Sobre a Eliminação das Concepções Erradas no Seio do Partido(1)

Mao Tsetung

Dezembro de 1929


Primeira Edição: Este texto é uma resolução redigida pelo camarada Mao Tsetung para o IX Congresso da Organização do Partido no IV Corpo do Exército Vermelho.
Tradução: A presente tradução está conforme à nova edição das Obras Escolhidas de Mao Tsetung, Tomo I (Edições do Povo, Pequim, Julho de 1952). Nas notas introduziram-se alterações, para atender as necessidades de edição em línguas estrangeiras.
Fonte: Obras Escolhidas de Mao Tsetung, Pequim, 1975, pág: 165-186
Transcrição e HTML: Fernando A. S. Araújo

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No seio da organização do Partido no IV Corpo do Exército Vermelho existem todas as espécies de concepções não-proletárias. Isso estorva consideravelmente a aplicação da linha justa do Partido. Se não se eliminam definitivamente tais concepções, o IV Corpo de Exército será seguramente incapaz de cumprir as tarefas que lhe cabem na grande luta revolucionária da China. Como é claro, essas concepções erradas no seio da organização do Partido no IV Corpo de Exército têm por origem o facto de a base dessa organização do Partido compor-se, em grande maioria, de camponeses e outros elementos pequeno-burgueses. Todavia, o facto de os órgãos dirigentes do Partido não terem dado um combate resoluto e unânime a tais concepções, nem terem educado suficientemente os membros do Partido no espírito da linha justa do Partido, constituiu igualmente uma das razões importantes da sua existência e desenvolvimento. Procedendo conforme ao espírito da carta de Setembro do Comité Central, o Congresso indicou as manifestações e a origem das diversas concepções não-proletárias no seio da organização do Partido no IV Corpo de Exército, bem como os meios de eliminá-las, e chamou os camaradas à luta para a sua liquidação total.

O Ponto de Vista Puramente Militar

O ponto de vista puramente militar está muito difundido entre uma parte dos camaradas do Exército Vermelho. Esse ponto de vista manifesta-se do modo seguinte:

1. Vêem-se como opostos o militar e o político e não se quer reconhecer que o militar constitui apenas um meio para a realização das tarefas políticas. Alguns chegam mesmo ao ponto de dizer que "se as coisas vão bem no plano militar, necessariamente vão bem no plano político, e que se vão mal no plano militar, não podem ir bem no plano político", o que é ir ainda mais longe, dando aos assuntos militares uma posição de comando sobre a política.

2. Pensa-se que as tarefas do Exército Vermelho como as do exército branco, consistem simplesmente em combater. Não se compreende que o Exercito Vermelho chinês seja um corpo armado destinado a cumprir as tarefas políticas da revolução. Especialmente no momento actual, o Exército Vermelho não deve, de maneira alguma, limitar-se apenas a combater; além de combater para destruir o poder militar do inimigo, deve ainda assumir tarefas importantes como a de fazer propaganda no seio das massas, organizá-las, armá-las, ajudá-las a instaurar o poder político revolucionário e, inclusivamente, criar organizações do Partido Comunista. O Exército Vermelho não combate só por combater, mas sim para fazer propaganda entre as massas, organizá-las, armá-las e ajudá-las a instaurar o poder político revolucionário. Sem esses objectivos, o combate perde o seu sentido e o Exército Vermelho deixa de ter razão de existir.

3. Em consequência, no domínio da organização, subordinam-se os órgãos que asseguram o trabalho político no Exército Vermelho aos órgãos militares e avança-se a palavra de ordem de "extensão da autoridade do comando à actividade exterior ao exército". Se semelhantes ideias se desenvolvem, corre-se o risco de ficar-se desligado das massas, de se deixar o exército controlar os órgãos do poder, de afastar-se da direcção proletária e, dessa maneira, escorregar-se na direcção daquele militarismo que caracteriza o exército do Kuomintang.

