A Medalha

Francisco Martins Rodrigues

9 de Junho de 1981


Primeira Edição: Em Marcha, 9 de Junho de 1981

Fonte: Francisco Martins Rodrigues — Escritos de uma vida

Transcrição: Ana Barradas

HTML: Fernando Araújo.

Direitos de Reprodução: Licença Creative Commons licenciado sob uma Licença Creative Commons.


capa

"Não aceitaremos qualquer condecoração das mãos de Eanes no 10 de Junho", vieram declarar, cheios de dignidade, os familiares de Sá Carneiro. O mote fora-lhes dado dias antes pelo prof. Freitas.

O que eles queriam era a Ordem da Liberdade, pelo 25 de Abril. Mas Eanes pôs os pés à parede: “Tudo tem os seus limites, que diabo! O Sá e o Amaro na mesma lista em que está o Humberto Delgado, até cai no ridículo”. E não lha deu.

O Freitas foi logo espingardar com o Balsemão: "O Eanes antes quer condecorar os comunas do que os nossos mártires da liberdade. Se você não for um banana, tem que tomar uma atitude".

Aí ficou o Balsemão encostado à parede! Para tentar descalçar a bota, e julgando-se muito esperto, propôs os dois "mártires" mais o Freitas para a condecoração do 10 de Junho.

O Eanes, encantado por poder assim amaciar a fera, fez logo saber que teria muito gosto. E o Freitas, é claro, com aquela velha ronha dos profs. de Direito de Coimbra, deixou a proposta seguir. Já tinha a sua fisgada.

Agora, à última hora, vem, majestoso e vingador, dar a bofetada no Eanes e no Balsemão: "Não queremos essa condecoração. Não nos serve".

O incidente reles está bem à medida da nossa política. Mas mostra alguma coisa. É que, se Eanes fez, como de costume, figura de vítima inocente da direita, se Balsemão fez, como também é hábito, figura de parvo — o prof. Freitas, tortuoso, rancoroso, cínico, ridículo, deu mais um passo em direcção ao controle do governo.

Quanto mais se afirma como o reaccionário puro, obstinado, sem escrúpulos, mais sobe a sua cotação nos meios do alto negócio. É um homem assim que lhes convém, capaz de submeter à bruta os operários, a Reforma Agrária, as liberdades.

A ascensão de Freitas do Amaral é um aviso sobre os projectos secretos da grande burguesia. Pensar que esse assalto poderá ser detido à sombra de Eanes, Soares ou Balsemão é uma estupidez. Porque eles acabam sempre por ceder às pressões e chantagens da extrema-direita, receosos de perder os favores do grande capital. Será que cinco anos não chegam para lição?


Observação: Tiro ao Alvo - Coluna de FMR no jornal Em Marcha

Inclusão 02/12/2018