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O Capital
Crítica da Economia Política
Karl Marx

Livro Primeiro: O processo de produção do capital

Primeira Seção: Mercadoria e dinheiro

Primeiro capítulo. A mercadoria


3. A forma-valor ou o valor de troca


capa

As mercadorias vêm ao mundo na forma de valores de uso ou de corpos de mercadorias, como ferro, tecido de linho, trigo, etc. Esta é a sua forma natural prosaica. No entanto, elas apenas são mercadorias porque são algo de duplo: objectos de uso e, simultaneamente, portadores de valor. Por isso, elas apenas aparecem como mercadorias ou apenas possuem a forma de mercadorias na medida em que possuem forma dupla, a forma natural e a forma-valor.

A objectividade de valor [Wertgegenständlichkeit] das mercadorias diferencia-se da Senhora Expedita pelo facto de não se saber por onde agarrá-la[N27]. De modo exactamente contrário à objectividade grosseira sensível dos corpos das mercadorias, nem um átomo de matéria natural entra na sua objectividade de valor. Pode-se, por isso, virar e tornar a virar como se quiser uma mercadoria singular que ela continua a não ser concebível como coisa-valor [Wertding]. Se recordarmos, no entanto, que as mercadorias só possuem objectividade de valor na medida em que são expressões da mesma unidade social, o trabalho humano, e que, portanto, a sua objectividade de valor é puramente social, então é evidente que esta só pode aparecer na relação social de mercadoria para mercadoria. Partimos, de facto, do valor de troca ou relação de troca das mercadorias para descobrirmos a pista do seu valor aí escondido. Temos agora de voltar a esta forma fenoménica do valor.

Toda a gente sabe, mesmo que não saiba mais nada, que as mercadorias possuem uma forma-valor comum que contrasta de modo extremamente gritante com as variegadas formas naturais dos seus valores de uso — a forma-dinheiro. Interessa aqui, no entanto, conseguir aquilo que a economia burguesa nem uma vez tentou, a saber, demonstrar a génese desta forma-dinheiro, ou seja, seguir o desenvolvimento da expressão de valor contida na relação de valor das mercadorias, desde a sua figura mais simples e mais imperceptível até à ofuscante forma-dinheiro. Desse modo desaparecerá simultaneamente o enigma do dinheiro.

A relação de valor mais simples é manifestamente a relação de valor de uma mercadoria com uma única mercadoria de espécie diversa, seja ela qual for. A relação de valor entre duas mercadorias fornece-nos, portanto, a mais simples expressão de valor para uma mercadoria.

A) Forma-valor simples, singular ou acidental

x de mercadoria A = y de mercadoria 6, ou:
x de mercadoria A vale y de mercadoria B

(20 côvados de tecido de linho = 1 casaco, ou:
20 côvados de tecido de linho valem 1 casaco.)

1. Os dois pólos da expressão de valor: forma-valor relativa e forma de equivalente

O segredo de toda a forma-valor está nesta forma-valor simples. A sua análise constitui, por isso, a dificuldade propriamente dita.

Aqui, duas mercadorias de espécie diferente, A e B, no nosso exemplo tecido de linho e casaco, desempenham manifestamente dois diferentes papéis. O tecido de linho expressa o seu valor no casaco; o casaco serve de material dessa expressão de valor. A primeira mercadoria desempenha um papel activo, a segunda um papel passivo. O valor da primeira mercadoria está exposto como valor relativo ou acha-se numa forma-valor relativa. A segunda mercadoria funciona como equivalente ou acha-se na forma de equivalente.

Forma-valor relativa e forma de equivalente são momentos [Momente] inseparáveis, que se condicionam mutuamente, fazem parte um do outro, mas, simultaneamente, extremos opostos ou que se excluem reciprocamente, i. é, pólos da mesma expressão de valor; eles repartem-se sempre entre as diversas mercadorias que a expressão de valor relaciona entre si. Não posso, p. ex., exprimir o valor do tecido de linho em tecido de linho. 20 côvados de tecido de linho = 20 côvados de tecido de linho não é nenhuma expressão de valor. Inversamente, a equação diz antes que 20 côvados de tecido de linho nada mais são que 20 côvados de tecido de linho, um determinado quantum do objecto de uso tecido de linho. O valor do tecido de linho só pode, portanto, ser expresso relativamente, i. é, em outra mercadoria. A forma-valor relativa do tecido de linho supõe por isso que uma qualquer outra mercadoria se acha em face dele na forma de equivalente. Por outro lado, esta outra mercadoria que figura como equivalente não pode achar-se simultaneamente na forma-valor relativa. Não é ela que expressa o seu valor. Ela apenas fornece o material para a expressão de valor de outra mercadoria.

Sem dúvida que a expressão: 20 côvados de tecido de linho = 1 casaco ou 20 côvados de tecido de linho valem 1 casaco inclui também as relações inversas: 1 casaco = 20 côvados de tecido de linho ou 1 casaco vale 20 côvados de tecido de linho. Mas a verdade é que eu tenho assim de inverter a equação para expressar o valor do casaco relativamente, e, logo que o faço, é o tecido de linho que se torna o equivalente em vez do casaco. Portanto, na mesma expressão de valor, a mesma mercadoria não pode aparecer simultaneamente em ambas as formas. Estas excluem-se, antes, polarmente.

Assim, se uma mercadoria se acha na forma-valor relativa ou na forma de equivalente oposta depende exclusivamente da sua posição, em cada caso, na expressão de valor, i. é, do facto de ela ser a mercadoria cujo valor é expresso ou a mercadoria em que se expressa valor.

2. A forma-valor relativa

a) Conteúdo da forma-valor relativa

Para descobrir como é que a expressão simples de valor de uma mercadoria está metida na relação de valor de duas mercadorias tenho antes de mais de considerar esta relação de modo totalmente independente do seu lado quantitativo. Na maioria das vezes procede-se exactamente de modo inverso e vê-se na relação de valor apenas a proporção em que determinados quanta de dois tipos de mercadorias se equivalem entre si. Não se repara que as magnitudes de coisas diversas apenas se tornam quantitativamente comparáveis depois da sua redução à mesma unidade. Só como expressões da mesma unidade é que elas são magnitudes homónimas e, daí, comensuráveis(1*).

Quer 20 côvados de tecido de linho = 1 casaco, ou = 20, ou = x casacos, i. é, quer um dado quantum de tecido de linho valha muitos ou poucos casacos, cada uma dessas proporções implica sempre que tecido de linho e casacos, como magnitudes de valor, são expressões da mesma unidade, coisas da mesma natureza. Tecido de linho = casaco é a base da equação.

Mas as duas mercadorias qualitativamente igualadas não desempenham o mesmo papel. Só o valor do tecido de linho é expressado. E como? Através da sua relação com o casaco como seu «equivalente» ou como por ele «trocável». Nesta relação, o casaco aparece como forma de existência de valor, como coisa-valor, pois só como tal ele é o mesmo que o tecido de linho. Por outro lado, o ser-valor [Wertsein] próprio do tecido de linho aparece ou recebe uma expressão autónoma, pois só como valor ele é relacionável com o casaco como algo de igual valor ou por ele trocável. Assim o ácido butírico é um corpo diverso do formiato de propilo. No entanto, ambos consistem nas mesmas substâncias químicas — carbono (C), hidrogénio (H) e oxigénio (O), e até em igual composição percentual, a saber, C4H8O2. Ora se o formiato de propilo fosse igualado ao ácido butírico, então, nessa relação, o formiato de propilo apareceria, em primeiro lugar, meramente como forma de existência de C4H8O2 e, em segundo lugar, ficaria dito que também o ácido butírico consiste em C4H8O2. Pela igualização do formiato de propilo e do ácido butírico, diferentemente da sua forma corpórea, seria, portanto, expressa a sua substância química.