4. Ao mesmo tempo, em propaganda, despreza-se a importância das equipas de agitação. No domínio da organização das massas, descuram-se os comités de soldados no exército e a organização das massas operárias e camponesas nas diversas localidades, o que redunda numa paralisação do trabalho de agitação e organização.

5. Suficiência após as vitórias, abatimento após as derrotas.

6. Egoísmo de grupo: em todas as circunstâncias, não se preocupar senão com o IV Corpo de Exército; não compreender que uma das tarefas importantes do Exército Vermelho é o armamento das massas nas diversas localidades. No fundo, é ainda o mesmo espírito fraccionário, simplesmente numa maior escala.

7. O pensar, por parte dum pequeno número de camaradas que se fecham no quadro estreito do IV Corpo de Exército, que fora deste não existem de modo algum outras forças revolucionárias. Daí essa tendência extremamente pronunciada para conservar as suas forças e evitar as acções militares. Isso é uma sobrevivência do oportunismo.

8. A recusa em ter em conta as condições subjectivas e objectivas, a impaciência revolucionária, a recusa em entregar-se a um trabalho rude, imperceptível e minucioso no seio das massas, a tendência a sonhar unicamente com grandes feitos, a propensão para entregar-se a ilusões. Tudo isso são sobrevivências do putchismo(2).

A origem desse ponto de vista puramente militar é:

1. Um nível político baixo. Daí a incompreensão do papel da direcção política no exército, a incompreensão da diferença radical que existe entre o Exército Vermelho e o exército branco.

2. A mentalidade de mercenário. Em resultado da incorporação no Exército Vermelho, após várias batalhas, dum grande número de prisioneiros que trouxeram essa mentalidade profundamente arraigada consigo, criaram-se nas unidades inferiores condições favoráveis ao nascimento dum ponto de vista puramente militar.

3. Dessas duas razões decorre a terceira — fé exagerada nas forças militares e falta de confiança na força das massas populares.

4. A falta duma atenção concentrada no trabalho militar e a ausência duma discussão activa desse trabalho no Partido estão igualmente na origem do ponto de vista puramente militar que existe em alguns dos nossos camaradas.

Os meios para eliminar esses defeitos são os seguintes:

1. Elevar o nível político dos membros do Partido através do trabalho de educação, destruir os fundamentos teóricos do ponto de vista puramente militar e pôr claramente em evidência a diferença radical que existe entre o Exército Vermelho e o exército branco. Convém igualmente liquidar, ao mesmo tempo, as sobrevivências do oportunismo e do putchismo, e acabar com o egoísmo de grupo no IV Corpo de Exército.

2. Reforçar a instrução política dos oficiais e dos soldados, em particular, a educação dos ex-prisioneiros que se encontram nas fileiras do Exército Vermelho. Além disso, fazer tudo para que os órgãos locais do poder escolham elementos operários e camponeses com experiência de combate e os canalizem para o Exército Vermelho, o que, no domínio da organização, enfraquecerá ou até extirpará completamente as raízes do ponto de vista puramente militar.

3. Chamar as organizações locais do Partido para a crítica das organizações do Partido no Exército Vermelho e levar os órgãos do poder popular a criticarem o Exército Vermelho, a fim de influenciar, dessa maneira, as organizações do Partido no Exército Vermelho, assim como os oficiais e soldados.

4. O Partido deve prestar uma atenção incessante ao trabalho militar, e discuti-lo com muito cuidado. Cada tarefa deve ser discutida e decidida pela organização do Partido antes da respectiva realização pelas massas.

5. Elaborar, para o Exército Vermelho, leis e regulamentos que definam claramente as tarefas, as ligações mútuas entre os órgãos militares e políticos, as relações entre o Exército Vermelho e as massas populares, a competência dos comités de soldados e, enfim, as suas relações com os órgãos militares e políticos.

