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O Capital
Crítica da Economia Política
Karl Marx

Livro Primeiro: O processo de produção do capital

Terceira Secção: A Produção da mais-valia absoluta

Sétimo capítulo: A Taxa da mais-valia


2. Manifestação do valor-produto em partes proporcionais do produto


capa

Voltemos agora ao exemplo que nos mostrou como o capitalista faz capital a partir de dinheiro. O trabalho necessário do seu fiandeiro ascendeu a 6 horas, o sobretrabalho o mesmo; o grau de exploração da força de trabalho, portanto, a 100%.

O produto do dia de trabalho de 12 horas são 20 lib. de fio no valor de 30 sh. Não menos do que 8/10 deste valor de fio (24 sh.) são formados pelo valor, que apenas reaparece, dos meios de produção consumidos (20 lib. de algodão: 20 sh., fusos, etc: 4 sh.), ou consistem em capital constante. Os restantes 2/10 são o novo valor de 6 sh. — surgido durante o processo de fiação —, dos quais metade substituem o valor diário adiantado da força de trabalho ou o capital variável e a outra metade forma uma mais-valia de 3 sh. O valor total das 20 lib. de fio é, portanto, composto do seguinte modo: form.

Dado que este valor total se manifesta no produto total de 20 lib. de fio, também os diversos elementos de valor têm de ser manifestáveis em partes proporcionais do produto.

Se existe um valor de fio de 30 sh. em 20 lib. de fio, então existem 8/10 deste valor, ou a sua parte constante de 24 sh., em 8/10 do produto, ou em 16 lib. de fio. Destas, 13 1/3 lib. manifestam o valor da matéria-prima, do algodão fiado: 20 sh., e 2 2/3 lib., o valor das matérias auxiliares e meios de trabalho consumidos, fusos, etc: 4 sh.

Portanto, 13 1/3 libras de fio representam todo o algodão fiado no produto total de 20 lib. de fio, a matéria-prima do produto total, mas também mais nada. Nelas estão metidas apenas 13 1/3lib. de algodão no valor de 13 1/3 sh., mas o seu valor acrescentado de 6 2/3 sh. forma um equivalente do algodão [Baumwolle] fiado nas outras 6 2/3 lib. de fio. E como se o algodão [Wolle] fosse arrancado a estas últimas e todo o algodão do produto total fosse acumulado em 13 1/3 libras de fio. Estas, pelo contrário, não contêm agora nenhum átomo do valor das matérias auxiliares e meios de trabalho gastos, nem do novo valor criado no processo de fiação.

Do mesmo modo, as restantes 2 2/3 lib. de fio — em que está metido o resto do capital constante (= 4 sh.) — não manifestam senão o valor das matérias auxiliares e meios de trabalho gastos no produto total de 20 lib. de fio.

Oito décimos do produto, ou 16 lib. de fio, ainda que considerados corporeamente, como valor de uso, como fio, sejam criações do trabalho de fiação tanto como as restantes partes do produto, não contêm, pois, nesta conexão qualquer trabalho de fiação, qualquer trabalho sugado durante o próprio processo de fiação. É como se, sem fiação, se tivessem transformado em fio e como se a sua figura de fio fosse pura mentira e ilusão. De facto, se o capitalista os vende por 24 sh. e, com eles, volta a comprar os seus meios de produção, vê-se que 16 lib. de fio são apenas algodão, fuso, carvão, etc, disfarçados.

Inversamente, os restantes 2/10 do produto ou 4 lib. de fio não manifestam agora senão o novo valor de 6 sh. produzido no processo de 12 horas de fiação. O que neles estava metido do valor das matérias-primas e meios de trabalho gastos fora já estripado e incorporado às primeiras 16 lib. de fio. O trabalho de fiação corporizado em 20 lib. de fio está concentrado em 2/10 do produto. É como se o fiandeiro tivesse tecido 4 lib. de fio com ar ou com algodão e fusos que, dados pela Natureza sem adição de trabalho humano, não acrescentassem ao produto qualquer valor.

Das 4 lib. de fio em que existe assim todo o produto-valor do processo diário de fiação, uma metade manifesta apenas o valor de substituição da força de trabalho gasta, portanto o capital variável de 3 sh.; as outras 2 lib. de fio, apenas a mais-valia de 3 sh.

