Relatório a V. I. Lênin

J. V. Stálin

19 de Janeiro de 1919


Primeira Edição: em 1942, na "Lêniski Sbórnik" (Coletânea de Lênin), XXXIV.
Fonte: J.V. Stálin – Obras – 4º vol., Editorial Vitória, 1954 – traduzida da edição italiana da Obras Completas de Stálin publicada pela Edizioni Rinascita, Roma, 1949.
Tradução: Editorial Vitória
Transcrição: Partido Comunista Revolucionário
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Fernando A. S. Araújo, setembro 2006.
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Ao camarada Lênin.

Recebemos seu telegrama cifrado. Já lhe referimos os motivos da catástrofe, apurados como resultado do inquérito[N54]: o exército, formado por destacamentos cansados, destituído de reservas e de um comando firme, ameaçado de flanqueamento e, além disso, sob a ameaça de ser envolvido pelo norte, não podia manter-se, desde que submetido a uma séria pressão das forças frescas e superiores do inimigo. A nosso ver, não está em causa apenas a fraqueza dos órgãos do III exército e da retaguarda imediata, mas também:

1.°) — O Estado-Maior central e os comandos militares distritais, que arregimentam e enviam para a frente destacamentos notoriamente inseguros;

2.°) — o Bureau, dos Comissários de Toda a Rússia, que destina aos destacamentos, que se formam na retaguarda, não comissários, mas rapazolas;

3.°) — o Conselho Militar Revolucionário da República, que com as suas chamadas diretivas e as suas ordens desorganiza o comando da frente e do exército. Se os órgãos militares centrais não forem devidamente modificados, não haverá garantia de êxitos nas frentes.

Nossa resposta quanto aos assuntos militares.

1.°) — Os dois regimentos. Renderam-se dois regimentos: o 1.° soviético e o dos marinheiros de Petrogrado. Não praticaram atos hostis a nós. Praticou-os, entretanto, o 10.° Regimento de Cavalaria da 10.a Divisão, estacionado na aldeia de Ilinski e constituído pelo comando militar distrital dos Uruais. Ademais, foi desarticulado o motim do 10.° Regimento de Engenharia, transferido para a fábrica Otchersk e constituído, também, pelo comando militar distrital. O motivo da passagem para o inimigo e desses atos hostis é o espírito contra-revolucionário dos regimentos, devido aos velhos métodos de mobilização e de arregimentação sem a depuração preventiva dos recrutas e à falta de um trabalho político, por mínimo que seja, nos regimentos.

2.°) — Motovilikha. Os maquinismos da fábrica e o equipamento da seção elétrica foram em tempo inventariados desmontados e carregados em vagões, mas não foram transportados, nem destruídos. A responsabilidade recai sobre o Colégio Central[N55], sobre o comandante das comunicações militares sobre o Conselho Militar Revolucionário do exército, que deram prova de uma inaudita imperícia. Cinco sextos dos operários da Motovilikha ficaram em Perm, onde permaneceu também todo o pessoal técnico da fábrica com a matéria-prima. Segundo todos os dados, a fábrica pode iniciar o trabalho dentro de um mês e meio. Os rumores em torno da revolta dos operários da Motovilikha às vésperas da queda de Perm não são confirmados; houve apenas uma acentuada fermentação por motivo da desordem no aprovisionamento.

3.°) — A destruição da ponte e das instalações importantes. A ponte e o resto não foram pelos ares devido à incapacidade do Conselho Militar Revolucionário do exército e à falta de ligação entre as unidades em retirada e o Estado-Maior do exército. Segundo uma versão, o camarada encarregado de fazer a ponte voar, não pôde realizar sua tarefa, por ter sido morto pelos guardas brancos poucos minutos antes de se dar a explosão. A veracidade dessa versão até agora ainda não pôde ser confirmada, em vista da fuga do piquete de guarda na ponte e da partida "para destino ignorado" de um considerável número de funcionários "soviéticos".

4.°) — As reservas de Perm. A reserva era constituída de um "regimento soviético" débil e inseguro, que, na primeira ofensiva, na frente, passou para o lado de inimigo. Não havia outras reservas.

5.°) — Perdas de materiais e de homens. Por ora não é possível apresentar um quadro completo das perdas, porque muitos documentos extraviaram-se e diversos especialistas "soviéticos" que se ocupavam do assunto passaram-se para o inimigo.

Segundo os dados escassos existentes, perdemos: 297 locomotivas (das quais 86 em mau estado), cerca de 3.000 vagões (provavelmente ainda mais), 900.000 puds de querosene e de gasolina, algumas centenas de milhares de puds de soda cáustica, dois milhões de puds de sal, 5 milhões de rublos em medicamentos, depósitos de materiais de grande valor na oficina da Motovilikha e nas oficinas ferroviárias de Perm, maquinismos e equipamentos da oficina da Motovilikha, máquinas das embarcações da flotilha do Kama, 65 vagões de couros, 150 vagões de víveres da seção de aprovisionamento do exército, um enorme depósito da administração regional dos transportes fluviais, no qual havia fardos de algodão, tecidos, óleos, etc., 10 vagões com soldados feridos, o parque de material rodante das estradas de ferro com grande provisão de rodeiros americanos, 29 canhões, 10.000 projéteis de artilharia, 2.000 fuzis, oito milhões de cartuchos, e, no período de 22 a 29 de dezembro, mais de 8.000 homens entre mortos, feridos e desaparecidos. Ficaram em Perm todos os especialistas ferroviários e quase todos os especialistas de abastecimentos. O balanço das perdas continua.

