Problemas Estratégicos da Guerra Revolucionária na China

Mao Tsetung


Capítulo I — Como Estudar a Guerra


Secção 1. As Leis da Guerra São Evolutivas
capa

As leis da guerra constituem um problema que deve ser estudado e resolvido por todos os que dirigem uma guerra.

As leis da guerra revolucionária constituem um problema que deve ser estudado e resolvido por todos os que dirigem uma guerra revolucionária.

As leis da guerra revolucionária na China constituem um problema que deve ser estudado e resolvido por todos os que dirigem a guerra revolucionária na China.

Actualmente, nós fazemos uma guerra; a nossa guerra é revolucionária e faz-se na China, isto é, num país semi-colonial e semi-feudal. Sendo assim, devemos estudar não só as leis da guerra em geral mas também as leis específicas da guerra revolucionária e ainda as leis particularmente específicas da guerra revolucionária na China.

Como todos sabem, sempre que se faz alguma coisa é impossível conhecer as leis que a regem, saber como realizá-la e levá-la a bom fim, se não se lhe compreendem as condições, o carácter e os laços com as outras coisas.

A guerra, que existe desde que surgiram a propriedade privada e as classes, é a forma suprema de luta para resolver contradições, em determinada etapa do seu desenvolvimento, entre classes, nações, Estados ou grupos políticos. Se não se compreendem as condições em que a guerra se desenrola, a sua natureza e as suas relações com os outros fenómenos, não é possível conhecerem-se-lhe as leis, não se sabe como conduzi-la e é-se incapaz de alcançar a vitória.

A guerra revolucionária, seja uma guerra revolucionária de classe ou uma guerra revolucionária nacional, além das condições e natureza da guerra em geral tem as suas condições e natureza próprias, estando, por isso, submetida às leis da guerra em geral e, igualmente, a leis específicas. Se não se compreendem as condições e a natureza particulares dessa guerra, se não se lhe conhecem as leis específicas, não se pode dirigir a guerra revolucionária e é-se incapaz de vencer.

A guerra revolucionária na China, trate-se duma guerra civil ou duma guerra nacional, desenrola-se em condições próprias à China, e distingue-se da guerra em geral e da guerra revolucionária em geral pelas suas condições e natureza particulares. Daí que ela esteja sujeita, além das leis da guerra em geral e das leis da guerra revolucionária em geral, a leis que lhe são próprias. Se não se conhecem todas essas leis não pode conquistar-se a vitória na guerra revolucionária na China.

Devemos pois estudar as leis da guerra em geral, as leis da guerra revolucionária e, finalmente, as leis da guerra revolucionária na China.

Alguns defendem um ponto de vista errado, refutado por nós há já muito: dizem que basta estudar as leis da guerra em geral, isto é, falando duma maneira mais concreta, basta seguir os manuais militares publicados na China pelo governo reaccionário ou pelos estabelecimentos de ensino militares reaccionários. Eles não vêem que esses manuais expõem meramente as leis da guerra em geral e são, aliás, inteiramente copiados do estrangeiro, donde resulta que, utilizá-los tal como são, sem lhes modificar a forma e o fundo, equivale a "roer o próprio pé para adaptá-lo ao sapato", o que nos conduziria à derrota. Para justificar o seu ponto de vista, argumentam da seguinte maneira: por que razão devemos renunciar ao que foi adquirido no passado ao preço de sangue? Eles não compreendem que, se devemos, naturalmente, apreciar no seu justo valor a experiência ganha no passado ao preço de sangue, também devemos apreciar a experiência que pagámos com o nosso próprio sangue.