O Ultra-Democratismo

Depois que o IV Corpo de Exército recebeu as directivas do Comité Central, as manifestações de ultra-democratismo passaram a ser muito menos frequentes. Foi assim que, por exemplo, se tornou mais fácil a aplicação das decisões do Partido. Já não se elevam vozes para fazer propostas erradas, como seja, a realização no Exército Vermelho daquilo a que se chama "o centralismo democrático que vai da base ao topo", ou "a discussão prévia das questões nos escalões inferiores e decisões em seguida pelos escalões superiores". Na realidade, porém, esse enfraquecimento do ultra-democratismo foi provisório e superficial. Ele não significa, de modo algum, que tal estado de espírito tenha sido completamente eliminado. Dito doutra maneira, o ultra-democratismo ainda está profundamente enraizado no espírito de numerosos camaradas. A prova está, por exemplo, na pouca vontade que se verifica na execução das decisões do Partido.

A maneira de eliminar esse estado de espírito é a seguinte:

1. No campo da teoria, é necessário arrancar as raízes do ultra-democratismo. Primeiro, há que assinalar que o perigo do ultra-democratismo está em prejudicar e mesmo destruir completamente a organização do Partido, em enfraquecer e mesmo minar inteiramente a capacidade combativa do Partido, tornando-o incapaz de cumprir as suas tarefas de luta e arrastando, por consequência, a derrota da revolução. Por último, há também que assinalar que a origem do ultra-democratismo está na aversão individualista da pequena burguesia pela disciplina. Essa aversão, uma vez introduzida no Partido, traduz-se em ideias ultra-democráticas nos planos político e de organização, ideias absolutamente incompatíveis com as tarefas de luta do proletariado.

2. No plano orgânico, é necessário assegurar uma democracia sob direcção centralizada. Isso deve fazer-se conformemente às linhas seguintes:

1) Os órgãos dirigentes do Partido devem definir uma linha directriz correcta e encontrar soluções para os problemas que surgem, de modo a erigirem-se em autênticos centros de direcção.

2) Os órgãos superiores devem conhecer bem a situação existente nos órgãos inferiores, assim como a vida das massas, de modo a disporem duma base objectiva para dirigir correctamente.

3) Seja em que escalão for, nenhum órgão do Partido deve resolver levianamente os problemas. Uma vez que se tome uma decisão, ela deve ser firmemente aplicada.

4) Todas as decisões de certa importância tomadas pelos órgãos superiores do Partido devem ser prontamente transmitidas aos órgãos inferiores, bem como à massa dos membros do Partido. Os meios para chegar a isso consistem em convocar reuniões de activistas ou, quando as circunstâncias o permitam, assembleias gerais dos membros do Partido das células ou das colunas(3)1nota tradutor) assim como em enviar gente para que aí apresente relatórios.

5) Os órgãos inferiores e a massa dos membros do Partido devem discutir em detalhe as directivas dos órgãos superiores, de maneira a compreenderem completamente o respectivo significado e decidirem sobre os métodos a seguir na sua execução.

As Concepções Contrárias aos Princípios de Organização do Partido

As concepções contrárias aos princípios de organização do Partido, que existem na organização do Partido no IV Corpo de Exército, manifestam-se como segue:

A) A minoria recusa submeter-se à maioria. Assim, por exemplo, logo que uma proposta da minoria é repelida, os seus defensores não aplicam com fidelidade a decisão da organização do Partido. Os meios para remediar isso são os seguintes:

1. Fazer de modo que todos os participantes a uma reunião tenham inteira possibilidade de expressar as suas opiniões. Fazer uma clara distinção entre a verdade e o erro no exame das questões litigiosas, não admitindo compromissos nem negligências. Se a questão não fica resolvida, convém examiná-la uma segunda vez (se isso não estorva o trabalho), a fim de chegar-se a uma conclusão precisa.

2. Uma das exigências da disciplina do Partido é a submissão da minoria à maioria. Uma vez que o seu ponto de vista seja rejeitado, a minoria deve apoiar a decisão adoptada pela maioria. A não ser em casos de necessidade, em que ela poderá trazer de novo o problema para consideração em reunião posterior, a minoria não deve, de modo algum, agir contrariamente à decisão já adoptada.

B) A crítica sem respeito pelos princípios de organização.