Se dissermos que, como valores, as mercadorias são meras gelatinas de trabalho humano, a nossa análise redu-las à abstracção-valor [Wertabstraktion], mas não lhes dá nenhuma forma-valor diversa das suas formas naturais. Outra coisa se passa na relação de valor de uma mercadoria com outra. O seu carácter de valor evidencia-se aqui através da sua própria relação com a outra mercadoria.

Na medida em que, p. ex., o casaco, como coisa-valor, é igualado ao tecido de linho, o trabalho que está metido num é igualado ao trabalho que está metido no outro. É certo que a costura, que faz o casaco, é um trabalho concreto de espécie diversa da tecelagem, que faz o tecido de linho. Mas a igualização à tecelagem reduz a costura, de facto, àquilo que há de realmente igual nos dois trabalhos, ao seu carácter comum de trabalho humano. Por este desvio fica assim dito que também a tecelagem, na medida em que tece valor, não possui nenhuns caracteres distintivos em relação à costura, sendo, portanto, trabalho humano em abstracto. Só a expressão de equivalência de mercadorias de espécie diversa faz aparecer o carácter específico do trabalho formador de valor, na medida em que ela, efectivamente, reduz os trabalhos de espécie diversa, que estão metidos nas mercadorias de espécie diversa, ao que têm de comum, a trabalho humano em geral(2*).

No entanto, não basta exprimir o carácter específico do trabalho em que o valor do tecido de linho consiste. Força de trabalho humana em estado fluido ou trabalho humano forma valor, mas não é valor. Torna-se valor no estado coagulado, na forma de objecto. Para exprimir o valor do tecido de linho como gelatina do trabalho humano esse valor tem de ser expresso como uma «objectividade», a qual é, como coisa [dinglich], diversa do próprio tecido de linho e, simultaneamente, lhe é comum com outra mercadoria. O problema está já resolvido.

Na relação de valor do tecido de linho o casaco vale como seu equivalente qualitativamente igual, como coisa da mesma natureza, porque é um valor. Aqui, ele vale, pois, como uma coisa em que se manifesta valor ou que expõe valor na sua forma natural palpável. Ora o casaco, o corpo da mercadoria casaco, é um mero valor de uso. Um casaco expressa tão pouco valor como a primeira peça de tecido de linho que apareça. Isto prova apenas que ele dentro da relação de valor com o tecido de linho significa mais do que fora dela, tal como muita gente dentro de um casaco com galões significa mais do que fora do mesmo.

Na produção do casaco foi efectivamente despendida força de trabalho humana sob a forma de costura. Está, portanto, nele acumulado trabalho humano. Segundo este aspecto, o casaco é «portador de valor», apesar de esta sua propriedade não transparecer mesmo que ele se gaste até ao fio. E, na relação de valor do tecido de linho, ele vale apenas segundo este aspecto e, portanto, como valor encarnado, como corpo de valor. Apesar da sua aparência abotoada, o tecido de linho reconheceu nele a bela alma de valor da mesma linhagem. No entanto, face ao tecido de linho, o casaco não pode representar valor sem que, simultaneamente, para o tecido de linho o valor tome a forma de um casaco. Assim, o indivíduo A não pode comportar-se para com o indivíduo B como [se este fosse] uma majestade sem que para A, simultaneamente, a majestade tome a figura corpórea de B e, por isso, mude de fisionomia, cabelo e muitas outras coisas com cada novo pai da pátria [Landesvater].

Na relação de valor em que o casaco constitui o equivalente do tecido de linho, a forma-casaco vale, pois, como forma-valor. O valor da mercadoria tecido de linho é, assim, expresso no corpo da mercadoria casaco, o valor de uma mercadoria no valor de uso da outra. Como valor de uso, o tecido de linho é uma coisa diversa sensivelmente do casaco, como valor é «um igual do casaco» e, por isso, tem o aspecto de um casaco. Assim, ele recebe uma forma-valor diversa da sua forma natural. O seu ser-valor aparece na sua igualdade com o casaco como a natureza ovina do cristão na sua igualdade com o cordeiro de deus.

Vemos que tudo o que a análise do valor da mercadoria nos disse antes o diz agora o próprio tecido de linho logo que entra em contacto com outra mercadoria, o casaco. Só que trai os seus pensamentos na única linguagem que lhe é familiar, a linguagem das mercadorias. Para dizer que o trabalho na sua propriedade abstracta de trabalho humano forma o seu próprio valor, o tecido de linho diz que o casaco, na medida em que lhe equivale, ou seja, em que é valor, consiste no mesmo trabalho que o tecido de linho. Para dizer que a sua sublime objectividade de valor é diversa do seu corpo entretecido, ele diz que o valor tem o aspecto de um casaco e que, por isso, ele próprio, como coisa-valor, se parece com o casaco como um ovo se parece com outro. Note-se, a propósito, que também a linguagem das mercadorias tem, para além do hebreu, muitos outros dialectos mais ou menos correctos. O alemão Wertsein, p. ex., expressa de forma menos acutilante do que o verbo românico valere, valer, valoir, que a igualização da mercadoria B à mercadoria A é a própria expressão de valor da mercadoria A. Paris vaut bien une messe![N28]

Assim, por meio da relação de valor, a forma natural da mercadoria B torna-se na forma-valor da mercadoria A ou o corpo da mercadoria B no espelho de valor da mercadoria A(4*). Na medida em que a mercadoria A se relaciona com a mercadoria B como corpo de valor, como materialização [Materiatur] de trabalho humano, ela faz do valor de uso B material da sua própria expressão de valor. O valor da mercadoria A, assim expresso no valor de uso da mercadoria B, possui a forma do valor relativo.

b) Determinidade quantitativa da forma-valor relativa

Toda a mercadoria cujo valor deva ser expresso é um objecto de uso de um dado quantum, 15 alqueires de trigo, 100 lib. de café, etc. Este dado quantum de mercadoria contém um determinado quantum de trabalho humano. Portanto, a forma-valor tem de exprimir não só valor em geral mas também valor quantitativamente determinado ou magnitude de valor. Na relação de valor da mercadoria A com a mercadoria B, do tecido de linho com o casaco, portanto, a espécie de mercadoria casaco é não só igualada qualitativamente, como corpo de valor em geral, ao tecido de linho, mas também a um determinado quantum do tecido de linho, p. ex., 20 côvados de tecido de linho, um determinado quantum do corpo de valor ou do equivalente, p. ex., 1 casaco.

A equação «20 côvados de tecido de linho = 1 casaco, ou: 20 côvados de tecido de linho valem 1 casaco» pressupõe que em 1 casaco existe exactamente tanta substância de valor como em 20 côvados de tecido de linho, que ambos os quanta de mercadoria, portanto, custam igual quantidade de trabalho ou um tempo de trabalho de igual magnitude. O tempo de trabalho necessário para a produção de 20 côvados de tecido de linho ou de 1 casaco, porém, muda com qualquer mudança na força produtiva da tecelagem ou da costura. Temos, pois, de investigar mais de perto a influência de tal mudança sobre a expressão relativa da magnitude de valor.

I. Suponhamos que o valor do tecido de linho muda(6*), enquanto o valor do casaco se mantém constante. Se o tempo de trabalho necessário para a produção do tecido de linho duplicar, em consequência, p. ex., da crescente infertilidade do solo que dá linho, então o seu valor também duplica. Em vez de 20 côvados de tecido de linho = 1 casaco, teríamos 20 côvados de tecido de linho = 2 casacos, pois 1 casaco conteria agora apenas metade do tempo de trabalho de 20 côvados de tecido de linho. Se, pelo contrário, o tempo de trabalho necessário para a produção do tecido de linho se reduzir para metade em consequência, p. ex., de teares aperfeiçoados, então o valor do tecido de linho cai para metade. De acordo com isto, teríamos agora 20 côvados de tecido de linho = l/2 casaco. O valor relativo da mercadoria A, i. é, o seu valor expresso na mercadoria B, sobe e desce, pois, em relação directa com o valor da mercadoria A, mantendo-se igual o valor da mercadoria B.

