A Política do Poder Soviético e a Questão Nacional na Rússia

J. V. Stálin

10 de Outubro de 1920


Primeira Edição:"Pravda" ("A Verdade"), n.° 226, 10 de outubro de 1920.
Fonte: J.V. Stálin - Obras - 4º vol., Editorial Vitória, 1954 - traduzida da edição italiana da Obras Completas de Stálin publicada pela Edizioni Rinascita, Roma, 1949.
Tradução: Editorial Vitória
Transcrição: Partido Comunista Revolucionário
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Fernando A. S. Araújo, setembro 2006.
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Três anos de revolução e de guerra civil na Rússia mostraram que sem o apoio mútuo da Rússia Central e de suas regiões periféricas a vitória da revolução é impossível, e é impossível a libertação da Rússia das garras do imperialismo. A Rússia Central, este foco da revolução mundial, não pode manter-se por muito tempo sem o auxílio das regiões periféricas, ricas em matérias-primas, em combustíveis e em gêneros alimentícios. As regiões periféricas da Rússia, por sua vez, se lhes faltar o auxílio político, militar e organizativo da Rússia Central que é mais desenvolvida, estão condenadas inevitavelmente a suportar o jugo imperialista. Se é verdadeira a tese de que o Ocidente proletário mais bem desenvolvido não pode bater definitivamente a burguesia mundial sem o apoio do Oriente camponês menos desenvolvido, porém rico em matérias-primas e em combustíveis, é igualmente verdadeira a outra tese de que a Rússia Central, mais bem desenvolvida, não pode levar a termo a revolução sem o apoio das regiões periféricas da Rússia, menos desenvolvidas, porém ricas dos recursos necessários.

Indubitavelmente a Entente levou em conta essa circunstância desde os primeiros dias de existência do governo soviético, quando pôs em prática o plano de cerco econômico da Rússia Central, arrancando-lhe as regiões periféricas mais importantes. Em seguida, o plano de cerco econômico da Rússia continuou a figurar na base de todos os ataques da Entente contra a Rússia, de 1918 a 1920, não se excluindo suas atuais maquinações na Ucrânia, no Azerbaidjão e no Turquestão.

Tanto maior é a importância de que se reveste a garantia de uma sólida união entre o Centro e as regiões periféricas da Rússia.

Daí a necessidade de estabelecer determinadas relações, determinados laços entre o Centro e as regiões periféricas da Rússia, de modo a garantir uma união estreita e indissolúvel entre elas.

De que espécie devem ser essas relações e que formas devem assumir?

Em outras palavras: em que consiste a política do Poder Soviético com respeito à questão nacional na Rússia?

A separação da Rússia, reivindicada pelas regiões periféricas como forma de relações entre o Centro e a periferia, deve ser excluída não só porque está em contradição com a própria apresentação do problema no concernente à união entre o Centro e as regiões periféricas, como sobretudo porque está em absoluto contraste com os interesses das massas nacionais, quer do Centro quer das regiões periféricas. Se se prescindir do fato de que a separação das regiões periféricas minaria o poderio revolucionário da Rússia Central, a qual estimula o movimento de libertação do Ocidente e do Oriente, as próprias regiões, após haverem-se separado, cairiam necessariamente debaixo do jugo do imperialismo internacional. Basta lançar um olhar sobre a Geórgia, sobre a Armênia, sobre a Polônia, sobre a Finlândia e sobre as outras regiões- que se separaram da Rússia, que conservaram só a forma exterior da independência, e, de fato, se transformaram em Estados vassalos, submetidos ao poder incondicional da Entente; basta, enfim, recordar a recente história da Ucrânia e do Azerbaidjão, a primeira saqueada pelo capital alemão e o segundo pela Entente, para se compreender todo o caráter contra-revolucionário de que, nas atuais condições internacionais, se reveste essa reivindicação de separação das regiões periféricas. Enquanto lavra uma luta de morte entre a Rússia proletária e a Entente imperialista, apresentam-se diante das regiões periféricas apenas duas saídas: ou junto com a Rússia, e se tem então a libertação das massas trabalhadoras das regiões periféricas do jugo imperialista; ou junto com a Entente, e se tem então o inevitável jugo imperialista.

Uma terceira saída não existe.