1. A crítica no interior do Partido é uma arma que serve para fortalecer a organização do Partido e elevar a sua capacidade de combate. Contudo, nas organizações do Partido no seio do Exército Vermelho, a crítica não apresenta sempre esse carácter, transformando-se por vezes em ataques pessoais. Disso não só resulta um prejuízo para os indivíduos como também para a própria organização do Partido. É uma manifestação do individualismo pequeno-burguês. O método de correcção consiste em ajudar os membros do Partido a compreender que o objectivo da crítica é elevar a capacidade de combate do Partido de modo a alcançar-se a vitória na luta de classes, não devendo esta ser utilizada como um meio para ataques pessoais.

2. Muitos dos membros do Partido fazem críticas não no interior do Partido mas no exterior. Isso explica-se pelo facto de os membros do Partido, em geral, não compreenderem ainda a importância da organização do Partido (reuniões, etc.) e imaginarem que a crítica fora da organização em nada difere da realizada no interior. Os meios para remediar isso consistem em educar os membros do Partido, a fim de que compreendam a importância da organização deste, sendo nas reuniões do Partido que devem, em caso de necessidade, criticar os comités do Partido ou os camaradas em particular.

O Igualitarismo Absoluto

Num certo período, o igualitarismo absoluto registrou um sério desenvolvimento no Exército Vermelho. Assim, por exemplo, quando se distribui o dinheiro para os gastos pessoais dos soldados feridos, alguns exigem que não se faça diferença alguma entre feridos graves e feridos ligeiros e que se entregue a todos a mesma quantia. Se um oficial vai a cavalo, alguns não se dão conta de que isso é necessário para o cumprimento da sua função e não vêem aí mais do que uma marca de desigualdade. Quando se distribuem os abastecimentos, exigem partes rigorosamente iguais, e não aceitam que se possa, em condições particulares, receber uma parte maior. Quando se transporta o arroz, querem que todos levem a .mesma carga, as crianças como os adultos, os fracos como os fortes. Nos aquartelamentos, pedem que se atribua a todos um mesmo espaço e, se o Quartel General dispõe dum pouco mais de espaço, chovem os insultos. No serviço, exigem que cada um tenha rigorosamente o mesmo volume de trabalho, e se alguém tem um pouco mais que fazer, ei-lo que se recusa a cumprir as tarefas. Acontece até que, quando não há mais do que uma maca para dois feridos, prefere-se não transportar ferido algum, a ter de transportar-se um só deles. Tudo isso mostra como são sérias as tendências ao igualitarismo absoluto entre os oficiais e os soldados do Exército Vermelho.

O igualitarismo absoluto tem a mesma origem que o ultra-democratismo em política, é um produto da economia artesanal e da pequena exploração camponesa. A única diferença está no facto de um se manifestar no domínio político e o outro, no da vida material.

Meios para eliminar essas tendências: é preciso mostrar que, antes da abolição do capitalismo, a igualdade absoluta não é mais do que uma ilusão dos camponeses e dos pequenos proprietários, e que, mesmo sob o socialismo, a chamada igualdade absoluta não pode existir de modo algum, pois a repartição dos bens materiais há-de fazer-se segundo o princípio: "de cada um segundo as suas capacidades e a cada um segundo o seu trabalho", e conformemente às necessidades do trabalho. No essencial, os bens materiais devem ser repartidos duma maneira igual entre os homens do Exército Vermelho, por exemplo, no que respeita ao soldo dos oficiais e soldados, pois a situação actual da nossa luta assim o exige. Contudo, o igualitarismo absoluto, que não considera razões, quaisquer que sejam elas, deve ser combatido, pois não responde às necessidades da luta mas, pelo contrário, estorva-a.

O Subjectivismo

Alguns membros do Partido estão fortemente imbuídos de subjectivismo, o que é muito prejudicial quando se trata de analisar a situação política e dirigir o trabalho. Uma análise subjectivista da situação política e uma direcção subjectivista no trabalho desembocam necessariamente no oportunismo ou no putchismo. As críticas subjectivistas no Partido, os propósitos inconsiderados e não fundados, bem como a suspeição mútua, resultaram frequentemente em querelas sem princípios e minaram as organizações do Partido.

