedas de cobre, de bronze e de níquel, é menor ainda comparativamente ao par do ouro.

A circulação dessas diversas moedas metálicas ao par do ouro não tem necessidade de uma explicação especial. Elas substituem temporariamente a moeda de ouro, no processo da circulação, e se o seu poder aquisitivo não é inferior ao do ouro, é que a sua quantidade não ultrapassa o valor da circulação. Se o ultrapassasse, o seu poder aquisitivo desceria até o momento em que se restabelecesse a equivalência entre o valor da circulação e o valor real de metal contido na moeda divisionária. Se o valor da circulação diminuísse, depois, relativamente à massa do dinheiro, as moedas divisionárias de valor incompleto teriam a mesma sorte que a moeda de ouro, quando ela ultrapassa em quantidade as solicitações da circulação; as moedas de prata (ou de cobre, etc.) serviriam para o entesouramento ou seriam transformadas em objetos metálicos, etc.

4. A discriminação entre a moeda de crédito e o papel-moeda merece reter a nossa atenção. A moeda de crédito não é sempre nitidamente delimitada em relação ao papel-moeda, e acontece frequentemente transformar-se ela em papel-moeda; assim, os substitutos do dinheiro que circulavam antes da guerra no Império russo, equiparados à moeda metálica, representavam a moeda de crédito do Banco do Estado, livremente trocada por ouro e emitida na sua maior parte contra descontos de títulos comerciais, isto é, emitida pelo banco em troca de títulos reais de crédito; mas, no começo da guerra, essa moeda de crédito se transformou em papel-moeda(2). Ela cessou de ser conversível em ouro: o banco não a emitiu em troca de títulos comerciais, mas em troca de bônus do tesouro e “nas proporções necessárias ao tempo de guerra”. Os bônus do tesouro não podiam ser considerados como títulos de comércio reais, porque eles não representavam nenhuma circulação real de mercadorias. Assemelhavam-se antes a títulos de favor. Por essa razão, às emissões do Banco do Estado seguiu-se uma baixa rápida do poder aquisitivo do papel-moeda.

continua>>>


Notas de rodapé:

(1) O governo polonês formou-se sob a ocupação alemã, o que explica a influência do marco ouro. (retornar ao texto)

(2) O mesmo aconteceu em vários países beligerantes, notadamente na França. (retornar ao texto)

Inclusão 03/10/2018