A chamada independência das consideradas independentes Geórgia, Armênia, Polônia, Finlândia, etc., não é senão uma falaz aparência, que esconde a completa dependência desses, digamos assim, Estados, deste ou daquele grupo de imperialistas.

Naturalmente, as regiões periféricas da Rússia, as nações e as raças que povoam essas regiões, como, de um modo geral, todas as outras nações, têm o imprescritível direito de separar-se da Rússia, e se qualquer uma dessas nações decidisse em sua maioria separar-se da Rússia, como fez a Finlândia em 1917, a Rússia provavelmente tomaria nota do fato e sancionaria a separação. Mas não se trata aqui dos direitos das nações, que são incontestáveis, e sim dos interesses das massas populares quer do Centro quer das regiões periféricas, trata-se do caráter, determinado, por esses interesses, da agitação que o nosso Partido deve promover se não quiser renegar a si mesmo, se quiser exercer influência sobre a vontade das massas trabalhadoras das várias nacionalidades para dar a essa vontade uma determinada orientação. Pois bem, os interesses das massas populares indicam que a reivindicação de separação das regiões periféricas, na etapa atual da revolução, é profundamente contra-revolucionáría.

Do mesmo modo deve ser excluída a chamada autonomia cultural nacional como forma de união entre o Centro e as regiões periféricas da Rússia. A experiência da Áustria-Hungria (pátria da autonomia cultural nacional) nos últimos dez anos mostrou o quanto esse tipo de autonomia, como forma de união entre as massas trabalhadoras de várias nacionalidades num Estado multinacional, é efêmero e privado de vitalidade. Springer e Bauer, esses descobridores da autonomia cultural nacional, os quais agora, com todo o seu astuto programa nacional, ficaram a ver navios, são uma prova evidente disso. Enfim, o arauto da autonomia cultural nacional da Rússia, o Bund, outrora famoso, foi obrigado não faz muito tempo a reconhecer oficialmente a inutilidade dessa autonomia, declarando abertamente que:

"A exigência da autonomia cultural nacional no quadro do regime capitalista perde seu significado nas condições da revolução socialista" (vide XII Conferência do Bund, 1920, pág. 21).

Resta a autonomia regional das zonas periféricas que se distinguem por particularidades de costumes e por composição étnica, como a única forma racional de união entre o Centro e as regiões periféricas, autonomia que deve unir as regiões periféricas da Rússia ao centro com os laços da união federativa. Isto é, justamente aquela autonomia soviética que o Poder Soviético proclamou desde os primeiros dias de sua existência e que é posta agora em prática nas regiões periféricas sob formas de comunas administrativas e de repúblicas soviéticas autônomas.

A autonomia soviética não é algo de cristalizado e de fixado de uma vez por todas; ela admite as mais variadas formas e os mais variados graus de desenvolvimento. Da estrita autonomia administrativa (alemães do Volga, tchuvachos, carélios) ela passa a uma autonomia mais ampla, política (bachkírios, tártaros do Volga, quirguizes); da autonomia ampla, política, a uma forma ainda mais ampla (Ucrânia, Turquestão) e, enfim, do tipo de autonomia ucraniano à forma suprema de autonomia, às relações estabelecidas por um tratado (Azerbaidjão). Essa maleabilidade de autonomia soviética constitui um dos seus méritos principais, porque lhe permite abranger todas as características heterogêneas das regiões periféricas da Rússia, que se encontram nos mais vários graus de desenvolvimento cultural e econômico. Três anos de política soviética dirigida no sentido de resolver a questão nacional na Rússia mostraram que, realizando a autonomia soviética nas suas variadas formas, o Poder Soviético se encontra no caminho certo, porque só graças a essa política conseguiu penetrar nos mais remotos rincões das regiões periféricas da Rússia, elevar a uma vida política as massas mais atrasadas e diferentes pela nacionalidade, ligar essas massas ao Centro por meio dos mais variados canais, tarefa que nenhum governo no mundo não só não resolveu, mas nem sequer se propôs resolver (pois havia medo de fazê-lo!). A subdivisão administrativa da Rússia, fundada sobre a autonomia soviética, ainda não está ultimada: os caucasianos do norte, os calmucos, os tcheremissos, os votiacos, os buriatas, etc., ainda esperam que a questão seja resolvida; mas qualquer que seja o aspecto que assuma o mapa administrativo da Rússia futura e quaisquer que sejam os erros que possam ser cometidos nesse terreno, e alguns erros foram de fato cometidos, é preciso reconhecer que, pondo em prática a subdivisão administrativa baseada na autonomia regional, a Rússia deu um passo enorme para a frente no caminho do agrupamento das regiões periféricas em torno do Centro proletário, no caminho da aproximação do governo às amplas massas populares dessas regiões.