Um outro ponto que se deve mencionar em ligação com a crítica no interior do Partido é o de certos camaradas que, ao fazerem as suas críticas, descuram as questões principais e confinam a sua atenção em pontos de menor importância. Eles não compreendem que a tarefa principal da crítica é expor os erros políticos e de organização. Com respeito às falhas pessoais, desde que não estejam relacionadas com erros políticos ou de organização, não se torna necessário criticá-las demasiadamente, pois, de contrário, os camaradas em causa ficarão perdidos, sem saber o que fazer. Além disso, se uma tal crítica se desenvolve, a atenção dos membros do Partido passa a concentrar-se exclusivamente em faltas menores, toda a gente se intimida, torna-se cautelosa em excesso e esquece as tarefas políticas do Partido. Isso constitui um grande perigo.

Meios para eliminar esses defeitos: O essencial é educar os membros do Partido de tal maneira que as suas concepções e toda a vida interior do Partido tomem uma orientação política e científica. Para isso é preciso:

1) ensinar os membros do Partido a fazerem análises da situação política e a apreciarem as forças das classes segundo o método marxista-leninista, em vez de procederem a análises e a apreciações subjectivistas;

2) atrair a atenção dos membros do Partido para as investigações e estudos económicos e sociais, com vistas à determinação da táctica da luta e dos métodos de trabalho; fazer compreender aos camaradas que, sem uma investigação sobre a situação real, eles embrenham-se no abismo das imaginações vãs e da aventura;

3) na crítica dentro do Partido há que saber guardar-se do subjectivismo, da arbitrariedade e da banalização da crítica; todas as afirmações devem basear-se em factos e a crítica deve ter um sentido político.

O Individualismo

As tendências individualistas nas organizações do Partido do Exército Vermelho manifestam-se da maneira seguinte:

1. Espírito de vingança. Um membro do Partido que, dentro deste tenha sido criticado por um soldado, seu camarada, procura vingar-se dele fora do Partido. As ofensas corporais, os insultos, eis o modo de realizar tais vinganças. E igualmente se procura a vingança no seio do Partido: tu criticaste-me na última reunião, na próxima, eu encarregar-me-ei de encontrar um pretexto para vingar-me. Um tal espírito provém puramente de considerações pessoais. Ele desconhece os interesses de classe e os interesses do conjunto do Partido. Ele não é dirigido contra as classes inimigas mas sim contra as pessoas que estão nas nossas próprias fileiras. Como um corrosivo, ele enfraquece a organização e a sua capacidade de luta.

2. O espírito de grupo. Preocupar-se apenas com os interesses do seu grupinho e não prestar atenção ao interesse geral. Se bem que na aparência não vise interesses pessoais, na realidade trata-se dum individualismo dos mais estreitos. O espírito de grupo exerce igualmente uma possante acção dissolvente e desagregadora. O espírito de grupo esteve sempre em voga no Exército Vermelho; graças à crítica, a situação melhorou um pouco, mas existem ainda sobrevivências desse espírito, convindo por isso fazer novos esforços para vencê-las.

3. A mentalidade de mercenário. Alguns indivíduos não compreendem que o Partido e o Exército Vermelho são instrumentos necessários ao cumprimento das tarefas da revolução e que cada um deles representa um elemento dessas colectividades. Não compreendem que eles próprios são uma força motriz da revolução; imaginam que apenas são responsáveis diante dos seus superiores e não, diante da revolução. Esse espírito passivo, mercenário, relativamente à revolução constitui, igualmente, uma manifestação de individualismo. A existência dum tal estado de espírito explica o facto de não dispormos suficientemente de elementos activos que dêem, sem reservas, todas as suas forças à revolução. Se não liquidarmos essa mentalidade mercenária, não poderá aumentar o número de elementos activos, e as pesadas responsabilidades da revolução cairão sobre os ombros dum pequeno número de camaradas, o que terá uma influência extremamente desfavorável sobre o curso da nossa luta.

