A Insurreição Armada e a Nossa Tática

J. V. Stálin

15 de julho de 1905


Primeira Edição: Jornal "Proletariatis Brdzola" (A Luta do Proletariado), n.º10,  15 de julho de 1905.
Fonte: J.V. Stálin - Obras 1º vol. -traduzida da edição italiana  da Obras Completas de Stálin publicada pela Edizioni Rinascita, Roma, 1949.
Tradução de:........
Transcrição e HTML de: Fernando A. S. Araújo, dezembro 2005.
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O movimento revolucionário "no momento atual já atingiu um ponto em que se torna necessária a insurreição armada"; este pensamento, expresso pelo terceiro Congresso do nosso Partido, vem dia a dia recebendo novas confirmações. A chama da revolução arde cada vez mais forte, suscitando aqui e ali insurreições locais. Três dias de barricadas e de lutas de rua em Lodz, uma greve de muitas dezenas de milhares de operários em Ivanovo-Voznessensk, com inevitáveis encontros sangrentos com a tropa, insurreição em Odessa, "amotinação" na frota do Mar Negro e das tripulações da frota de Libau, a "semana" de Tíflis, tudo isso são presságios da tempestade que se aproxima. Ela se aproxima, aproxima-se de modo irresistível, e, se não for hoje, amanhã desabará sobre a Rússia e como uma poderosa torrente purificadora varrerá do caminho todas as coisas velhas e pútridas, libertará o povo russo de seu opróbrio multissecular, que se chama autocracia. Os derradeiros esforços convulsivos do tzarismo - a intensificação de todos os gêneros de repressão, a decretação do estado de sítio na metade do país, a multiplicação das forças e, junto a tudo isso, os discursos tentadores dirigidos aos liberais e as enganadoras promessas de reforma -não o livrarão de seu destino histórico. Os dias da autocracia estão contados, a tempestade é inevitável. Já vem nascendo uma ordem nova, saudada por todo o povo, que dela espera a renovação e o renascimento.

Que novos problemas coloca diante de nosso Partido essa tempestade que se aproxima? Como devemos adaptar nossa organização e nossa tática às novas exigências da vida, para ter uma participação mais ativa e organizada na insurreição, que constitui o único e necessário início da revolução? Para dirigir a insurreição devemos nós, destacamento de vanguarda dessa classe que não é apenas uma vanguarda, mas também a principal força operante da revo1ução, criar organismos especiais, ou basta para esse fim o atual mecanismo do Partido?

Essas questões já se acham colocadas diante do Partido há alguns meses, e exigem uma solução urgente. Para aqueles que têm o culto da "espontaneidade", que rebaixam a função do Partido a um simples acompanhamento do curso da vida, que se arrastam a reboque e não marcham à testa, como condiz com o destacamento consciente de vanguarda, não existem tais questões. A insurreição é espontânea, dizem eles, não é possível organizá-la e prepará-la; todo plano de ação elaborado previamente é uma utopia (são contrários a qualquer "plano"; plano é "consciência" e não "fenômeno espontâneo"!), é um inútil desperdício de forças; a vida social possui os seus caminhos inexplorados e reduzirá a frangalhos todos os nossos projetos. Por isso nós -dizem eles -devemos limitar-nos apenas à propaganda e à agitação da idéia da insurreição, da idéia do "auto-armamento" das massas; devemos exercer apenas a "direção política", e quanto ao povo insurreto, quem quiser que o dirija "tècnicamente".