Outros defendem um outro ponto de vista também errado, e que igualmente foi refutado desde há muito: dizem que não é necessário estudar mais do que a experiência da guerra revolucionária, na Rússia, isto é, falando mais concretamente, que basta agir conforme as leis que presidiram à condução da guerra civil na União Soviética e seguir os manuais militares publicados pelas instituições militares daquele país. Eles não compreendem que essas leis e esses manuais reflectem o carácter específico da guerra civil na União Soviética e do Exército Vermelho Soviético e que, aplicá-los tal qual são, sem admitir a mínima modificação, equivale uma vez mais a "roer o próprio pé para adaptá-lo ao sapato", o que nos conduziria igualmente à derrota. Para justificar o seu ponto de vista, dizem que a União Soviética fez uma guerra revolucionária e que nós também estamos fazendo uma guerra revolucionária; e se a União Soviética obteve a vitória, que outra alternativa poderá haver senão a de seguirmos o seu exemplo? Eles não compreendem que, se devemos, é certo, atribuir um valor particular à experiência de guerra da União Soviética, visto tratar-se da experiência duma guerra revolucionária da época contemporânea, experiência adquirida sob a direcção de Lenine e Estaline, também devemos apreciar no seu justo valor a experiência da guerra revolucionária na China, uma vez que muitas das condições são particulares à revolução chinesa e ao Exército Vermelho chinês.

Outros, enfim, defendem um outro ponto de vista também errado, o qual, igualmente, temos combatido desde há muito: dizem que a experiência mais preciosa é a da Expedição do Norte, em 1926-1927, e que devemos por isso inspirar-nos nela, isto é, para falar mais concretamente, devemos imitar a Expedição do Norte na sua penetração em profundidade e na sua conquista das grandes cidades. Eles não compreendem que, embora devendo estudar a experiência da Expedição do Norte, não devemos copiá-la mecanicamente, pois a guerra desenvolve-se hoje em condições diferentes. Da experiência da Expedição do Norte não devemos aproveitar senão o que ainda é aplicável actualmente, devendo, conforme a situação presente, elaborar alguma coisa de nosso.

Assim pois, as leis de condução duma guerra variam em função das condições da guerra, do tempo, do lugar e da natureza da guerra. Se falamos do factor tempo, vê-se que com o tempo evoluem tanto a guerra como as leis da sua condução; cada fase histórica tem as suas particularidades, donde se segue que as leis da guerra têm as suas particularidades em cada fase, pelo que não devem ser transpostas mecanicamente duma fase para outra. Se se considera a guerra na sua natureza, a guerra revolucionária e a guerra contra-revolucionária têm as suas particularidades, as leis que as regem também têm, por consequência, as suas próprias particularidades, não podendo, por isso, ser transpostas mecanicamente duma guerra para outra. Se encaramos o lugar onde se desenrola a guerra, cada país, cada nação, e em particular um grande país, uma grande nação, tem as suas particularidades e, por consequência, as leis da guerra em cada país, em cada nação, têm também as suas particularidades, não podendo ser transpostas mecanicamente dum país para outro. Ao estudarmos as leis que regem guerras de carácter diferente, conduzidas por nações diferentes e em lugares e fases históricas diferentes, devemos fazer incidir a nossa atenção sobre as suas particularidades e evolução, lutando contra toda a concepção mecanista na questão da guerra.

Mas isso ainda não é tudo. Num comandante, passar da capacidade para comandar uma pequena unidade à capacidade para comandar uma grande unidade, é um sinal de progresso e de desenvolvimento. Comandar num só e mesmo lugar é uma coisa e comandar em vários lugares diferentes é outra. Num comandante, passar da capacidade para combater num lugar que lhe seja familiar, à capacidade para dirigir combates em vários lugares diferentes, é igualmente um sinal de progresso e desenvolvimento. Em virtude da evolução da técnica, da táctica e da estratégia, tanto para nós como para o adversário, as condições próprias de cada guerra variam dum estádio a outro. Se um oficial capaz de exercer o comando num estádio elementar da guerra se mostra igualmente capaz de comandar num estádio superior, isso é sinal de progresso e de desenvolvimento ainda mais marcados. Permanecer unicamente capaz de comandar uma certa unidade, num certo lugar e num determinado estádio de desenvolvimento duma guerra, significa não fazer progresso algum, não registrar o menor desenvolvimento. Pessoas há que, satisfeitas com a sua capacidade em certo domínio, e contentando-se com a sua visão limitada, não fazem mais progressos; tais pessoas podem desempenhar um certo papel na revolução, em dado lugar e em dado momento, mas não podem desempenhar um grande papel. Nós temos necessidade de chefes" capazes de desempenhar grandes papéis na condução da guerra. Todas as leis de condução da guerra evoluem segundo o desenvolver da História e segundo a evolução da própria guerra. Nada é imutável no mundo.


Inclusão 08/03/2010