Mas a proclamação desta ou daquela forma de autonomia soviética, a publicação dos decretos e das disposições correspondentes, e até mesmo a criação de governos regionais sob a forma de conselhos regionais dos comissários do povo das repúblicas autônomas estão longe de ser suficientes para robustecer a união entre as regiões periféricas e o Centro. Para reforçar essa união é necessário, antes de mais nada, liquidar aquele particularismo e aquele espírito de campanário das regiões, aquele caráter patriarcal e aquela falta de cultura, aquela desconfiança contra o centro, que permaneceram nas regiões periféricas, como herança da feroz política do tzarismo. O tzarismo cultivava de propósito nas regiões periféricas o jugo patriarcal feudal, a fim de manter as massas na escravidão e na ignorância. O tzarismo povoava de propósito com colonizadores as mais belas localidades das regiões periféricas para expulsar as massas nacionais locais para as piores zonas e acirrar as inimizades nacionais. O tzarismo punha empecilhos à escola, ao teatro, às instituições culturais locais, ou as suprimia simplesmente, com o fim de manter as massas na ignorância; reprimia qualquer iniciativa dos melhores homens da população das regiões periféricas. Enfim, destruiu qualquer atividade das massas populares dessas regiões. Agindo dessa maneira, fez nascer no seio das massas nacionais locais a mais profunda desconfiança, que talvez se haja transformado em hostilidade contra tudo quanto era russo. Para consolidar a união entre a Rússia Central e as regiões periféricas é preciso que essa desconfiança desapareça, é preciso criar uma atmosfera de compreensão mútua e de confiança fraternal. Mas para fazer desaparecer a desconfiança é preciso antes de mais nada ajudar as massas populares das regiões periféricas a libertarem-se dos restos do jugo patriarcal feudal, é preciso eliminar, eliminar de fato e não só em palavras, todos os privilégios dos colonizadores, é preciso que as massas populares sintam os benefícios materiais da revolução.

Em suma: é preciso demonstrar às massas que a Rússia Central proletária defende os interesses delas, e somente delas, e demonstrá-lo não só por meio de medidas repressivas contra os colonizadores e os nacionalistas burgueses, medidas que muitas vezes as massas não compreendem em absoluto, mas, antes de mais nada, por meio de uma política econômica conseqüente e ponderada.

É do conhecimento de todos que os liberais sempre exigiram a instrução geral obrigatória. Os comunistas das regiões periféricas não podem mostrar-se menos adiantados que os liberais; devem instituir nessas regiões a instrução geral, se quiserem liquidar a ignorância do povo, se quiserem aproximar espiritualmente o Centro e as regiões periféricas da Rússia. Mas para fazer isso é necessário desenvolver uma escola nacional local, um teatro nacional, instituições culturais nacionais, elevar o nível cultural das massas populares das regiões periféricas, porque não é necessário demonstrar que a ignorância e a falta de cultura são o inimigo mais perigoso do Poder Soviético. De um modo geral, não sabemos se prossegue com o êxito ou não o trabalho por nós desenvolvido nesse sentido, mas, ao que nos comunicam, numa das regiões periféricas mais importantes o Comissariado do Povo para a Instrução Pública local emprega nas escolas locais apenas 10% das verbas do seu orçamento. Se isso for verdade, é preciso reconhecer que nesse campo, infelizmente, fomos bem pouco para a frente, em confronto com o "velho regime".

O Poder Soviético não pode ser considerado como um poder desligado do povo; pelo contrário, ele é um poder único no seu gênero, expresso pelas massas populares russas e familiar, próximo delas. Justamente isso é que explica a força inaudita e a maleabilidade que de costume o Poder Soviético manifesta nos momentos críticos.

