Carta Aberta ao Sr. Winston Churchill

Dora B. Montefiore

Agosto de 1920


Primeira Edição: Vanguard, agosto de 1920, página 5;

Tradução: Talita Guglak da versão disponível em https://www.marxists.org/archive/montefiore/1920/08/churchill.htm

HTML: Fernando Araújo.

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Ao Muito Honorável Sr. Winston Churchill, Ministro de Guerra.

Sr.,

Ao que me lembro fomos nós, sufragistas militantes, as primeiras a adotarem o adjetivo adequado às suas atividades políticas. No entanto, apesar de algumas de nós então conhecessem você pelo que você é, seus poderes e seu escopo para facínora não eram o que são agora. E, dessa forma, à época, no trabalho sujo geral da política, suas mãos sujas passaram no teste. Mas agora que suas mãos, além de encardidas, são vermelhas com sangue - o sangue de seus compatriotas, mortos às suas ordens, e em consequência de suas intrigas com militaristas continentais. E vermelhas com o sangue de trabalhadores e de pobres judeus, e quem seu amigo e companheiro militarista, Denikin, torturou e matou durante sua pouca hora de triunfo sobre as tropas da Rússia soviética - todos homens e mulheres decentes devem se afastar com ojeriza do homem que você provou ser.

Isso não significa, deixe-me lembrá-lo, que seus parceiros de Coalizão estão isentos do derramamento de sangue, mas na grande guerra europeia, que findou no Armistício de 1918, você poderia ao menos alegar que teve o país atrás de você; e que, portanto, para suas especiais fanfarronices e erros na Antuérpia e em Galípoli você estava assegurado com o mandato do povo.

Mas o cenário mudou após 1918, e a guerra das intrigas políticas tornaram-se a ordem do dia no Ministério de Guerra e no Ministério das Relações Exteriores - de modo que após a Eleição Geral de 1919, quando você (apesar da antipatia pessoal indiscreta do Sr. Lloyd George por você) tornou-o seu Ministro para a Guerra. O palco estava montado para mais uma de suas intrigantes aventuras, e a chance foi dada a você para desferir outro golpe mortal no proletariado, que sua casa de cogumelos de Marlborough sempre desprezou. Porque, enquanto imperialistas aliados estão lutando, durante os meses seguintes após o Armistício, entre eles pelos espólios e óleos da vitória, a Rússia (cujo território se extende para mais da metade do continente da Europa e um terço da Ásia) estava renunciando, silenciosamente, ao imperialismo, estava se despindo da pompa e das vestes da corte e da aristocracia, e estava mudando a partir das raízes toda a base de sua estrutura econômica. Você, com seus instintos hereditários de cortesão e político, imediatamente farejou o perigo de cada forma de imperialismo, e, na sua posição como Ministro de Guerra, se lançou em todas as intrigas duvidosas contra a Rússia soviética.

Não é necessário recapitular a lista de seus amigos derrotados, os almirantes e os generais impulsionados pela opinião pública da Rússia, e para quem você encontrou, nos bolsos dos contribuintes britânicos, munições, uniformes, apetrechos, provisões e dinheiro para pagar os soldados. O contribuinte britânico é um indivíduo tão sonolento e permite ser tão facilmente roubado que você sente que a série de aventuras russas podiam ser facilmente feitas se apenas o público soubesse de vez em quando que nós - o Império Britânico - não estamos em guerra com a Rússia, e estamos apenas fazendo o nosso melhor para retirar de certas posições nossas tropas que estavam em perigo.

Mas, como outros cavalheiros de certa classe, Sr. Winston Churchill, você deixou suas impressões digitais na cena do seu crime, e a polícia internacional dos trabalhadores, que estão vagando pelo mundo tomando notas, te obrigará a mostrar suas mãos. Enquanto isso, se as impressões digitais corresponderem, você também talvez seja obrigado a ler da página 112 à página 129 de “República Russa” do Coronel Malone, em que estão registrados alguns dos crimes horríveis cometidos pelo seu amigo Denikin em Carcóvia, Voronej e outros lugares. Além dos milhares de assassinatos de trabalhadores e intelectuais. Os gritos das mulheres violadas devem ecoar nos seus ouvidos. Talvez você já tenha lido a frase de Clough:

“Não matarás, mas não precisas se esforçar para se manter vivo, de fato”

Dessa forma, você permitiu que as vidas de ambos os lados fossem oferecidas na chance de um de seus amigos militaristas, que você apoiava, ter suceso na queda da República Soviética.

Mas a chance, assim como suas outras pequenas aventuras militares, Sr. Winston Churchill, não vingou! Até Peter, o Pintor, escapou de seu cerco da rua Sydney; então lembre-se de Antuérpia, e se puder imaginar Galípoli…

Enquanto escrevo essas linhas, é trazida a notícia da morte do homem que tentou resistir a você naquela última aventura desastrosa. “Jacky” Fisher foi para o oeste e a história algum dia irá justificá-lo e te julgar.

Os jornais relatam que quando a questão foi levantada na Casa de sua detectada comunicação com Golovin, o enviado militar de Koltchak, você deixou o outro homem responder por você. E você sorriu, sorriu…

Os jornais também relataram que quando você fez seu discurso um ou dois dias depois na questão de Amritsar, você concordou com a decisão do Conselho do Exército que o General Dyer deveria ser aposentado com metade do salário; e você completou que “o tiroteio britânico não precisava ser apoiado por atos como o de Amritsar”. Isso, Sr., é uma mentira. Todos os imperialistas são apoiados por baionetas e derramamento de sangue. Indianos, kafirs, zulus e egipcíos todos, na memória de homens e mulheres vivos, foram massacrados para que o imperialismo britânico pudesse se espalhar e se consolidar.

Sr., você pode sorrir hoje, você pode mentir leviana e oratoricamente, mas a escrita está na parede, e você, como o amigo inglês no poder de Koltchak e companhia terá de ir.

Atenciosamente, sem me arrepender de sua queda,
DORA B. MONTEFIORE


Inclusão: 09/08/2022