Mas até o presente momento sempre agimos, de fato, nesse sentido! -objetam os adversários da "política seguidista". É evidente que uma ampla agitação e propaganda, que uma direção política do proletariado são absolutamente necessárias. Limitar-se, porém, a essas tarefas de ordem geral significa que ou evitamos responder à questão colocada diretamente pela vida, ou revelamos uma total incapacidade para adaptar nossa tática às exigências da luta revolucionária em impetuoso desenvolvimento. Daí se depreende que devemos, agora, decuplicar a agitação política, que devemos esforçar-nos por submeter à nossa influência não apenas o proletariado, mas também as inúmeras camadas do "povo" que pouco a pouco se aproximam da revolução, que devemos esforçar-nos para popularizar em todas as classes da população a idéia da necessidade da insurreição. Mas não podemos limitar-nos a isso somente! A fim de que o proletariado possa utilizar para os fins de sua luta de classe a revolução que se aproxima, a fim de que possa instaurar a ordem democrática que mais do que qualquer outra assegure a luta ulterior pelo socialismo, é indispensável que o proletariado, em torno do qual cerra fileiras a oposição, não somente se encontre no centro da luta, mas também se torne o chefe e o dirigente da insurreição. A direção técnica e a preparação orgânica da insurreição em toda a Rússia constituem exatamente a nova tarefa que a vida colocou perante o proletariado. E se o nosso Partido quer ser o dirigente político efetivo da classe operária, não pode e não deve recusar-se a realizar estas novas tarefas.

Que devemos fazer então para alcançar esse objetivo? Quais devem ser os nossos primeiros passos?

Muitas das nossas organizações já resolveram praticamente a questão, empregando parte de suas forças e de seus meios em armar o proletariado. Nossa luta contra a autocracia entrou agora num período em que a necessidade do armamento é por todos reconhecida. Mas é certo que não basta a consciência da necessidade do armamento, é necessário apresentar ao Partido, a tarefa prática de modo claro e direto. Para isso, nossos comitês devem empenhar-se sem delongas em armar o povo localmente, em criar grupos especiais para executar esse trabalho, em organizar grupos distritais para conseguir as armas, em organizar laboratórios para a preparação de várias substâncias explosivas, em elaborar um plano de ocupação dos depósitos de armas e dos arsenais privados e estatais. Não devemos armar o povo apenas com "a ardente necessidade do auto-armamento", como nos aconselha a nova Iskra, mas devemos também "tomar as mais enérgicas medidas no sentido de armar o proletariado", segundo o compromisso que nos fez assumir o terceiro Congresso do Partido. Para resolver esta questão é-nos mais fácil que qualquer outra coisa chegar a um acordo seja com a fração que se separou do Partido (se é que pensa efetivamente, com seriedade, no armamento, e não se limita a tagarelar sobre a "ardente necessidade do auto-armamento"), seja com as organizações social-democráticas nacionais, como, por exemplo, os federalistas armênios e outros, que se traçaram a mesma tarefa. Uma tentativa desse gênero já foi feita em Baku, onde após o massacre de fevereiro, nosso comitê, o grupo "Balakhano-Bibi-Eibat" e o comitê dos guentchakistas(1) escolheram, em seu próprio seio, uma comissão organizadora para o armamento. É absolutamente necessário que esse trabalho difícil e de responsabilidade, seja organizado por um esforço geral, e consideramos que os cálculos dos fracionistas devem representar um obstáculo o menor possível à união de todas as forças social-democráticas nesse terreno.

Simultaneamente ao aumento das reservas de armas e à organização de sua busca e de sua preparação em fábricas especiais, é necessário dedicar a mais séria atenção à criação de toda espécie de grupos de combate para a utilização das armas de que nos apossarmos. Em caso algum devem ser permitidas ações tais como a entrega de armas diretamente às massas. Já que dispomos de poucos meios e é muito difícil esconder as armas aos olhos vigilantes da polícia, não conseguiremos armar camadas mais ou menos consideráveis da população, e nossos esforços cairão no vazio. Coisa muito diferente se verificará quando tivermos criado uma organização especial de combate. Nossos grupos de combate aprenderão a fazer bom uso das armas; durante a insurreição -quer ela comece espontaneamente quer seja previamente preparada - agirão como destacamentos principais e de vanguarda, em torno deles reunirá o povo insurreto e sob sua direção irá ao combate. Graças à sua experiência e capacidade organizadora, e graças, ainda, ao bom armamento, será possível utilizar todas as forças do povo insurreto e assim alcançar o objetivo imediato: o armamento de todo o povo e a execução de um plano de ação previamente estabelecido. Esses grupos ocuparão ràpidamente os diversos depósitos de armas, as instituições governamentais e sociais, os correios, os telégrafos, etc., o que será indispensável ao ulterior desenvolvimento da revolução.