6.°) — Os atuais efetivos numéricos do exército. O terceiro exército atualmente está formado de duas divisões (a 29ª e a 30ª) com 14.000 infantes, 3.000 cavalarianos, 323 metralhadoras, 78 canhões. As reservas são constituídas de uma brigada da 7.ª divisão enviada da Rússia, que ainda não foi utilizada devido à sua pouca segurança e à necessidade de se fazer nela uma cuidadosa depuração. Os três regimentos prometidos por Vatsétis ainda não chegaram (e não chegarão, pois ontem, ao que parece, receberam nova ordem, a de se dirigirem para Narva)[N56]. As unidades em operações encontram-se fatigadas, esgotadas, mantendo-se em linha de combate com dificuldade.

7.°) — Métodos de comando no III exército. Aparentemente, o método de comando no exército é o habitual, "segundo o regulamento"; na realidade, falta-lhe qualquer método, encontra-se numa completa desorganização, não há ligação com as zonas de operação, as divisões são de fato autônomas.

8.°) — São suficientes as medidas tomadas para conter a retirada? Dentre as medidas tomadas, podem ser consideradas medidas sérias: 1.°) — o deslocamento do II exército na direção de Kungur, que sem dúvida trará um grande apoio ao III exército, e 2.°) — o envio à frente, graças aos esforços de Stálin e de Dzerjinski, de 900 soldados repousados, de toda a confiança, com a tarefa de pôr fim à situação de desmoralização do III exército. Dentro de dois dias, enviaremos à frente dois esquadrões de cavalaria e o 62.° Regimento da 3.ª Brigada (já selecionado). Dentro de dez dias, seguirá para a frente mais um regimento. As tropas do III exército que sustentam a frente foram informadas a respeito e percebem que na retaguarda há interesse por sua situação, e seu moral se reergue. Não há dúvida de que a situação atual é melhor que a de duas semanas atrás. Em alguns pontos, o exército passa diretamente ao ataque, sem vacilações, e não sem êxito. Se o inimigo ainda nos conceder duas semanas de folga, isto é, se não fizer afluirem à frente novas forças descansadas, pode-se esperar que no setor do III exército a situação se tornará estável.

Agora estamos liquidando a tentativa de envolvimento pelo norte, feita por algumas unidades inimigas que ameaçam Viatka, ao longo da auto-estrada que passa por Káigorod. Viemos a Viatka, além do mais, para enviar a Káigorod um destacamento de esquiadores, o que faremos. No que se refere a outras medidas (para o fortalecimento da retaguarda), mobilizaremos os militantes, quer simples quer qualificados, mandaremos esses homens para as unidades do exército na retaguarda, depuraremos os Soviets de Deputados de Glázov e de Viatka. Mas, para que esse trabalho dê seus resultados, necessitamos, naturalmente, de tempo.

São todas essas as providências tomadas. De modo nenhum podem ser consideradas suficientes, pois os esgotados destacamentos do III exército não podem resistir por muito tempo se não forem ao menos parcialmente substituídos. É, portanto, necessário enviar para aqui pelo menos dois regimentos. Só assim poderá ser garantida a solidez da frente. Além disso, é necessário:

1.°) —mudar o comando do exército;

2.°)—enviar três dirigentes políticos capazes;

3.°) — dissolver o mais depressa possível o comitê e o soviet regionais, etc., a fim de acelerar a mobilização dos funcionários evacuados.

Stálin e Dzerjinski.
Viatka, 19 de janeiro de 1919.

P. S. — Dentro de alguns dias, voltaremos a Glázov para levar a cabo o inquérito.


Notas de fim de tomo:

[N54] Em 13 de janeiro de 1919, Stálin e Dzerjinski enviaram a Lênin e ao C.C. do Partido um Breve relatório preliminar, no qual eram expostos os resultados do inquérito sobre as causas da catástrofe de Perm, e eram comunicadas as medidas projetadas para restabelecer favoravelmente a situação no setor do III exército e para permitir que este passasse à ofensiva. Em 14 de janeiro, Lênin respondeu ao relatório com o seguinte telegrama:
“Glázov ou localidade em que se encontram Stálin e Dzerjinski.
Recebi e li o primeiro despacho cifrado. Peço-vos encarecidamente dirigir em pessoa no local a execução das medidas projetadas, porque de outro modo não existem garantias de êxito — Lênin" (retornar ao texto)

[N55] Colégio Central era o órgão local comissão nacional para a evacuação. (retornar ao texto)

[N56] Trata-se dos regimentos que o comandante-chefe devia enviar ao III exército a pedido de Stálin e de Dzerjinski. O relatório ao Conselho Militar Revolucionário da República era acompanhado de uma nota de Lênin: "... Em minha opinião é o cúmulo da vergonha que Vatsétis tenha enviado três regimentos a Narva. Anulai ess ordem!" (vide Lêninski sbórnik [Coletânea de Lênin], XXXIV, pág. 90). (retornar ao texto)

pcr
Inclusão 17/02/2008