II. Suponhamos que o valor do tecido de linho se mantém constante, enquanto o valor do casaco muda. Se, nestas circunstâncias, duplicar o tempo de trabalho necessário para a produção do casaco em consequência, p. ex., de uma tosquia fraca, então temos agora 20 côvados de tecido de linho = 1/2 casaco, em vez de 20 côvados de tecido de linho = 1 casaco. Se, pelo contrário, o valor do casaco descer para metade, então 20 côvados de tecido de linho = 2 casacos. Mantendo-se igual o valor da mercadoria A, desce ou sobe, portanto, o seu valor relativo, expresso na mercadoria B, em relação inversamente proporcional à mudança de valor de B.

Se compararmos os casos diversos em I e II, resulta que a mesma mudança de magnitude do valor relativo pode provir de causas totalmente opostas. Assim, a partir de 20 côvados de tecido de linho = 1 casaco tem-se: 1. a equação 20 côvados de tecido de linho = 2 casacos, ou porque o valor do tecido de linho duplica ou porque o valor dos casacos desce para metade, e 2. a equação 20 côvados de tecido de linho = 1/2 casaco, ou porque o valor do tecido de linho cai para metade ou porque o valor do casaco sobe para o dobro.

III. Suponhamos que os quanta de trabalho necessários para a produção de tecido de linho e de casaco mudam simultaneamente, no mesmo sentido e na mesma proporção. Neste caso, tal como antes, 20 côvados de tecido de linho = 1 casaco, por muito que os seus valores se tenham alterado. Descobre-se a sua mudança de valor logo que se compara aqueles com uma terceira mercadoria cujo valor permanecesse constante. Se os valores de todas as mercadorias subissem ou descessem simultaneamente e na mesma proporção, os seus valores relativos permaneceriam inalterados. A sua mudança real de valor só seria visível através do facto de agora, em geral, no mesmo tempo de trabalho, se fornecer um quantum de mercadorias maior ou menor do que antes.

IV. Suponhamos que os tempos de trabalho necessários para a produção, respectivamente, de tecido de linho e de casaco, e, por isso, os seus valores, mudam simultaneamente no mesmo sentido, mas em grau desigual, ou no sentido oposto, etc. A influência de todas as possíveis combinações deste tipo sobre o valor relativo de uma mercadoria resulta simplesmente da aplicação dos casos I, II e III.

Portanto, mudanças reais da magnitude de valor não se reflectem nem inequívoca nem exaustivamente na sua expressão relativa ou na magnitude do valor relativo. O valor relativo de uma mercadoria pode mudar, embora o seu valor permaneça constante. O seu valor relativo pode permanecer constante embora o seu valor mude, e, finalmente, mudanças simultâneas na sua magnitude de valor e na expressão relativa dessa magnitude de valor não precisam, de forma nenhuma, de ser congruentes(7*).

3. A forma de equivalente

Vimos que uma mercadoria A (o tecido de linho), na medida em que expressa o seu valor no valor de uso de uma mercadoria de espécie diversa B (o casaco), imprime a esta última uma forma-valor peculiar, a de equivalente. A mercadoria tecido de linho faz aparecer o seu próprio ser-valor pelo facto de o casaco, sem tomar uma forma-valor diversa da sua forma corpórea, lhe equivaler. Efectivamente, o tecido de linho exprime, pois, o seu próprio ser-valor pelo facto de o casaco ser imediatamente trocável por ele. A forma de equivalente de uma mercadoria é, consequentemente, a forma da sua trocabilidade imediata por outra mercadoria.

Se uma espécie de mercadorias, como os casacos, serve de equivalente a outra espécie de mercadorias, como o tecido de linho, e, desse modo, os casacos recebem a propriedade característica de se encontrarem numa forma imediatamente trocável pelo tecido de linho, não nos é dada com isso, de modo nenhum, a proporção em que casacos e tecido de linho são trocáveis. Como a magnitude de valor do tecido de linho está dada, a proporção depende da magnitude de valor dos casacos. Quer o casaco seja expresso como equivalente e o tecido de linho como valor relativo ou, inversamente, o tecido de linho como equivalente e o casaco como valor relativo, a sua magnitude de valor permanece, tal como antes, determinada pelo tempo de trabalho necessário para a sua produção, independentemente, portanto, da sua forma-valor. Porém, logo que a espécie de mercadoria casaco toma, na expressão de valor, o lugar do equivalente, a sua magnitude de valor não recebe qualquer expressão como magnitude de valor. Na equação de valor, ela figura antes, apenas, como quantum determinado de uma coisa.

P. ex.: 40 côvados de tecido de linho «valem» — o quê? 2 casacos. Como a espécie de mercadoria casaco desempenha aqui o papel de equivalente — o valor de uso casaco serve de corpo de valor ao tecido de linho — basta também um quantum determinado de casacos para exprimir um determinado quantum de valor de tecido de linho. Assim, dois casacos podem exprimir a magnitude de valor de 40 côvados de tecido de linho, mas nunca podem exprimir a sua própria magnitude de valor, a magnitude de valor de casacos. A concepção superficial do facto de que, na equação de valor, o equivalente possui sempre e apenas a forma de um simples quantum de uma coisa, de um valor de uso, induziu erradamente Bailey, tal como muitos dos seus predecessores e sucessores, a ver na expressão de valor uma relação apenas quantitativa. Acontece antes que a forma de equivalente de uma mercadoria não contém nenhuma determinação de valor quantitativa.

A primeira peculiaridade que ressalta da observação da forma de equivalente é esta: o valor de uso torna-se forma fenoménica do seu contrário, do valor.

A forma natural da mercadoria torna-se forma-valor. Mas, nota bene(8*), este quiproquó só acontece a uma mercadoria B (casaco ou trigo ou ferro, etc.) no interior da relação de valor, na qual uma qualquer outra mercadoria A (tecido de linho, etc.) a ela se reporta, e só no interior dessa relação. Como nenhuma mercadoria se pode relacionar consigo própria como equivalente e, portanto, também não pode fazer da sua própria pele natural a expressão do seu próprio valor, ela tem de se relacionar com outra mercadoria como equivalente ou fazer da pele natural de uma outra mercadoria a sua própria forma-valor.

Ilustremos isto com o exemplo de uma medida que se aplica aos corpos das mercadorias como corpos de mercadorias, i. é, como valores de uso. Um pilão de açúcar, sendo corpo, é [um] grave [schwer] e tem, portanto, peso [Gewicht], mas em nenhum pilão se pode ver ou tocar o seu peso. Tomemos, porém, diversos bocados de ferro cujo peso esteja previamente determinado. A forma corpórea do ferro, considerada por si, é tão pouco forma fenoménica da gravidade [Schwere] como a do pilão de açúcar. No entanto, para exprimir o pilão como gravidade, coloquemo-lo numa relação de peso com o ferro. Nesta relação o ferro serve como corpo que nada representa além da gravidade. Deste modo, quanta de ferro servem para medida de peso do açúcar e representam, em relação ao corpo do açúcar, uma mera figura da gravidade, uma forma fenoménica da gravidade. O ferro só desempenha este papel no interior desta relação, em que o açúcar ou qualquer outro corpo, cujo peso se pretende encontrar, a ele se reporta. Se as duas coisas não fossem graves, não poderiam entrar nessa relação e, por isso, uma não poderia servir como expressão da gravidade da outra. Se as atirarmos ambas para o prato da balança, vemos de facto que elas, como gravidade, são o mesmo e, por isso, numa determinada proporção, têm também o mesmo peso. Tal como o corpo do ferro, como medida de peso, em relação ao pilão apenas representa gravidade, assim também na nossa expressão de valor o corpo do casaco, em relação ao tecido de linho, apenas representa valor.

No entanto, a analogia termina aqui. Na expressão de peso do pilão de açúcar, o ferro representa uma propriedade natural comum aos dois corpos, a sua gravidade, ao passo que, na expressão de valor do tecido de linho, o casaco representa uma propriedade supranatural de ambas as coisas: o seu valor, algo de puramente social.