No entanto esses grupos de combate não são necessários apenas quando a insurreição revolucionária já se haja alastrado por toda a cidade; sua função não é menos importante também às vésperas da insurreição. Nos últimos seis meses chegamos à clara convicção de que a autocracia, desacreditada aos olhos de todas as classes da população, concentrou todas as suas energias na mobilização das forças obscurantistas do país, sejam os bandidos profissionais, sejam os elementos menos conscientes e fanatizados dos tártaros, para lutar contra os revolucionários. Armados pela polícia e sob sua proteção, eles aterrorizam a população e criam uma atmosfera pesada para o movimento de libertação. Nossas organizações de combate devem estar sempre prontas a opor a devida resistência a quaisquer tentativas dessas forças obscurantistas, e esforçar-se por transformar o desprezo e a resistência suscitados por sua ação, num movimento contra o governo. Os grupos armados de combate, sempre prontos para sair à praça pública e a colocar-se à frente das massas populares, podem fàcilmente alcançar o objetivo apontado pelo terceiro Congresso, "organizar a resistência armada ao ataque das Centúrias Negras e de todos os elementos reacionários em geral, dirigidos pelo governo" (Resolução relativa à tática do governo nas vésperas da revolução Vide Informações)(2).

Uma das principais tarefas dos nossos grupos de combate e, de modo geral, da organização técnico-militar, deve ser a elaboração de um plano de insurreição para cada distrito e sua coordenação com o plano elaborado pelo centro do Partido para toda a Rússia. Descobrir os pontos mais débeis do adversário, indicar os pontos dos quais se deve atacá-lo, distribuir todas as forças no distrito, estudar a topografia da cidade, tudo isso deve ser executado preliminarmente, a fim de que em nenhuma circunstância sejamos apanhados de surpresa. É absolutamente fora de propósito examinar aqui, em seus pormenores, este aspecto da atividade de nossas organizações. O completo sigilo na elaboração do plano de ação deve ser acompanhado da mais ampla divulgação possível, entre o proletariado, dos conhecimentos técnico-militares absolutamente necessários para conduzir as lutas de rua. Para a execução dessa tarefa, devemos convocar os militares pertencentes à organização. Podemos também convocar, para isso, muitos outros companheiros nossos, que por sua natural capacidade e por suas tendências; serão muito úteis nesse trabalho.

Somente essa cuidadosa preparação da insurreição poderá assegurar a função dirigente da social-democracia nos combates que se aproximam entre o povo e a autocracia.

Somente uma plena preparação para o combate é que dará ao proletariado a possibilidade de transformar os encontros isolados com a polícia e o exército numa insurreição de todo o povo, a fim de substituir o governo tzarista por um governo revolucionário provisório.

O proletariado organizado, malgrado os partidários da "política seguidista", dedicará todas as suas energias a concentrar, nas próprias mãos a direção, quer técnica, quer política, da insurreição. Essa direção é a condição indispensável graças à qual poderemos utilizar, no interesse de nessa luta de classe, a revolução que se aproxima.

Artigo não assinado.


Notas:

(1) Guentchakistas, membros do partido pequeno-burguês armênio "Guentchak", fundado em Genebra, em 1887, por iniciativa de estudantes armênios. Na Transcaucásia, esse partido tomou o nome de Partido Social-Democrata Armênio e conduziu uma política divisionista no movimento operário. Após a revolução de 1905-1907 degenerou, transformando-se num grupo reacionário nacionalista. (retornar ao texto)

(2) Vide O P.C.(b) da URSS nas resoluções e nas decisões dos congressos, das conferências e sessões plenárias do Comitê Central, parte 1, 6. edição, 1940, pág. 45, ed. russa. (retornar ao texto)

Inclusão 22/12/2005
Última alteração 22/09/2011