4. O gosto dos prazeres. No Exército Vermelho, não são poucos aqueles em quem o individualismo se manifesta pelo gosto dos prazeres. Eles pretendem sempre que as nossas tropas marchem para as grandes cidades, não para o trabalho mas sim para os prazeres. O que mais lhes desagrada é trabalhar nas regiões vermelhas, onde as condições de vida são difíceis.

5. A passividade e a inactividade. Alguns, assim que as coisas não vão como querem, tornam-se passivos e recusam-se a trabalhar. A razão essencial consiste na insuficiência do trabalho educativo; contudo, acontece por vezes que isso é devido ao facto de os dirigentes agirem de maneira inadequada quanto à solução dada a diversas questões, à divisão do trabalho ou ao emprego de medidas disciplinares.

6. O desejo de abandonar o exército. Cada dia se vê engrossar o número dos que pedem para retirar-se do Exército Vermelho e para que lhes sejam atribuídas tarefas civis numa localidade qualquer. Isso nem sempre é devido a razões de carácter pessoal. Isso explica-se igualmente pelo facto de: a) serem muito difíceis as condições materiais de existência do Exército Vermelho; b) sentirem-se fatigados após os longos anos de combate; c) alguns dirigentes actuarem de modo inadequado quanto à solução dada a diversas questões, à divisão do trabalho ou ao emprego de medidas disciplinares.

Meios para corrigir esses defeitos: convém, em primeiro lugar, reforçar o trabalho de educação, a fim de vencer o individualismo no plano ideológico. É preciso, além disso, encontrar soluções correctas para todas as questões, para a divisão do trabalho e para o emprego das medidas disciplinares. Convém, ademais, tomar medidas adequadas para melhorar as condições materiais de existência do Exército Vermelho e utilizar todas as oportunidades que se apresentem para permitir às tropas o repouso e a reorganização, a fim de melhorarem as suas condições materiais. No nosso trabalho de educação, devemos fazer sobressair claramente que, com respeito às suas origens sociais, o individualismo é o reflexo da ideologia pequeno-burguesa e burguesa no seio do Partido.

A Mentalidade de Bando Rebelde Errante

Em resultado da presença dum grande número de vagabundos nas filas do Exército Vermelho e, além disso, da existência duma massa enorme de elementos do mesmo tipo no país, em particular nas províncias meridionais, surgiu no Exército Vermelho uma mentalidade de bando rebelde errante, no plano político. Essa mentalidade manifesta-se:

1. pela tendência a estender a nossa influência política, não graças a um rude trabalho de criação de bases de apoio e estabelecimento do poder das massas populares, mas unicamente através de acções volantes de guerrilhas;

2. pela tendência a aumentar os efectivos do Exército Vermelho, não multiplicando o número dos destacamentos locais da Guarda Vermelha e das unidades locais do Exército Vermelho, para engrossar finalmente as forças principais do Exército Vermelho, mas sim "recrutando homens e comprando cavalos", e "recrutando desertores e aceitando desordeiros";

3. pela repugnância em travar rudes combates ao lado das massas e pela tendência em querer chegar o mais depressa possível às grandes cidades para entregar-se aos prazeres da mesa.

Todas essas manifestações da mentalidade de bando rebelde errante impedem em muito o Exército Vermelho de cumprir as tarefas justas que lhe cabem. Essa a razão por que um dos objectivos principais da luta ideológica no interior das organizações do Partido no Exército Vermelho consiste em eliminar precisamente tal mentalidade. É preciso compreender que essa mentalidade, idêntica à que existia nos tempos de Huam Tchao(4) e de Li Tchuam(5), é inadmissível nas condições actuais.

Meios para eliminar esse estado de espírito:

1. Liquidar a mentalidade de bando rebelde errante, reforçando o trabalho de educação e criticando as concepções erradas.