Na medida em que a forma-valor relativa de uma mercadoria, p. ex., o tecido de linho, exprime o seu ser-valor como algo de completamente diferente do seu corpo e das suas propriedades, p. ex., como igual a casaco, essa própria expressão indica que esconde uma relação social. Dá-se o inverso com a forma de equivalente. Esta consiste precisamente no facto de o corpo de uma mercadoria, como o casaco, assim tal como é, exprimir valor, portanto, possuir, por natureza, forma-valor. É certo que isto apenas é válido no interior da relação de valor em que a mercadoria tecido de linho está referida como equivalente à mercadoria casaco(9*). Porém, como as propriedades de uma coisa não resultam da sua relação com outras coisas, antes apenas se activam em tal relação, também o casaco parece possuir por natureza a sua forma de equivalente, a sua propriedade de trocabilidade imediata, assim como a sua propriedade de ser um grave ou de conservar o calor. Daí o enigmático da forma de equivalente, que só chama a atenção burguesamente tosca do economista político quando essa forma se lhe depara de modo acabado no dinheiro. Ele procura então dissipar o carácter místico do ouro e da prata, substituindo-os por mercadorias menos deslumbrantes e recitanto com um prazer sempre renovado o catálogo de toda a chusma de mercadorias que a seu tempo representaram o papel de equivalente de mercadorias [Warenäquivalents]. Ele não suspeita que até a mais simples expressão de valor, como 20 côvados de tecido de linho = 1 casaco, permite resolver o enigma da forma de equivalente.

O corpo da mercadoria que serve de equivalente vigora sempre como corporização de trabalho humano em abstracto e é sempre o produto de um determinado trabalho útil, concreto. Este trabalho concreto torna-se, pois, expressão de trabalho humano em abstracto. Se o casaco, p. ex., vigora como mera realização [de trabalho humano em abstracto], também a costura, que nele efectivamente se realiza, vigora como mera forma de realização de trabalho humano em abstracto. Na expressão de valor do tecido de linho, a utilidade da costura não consiste no facto de fazer roupas — e, portanto, também gente(11*) —, mas no de fazer um corpo que se vê que é valor, portanto, gelatina de trabalho que em nada se distingue do trabalho objectivado no valor do tecido de linho. Para fazer um tal espelho de valor, a própria costura tem de não reflectir nada a não ser a sua propriedade abstracta de ser trabalho humano.

Sob a forma da costura, tal como sob a forma da tecelagem, é despendida força de trabalho humana. Ambas possuem, assim, a propriedade geral de trabalho humano e, por isso, podem, em determinados casos, como, p. ex., na produção de valor, ser consideradas apenas sob este ponto de vista. Nada disto é misterioso. Mas, na expressão de valor da mercadoria, a coisa muda. Para exprimir, p. ex., que o tecer — não na sua forma concreta de tecer, mas na sua propriedade geral de trabalho humano — forma o valor do tecido de linho, é-lhe contraposta, como forma de realização palpável de trabalho humano em abstracto, a costura, o trabalho concreto que produz o equivalente do tecido de linho.

É, portanto, uma segunda peculiaridade da forma de equivalente que o trabalho concreto se torne forma fenoménica do seu contrário, o trabalho humano em abstracto.

No entanto, este trabalho concreto, a costura, na medida em que vigora como mera expressão de trabalho humano indiferenciado, possui a forma da igualdade com outro trabalho, o trabalho que está metido no tecido de linho, e, por isso, embora sendo trabalho privado, como todo o outro trabalho que produz mercadorias, é, no entanto, trabalho em forma imediatamente social. É precisamente por isso que ele se manifesta num produto que é imediatamente trocável por outra mercadoria. Uma terceira peculiaridade da forma de equivalente é, portanto, que trabalho privado se torna forma do seu contrário, trabalho em forma imediatamente social.

As duas peculiaridades da forma de equivalente desenvolvidas em último lugar tornam-se ainda mais apreensíveis se recuarmos até ao grande investigador que primeiro analisou — tal como tantas outras formas do pensamento, formas da sociedade e formas da Natureza — a forma-valor. Foi ele Aristóteles.

Antes de mais, Aristóteles afirma claramente que a forma-dinheiro da mercadoria é apenas a figura mais desenvolvida da forma-valor simples, i. é, da expressão de valor de uma mercadoria em qualquer outra mercadoria que se queira, pois ele diz:

«5 leitos = 1 casa»
texto grego

«não se diferencia» de:

«5 leitos = tanto dinheiro»
texto grego2

Ele percebe, além disso, que a relação de valor em que esta expressão de valor está metida implica por seu lado que a casa seja qualitativamente igualada ao leito e que estas coisas diversas sensivelmente, sem essa igualdade de essência, não seriam relacionáveis entre si como magnitudes comensurávais. «Não há troca», diz ele, «sem haver igualdade, não há igualdade sem haver comensurabilidade» (texto grego3). Neste ponto, porém, ele detém-se e desiste de continuar a análise da forma-valor. «Mas, na verdade, é impossível» (texto grego4) «que coisas de tal modo diferentes sejam comensuráveis», i. é, qualitativamente iguais. Esta igualização apenas pode ser algo de estranho à verdadeira natureza das coisas e, portanto, apenas um «recurso de emergência para a necessidade prática»[N29].

Portanto, o próprio Aristóteles nos diz onde falha a continuação da sua análise, a saber, na falta do conceito de valor. Qual é o igual, i. é, a substância comum, que a casa representa para o leito na expressão de valor do leito? Algo assim «não» pode, «na verdade, existir», diz Aristóteles. Porquê? Em relação ao leito, a casa representará algo de igual na medida em que representar o que em ambos, no leito e na casa, é realmente algo de igual. E isso é — o trabalho humano.

Porém, que, na forma dos valores das mercadorias, todos os trabalhos estejam expressos como trabalho humano igual e, portanto, como equivalentes, isso não podia Aristóteles tirar da própria forma-valor porque a sociedade grega assentava no trabalho escravo e, por isso, tinha por base natural a desigualdade dos homens e das suas forças de trabalho. O segredo da expressão de valor, a igualdade e igual validade de todos os trabalhos, porque e na medida em que são trabalho humano em geral, só pode ser decifrado a partir do momento em que o conceito da igualdade humana possua já a solidez de um preconceito do povo. Mas isto só é possível numa sociedade em que a forma-mercadoria seja a forma geral do produto de trabalho e, portanto, também a relação dos homens entre si como possuidores de mercadorias seja a relação social dominante. O génio de Aristóteles brilha precisamente pelo facto de ele descobrir na expressão de valor das mercadorias uma relação de igualdade. Só a limitação histórica da sociedade em que viveu o impede de descobrir em que consiste afinal «na verdade» esta relação de igualdade.

4. O todo da forma-valor simples

A forma-valor simples de uma mercadoria está contida na sua relação de valor com uma mercadoria de espécie diversa ou na relação de troca com a mesma. O valor da mercadoria A é expresso qualitativamente pela trocabilidade imediata da mercadoria B pela mercadoria A. Ele é expresso quantitativamente pela trocabilidade de um determinado quantum da mercadoria B pelo quantum dado da mercadoria A. Por outras palavras, o valor de uma mercadoria é expresso autonomamente pela sua apresentação como «valor de troca». Ao dizermos, no princípio deste capítulo, de uma forma corrente, que a mercadoria é valor de uso e valor de troca, a verdade é que isto, para falar exactamente, é falso. A mercadoria é valor de uso ou objecto de uso e «valor». Ela manifesta-se como esta coisa dupla, que é, logo que o seu valor possui uma forma fenoménica própria — a de valor de troca —, diversa da sua forma natural, e nunca possui essa forma se considerada isoladamente, mas sempre apenas quando numa relação de valor ou de troca com uma segunda mercadoria, de espécie diversa. No entanto, uma vez que o saibamos, aquela maneira de dizer não causa qualquer dano, antes serve de abreviação.

