A questão da mulher de novo?

Lucy Parsons

3 de outubro de 1905


Primeira Edição: Chicago, The Liberator, 3 de outubro de 1905

Fonte: https://medium.com/@roxoenegro/a-quest%C3%A3o-da-mulher-de-novo-bb9cd325663f

Tradução: Roxo e Negro Publicações

HTML: Fernando Araújo.


Kewanee, Illinois, 2 de outubro. Aconteceu hoje o funeral das vítimas da tragédia na casa dos Markham, no sábado, na qual oito vidas foram tiradas pelo ato insano da mãe. Apenas dois caixões foram usados, um para a senhora Markham e outro para os filhos que ela matou, cujos corpos carbonizados foram retirados das cinzas da casa.

Quem pode saber quanta dor reprimida o breve telegrama acima contém? Aqui estava uma jovem mulher de trinta e cinco anos que havia dado à luz sete crianças, a mais velha de 11 anos, a mais nova de quatro meses. Não houve “suicídio em massa” naquela casa. O pai, fomos informados, era um pobre agricultor no verão e fazia bicos no inverno para sobreviver. O pai, ao saber do ato terrível, cometeu suicídio na hora! Então a família inteira, de oito pessoas, se foi. Os primeiros relatos nos informam que a senhora Markham havia se tornado deprimida pelos cuidados com a família e a solidão da vida na fazenda.

Quantas senhoras Markham existem na América hoje? Isso daria estatísticas interessantes, se fosse possível coletá-las. Quantas dessas crianças teriam nascido, se os desejos da mãe tivessem sido consultados e respeitados todas as vezes, é outra pergunta muito interessante. Ousamos dizer que não as sete, já que se fossem todas crianças bem-vindas, o coração da mãe jamais teria se tornado tão anti-natural ao ponto de levantar a mão contra suas vidas.

Pobre Mary Markham carregadora dos fardos, atingida pela pobreza, cuidadora exaurida, excessivas vezes gestante, você se foi! E você levou suas tristezas e seus pequenos com você ao Grande Desconhecido, mas você foi uma vítima da nossa falsa sociedade que torna um crime transmitir o conhecimento que teria transformado sua vida jovem na alegria de uma mãe, com poucas e saudáveis crianças que lhe afagassem; mas ao invés disso você viu, dia após dia, o fardo sem remédio da pobreza e do desespero. Ou talvez nossa irmã esgotada pelos esforços de cuidar tenha sido uma das que foram ensinadas: “Esposas, submetam-se a seus maridos e aos desejos dele o tempo todo”.

Vamos nos alegrar por essa espécie de mulher estar se tornando mais rara a cada dia. Vamos confiar que em breve ela estará extinta; e então teremos menos crianças, que serão melhor instruídas, e teremos menos escravos para nossos senhores nas fábricas.

Mulher Sai de Casa por “Negócios”

Aqui temos um tipo de mulher muito diferente da senhora Markham. Viajar como vendedora para um fornecedor de mercados era uma posição mais ao gosto da senhora Kate Fitzgibbon Hamblin do que atuar como esposa e mãe, de acordo com o pedido de divórcio preenchido ontem por Eugene L. Hamblin, presidente da Hamblin Printing Company na rua Dearbon. O reclamante declara que sua esposa o deixou e deixou seus dois filhos, de 7 e 5 anos, para assumir um trabalho na Sprague, Warner & Co., dizendo que ela “preferia ser uma mulher de negócios bem-sucedida do que uma boa dona de casa.” O senhor Hamblin diz que ainda está disposto a aceitá-la de volta.

Provavelmente a senhora Hamblin nunca pretendeu sufocar sua individualidade quando se casou; vendo que era impossível não fazer isso e permanecer com seu marido, ela simplesmente o deixou. Claro que ela não abandonou seus filhos. Que mãe que de fato abandona seus filhos? As crianças serão melhor criadas e cuidadas com a mãe e o pai separados, já que eles não conseguem concordar, do que se fossem levadas para o meio de um conflito eterno entre seus pais. Presumimos que a senhora Hamblin é uma mulher muito estimada, já que o fato é que “o senhor Hamblin diz que ainda está disposto a aceitá-la de volta.”

A “nova mulher” fez sua estréia como um ser humano independente no palco das atividades da vida e ela sente sua importância; ela se sente muito diferente de suas irmãs grudadas-nos-homens de gerações passadas, que imaginavam que não podiam sequer se mover sem a assistência de um homem.

Quanto antes os homens aprenderem a fazer de suas esposas companheiras e iguais ao invés de subordinadas, mais rápido o casamento será uma relação de harmonia.

Chicago, The Liberator, 3 de outubro de 1905


Inclusão: 09/03/2021