Em defesa dos alunos do Instituto Pedagógico

José Carlos Mariátegui

31 de agosto de 1928


Primeira Edição: Publicado em Mundial, Lima, 31 de agosto de 1928

Fonte: Nova Cultura - https://www.novacultura.info/post/2018/09/15/em-defesa-dos-alunos-do-instituto-pedagogico

Tradução: F. Fernandes

Transcrição: Igor Dias

HTML: Fernando Araújo.

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O primeiro ano de vida do Instituto Pedagógico acaba de ser perturbado por um incidente, que seria prematuro declarar resolvido com a execução da medida disciplinar emitida pelas autoridades superiores da Instrução Pública contra seis estudantes daquela escola. Porque o incidente começa, na realidade, com essa medida, se os fatos que a precederem forem considerados com calma.

Estes seis alunos normalistas não são responsáveis, mas escreveram, de acordo com a deliberação de uma assembleia de seus pares, e em termos que nesta assembleia foram acordados, um memorial ao Congresso sobre as deficiências que, na opinião dos estudantes, são evidentes no funcionamento do Instituto Pedagógico.(1) O acerto ou erro dos estudantes em dirigirem-se ao Congresso ao invés de dirigirem-se ao Ministério da área é uma questão que, de minha parte, não pretendo examinar. Entendo que, em matéria administrativa, um pedido ao Congresso deve seguir, na melhor das hipóteses, um caminho mais longo e leniente do que um pedido ao Ministério competente. É possível que os estudantes peticionários tenham julgado que ao recorrerem ao Congresso tenham incluído a consideração de que, sendo um dos pontos do memorial a necessidade de transferir o Instituto Pedagógico para um lugar apropriado – fator que dependia do voto das Câmaras, do regulamento do Orçamento da República –, a solução do problema maior daquele Instituto Superior Normal estava contemplado na petição. Qualquer que seja o julgamento que se pronuncie sobre este procedimento, o que está em questão é a responsabilidade que pode ter sido incorrida, de acordo com o diretor do Instituto e as autoridades de Ensino, aos seis alunos mencionados.

As medidas extremas tomadas para puni-los - cancelamento de suas bolsas e matrículas - não seguiu uma descrição sumária (nos termos legais), como verificado pelo próprio Ministério. Caso contrário, seria sabido que nenhuma sanção, caso fosse procedente, poderia recair exclusivamente sobre os seis estudantes, que, obedecendo a uma deliberação de seus colegas, escreveram o memorial. Não se trata, como a medida adotada parece supor, de instigadores, de promotores de um protesto. Da mesma forma que esses seis alunos foram designados para a tarefa, outros poderiam tê-la realizado. Os pontos do memorial foram determinados na assembleia, bem como a designação da comissão. Em sua composição certamente foi levado em conta os dotes de inteligência e sagacidade de seus membros para interpretar com sucesso o sentimento dos estudantes. O memorial, em suma, foi devidamente reconhecido e aprovado pelos 150 estudantes que o assinaram. Por que a repressão descobre apenas seis culpados? Esta é a pergunta que inquieta os 150 assinantes do memorial.

Contudo, não só foi dispensada qualquer investigação prudente dos fatos, como também, provavelmente, o Ministro da Instrução Pública não foi informado sobre os termos do memorial. Estes não autorizam qualquer punição. Os estudantes se dirigiram ao Congresso com todo respeito e toda cortesia. Não demonstraram qualquer intenção de turbulência, mas sim, o desejo legítimo de que o ensino, a administração e o funcionamento geral do Instituto fossem reformados e melhorados. O critério mais elementar de eficácia e oportunidade se opunha a assumir uma atitude impertinente. Podem estar errados no processo e no método; mas isso seria suficientemente punido com uma reconvenção.

A expulsão coloca repentinamente seis estudantes na rua, todos pobres e moradores de províncias, sem recursos para se sustentar fora do Instituto na capital. Condenara-os a perderem suas carreiras, as quais eles entusiasticamente dedicaram sua juventude e sua inteligência. Um ou dois desses alunos, se não me engano, tiveram que terminar seus estudos este ano.

O incidente, por outro lado, não foi resolvido, como afirmei no início, com a medida extrema adotada. Sem essa medida não haveria transtorno algum para a gestão do Instituto Pedagógico. Os alunos teriam retificado ou abandonado sua organização, aguardando o Dr. Oliveira – que devido ao fato de seu nome estar vinculado à criação deste estabelecimento, com base na antiga Escola Normal, supostamente, deveria interessar-se pelo bom andamento de sua gestão –, devendo informá-lo de seus desejos, ao passo que ele poderia ou não atendê-los tanto quanto lhe parecesse conveniente.

No entanto, frente a uma expulsão tão evidentemente injusta, os estudantes do Instituto Pedagógico têm deveres de solidariedade, além disso, têm deveres de responsabilidade por suas ações, sendo impossível impedi-los de cumpri-las. Se quiserem um conflito cujas derivações ninguém pode prever, não devem alterar a ordem do Instituto Pedagógico, em seu primeiro ano de trabalho a reconsideração da punição deve ser concedida sem demora. A Associação de Normalistas, órgão nacional, sustenta a demanda formulada pelos alunos do Instituto Pedagógico. Os estudantes da Universidade, por sua vez, aguardam ansiosamente a resolução do Ministro da Educação. O caso de Guadalupe – pensam todos – se repete com circunstâncias agravantes. O Dr. Oliveira está enfrentando uma questão de justiça, a qual não deve sobrepor-se nenhuma consideração adjetiva e processual.


Notas de rodapé:

(1) Amauta, em seu nº 17 (setembro de 1928, seção Panorama Móvel), comentou a crise precipitada no Instituto Pedagógico pela expulsão dos seis estudantes, nos seguintes termos:
O DIREITO DE OPINIÃO E DE CRÍTICA DOS ESTUDANTES
“Um memorial criado por estudantes do Instituto Nacional Pedagógica para a Câmara dos Deputados, pedindo um novo local e métodos melhores de administração e ensino, causou a expulsão imediata de seis estudantes do Instituto – Heraclio Garmendia, Esteban Hidalgo S. Francisco Quiroz S., Emilio Barrantes, Emilio Morales, Je­sús Gutiérrez – acusados precipitadamente e sem apelação pelo Ministério da Educação como instigadores da atitude dos alunos que não foi, no entanto, nada desrespeitosa ou turbulenta. Os seis alunos foram nomeados para a redação do memorial, por deliberação de uma assembleia estudantil, na qual os termos deste documento foram acordados. Essa explicação não foi suficiente para obter a reconsideração de uma medida tão extrema. Os esforços dos alunos do Instituto Pedagógico e da Associação Nacional das Normalistas não foram atendidos pelo Ministério, obstinados em seus erros. Apenas com uma revisão da sentença os seis estudantes foram enviados às suas províncias, com a promessa de que no próximo ano os seis serão readmitidos no Instituto.
Nosso companheiro José Carlos Mariátegui já lidou com esse fato na revista Mundial, fato que coincide com a crise na Universidade de Arequipa, agravada e não resolvida com a expulsão de vários alunos, como advertiu o reitor Dr. Escomel. Nós não temos confirmação desta notícia ainda, mas o que aconteceu na Escola Normal é suficiente para denunciar a abordagem reacionária que vem atuando na reforma do ensino superior, reacionária também em seu espírito, apesar de certa aparência de inovação e do golpe desferido na velha oligarquia de San Marcos em seu estado maior". (retornar ao texto)

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Inclusão: 18/08/2022