A nossa análise demostrou que a forma-valor ou a expressão de valor da mercadoria resulta da natureza do valor da mercadoria, e não inversamente, o valor e a magnitude de valor do seu modo de expressão como valor de troca. É esta, no entanto, a ilusão tanto dos mercantilistas e dos seus modernos reanimadores (tais como Ferrier, Ganilh, etc.(12*)) como também dos seus antípodas, os modernos commis-voyageurs(14*) do livre-câmbio, tais como Bastiat e consortes. Os mercantilistas põem o acento principal no aspecto qualitativo da expressão de valor e, portanto, na forma de equivalente da mercadoria, que tem no dinheiro a sua forma acabada; os modernos bufarinheiros do livre-câmbio, pelo contrário, que têm de se livrar da sua mercadoria a qualquer preço, põem o acento principal no aspecto quantitativo da forma-valor relativa. Para eles, consequentemente não existe nem valor nem magnitude de valor da mercadoria excepto na sua expressão através da relação de troca, portanto, apenas no boletim de preços correntes diários. O escocês Macleod, na sua função de enfeitar tanto quanto possível com ar erudito as confusas concepções da Lombard Street[N30], constitui uma síntese conseguida dos mercantilistas supersticiosos e dos bufarinheiros do livre-câmbio esclarecidos.

A consideração mais pormenorizada da expressão de valor da mercadoria A contida na relação de valor com a mercadoria B mostrou que, no seu interior, a forma natural da mercadoria A apenas vigora como figura do valor de uso e a forma natural da mercadoria B apenas vigora como forma-valor ou figura de valor. A oposição interna de valor de uso e valor encerrada dentro da mercadoria é, portanto, exposta por uma oposição externa, i. é, pela relação de duas mercadorias em que uma das mercadorias, cujo valor se pretende exprimir, apenas vigora imediatamente como valor de uso, e a outra mercadoria, pelo contrário, na qual o valor é expresso, apenas vigora imediatamente como valor de troca. A forma-valor simples de uma mercadoria é, portanto, a forma fenoménica simples da oposição de valor de uso e valor nela contida.

O produto de trabalho é, em todos os estados da sociedade, objecto de uso, mas só uma época de desenvolvimento historicamente determinada, a qual apresenta o trabalho despendido na produção de uma coisa de uso como sua propriedade «objectiva», i. é, como seu valor, é que transforma o produto de trabalho em mercadoria. Segue-se daqui que a forma-valor simples da mercadoria é simultaneamente a forma-mercadoria simples do produto de trabalho e que, portanto, também o desenvolvimento da forma-mercadoria coincide com o desenvolvimento da forma-valor.

Um primeiro olhar mostra logo a insuficiência da forma-valor simples, esse germe que só através de uma série de metamorfoses amadurece até à forma-preço.

A expressão do valor da mercadoria A em qualquer mercadoria B apenas distingue o valor da mercadoria A do seu próprio valor de uso e, por isso, também apenas a coloca numa relação de troca com uma qualquer espécie singular de mercadorias diversa dela própria, em vez de representar a sua igualdade qualitativa e proporcionalidade quantitativa com todas as outras mercadorias. À forma-valor relativa simples de uma mercadoria corresponde a forma de equivalente, singular, de uma outra mercadoria. Assim, o casaco, na expressão de valor relativa do tecido de linho, apenas possui forma de equivalente ou forma de trocabilidade imediata em relação a essa espécie singular de mercadorias, o tecido de linho.

Entretanto, a forma-valor singular transita, por si própria, para uma forma mais completa. É certo que, por meio dela, o valor de uma mercadoria A é expresso em apenas uma mercadoria de outra espécie. Mas a espécie desta segunda mercadoria, seja casaco, seja ferro, seja trigo, etc, é completamente indiferente. Portanto, consoante ela entra numa relação de valor com esta ou aqueloutra espécie de mercadorias, assim surgem diversas expressões de valor simples de uma e mesma mercadoria(15*). O número das suas expressões de valor possíveis só é limitado pelo número de espécies de mercadorias dela diversas. A sua expressão de valor singularizada transforma-se, por isso, na série sempre prolongável das suas diversas expressões de valor simples.

B) Forma-valor total ou desdobrada

z de mercadoria A = u de mercadoria B, ou = v de mercadoria C, ou = w de mercadoria D, ou = x de mercadoria E, ou = etc.

(20 côvados de tecido de linho = 1 casaco, ou = 10 lib. de chá, ou = 40 lib. de café, ou = 1 quarter de trigo, ou = 2 onças de ouro, ou = 1/2 tonelada de ferro, ou = etc.)

1. A forma-valor relativa desdobrada

O valor de uma mercadoria, p. ex., do tecido de linho, é agora expresso em inúmeros outros elementos do mundo das mercadorias. Qualquer outro corpo de mercadoria se torna no espelho do valor do tecido de linho(16*). Pela primeira vez aparece este próprio valor verdadeiramente como gelatina de trabalho humano indiferenciado. É que o trabalho que o forma está agora expressamente manifestado como trabalho a que qualquer outro trabalho humano equivale, qualquer que seja a forma natural que possua e quer se objective, por isso, em casaco ou trigo ou ferro ou ouro, etc. Assim, através da sua forma-valor, o tecido de linho já não se encontra agora em relação social com apenas uma outra espécie singular de mercadorias, mas com o mundo das mercadorias. Como mercadoria, ele é cidadão desse mundo. Simultaneamente, na série infinita das suas expressões está implícito que o valor das mercadorias seja indiferente à forma particular do valor de uso em que ele aparece.

Na primeira forma, 20 côvados de tecido de linho = 1 casaco, pode ser um facto casual que estas duas mercadorias sejam trocadas numa determinada relação quantitativa. Na segunda forma, em contrapartida, transparece logo um fundo essencialmente diverso do fenómeno casual e que o determina. O valor do tecido de linho mantém a mesma magnitude, quer seja apresentado em casaco ou café ou ferro, etc, em inúmeras mercadorias diversas, pretencendo aos mais diversos possuidores. A relação casual de dois possuidores individuais de mercadorias desaparece. Torna-se manifesto que não é a troca que regula a magnitude de valor da mercadoria, mas, inversamente, a magnitude de valor da mercadoria que regula as suas relações de troca.

2. A forma de equivalente particular

Na expressão de valor do tecido de linho cada mercadoria — casaco, chá, trigo, ferro, etc. — vigora como equivalente e, portanto, como corpo de valor. A forma natural determinada de cada uma destas mercadorias é agora uma forma de equivalente particular ao lado de muitas outras. Do mesmo modo, as múltiplas espécies de trabalho útil, concreto, determinado, contidas nos diversos corpos de mercadorias vigoram agora, pura e simplesmente, como outras tantas formas particulares de realização ou formas fenoménicas de trabalho humano.

3. Defeitos da forma-valor total ou desdobrada

Em primeiro lugar, a expressão de valor relativa da mercadoria é inacabada, porque a sua série de representações nunca se conclui. A cadeia em que uma equação de valor se liga à seguinte matém-se constantemente prolongável por meio de cada espécie de mercadorias que surja de novo, a qual fornece o material de uma nova expressão de valor. Em segundo lugar, ela forma um colorido mosaico de expressões de valor díspares e de espécies diversas. Se, finalmente, como tem de acontecer, o valor relativo de cada mercadoria for expresso nesta forma desdobrada, então a forma-valor relativa de cada mercadoria é uma série infinita de expressões de valor diversa da forma-valor relativa de qualquer outra mercadoria. — Os defeitos da forma-valor relativa desdobrada reflectem-se na forma de equivalente que lhe corresponde. Como a forma natural de cada espécie singular de mercadorias é aqui uma forma particular de equivalente ao lado de inúmeras outras formas particulares de equivalente, em geral apenas existem formas de equivalente limitadas, em que cada uma exclui a outra. De igual modo, a espécie de trabalho útil, concreto, determinado, contido em cada equivalente de mercadorias particular é apenas a forma fenoménica particular, portanto não exaustiva, do trabalho humano. É certo que este possui a sua forma fenoménica completa ou total no conjunto global daquelas formas fenoménicas particulares. Mas, desse modo, não possui nenhuma forma fenoménica unitária.