É preciso que o Poder Soviético se torne igualmente familiar e próximo das massas populares das regiões periféricas da Rússia. Mas para tornar-se familiar, o Poder Soviético deve antes de mais nada tornar-se compreensível a essas massas. É necessário, por isso, que todos os organismos soviéticos nas regiões periféricas, os tribunais, os organismos administrativos, os econômicos, os órgãos imediatos do Poder (e também os organismos partidários), sejam compostos, na medida do possível, de pessoas do lugar, que conheçam os usos e costumes, o caráter, a língua da população local; que nessas instituições se proceda de modo que ingressem todos os melhores homens pertencentes às massas populares do lugar; que se faça com que as massas trabalhadoras participem, em todos os campos, do trabalho de direção do país, inclusive do trabalho das formações militares; que as massas vejam que o Poder Soviético e seus órgãos são obra dos próprios esforços delas, personificação das esperanças delas. Só dessa maneira se pode estabelecer um indissolúvel laço espiritual entre as massas e o Poder, só dessa maneira pode-se tornar o Poder Soviético compreensível e próximo às massas trabalhadoras das regiões periféricas.

Alguns camaradas vêem nas repúblicas autônomas da Rússia e, de um modo geral, na autonomia soviética, um mal temporário mas necessário, que não podia ser evitado por causa de certas circunstâncias, mas contra o qual é preciso lutar de^ maneira que com o tempo possa ser eliminado. Não é necessário demonstrar que essa opinião é absolutamente errada e, em todo o caso, não tem nada que ver com a política do Poder Soviético em relação à questão nacional. A autonomia soviética não pode ser considerada como algo de abstrato e de artificioso, e muito menos como uma simples promessa, uma simples declaração. A autonomia soviética é a forma mais real. mais concreta, de união das repúblicas periféricas com a Rússia Central. Não ocorrerá a ninguém dizer que a Ucrânia, o Azerbaidjão, o Turquestão, a Quirguízia, a Bachkíria, a Tartária e as outras regiões periféricas, ao aspirarem ao desenvolvimento cultural e material das massas populares, não necessitarão de uma escola nacional, de tribunais, de órgãos administrativos e de um governo todos eles compostos principalmente por elementos locais. Além disso, a sovietização efetiva dessas regiões, sua transformação em países soviéticos, estreitamente ligados à Rússia Central num único Estado, são inconcebíveis sem a organização, em vasta escala, de escolas locais, sem a criação de tribunais, de órgãos administrativos e de um poder, etc., compostos de homens que conheçam os costumes e a língua da população. Mas fundar escolas, tribunais, órgãos administrativos e do Poder que se sirvam da língua nacional, significa justamente realizar com fatos a autonomia soviética, uma vez que a autonomia soviética não é senão a soma de todas essas instituições, revestidas das formas ucraniana, turquestana, quirguiz, etc.

Após isso, como é que se pode falar seriamente do caráter efêmero da autonomia soviética, da necessidade de lutar contra ela, etc.?

De duas uma:

ou as línguas ucraniana, azerbaidjana, quirguiz, uzbek, bachkíria e outras são uma realidade efetiva, e portanto é absolutamente necessário desenvolver nessas regiões uma escola nacional, tribunais, órgãos administrativos e do Poder com pessoas do lugar, e então a autonomia soviética deve ser posta em prática nessas regiões até ao fim, sem reservas;

ou as línguas ucraniana, azerbaidjana e outras não passam de vãs invenções, e as escolas e as outras instituições na língua nacional não são necessárias, portanto, e então a autonomia soviética deve ser rejeitada, como inútil traste velho.

A procura de um terceiro caminho é o resultado da ignorância do problema ou de uma lamentável falta de reflexão.

