As Democracias Populares da Europa Oriental

Eugene Reale

1947


Primeira edição: ....
Fonte: Problemas Revista Mensal de Cultura Política, nº. 4, novembro 1947.
Transcrição e HTML: Fernando A. S. Araújo.
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Eugene Reale
Membro do CC do
Partido Comunista Italiano

Poderemos admitir que uma nova constituição dos povos, um novo regime social, seja um dos resultados da última guerra? Estaremos, hoje, ante uma nova concepção de Estado, ante uma forma nova de democracia? No conflito entre o regime capitalista e o regime socialista do mundo contemporâneo pode, até certo ponto, apresentar-se uma terceira forma, que não tenha o caráter peculiar nem de um nem de outro, mas represente historicamente uma expressão própria, uma solução particular, um fato bem diferenciado e individualizado?

A essas perguntas, que muitos escritores e figuras políticas tem apresentado e que interessa a camadas cada vez mais amplas de estudiosos, devemos responder que uma tal eventualidade não é apenas possível, mas diremos quase natural, desde que se tenha a consciência da inelutabilidade do desenvolvimento histórico; não apenas possível mas lógico, desde que se tenha a compreensão do conceito de progresso, para o qual nada se pode fossilizar em fórmulas fixas e imutáveis.

Depois da primeira guerra mundial, a revolução dos operários e camponeses na Rússia representou a rutura violenta com o velho mundo capitalista, e o regime comunista significou exatamente o contrário do regime burgues. Dada a tese, colocava-se a sua antítese: desenvolvida até o último grau a crise da sociedade capitalista, concretizava-se o fim de seu superamento — o bolchevismo.

A revolução bolchevique foi a grande conquista dos tempos modernos, no sentido em que significou a libertação definitiva do trabalho em relação ao capital e a sua organização por si mesmo e de modo autônomo. Assim como a revolução francesa tinha realizada a liquidação do mundo feudal, a revolução bolchevique realizava a liquidação da sociedade capitalista.

O grande processo histórico que teve início em 1917, com a Revolução soviética, está longe de ter-se encerrado e o seu desenvolvimento foge, por isso, a uma análise definitiva.

Ao contrário, aquele processo histórico que teve início em 1789, com a Revolução Francesa concluiu seu ciclo e oferece suficiente perspectiva para uma análise completa.

Também ali foi aberta uma voragem no seio da velha sociedade europeia, uma nova, radical e temerária afirmação ideológica, que libertou o homem das peias dos privilégios feudais e ofereceu um novo conceito do cidadão, em contraposição às velhas fórmulas de uma sociedade erguida sobre a desigualdade e os privilégios.

Também ali, se desenvolveu num processo ininterrupto de guerras para a afirmação desses princípios, numa série alternada de progressos e retrocessos, de revoluções e reações internas, de aventuras ditatoriais e de empresas contrarrevolucionárias por parte da Europa coligada.

Como a União Soviética de hoje, a França exportava, então, com as bandeiras do Diretório e com as águias napoleônicas, um princípio novo que seria o germe de toda a história futura.

Quando aqueles capítulos se encerraram, quando o déspota corso terminou a sua parte, o quadro que se apresentou — vencido ou vencedor que ele tinha sido — foi de todo novo: a estrutura social da Europa estava completamente transformada.

Realizou-se, através do grande contraste entre o princípio do absolutismo e o princípio revolucionário, uma terceira forma de regime dos povos que não tem o caráter peculiar de um ou de outros desses extremos, mas é e quer ser uma expressão histórica própria.

A França havia afirmado os princípios imortais dos direitos do homem e a Europa embora os tendo combatido, e combatendo-os, acabou por assimilá-los. "A Grécia mesmo derrotada triunfou sobre seus ferozes vencedores".

Era natural que esse processo fosse mais evidente, sobretudo nas zonas de maior atrito e desgaste, naqueles países onde mais violenta se desenvolveu a luta, onde mais viva se manifestou a contenda.

Nos países colocados nos limites da nação iniciadora e irradiadora, na Itália e na Alemanha, o processo de reação-assimilação foi mais imediato e veloz, abrindo caminho a novas combinações políticas e a novas formas ideológicas que, revividas nas grandes revoluções de 1848, tornaram-se irresistíveis afirmações populares.

Hoje, graças ao impulso que havia animado aquela primeira orientação, o princípio democrático triunfante é uma conquista definitiva, reconhecida em todo o mundo. O processo se renova atualmente nos países colocados nas proximidades da nova grande nação iniciadora e irradiadora — a URSS.