A forma-valor relativa desdobrada, no entanto, consiste apenas numa soma de expressões de valor relativas simples ou equações da primeira forma, como:

20 côvados de tecido de linho = 1 casaco
20 côvados de tecido de linho = 10 lib. de chá, etc

Mas cada uma destas equações contém também, reversamente, a equação idêntica:

1 casaco = 20 côvados de tecido de linho
10 lib. de chá = 20 côvados de tecido de linho, etc.

De facto, se um homem troca o seu tecido de linho por muitas outras mercadorias e, por isso, expressa o seu valor numa série de outras mercadorias, então os muitos outros possuidores de mercadorias têm também, necessariamente, de trocar as suas mercadorias por tecido de linho e, por isso, de exprimir os valores das suas diversas mercadorias na mesma terceira mercadoria, o tecido de linho. — Se invertermos, pois, a série: 20 côvados de tecido de linho = 1 casaco ou = 10 lib. de chá ou = etc, i. é, se expressarmos a relação reversa já implícita na série, obtemos então:

C) Forma-valor geral
1 casaco = 20 côvados de tecido de linho
10 lib. de chá  =
40 lib. de café     =
1 quarter de trigo  =
2 onças de ouro    =
1/2 tonelada de ferro =
x de mercadoria A =
etc.de mercadoria  =
1. Carácter alterado da forma-valor

As mercadorias apresentam agora os seus valores: 1. simplesmente, porque numa única mercadoria, e 2. unitariamente, porque na mesma mercadoria. A sua forma-valor é simples e comum, e por isso geral.

As formas I e II apenas conseguiam exprimir o valor de uma mercadoria como algo diferente do seu próprio valor de uso ou do seu corpo de mercadoria.

A primeira forma produzia equações de valor como: 1 casaco = 20 côvados de tecido de linho, 10 lib. de chá = 72 tonelada de ferro, etc. O valor do casaco expressa-se como algo de igual a tecido de linho, o valor do chá como algo de igual a ferro, etc, mas estas expressões de valor do casaco e do chá — algo de igual a tecido de linho e algo de igual a ferro — são tão diversas como o tecido de linho e o ferro. Esta forma só ocorre manifestamente de um modo prático nos primeiros começos, quando os produtos de trabalho são transformados em mercadorias através de uma troca acidental e ocasional.

A segunda forma distingue mais completamente que a primeira o valor de uma mercadoria do seu próprio valor de uso, pois o valor do casaco, p. ex., é agora confrontado com a sua forma natural em todas as formas possíveis: como algo de igual a tecido de linho, algo de igual a ferro, algo de igual a chá, etc, tudo o mais, excepto algo de igual a casaco. Por outro lado, está aqui directamente excluída qualquer expressão comum de valor das mercadorias, pois na expressão de valor de cada mercadoria todas as outras mercadorias aparecem agora apenas na forma de equivalentes. A forma-valor desdobrada ocorre, efectivamente, pela primeira vez, quando um produto de trabalho, o gado, p. ex., já não é excepcionalmente mas habitualmente trocado por diversas outras mercadorias.

A forma recém-adquirida exprime os valores do mundo das mercadorias numa única espécie de mercadorias destacada desse mundo, p. ex., em tecido de linho, apresentando assim os valores de todas as mercadorias por meio da sua igualdade com o tecido de linho. Como algo de igual a tecido de linho, o valor de cada mercadoria não é agora diferente apenas do seu próprio valor de uso, mas de todo o valor de uso, e, precisamente por isso, expresso como aquilo que ela tem de comum com todas as mercadorias. Assim, só esta forma relaciona realmente as mercadorias entre si como valores ou as faz aparecer umas às outras como valores de troca.

Ambas as formas anteriores exprimem, cada uma, o valor de uma mercadoria, seja numa mercadoria singular de espécie diversa seja numa série de muitas mercadorias dela diversas. De ambas as vezes, é, por assim dizer, assunto privado da mercadoria singular dar a si própria uma forma-valor, e fá-lo sem intervenção das outras mercadorias. Estas desempenham em relação a ela o papel meramente passivo do equivalente. Em contrapartida, a forma-valor geral surge apenas como obra comum do mundo das mercadorias. Uma mercadoria só adquire expressão de valor geral porque simultaneamente todas as outras mercadorias exprimem o seu valor no mesmo equivalente e qualquer espécie de mercadorias que surja de novo tem de fazer o mesmo. Torna-se deste modo visível que a objectividade de valor das mercadorias, porque é a mera «existência social» dessas coisas, também só pode ser expressa por meio da sua relação social omnilateral e, por isso, a sua forma-valor tem de ser uma forma socialmente válida.

Na forma de iguais a tecido de linho, todas as mercadorias aparecem agora não só como iguais qualitativamente, valores em geral, mas simultaneamente como magnitudes de valor quantitativamente comparáveis. Como espelham as suas magnitudes de valor num único material, o tecido de linho, essas magnitudes de valor reflectem-se umas às outras. P. ex., 10 lib. de chá = 20 côvados de tecido de linho e 40 lib. de café = 20 côvados de tecido de linho. Portanto, 10 lib. de chá = 40 lib. de café. Ou, numa 1 lib. de café está metido apenas 1/4 da substância de valor, do trabalho, do que em 1 lib. de chá.

A forma-valor relativa geral do mundo das mercadorias imprime à mercadoria equivalente excluída desse mundo, o tecido de linho, o carácter de equivalente geral. A sua própria forma natural é a figura de valor comum a esse mundo, sendo o tecido de linho, por isso, imediatamente trocável por todas as outras mercadorias. A sua forma corpórea vigora como a encarnação visível, a crisalidação social geral de todo o trabalho humano. A tecelagem, o trabalho privado que produz o tecido de linho, encontra-se simultaneamente numa forma social em geral, a forma da igualdade com todos os outros trabalhos. As inúmeras equações de que a forma-valor geral se compõe igualam, sucessivamente, o trabalho realizado no tecido de linho a todo o trabalho contido em outra mercadoria e fazem assim da tecelagem a forma fenoménica geral de trabalho humano em geral. Assim, o trabalho objectivado no valor das mercadorias não é apresentado apenas negativamente, como trabalho em que se abstrai de todas as formas concretas e propriedades úteis dos trabalhos reais. A sua própria natureza positiva destaca-se expressamente. Ela é a redução de todos os trabalhos reais ao carácter de trabalho humano que lhes é comum, ao dispêndio de força de trabalho humana.

A forma-valor geral, que apresenta os produtos de trabalho como meras gelatinas de trabalho humano indiferenciado, mostra, através do seu próprio travejamento, que é a expressão social do mundo das mercadorias. Assim, ela revela que, no interior desse mundo, o carácter humano geral do trabalho forma o seu carácter especificamente social.

2. Relação de desenvolvimento entre a forma-valor relativa e a forma de equivalente

Ao grau de desenvolvimento da forma-valor relativa corresponde o grau de desenvolvimento da forma de equivalente. Mas é preciso notar bem que o desenvolvimento da forma de equivalente é apenas expressão e resultado do desenvolvimento da forma-valor relativa.

A forma-valor relativa simples ou singularizada de uma mercadoria faz de uma outra mercadoria equivalente singular. A forma desdobrada do valor relativo, essa expressão do valor de uma mercadoria em todas as outras mercadorias, imprime-lhes a forma de equivalentes particulares de espécie diversa. Finalmente, uma espécie particular de mercadorias adquire a forma de equivalente geral porque todas as outras mercadorias fazem dela material da sua forma-valor geral, unitária.

