Prova de força

Francisco Martins Rodrigues

15 de Abril de 1981


Primeira Edição: Em Marcha, 15 de Abril de 1981

Fonte: Francisco Martins Rodrigues Escritos de uma vida

Transcrição: Ana Barradas

HTML: Fernando Araújo.

Direitos de Reprodução: licenciado sob uma Licença Creative Commons.


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Vocês viram a graça e o desembaraço com que o Eusébio Marques de Carvalho, o Abílio dos Transportes e o Basílio da ex-ANP vieram à televisão dizer-nos na cara que o Governo não negoceia com os sindicatos da Função Pública, que os trabalhadores não trabalham, que é preciso acabar com a mediocridade e pagar maiores ordenadões às chefias e que as greves se inserem numa estratégia de subversão apontada para o 1° de Maio?

O falecido Marcelo Caetano não diria melhor. Não há razões de descontentamento. Não há carestia galopante. Não há privilégios insultuosos. O que há são manejos de agitadores profissionais e trabalhadores imbecis que se deixam levar.

Esta linguagem insolente faz já parte da prova de força em que o Governo se meteu. E o Balsemão, que saiu do Porto com as orelhas a arder, tantas foram as vaias que ouviu dos manifestantes, já foi garantira Paris: o Governo não cede nem muda de rumo.

Esta prova de força tem alguma coisa a ver, decerto, com o novo empréstimo de 28 milhões de contos prometido pela banca internacional, "em condições bastante favoráveis" (como sempre, aliás. Não se percebe porque é que estamos cada vez mais afogados em dívidas). O cacau vem mas precisa de garantias.

Essas garantias, quais são?

Antes do Outono, vamos ter novos aumentos dos combustíveis, da electricidade, dos transportes, do pão e do resto. Assim, os salários, que são os mais baixos da Europa, mais baixos mesmo que os da Grécia, baixarão ainda mais, criando perspectivas "interessantes" para os investigadores.

Isto desde que o Governo aguente com mão dura os protestos dos trabalhadores. Por isso, o Balsemão tem que mostrar o que vale. Para a frente é que é caminho!

Os matreiros do CDS, que andavam a espingardar contra a "moleza" do Governo, agora aparecem escandalizados a dizer que é preciso respeitar os direitos dos trabalhadores. Não vai tardar uma semana já estarão aí a protestar outra vez que o Governo é frouxo! A Roseta e o Cavaco preparam uma manifestação pró-Governo que traz muita água no bico. Não se admirem se for uma rasteira ao Balsemão.

Estão todos ao desafio a ver quem é melhor para meter os trabalhadores na ordem. Pois se querem uma prova de força vamos a ela!


Inclusão 22/08/2019