A nova Europa, que nasce das ruínas da segunda guerra mundial mostra, nos países onde foi maior o atrito entre as duas formas opostas de organização social, os sinais já visíveis e individualizados de uma profunda transformação de estrutura política e econômica.

Nasce uma nova forma constitucional, uma nova organização do Estado, que já superou as velhas formas de organização capitalista, mas que não é, pelo menos na acepção estrita da palavra, uma verdadeira e exata organização socialista ou comunista da sociedade.

Na Polônia, Checoslováquia, Iugoslávia, Bulgária e em geral em toda a Europa centro e sul-oriental está se processando uma experiencia nova: estes países assumem agora a sua grande função mediadora entre a civilização de tipo nitidamente capitalista e a civilização de tipo soviético.

Esses países se erguiam sobre uma estrutura semi-feudal e, por vezes, realmente semibárbara, incapazes de resistir às pressões externas, porque estavam internamente desunidos, arruinados, carcomidos, apodrecidos.

Às fronteiras da nação socialmente mais evoluída do mundo se extendia ainda, antes da última guerra uma grande faixa de países atrasados, fundados sobre uma economia anacrônica e mantidos nessas condições para constituir um cinturão de segurança, uma barreira contra a União Soviética.

Sociedades como essas, nas quais dominava a grande propriedade latifundiária de origem feudal, rebeldes a todo o progresso, surdas a qualquer voz de renovação, não podiam ser senão sociedades em dissolução.

Em cada um desses países, com efeito, uma cadeia de interes- ses oprimia o povo e toda a nação estava subjugada por essa cadeia.

Daí o equilíbrio instável sobre o qual se erguiam os próprios agrupamentos nacionais; uma vez arrebentada aquela cadeia, todas as relações sociais estariam convulsionadas.

O Exemplo da Polônia e seus Vizinhos

Pensemos, por exemplo, na Polônia de antes de 1939.

O latifundiário polaco, tipo social bem próximo do junker prussiano, era o verdadeiro senhor do Estado e toda a organização política do país só existia em função da defesa de seus privilégios. Nesses setores, onde não penetrava a influencia direta do grande proprietário polaco, intervinham dois de seus naturais aliados, o clero católico atrasado, ávido e reacionário, e o grande capital financeiro estrangeiro.

O regime de Pilsudski, inicialmente, e o de seus sucessores, depois, não foi senão a expressão dessa coalizão.

A odiosa política de opressão das minorias, o antissemitismo, o fanatismo nacionalista e, naturalmente, o caráter antissoviético de todas as iniciativas diplomáticas do governo, estavam a serviço dessa mesma coalizão.

Pensemos na Albânia do rei Zogú, completamente submetida a Mussolini, mesmo antes da ocupação armada fascista; pensemos na Iugoslávia de Stojadinovich, de Alexandre e do Príncipe Paulo. Ali os antagonismos étnicos eram artificiosamente exasperados até o fanatismo em benefício de uma restrita classe dirigente da monarquia de grandes proprietários sérvios, que apoiavam a monarquia e, por sua vez, obtinham a força e a autoridade.

Também ali, a monarquia era completamente dependente, no plano internacional, das grandes potencias ocidentais (França, Grã-Bretanha e por alguns momentos, Itália e Alemanha), que, através da organização monárquica, controlavam a vida econômica e política da nação.

Faltava, em suma, em cada um desses países, uma verdadeira unidade popular e um governo que fosse a expressão da vontade do povo.

Eram regimes camuflados com os ouropéis da falsa democracia, por vezes abertamente ditatoriais, fascistas, ou filo-fascistas.

A igreja católica na Polônia, a igreja ortodoxa na Iugoslávia, participavam desse sistema de interesses, e, especialmente sobre as camadas rurais e as camadas mais atrasadas do proletariado urbano, desenvolviam sua ação narcotizante da vontade e das aspirações das grandes massas populares.

A natural aliança entre operários e camponeses, base fundamental da unidade popular, era assim dificultada e mesmo virtualmente impedida.

As consequências desse sistema são bem conhecidas. Ao primeiro choque dos grandes interesses em oposição a velha estrutura se esboroou. Habituados a enganar o próprio povo com fórmulas vazias, com vãs declarações nacionalistas, com a ostentação de uma força insubsistente, os governos fascistas e filo-fascistas da Europa centro e sul-oriental foram varridos em poucos dias por um inimigo aguerrido, que conhecia bem a falta de preparação política e militar daquelas nações.