Porém, no mesmo grau em que a forma-valor em geral se desenvolve, desenvolve-se também a oposição entre os seus dois pólos, a forma-valor relativa e a forma de equivalente.

A primeira forma — 20 côvados de tecido de linho = 1 casaco — contém já esta oposição, mas não a fixa. Consoante a mesma equação seja lida de trás para a frente ou de frente para trás, cada um dos dois extremos-mercadorias, o tecido de linho e o casaco, se encontra por igual, ora na forma-valor relativa ora na forma de equivalente. Aqui, dá ainda trabalho fixar a oposição polar.

Na forma II só uma espécie de mercadorias de cada vez pode desdobrar totalmente o seu valor relativo ou então ela própria só possui forma-valor relativa desdobrada porque e na medida em que todas as outras mercadorias se encontram, em relação a ela, na forma de equivalente. Aqui já não se podem inverter os dois membros da equação de valor — como 20 côvados de tecido de linho = 1 casaco ou = 10 lib. de chá ou = 1 quarter de trigo, etc. — sem alterar o seu carácter global e sem a transformar de forma-valor total na forma-valor geral.

A última forma, a forma III, finalmente, dá ao mundo das mercadorias uma forma-valor relativa social geral porque e na medida em que, com uma única excepção, todas as mercadorias que lhe pertencem estão excluídas da forma de equivalente geral. Uma mercadoria, o tecido de linho, encontra-se por isso na forma de troca-bilidade imediata por todas as outras mercadorias ou em forma imediatamente social porque e na medida em que todas as outras mercadorias não se encontram nessa forma(17*).

Inversamente, a mercadoria que figura como equivalente geral está excluída da forma-valor relativa unitária e, por isso, geral, do mundo das mercadorias. Se o tecido de linho, i. é, qualquer mercadoria que se encontre na forma de equivalente geral, participasse também, simultaneamente, da forma-valor relativa geral, então teria de servir de equivalente a si própria. Teríamos então 20 côvados de tecido de linho = 20 côvados de tecido de linho, uma tautologia, em que não se expressa nem valor nem magnitude de valor. Para exprimir o valor relativo do equivalente geral temos antes de inverter a forma III. O equivalente não possui nenhuma forma-valor relativa comum às outras mercadorias: o seu valor exprime-se relativamente na série infinita de todos os outros corpos de mercadorias. Assim, a forma-valor relativa desdobrada ou forma II aparece agora como a forma-valor relativa específica da mercadoria equivalente.

3. Transição da forma-valor geral para a forma-dinheiro

A forma de equivalente geral é uma forma do valor em geral. Pode, pois, ser atribuída a qualquer mercadoria. Por outro lado, uma mercadoria só se encontra na forma de equivalente geral (forma III) porque e na medida em que é excluída por todas as outras mercadorias como equivalente. E só a partir do momento em que essa exclusão se limita definitivamente a uma espécie de mercadorias específica é que a forma-valor relativa unitária do mundo das mercadorias adquire solidez objectiva e validade social em geral.

A espécie de mercadorias específica com cuja forma natural a forma de equivalente socialmente se funde torna-se agora na mercadoria-dinheiro ou funciona como dinheiro. Desempenhar o papel de equivalente geral no interior do mundo das mercadorias torna-se a sua função especificamente social e, por isso, o seu monopólio social. Entre as mercadorias que figuram na forma II como equivalentes particulares do tecido de linho e exprimem na forma III, conjuntamente, o seu valor relativo em tecido de linho, uma mercadoria determinada, o ouro, conquistou historicamente esse lugar. Assim, na forma III, se pusermos a mercadoria ouro no lugar da mercadoria tecido de linho, temos:

D) Forma-dinheiro
20 côvados de tecido de linho = 2 onças de ouro
1 casaco =
10 lib. de chá  =
40 lib. de café     =
1 quarter de trigo  =
2 onças de ouro    =
1/2 tonelada de ferro =

Na transição da forma I para a forma II, da forma II para a forma III, têm lugar transformações essenciais. Em contrapartida, a forma IV em nada se diferencia da forma III, a não ser pelo facto de agora, em vez do tecido de linho, ser o ouro a possuir a forma de equivalente geral. Na forma IV, o ouro continua a ser o que o tecido de linho era na forma III — equivalente geral. O progresso consiste apenas no facto de a forma de trocabilidade geral imediata ou a forma de equivalente geral se fundir agora, definitivamente, por hábito social, com a forma natural específica da mercadoria ouro.

O ouro só defronta as outras mercadorias como dinheiro porque já antes esteve frente a elas como mercadoria. Tal como todas as outras mercadorias, ele funcionou também como equivalente, fosse como equivalente singular em actos de troca singulares, fosse como equivalente particular ao lado de outros equivalentes-mercadorias. Em círculos mais estreitos ou mais amplos, ele foi gradualmente funcionando como equivalente geral. Assim que conquistou o monopólio desse lugar na expressão de valor do mundo das mercadorias, tornou-se mercadoria-dinheiro, e só a partir do momento em que ele já se tornou mercadoria-dinheiro é que a forma IV se diferencia da forma III ou que a forma-valor geral se transforma na forma-dinheiro.

A expressão de valor relativa simples de uma mercadoria, p. ex., do tecido de linho, na mercadoria que já funciona como mercadoria-dinheiro, p. ex., o ouro, é a forma-preço. Daí, a «forma-preço» do tecido de linho:

20 côvados de tecido de linho = 2 onças de ouro
ou, se 2 lib. esterl. forem o nome monetário de duas onças de ouro,
20 côvados de tecido de linho = 2 lib. esterl.

A dificuldade no conceito da forma-dinheiro limita-se à compreensão da forma de equivalente geral, portanto, da forma-valor geral, em geral, a forma III. A forma III resolve-se, reversamente, na forma II, a forma-valor desdobrada, e o seu elemento constituinte é a forma I: 20 côvados de tecido de linho = 1 casaco ou x de mercadoria A = y de mercadoria B. A forma-mercadoria simples é, por isso, o germe da forma-dinheiro.


Notas de rodapé:

(1*) Os poucos economistas que, como S. Bailey, se ocuparam da análise da forma-valor não conseguiram chegar a nenhum resultado, primeiro, porque confundiram forma-valor e valor, segundo, porque, sob a tosca influência do burguês prático, eles desde o início encaram exclusivamente a determinidade quantitativa. «O comando da quantidade... constitui o valor.» (Money and its Vicissitudes, Lond., 1837, p. 11.) Autor S. Bailey. (retornar ao texto)

(2*) Nota à 2.a edição. O famoso Franklin, um dos primeiros economistas que, depois de William Petty, penetrou na natureza do valor, diz: «Não sendo o comércio em geral senão a troca de trabalho por trabalho(3*), o valor de todas as coisas é... do modo mais ajustado medido pelo trabalho.» (The Works of B. Franklin, etc, edited by Sparks, Boston, 1836, v. II, p. 267.) Franklin não está consciente de que, na medida em que avalia o valor de todas as coisas «em trabalho», abstrai da diversidade dos trabalhos trocados — e, assim, o reduz a trabalho humano igual. Embora não o saiba, ele di-lo. Ele fala primeiro de «um trabalho», depois do «outro trabalho», e finalmente de «trabalho» sem outra designação como substância do valor de todas as coisas. (retornar ao texto)

(3*) No original inglês: of labour for labour. Marx traduz: de um trabalho por outro trabalho (Nota da edição portuguesa.) (retornar ao texto)

(4*) De certa maneira, acontece ao homem o mesmo que à mercadoria. Como ele não vem ao mundo nem com um espelho nem como filósofo fichteano eu sou eu —, o homem começa por se ver ao espelho num outro homem. Só através da relação com o homem Paulo como seu igual é que o homem Pedro se relaciona consigo próprio como homem. Mas, assim, Paulo, dos pés à cabeça, na sua corporalidade pauliana, também vale para ele como forma fenoménica do Genus(5*) Homem. (retornar ao texto)

