Viva o Mal Menor!

Francisco Martins Rodrigues

9 de Fevereiro de 1983


Primeira Edição: Em Marcha, 9 de Fevereiro de 1983

Fonte: Francisco Martins Rodrigues — Escritos de uma vida

Transcrição: Ana Barradas

HTML: Fernando Araújo.

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O Comité Central do PCP vê no estrebuchar da AD e na convocação de eleições “acontecimentos capitais” que representam “grandes vitórias do povo e da democracia e estrondosas derrotas da contra-revolução”. Atrás deste marcial rufar de tambores, deixa-se passar o OGE da fome, “para não atrasar as eleições”, assina-se o pacto social na Setenave e já o MDP/CDE aparece a propor um governo “democrático” alargado ao PSD. Esperem pelo resto.

Sempre assim foi. A melhor maneira de disfarçar uma capitulação é apresentá-la como vitória. A cobardia máxima exige o máximo descaramento.

A “estrondosa derrota da contra-revolução” é uma mistificação. A primeira experiência de um bloco de direita fracassou, é certo, em grande medida pela própria inépcia dos seus chefes. Mas a política de direita não foi derrotada. Tem a sua lógica no FMI, na CEE, na NATO, no 25 de Novembro, na burguesia. A política de direita vai prosseguir, agora pela mão de qualquer governo PS/PSD. É como nas corridas de estafetas. O corredor esfalfado passa o testemunho ao seguinte. A corrida continua.

Porque, desenganem-se, não há milagres. Viragens politícas reais à esquerda sem pancadaria nunca se viram. A dura verdade é que os chefes do PCP precisam de jogar tudo neste simulacro de viragem para tentar convencer os trabalhadores de que a oposição “responsável e constitucional” sai mais barata e resulta na mesma. E para viabilizar este “passo em frente”, estão dispostos a baixar-se mais ainda. Está à vista.

Mas um governo PS ou PS/PSD não será apesar de tudo um mal menor? Toda a gente percebe que quem está posto diante de dois perigos a que não pode fugir, terá que se entregar ao mal menor para escapar ao mal maior. Dar a bolsa para salvar a vida. É uma questão de bom-senso.

Mas será que só existem esses dois males à escolha? Aí é que entra o contrabando. Quando se tempera a resistência nas águas mornas, quando se proíbe a agitação pela greve geral, quando se forçam os operários a ajoelhar — o que é isto senão fechar deliberadamente a via de saídas, contra o mal maior e contra o mal menor?

A opção do PCP pelo mal menor tem um nome, em palavras cruas: é fazer o frete à burguesia liberal, ajudá-la a desactivar os conflitos sociais. Para o PCP, o mal maior, verdadeiramente, é só um: a viragem real à esquerda, a contra-ofensiva operária e popular. O fantasma da revolução.


Observação: Tiro ao Alvo - Coluna de FMR no jornal Em Marcha e no jornal Política Operária.

Inclusão 06/02/2018