Após inútil derramamento de sangue (quem não se recorda da carga de cavalaria polaca contra as divisões couraçadas alemãs nas planícies abertas do Vístula?) os povos tiveram que sofrer todos os horrores da ocupação nazista, todas as consequências extremas da criminosa política de suas velhas classes dirigentes.

Dois Fatos Novos

Mas através da guerra dois fatos novos se concretizaram:

  1. — Foi afinal destruída aquela rede de interesses e de cumplicidades que envilecia aqueles povos.
  2. — Apresentou-se afinal a oportunidade de realizar, através da resistência à opressão hitlerista e da luta contra os colaboracionistas, aquela guerra verdadeiramente nacional, na qual as grandes massas populares conquistaram consciência de sua própria força e de seus interesses próprios.

Sobre esses dois fatos históricos, de fundamental importância, se firmaram as bases dessa nova forma de regime político que se chama democracia popular.

E, de fato, um novo mundo nasce das ruínas da segunda guerra mundial.

Ali, onde se quebraram as ondas mais terríveis da tempestade; ali, onde se combateu a guerra mais sanguinolenta; ali, onde o exército hitlerista se encontrou com os exércitos soviéticos e se despedaçou; ali se realiza hoje aquela nova forma política que provavelmente está destinada a ter, durante muito tempo, uma profunda repercussão sobre a história europeia.

Um problema fundamental se apresentou a esses povos após a libertação: seria possível voltar aos regimes de falsa democracia parlamentar com os quais essas nações se tinham governado, com os insucessos que eram de todos conhecidos e sentidos antes do segundo conflito mundial?

Os regimes que haviam surgido após a primeira guerra mundial e que representavam o verdadeiro cordão sanitário com o qual as potencias ocidentais pretendiam assediar a União Soviética, não podiam ser restaurados, nem correspondiam de nenhuma maneira aos interesses daquelas populações.

De outro lado, a própria guerra, com seus longos anos de luta contra o invasor nazista, em vez de refrear tinha despertado o sentimento nacional, a consciência da individualidade dos povos.

Todo o povo tem necessidade de uma forma constitucional própria, que corresponde às suas exigências específicas, que se adapte às suas condições particulares e, dessa maneira, não era possível adotar uma organização social nascida em diferente clima histórico, imposta em meio àquela comoção social que foi a Revolução de Outubro, amadurecida e elaborada através de um longo e profundo processo revolucionário.

A democracia popular, como nova concepção do Estado, como novo sistema político de nosso tempo, nasce da falencia das velhas castas dirigentes e da velha estrutura reacionária, do espírito das guerrilhas, da experiencia da luta contra o opressor hitleriano e o colaboracionismo interno, do reforçamento da consciência nacional das populações.

E, como vemos, uma solução que nasce concretamente da própria natureza dos acontecimentos, das novas exigências provocadas pelas transformações sociais que a guerra operou.

Duas Definições sobre as Novas Democracias

Na sua ordem do dia, aos exércitos soviéticos, a 1.° de Maio de 1946, Stalin declarava:

"O enfraquecimento e a liquidação das principais forças do fascismo e da opressão mundial, conduziram a profundas transformações na vida política dos povos do mundo, a um notável desenvolvimento do movimento democrático dos povos. Amadurecidas pela experiencia da guerra, as massas populares compreenderam que não se pode confiar o destino do Estado a dirigentes reacionários, que apenas procuram atingir objetivos estreitos de egoismo de classe, em contraste com os interesses do povo. Precisamente por isso, os povos que não querem viver nas condições que tinham vivido até então, tomam os destinos de seus Estados nas próprias mãos, edificam uma ordem democrática- e dirigem uma luta ativa contra as forças da reação, contra os incendiários de uma nova guerra."

E Molotov, em seu discurso pronunciado por ocasião da celebração do 28.° aniversário da Revolução de Outubro, declarou:

"Em uma série de países europeus realizaram-se reformas sociais de grande vulto, com a liquidação dos restos do poderio territorial e feudal e a transferência da posse da terra aos camponeses não proprietários, o que liquidou a capacidade de resistência de que dispunham anteriormente as forças reacionárias fascistas e estimulou o renascimento do movimento democrático e socialista nesses mesmos países."

