Privatize-se tudo!

José Saramago

1996


Primeira Edição: em “Cadernos de Lanzarote – Diário III”. Lisboa: Editorial Caminho, 1996.

Fonte: https://www.revistaprosaversoearte.com/

Transcrição e HTML: Fernando Araújo.


Me parece-me bem.

Privatize-se Machu Picchu, privatize-se Chan Chan,
privatize-se a Capela Sistina,
privatize-se o Pártenon,
privatize-se o Nuno Gonçalves,
privatize-se a Catedral de Chartres,
privatize-se o Descimento da Cruz,
de Antonio da Crestalcore,
privatize-se o Pórtico da Glória
de Santiago de Compostela,
privatize-se a Cordilheira dos Andes,
privatize-se tudo, privatize-se o mar e o céu,
privatize-se a água e o ar, privatize-se a justiça e a lei,
privatize-se a nuvem que passa,
privatize-se o sonho, sobretudo se for diurno
e de olhos abertos.

E, finalmente, para florão e remate de tanto privatizar,
privatizem-se os Estados, entregue-se por uma vez
a exploração deles a empresas privadas,
mediante concurso internacional.
Aí se encontra a salvação do mundo…

E, já agora, privatize-se também
a puta que os pariu a todos.


Inclusão 11/07/2019