(5*) Em latim no texto: Gênero. (Nota da edição portuguesa.) (retornar ao texto)

(6*) A expressão «valor», como ocasionalmente já aconteceu atrás, numa ou noutra passagem, é aqui usada como valor quantitativamente determinado, ou seja, como magnitude de valor. (retornar ao texto)

(7*) Nota à 2.a ed. Esta incongruência entre a magnitude de valor e a sua expressão relativa foi explorada com a habitual perspicácia pela economia vulgar. Um exemplo: «Uma vez admitido que A baixa porque B, pelo qual é trocado, sobe, embora entretanto não seja despendido menos trabalho em A, o vosso princípio geral do valor cai por terra... Se ele [Ricardo] admitiu que, quando A aumenta de valor relativamente a B, B baixa de valor relativamente a A, tirou o terreno em que assentava a sua magna proposição segundo a qual o valor de uma mercadoria é sempre determinado pelo trabalho nela corporizado; pois, se uma mudança no custo de A altera não só o seu próprio valor em relação a B, pelo qual é trocado, mas também o valor de B relativamente ao de A, apesar de não ter ocorrido nenhuma mudança na quantidade de trabalho para produzir B, então cai por terra não só a doutrina que assevera que a quantidade de trabalho despendida num artigo regula o seu valor, como também a que afirma que o custo de um artigo regula o seu valor.» (J. Broadhurst, Political Economy, London, 1842, pp. 11, 14.) O senhor Broadhurst podia igualmente dizer: consideremos as relações numéricas 10/20, 10/50, 10/100, etc. O número 10 permanece inalterado e, no entanto, a sua grandeza proporcional, a sua grandeza relativamente aos denominadores 20, 50, 100, diminui constantemente. Portanto, cai por terra o grande princípio de que a grandeza de um número inteiro, como, p. ex., 10, é «regulada» pelo número de unidades nele contidas. (retornar ao texto)

(8*) Em latim no texto: note bem. (Nota da edição portuguesa.) (retornar ao texto)

(9*) Com estas determinações de reflexão(10*), em geral, passa-se uma coisa curiosa. Um homem, p. ex., só é rei porque outros homens se comportam em relação a ele como súbditos. Inversamente, eles crêem ser súbditos por ele ser rei. (retornar ao texto)

(10*) Alusão à categoria hegeliana de «determinações de reflexão [Reflexionsbestimmungen]», caracterizadas por, no âmbito da «lógica da essência», a sua verdade consistir na sua ligação recíproca. Cf. Hegel, Wissenschaft der Logik, I. Teil, 2. Buch, I Abschnitt, 2. Kapitel, C, Anmerkung 1. (Nota da edição portuguesa) (retornar ao texto)

(11*) Alusão ao provérbio alemão Kleid machen Leute, literalmente: A roupa faz a gente, isto é, o hábito faz o monge. (Nota da edição portuguesa.) (retornar ao texto)

(12*) Nota à 2.ª ed. F. L. A. Ferrier (sous-inspecteur des douanes(13*)), Du gouvernement considere dans ses rapports avec le commerce. Paris, 1805, e Charles Ganilh, Des systèmes d'économie politique, 2ème ed., Paris, 1821.(retornar ao texto)

(13*) Em francês no texto: subinspector das alfândegas. (Nota da edição portuguesa.) (retornar ao texto)

(14*) Em francês no texto: caixeiros-viajantes. (Nota da edição portuguesa.) (retornar ao texto)

(15*) Nota à 2.ª ed. Em Homero, p. ex., o valor de uma coisa é expresso numa série de coisas diversas. (retornar ao texto)

(16*) Fala-se, por isso, do valor-casaco do tecido de linho quando se apresenta o seu valor em casacos; do seu valor-cereal, quando ele se apresenta em cereal, etc. Cada uma destas expressões diz que o seu valor é o que aparece nos valores de uso casaco, cereal, etc. «Denotando o valor de qualquer mercadoria a sua relação na troca podemos falar dele como... valor-cereal, valor-tecido, de acordo com a mercadoria com que ele é comparado; assim, há mil diferentes espécies de valor, tantas espécies de valor quantas as mercadorias que existem e todas são igualmente reais e igualmente nominais.» (A Criticai Dissertation on the Nature, Measures, and Causes of Value; Chiefly in Reference to the Writings of Mr. Ricardo and His Followers. By the Author of Essays on the Formation, etc, of Opinions, London, 1825, p. 39.) S. Bailey autor deste escrito anónimo, que a seu tempo deu muito brado em Inglaterra, presume, com esta indicação sobre as muitas expressões relativas do mesmo valor das mercadorias, ter aniquilado toda a determinação conceptual do valor. Que ele, de resto, apesar da tacanhez própria, tinha sondado pontos fracos da teoria de Ricardo, demonstrou-o a irritação com que a escola de Ricardo o atacou, p. ex., na Westminster Review." (retornar ao texto)

(17*) De facto, na forma de trocabilidade imediata geral de modo nenhum é evidente que ela seja uma forma-mercadoria opositiva, tão indissociável da forma de trocabilidade não imediata como a positividade de um pólo magnético da negatividade do outro. Pode, por isso, imaginar-se que se poderia imprimir a todas as mercadorias, simultaneamente, o cunho da trocabilidade imediata, tal como se pode imaginar que se poderia transformar todos os católicos em papas. Para o pequeno burguês, que vislumbra na produção de mercadorias o nec plus ultra(18*) da liberdade humana e da independência individual, seria naturalmente muito desejável ver-se livre dos inconvenientes ligados a esta forma, nomeadamente também da não trocabilidade imediata das mercadorias. O socialismo de Proudhon — que, como mostrei noutro lugar[N31], nem possui sequer o mérito da originalidade, mas antes foi desenvolvido de longe melhor por Gray, Bray e outros muito antes dele — consiste na figuração desta utopia filistina. Isto não impede tal sabedoria de grassar actualmente, em certos círculos, sob o nome de «science»(19*). Nunca uma escola encheu mais a boca com a palavra science do que a de Proudhon, já que «onde os conceitos faltam, em tempo oportuno acorre uma palavra»[N32].(retornar ao texto)

(18*) Em latim no texto: cúmulo. (retornar ao texto)

(19*) Em francês no texto: «ciência». (Nota da edição portuguesa.) (retornar ao texto)

Notas de fim de tomo:

[N27] Marx utiliza aqui um diálogo da crónica histórica de Shakespeare Henrique IV, parte I. Na cena 3 do III acto Falstaff diz à viúva Quickly [Expedita] que «não se sabe por onde lhe pegar». Ao que ela responde: «Es injusto ao dizer isso: tu e qualquer outro homem sabem por onde me pegar.» (retornar ao texto)

[N28] «Paris vaut bien une messe» («Paris vale bem uma missa») — palavras atribuídas a Henrique IV de França, ditas em 1593 a propósito da promessa dos parisienses de o reconherem como rei se ele mudasse do protestantismo para o catolicismo. (retornar ao texto)

[N29] Marx dita aqui a obra de Aristóteles Ética a Nicómaco, segundo Aristotelis opera ex recensione Immanuelis Bekkeri. Tomus IX. Oxonii, 1837, pp. 99, 100 [V, 5, 133b 28, 18-21]. (retornar ao texto)

[N30] Lombard Street — rua da City (centro financeiro de Londres) onde se encontra uma série de grandes bancos; sinónimo de mercado financeiro londrino. (retornar ao texto)

[N31] Karl Marx, Misère de la philosophie. Réponse à la philosophie de la misère de M. Proudhon, Paris, Bruxelles, 1847, cap. 1. [Cf. Miséria da Filosofia. Resposta à Filosofia da Miséria do Sr. Proudhon, Edições «Avante!», Lisboa, 1991, pp. 31-91.] (retornar ao texto)

[N32] Goethe, Fausto, parte I, cena 4 («Gabinete de Trabalho»). (retornar ao texto)

Inclusão 29/11/2011