A "Democracia Popular" é uma forma de regime político no qual o povo exerce, não apenas em aparência, mas na realidade e numa ampla medida, o poder governamental e administrativo. A eliminação da instituição monárquica é uma das primeiras realizações dessa nova democracia. Eliminado esse centro, em torno do qual se aglomeravam todos os restos de um sistema baseado na desigualdade econômica, as novas repúblicas populares puderam romper a unidade das forças reacionárias. Completado o confisco ou expropriação das grandes propriedades territoriais, divididos os latifúndios entre os camponeses necessitados de terra, liquidadas as uniões monopolistas do capital, nacionalizadas as grandes indústrias e os bancos, postos sob a direção estatal os transportes ainda sob o controle das grandes empresas privadas, as novas repúblicas populares puderam deixar intacta, sem perigo, a propriedade privada, média e pequena, puderam fazer subsistir todas as outras formas de economia capitalista.

Não se pode, assim, falar de economia socialista ou sovietizada, mas sim de uma economia de fundamentos sociais, de uma economia profundamente democrática, de um programa de saneamento e de renovação nacional, como é compreendida em muitos países capitalistas e, também, por partidos não socialistas, programa tanto mais indispensável e urgente naquela zona europeia, quanto mais ela tinha ficado para trás no caminho do progresso, devido aos obstáculos opostos pelos velhos regimes reacionários.

Liberdade dos Indivíduos e dos Grupos

Originada na luta pela libertação, a democracia popular tutela a liberdade dos indivíduos e dos grupos, como o maior dos bens, como conquista própria de sua formação histórica e à qual não seria possível renunciar sem desnaturar-se, como premissa indispensável a todo o progresso ulterior. A liberdade de consciência é o principio regulador das relações entre o Estado e as várias confissões nacionais. Na Polônia e em muitos outros países, as propriedades pertencentes às comunidades religiosas, embora muito grandes, ficaram isentas de confisco ou expropriação. Segundo as regras de toda a sã e viril concepção de liberdade, a liberdade da Igreja tem seus justos limites no livre exercício da religião.

O estado leigo, zeloso de suas atribuições, intervém contra toda tentativa de intromissão da Igreja no campo estritamente político.

Da mesma forma que durante a guerra de guerrilhas, aqueles padres que foram encontrados de armas na mão contra o povo, haviam sido tratados, da mesma maneira que todos os outros colaboracionistas, segundo as leis de guerra, assim hoje aquela parte do clero que colaborou com o opressor nazista e pretendia continuar a servir-se de seus meios espirituais para sabotar a obra do governo, foi colocada em condições de não causar dano. Mas, felizmente, a maior parte do clero colocou-se ao lado do povo na luta contra o invasor e, hoje, completamente livre no exercício de sua atividade religiosa, observa lealmente seus deveres para com o Estado.

São estes critérios, reguladores das relações entre o Estado e a Igreja, critérios de legislação Socialista?

Não é necessária uma longa argumentação para demonstrar que estas normas não cabem no âmbito das reformas especificamente socialista, mas são antes conquistas de direito constitucional moderno, comuns a todos os Estados democratas e, por isso, pertencem tanto à democracia socialista como à clássica democracia liberal, tendo sido por esta última codificadas, não só na conhecida fórmula cavouriana, como naquele livro valioso de Montalembert, "A Igreja livre no Estado livre".

A política religiosa que hoje vem se desenvolvendo nas novas repúblicas populares da Europa centro e sul-oriental é, antes, sob certos aspectos, ainda menos avançada e radical do que a política religiosa desenvolvida em relação à Igreja Nacional do Estado Frances, durante a grande Revolução e logo após.

Na Polônia, por exemplo, um milhão de hectares de bens eclesiásticos ficaram isentos do confisco ou expropriação, enquanto que na França, durante a Revolução de 89, junto aos bens dos emigrados foram confiscados as propriedades religiosas. Na Itália, sob o governo da Direita, foi promulgada a lei sobre o eixo Eclesiástico: e no entanto o Estado de Saboia não era na verdade nenhum Estado Socialista...

Na nova forma constitucional das democracias populares, o poder executivo é emanação direta do povo.

Isto quer dizer que os novos Estados surgidos desta guerra na Europa centro e sul-oriental, não são organizações políticas no velho sentido burgues, isto é, uma democracia formal e parlamentar na qual o povo elege as câmaras e estas se limitam a discutir e a promulgar as leis, enquanto o poder executivo, dependente na realidade unicamente da camarilha das forças reacionárias no poder, as aplica a seu talante e conveniência.

