PSR Abandona Coligação “Por Lisboa”

Francisco Martins Rodrigues

Novembro/Dezembro de 1996


Primeira Edição: Política Operária nº 57, Nov-Dez 1996

Fonte: Francisco Martins Rodrigues - Escritos de uma vida

Transcrição: Ana Barradas

HTML: Fernando A. S. Araújo.

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Este tardio rebate anti-eleitoralista anuncia um rumo mais político do partido – ou ainda mais despolitizado?

Não se pode dizer que o X congresso do PSR, que decorreu em 1-3 de Novembro em Lisboa sob o lema “Na construção de uma alternativa”, tenha trazido novas perspectivas à área da esquerda – o que, aliás, seria difícil, no clima de recessão das lutas sociais que atravessamos. Mas algo de novo trouxe, sem dúvida.

Mudança evidente foi a presença de grande número de delegados jovens e a eleição dum bom número deles para a nova direcção (onde passam a ocupar cerca de metade dos lugares), a par do quase completo eclipse dos elementos “históricos” da velha LCI e sobretudo do abandono definitivo por Francisco Louçã do cargo de “porta-voz” do partido (na realidade, de sua cabeça política e ideológica), para se consagrar a uma carreira académica.

Irá este rejuvenescimento do partido (já patente no Acampamento internacional da juventude, de fins de Junho, em Amarante) provocar um maior radicalismo de posições? É o que parece, à primeira vista, ao saber-se que no centro dos debates do congresso esteve a proposta, finalmente aprovada após acesa polémica, para o abandono da coligação “Por Lisboa” nas eleições do próximo ano. Segundo Alfredo Frade, elemento influente da nova direcção e deputado municipal eleito por aquela lista, o apoio à coligação PS-PC já não se justifica visto não haver perigo de uma vitória da direita em Lisboa e tendo em conta, além disso, o desgaste político a que o partido estaria exposto caso continuasse ligado à gestão municipal no período que se aproxima, marcado pelos festejos faraónicos da Expo98. É possível também que o PS, hoje em situação mais confortável, tenha endurecido excessivamente as condições para uma eventual participação do PSR na coligação.

Seja como for, seria caso para nos felicitarmos com este tardio rebate anti-eleitoralista se ele não se integrasse num palpável distanciamento de tudo o que respeita à luta política. Como assume Louçã, em entrevista ao semanário Já, face ao recuo do movimento operário e dos movimentos sociais e estudantis, “a partir da metade dos anos 80, o nosso esforço foi o de mudar substancialmente o perfil da organização, no sentido de procurar o centro de gravidade na intervenção com outras pessoas”. Este frentismo orientara os temas que de momento se revelam mais rentáveis junto de uma certa faixa juvenil  (citem-se as batalhas em torno do ambiente, das drogas, da homossexualidade…), resultou no abandono da luta política directa, de que é espelho (lamentável) o esvaziamento político do Combate.

É certo que o processo de despolitização do partido não é ainda completo. Os documentos do congresso continuam a assumir com mérito algumas posições políticas radicais, como a saída de Portugal da NATO, o referendo sobre a moeda única, a retirada das tropas da Bósnia, a denúncia da escalada do controlo policial e do racismo, o direito ao aborto livre e gratuito. Mas fica a dúvida sobre a eficácia destas reivindicações formais quando se sabe que a actividade real do PSR se cinge às questões mais sensíveis à sua base social: reforma do ensino, drogas (o congresso reafirmou a exigência da legalização total), homossexualidade, serviço militar, ambiente… Ao modernizar-se de modo a adequar a sua vocação de bloco animador da juventude contestatária às novas condições dos anos 90, o PSR acentua a sua deslocação para a área do centro (no meio de campanhas altamente irreverentes, estamos certos). Será a esquerda a perder.

Representantes da Política Operária assistiram a convite à sessão de encerramento do congresso.


Inclusão 10/06/2018