2. No seio das unidades fundamentais do Exército Vermelho e dos prisioneiros recentemente incorporados, reforçar o trabalho de educação, a fim de acabar com a mentalidade de lumpen-proletariado.

3. Fazer entrar no Exército Vermelho elementos activos, operários e camponeses, com experiência de luta, a fim de modificar dessa maneira a composição do Exército Vermelho.

4. Criar novas unidades do Exército Vermelho com as massas operárias e camponesas em luta.

As Sobrevivências do Putchismo

Nas organizações do Partido do Exército Vermelho, o putchismo já foi combatido, mas duma maneira ainda insuficiente. Assim, ainda existem nas fileiras do Exército Vermelho sobrevivências dessas tendências putchistas. Elas manifestam-se:

1. por acções irreflectidas, empreendidas sem ter em conta as condições subjectivas e objectivas;

2. pela aplicação incompleta e irresoluta da nossa política sobre as cidades;

3. pelo relaxamento da disciplina militar, em particular após as derrotas;

4. pelos incêndios ainda praticados por certas unidades;

5. pela execução dos desertores e aplicação de castigos corporais, que são, afinal, outros tantos actos de carácter putchista. As origens sociais do putchismo estão na combinação da mentalidade lumpen-proletária com a mentalidade pequeno-burguesa.

Meios para eliminar essas sobrevivências:

1. Liquidar o putchismo no plano ideológico.

2. Acabar com as acções putchistas, reforçando as leis e os regulamentos e adoptando medidas políticas adequadas.


Notas:

(1) Este texto é uma resolução redigida pelo camarada Mao Tsetung para o IX Congresso da Organização do Partido no IV Corpo do Exército Vermelho. A formação do exército popular da China foi um processo árduo e difícil. O Exército Vermelho chinês (transformado durante a guerra contra os invasores japoneses no VIII Exército e no Novo IV Exército e, hoje, em Exército Popular de Libertação) nasceu po ocasião da Insurreição de Nantcham, em 1 de Agosto de 1927. Dessa data a Dezembro de 1929, decorreram mais de dois anos. Lutando contra diversas concepções erradas, as organizações do Partido no Exército Vermelho aprenderam muito e acumularam uma experiência muito rica nesse período. A resolução redigida pelo camarada Mao Tsetung constitui o balanço dessa experiência. Ela colocou por completo o Exército Vermelho numa base marxista-leninista e libertou-o de toda a influência dos exércitos de tipo antigo. Tal resolução foi aplicada não só no IV Corpo de Exército mas também Posteriormente, nas outras unidades do Exército Vermelha chinês, o que permitiu a transformação do conjunto desse exército num verdadeiro exército popular. Nos últimos vinte e poucos anos, o trabalho do Partido e o trabalho político no exército popular da China registraram um grande desenvolvimento e apresentaram muitas inovações. Actualmente, esse duplo trabalho tomou um aspecto bem diferente, mas a sua linha fundamental permanece a mesma, determinada pela referida resolução. (retornar ao texto)

(2) Durante um curto lapso de tempo, após a derrota da revolução em 1927, manifestaram-se no seio do Partido Comunista tendências putchistas de "esquerda". Os adeptos do putchismo estimavam que a revolução chinesa tinha o carácter duma "revolução ininterrompida", que se encontrava numa fase de "ascensão ininterrupta". Por isso se recusavam a uma retirada em ordem e, seguindo um método errado, por meio de simples ordens administrativas, apoiando-se unicamente num pequeno número de membros do Partido e numa fracção reduzida da população, procuravam suscitar por todo o país toda uma série de levantamentos locais, que não tinham a menor possibilidade de sucesso. No fim de 1927, essas manifestações putchistas registaram uma larga extensão mas, no início de 1928, diminuíram progressivamente. Contudo, elas ainda subsistiram entre certos membros do Partido. O putchismo é o espírito de aventura. (retornar ao texto)

(3) Uma coluna do Exército Vermelho correspondia a um regimento de infantaria. (nota do tradutor) (retornar ao texto)