Dado que 12 horas de trabalho do fiandeiro se objectivam em 6 sh., no valor de fio de 30 sh. estão objectivadas 60 horas de trabalho. Elas existem em 20 lib. de fio, das quais 8/10 ou 16 lib. são a materialização de 48 horas de trabalho passadas antes do processo de fiação, a saber, do trabalho objectivado nos meios de produção do fio; pelo contrário, 2/10 ou 4 lib. são a materialização das 12 horas de trabalho despendidas no próprio processo de fiação.

Vimos anteriormente que o valor do fio é igual à soma do novo valor gerado na sua produção mais os valores já preexistentes nos seus meios de produção. Agora viu-se como as partes integrantes — funcional ou conceitualmente diversas — do valor do produto são manifestáveis em partes proporcionais do próprio produto.

Esta decomposição do produto — do resultado do processo de produção — num quantum de produto que apenas manifesta o trabalho contido nos meios de produção, ou a parte constante de capital, num outro quantum que apenas manifesta o trabalho necessário acrescentado no processo de produção, ou a parte variável de capital, e num último quantum de produto que apenas manifesta o sobretrabalho acrescentado no mesmo processo, ou a mais-valia, é tão simples quanto importante, como mostrará a sua posterior aplicação a problemas complicados e ainda sem solução.

Considerámos, precisamente, o produto total como resultado acabado do dia de trabalho de 12 horas. Todavia, podemos também acompanhá-lo no seu processo de surgimento e, no entanto, manifestar os produtos parcelares como partes do produto funcionalmente diversas.

O fiandeiro produz em 12 horas 20 lib. de fio, portanto em 1 hora 1 2/3 e em 8 horas 13 1/3 libras, logo um produto parcelar do valor total do algodão que é fiado durante todo o dia de trabalho.

Da mesma maneira, o produto parcelar da hora e 36 minutos seguintes é = 2 2/3 lib. de fio e manifesta assim o valor dos meios de trabalho gastos durante as 12 horas de trabalho. Do mesmo modo, o fiandeiro produz na hora e 12 minutos seguintes 2 lib. de fio = 3 sh., um valor-produto igual ao produto-valor todo que ele cria em 6 horas de trabalho necessário. Por fim, ele produz igualmente nos últimos 6/5 de hora 2 lib. de fio, cujo valor é igual à mais-valia gerada pelo seu sobretrabalho de meio dia. Este modo de cálculo serve ao fabricante inglês para uso doméstico e dirá, p. ex., que recuperou os custos do seu algodão nas primeiras 8 horas ou 2/3 do dia de trabalho, etc. Vê-se que a fórmula é correcta; de facto, é apenas a primeira fórmula transposta do espaço, onde as partes do produto repousam acabadas umas ao lado das outras, para o tempo, onde elas se seguem umas às outras. Todavia, a fórmula pode também ser acompanhada por representações muito bárbaras, nomeadamente em cabeças que também estão não menos interessadas praticamente no processo de valorização quanto têm interesse em o entender teoricamente mal. Então pode-se imaginar que o nosso fiandeiro, p. ex., nas primeiras 8 horas do seu dia de trabalho, produz ou substitui o valor do algodão; na hora e 36 minutos seguintes, o valor dos meios de trabalho consumidos; na hora e 12 minutos seguintes, o valor do salário; e só dedica a famosíssima «última hora» ao dono da fábrica, à produção de mais-valia. Ao fiandeiro é assim imputado o duplo milagre de produzir algodão, fuso, máquina a vapor, carvão, óleo, etc, no mesmo instante em que com eles fia e de fazer cinco dias de um dia de trabalho de dado grau de intensidade. No nosso caso, nomeadamente, a produção de matéria-prima e dos meios de trabalho exige 24/6 = 4 dias de trabalho de 12 horas, e a sua transformação em fio um outro dia de trabalho de 12 horas. Que a ganância crê em tais milagres e nunca lhe falta o sicofanta doutrinário que os demonstre, mostra-o agora um exemplo de celebridade histórica.


Inclusão 31/12/2011