Nenhuma Separação de Poderes

Nas Repúblicas Populares não há nenhuma separação entre poder legislativo e poder executivo; o povo participa diretamente da administração do Estado e da cousa pública, através dos representantes por ele eleitos e ante ele diretamente responsáveis. A burocracia parasitária, dependente unicamente do poder constituído, surda às necessidades e aspiração do povo, foi eliminada.

Toda a vida econômica, a vida artística, a vida cultural, existem em função e a serviço do povo.

Os comites populares na Iugoslávia, os Comites nacionais na Checoslováquia, os comitês da frente patriótica da Bulgária, os comitês de Libertação Nacional na Albânia, representam todas as categorias de trabalhadores, operários e camponeses artesãos, técnicos e intelectuais, exercem o controle direto e garantem a execução da vontade popular. Um novo despertar político e econômico é o grande fato novo que se realiza nesta radical transformação do conceito de Estado e das relações sociais.

O governo não é mais, para as massas populares, qualquer cousa de estranho e de outros interesses, mas o seu próprio governo, o governo da maioria, a expressão do próprio povo. As velhas classes dominantes desaparecem, os obstáculos são removidos, a vida política é aberta à participação dos melhores, na livre ascensão dos valores humanos. Um marco no caminho dos povos foi atingido.

Parece evidente, mesmo ao mais superficial observador, que esta profunda transformação que se realizou e continua a realizar-se, não é somente uma pura e simples restauração dos princípios democráticos nos países onde a influencia fascista, ou a macaqueação filo-fascista, os haviam desnaturado.

Os princípios democráticos, tomados na habitual acepção burguesa da palavra, não seriam suficientes para explicar a profunda renovação que esta guerra, tão nitidamente influenciada por motivos ideológicos novos, havia operado naquela zona europeia.

A transformação verificada no países colocados nas proximidades das fronteiras do grande Estado Socialista e libertados pelo exército vermelho, leva em si o germe da maior das revoluções dos tempos modernos, compreendida como nova concepção das relações sociais, e daí surgirem formas que também podem ser transitórias como liquidação teórica das concepções burguesas e como a defesa permanente de algumas determinadas conquistas da humanidade.

Trata-se agora de um tipo especial que já superou a era da burguesia como concepção e como modo de viver. Trata-se de uma forma especial de democracia, que se desenvolve das premissas gerais do socialismo.

O Socialismo na Etapa Atual

O Socialismo é, na atual etapa, o positivo do processo histórico.

Através da crítica socialista do sistema burgues, dissolveu-se aquele aglomerado de formas sociais do capitalismo, que a Revolução Francesa havia deixado.

Não se trata, pois, de restauração de princípios democráticos burgueses, mas de afirmação de princípios democráticos socialistas.

A nova corrente, que irrompe na história contemporânea, não é mais a Revolução de 89, é a Revolução de nosso século, a Revolução socialista.

Indubitavelmente, esta guerra operou uma transformação geral, a que não se subtraiu nenhuma das nações que dela tenha participado.

O Estado Socialista, que num processo de ordenação revolucionária tinha durante três decenios elaborado e superado algumas das suas manifestações originárias, pôde ulteriormente aperfeiçoar a sua forma política. A União Soviética, que deu ao Ocidente a contribuição de suas energias frescas e novas, e que com essa contribuição pôde salvá-lo do retorno à barbárie medieval, abriu-se nesse mesmo tempo, cada vez mais, ao Ocidente, assimilando aquilo que a civilização do ocidente havia independentemente conquistado nesses anos, no campo da ciência e do progresso humanos.

Por sua parte, mesmo as grandes nações capitalistas não podem subtrair-se à atração das grandes conquistas sociais da União Soviética.

A História, de resto, é toda baseada sobre essa troca de força e de valores, sobre essa perpétua relação do deve e haver, somente no qual e através do qual a humanidade pode avançar.

Um mundo em decomposição, uma artificiosa barreira criada pela reação desapareceu para sempre no fluxo desta guerra.

As novas democracias populares representam como que uma ponte lançada entre duas épocas: a época capitalista e a época socialista.

É portanto uma grande experiencia de renovação social, destinada a ter uma repercussão profundíssima na história do mundo.

Uma experiencia fundada sobre a libertação, sobre o trabalho, sobre a justiça social: eis o que se está realizando por trás daquilo que Mister Churchill, chamou de "cortina de ferro".


Inclusão 18/03/2015