(4) Huam Tchao, nascido em Iuantchiu, Tsaodjou (distrito de Hotse, província de Pim-iuan), dirigiu o levantamento camponês do fim da dinastia dos Tans. No ano 875, Huam Tchao, que reunira à sua volta um grande número de camponeses, aderiu ao levantamento provocado por Vam Sien-tchi. Depois que este último foi morto durante uma das batalhas, Huam Tchao juntou às suas forças a parte que restava dos destacamentos de Vam Sien-tchi, e proclamou-se "O grande capitão subindo ao assalto do céu". À testa das forças insurrectas, Huam Tchao realizou duas campanhas para além das fronteiras do Xantum. Durante a primeira, passou primeiro por Honan, depois por Anghuei e Hupei e regressou em seguida ao Xantum. Na segunda, atravessando o Honan, passou do Xantum para o Quiansi, cruzando em seguida o este de Tchequiam, e entrando no Fuquien e no Cuantum, depois no Cuansi e no Hunan e, por fim, no Hupei; de lá ele voltou-se para leste, e penetrou em Anghuei e Tchequiam. Em seguida, cruzando o rio Huai, penetrou na província de Honan, apoderou-se de Luoiam e tomou de assalto a passagem de Tonquan, entrando por fim na cidade de Tcham-an. Huam Tchao criou então o Império dos Tsis, e proclamou-se Imperador. Em consequência de querelas intestinas (o seu general Tchu Uen rendera-se ao Imperador dos Tans), e em virtude da ofensiva das tropas de Li Quei-iom, chefe da tribo dos Chatuos, Huam Tchao perdeu Tcham-an, retirando-se para o Honan e, finalmente, para o Xantum. Vencido, suicidou-se. A guerra que empreendera durou dez anos e é uma das guerras camponesas mais célebres da História da China. Nas crónicas oficiais, cujos autores pertenciam às classes dirigentes, diz-se de Huam que "todas as pessoas que sofriam em razão do fardo dos impostos corriam para junto dele". Como Huam Tchao se limitou a acções móveis e não criou bases de apoio, nem sequer bases pouco sólidas, foi qualificado de "rebelde errante". (retornar ao texto)

(5) Li Tchuam, Li Tse-tchem, originário do distrito de Mitche, no Xensi, dirigiu o levantamento camponês que ocorreu no fim da dinastia dos Mins. Em 1628, primeiro ano do reinado do Imperador Setsum, toda uma vaga de levantamentos camponeses varreu o norte de Xensi. Li Tse-tchem juntou-se ao destacamento insurrecto conduzido por Cao Im-siam que, vindo do Xensi, tinha penetrado no Honan e depois no Anghuei, para regressar finalmente ao Xensi. Em 1636, Cao Im-siam morreu e Li Tse-tchem foi proclamado rei, sob o nome de Tchuam-vam. A principal palavra de ordem de Li Tse-tchem com relação às massas populares era: "Os que estão a favor de Tchuam-vam não pagam a talha". Li Tse-tchem fez reinar uma severa disciplina entre as suas tropas. Ele declarava: "O que mata um homem, eu considero-o como assassino do meu próprio pai. O que viola uma mulher, eu considero-o como se tivesse violado a minha própria mãe". Por essa razão ele conquistou muitos partidários e os seus destacamentos tornaram-se a força principal das insurreições camponesas dessa época. Contudo, ele não criou bases de apoio, por mais frágeis que fossem, e deslocava-se continuadamente, para aqui e para ali. Após ter sido proclamado rei, dirigiu-se com as suas tropas sobre o Setchuan, depois ganhou o sul do Xensi, atravessou o Hupei, e entrou no Honan. Então, apoderou-se de Siam-iam, no Hupei, e, atravessando o Honan, regressou ao Xensi, onde se apoderou de Si-an. Em 1644, atravessou o Xansi e tomou Pequim, sendo pouco depois vencido pelas forças conjugadas do general dos Mins, Vu San-cuei, e dos Tsins que este último chamara em seu socorro. (retornar ao texto)

Inclusão: 22/02/2010
Última alteração: 02/09/2022