Um dos mais sérios obstáculos que se opõem à realização da autonomia soviética é a grande deficiência de intelectuais locais nas regiões periféricas, a falta de instrutores para todos, absolutamente todos, os setores do trabalho soviético e partidário. Essa falta não pode deixar de dificultar quer o trabalho educativo quer o trabalho revolucionário construtivo nas regiões periféricas. Mas justamente por isso seria insensato, prejudicial, afastar os grupos, já pouco numerosos, de intelectuais do lugar, os quais provavelmente desejariam pôr-se a serviço das massas populares, mas não podem fazê-lo porque, não sendo comunistas, sentem-se rodeados por uma atmosfera de desconfiança e temem possíveis repressões. Com relação a esses grupos, pode ser aplicada com êxito uma política que vise a fazê-los participar do trabalho soviético, uma política tendente a incluí-los no trabalho da indústria, da agricultura, do aprovisionamento e de outra espécie, para obter sua sovietização gradual. É de fato difícil afirmar que esses grupos de intelectuais sejam menos seguros que, digamos, aqueles especialistas militares contra-revolucionários, os quais, apesar de sua natureza contra-revolucionáría, foram postos a trabalhar e depois sovietizados quando já ocupavam postos importantíssimos.

Mas mesmo que se utilizem os grupos de intelectuais do lugar, ainda se está bem longe de poder satisfazer a necessidade que se tem de instrutores. Ao mesmo tempo é necessário desenvolver uma extensa rede de cursos e de escolas nas regiões periféricas, para todos os ramos da administração, com o fim de criar, com a gente do lugar, quadros de instrutores. B isso porque é claro que se não houver tais quadros, a organização. da escola, dos tribunais, dos órgãos administrativos e das outras instituições, em que seja adotada a língua nacional, tornar-se-á extremamente difícil.

Um obstáculo não menos sério para a realização da autonomia soviética é a pressa, que muitas vezes se transforma em grosseira falta de tato, demonstrada por alguns camaradas na sovietização das regiões periféricas. Quando esses camaradas, em regiões que permaneceram atrasadas por um período histórico inteiro com relação à Rússia Central, em regiões nas quais ainda não foi liquidada de todo a ordem medieval, decidem encarregar-se do "heróico esforço" de pôr em prática o "comunismo puro", pode-se dizer com certeza que dessa empresa cavalheiresca, desse "comunismo" não sairá nada de bom. Desejaríamos lembrar a esses camaradas um conhecido ponto do nosso programa, segundo o qual:

"O P.C. da Rússia se atem ao ponto de vista histórico e de classe, e leva em conta o grau de desenvolvimento histórico atingido por uma determinada nação; se se encontra no caminho da idade média para a democracia burguesa ou no da democracia burguesa para a democracia soviética ou proletária, etc."

E mais ainda:

"Em qualquer caso, o proletariado das nações outrora dominantes deve mostrar-se particularmente cauteloso e particularmente respeitoso com os restos de sentimentos nacionais das massas trabalhadoras das nações oprimidas ou que não gozam de plenos direitos" (vide Programa do P.C. da Rússia).

Isto é, se, por exemplo, no Azerbaidjão, a requisição de alguns espaços vagos em residências demasiado grandes para a família que as ocupa, com o objetivo de ali se instalarem novos inquilinos, afasta de nós as massas que consideram a habitação, o lar doméstico, como uma coisa inviolável, sagrada, é claro que a requisição deve ser substituída por um sistema indireto que permita, contornando as dificuldades, alcançar o mesmo objetivo. Ou ainda: se por exemplo as massas do Daguestão, fortemente imbuídas de preconceitos religiosos, seguem os comunistas "na base do chariat"[N109], é claro que o caminho da luta direta contra os preconceitos religiosos, nesse país, deve ser substituído por sistemas indiretos, mais cautelosos, etc., etc.

Em suma: das empresas cavalheirescas pela "imediata comunistização" das massas populares atrasadas é preciso passar a uma política cautelosa e ponderada que canalize gradativamente essas massas para o álveo geral do desenvolvimento soviético.

Tais são, de um modo geral, as condições práticas para realizar a autonomia soviética, cuja aplicação assegurará a aproximação espiritual e uma sólida união revolucionária do Centro com as regiões periféricas da Rússia.

A Rússia Soviética está levando a efeito uma experiência nunca vista até agora no mundo, qual seja a de organizar a colaboração entre uma série inteira de nações e de raças no âmbito de um Estado proletário unitário, colaboração baseada nos princípios da confiança recíproca, nos princípios do entendimento voluntário, fraternal. Três anos de revolução mostraram que essa tentativa tem todas as possibilidades de êxito. Mas só se pode contar com o triunfo pleno no caso de que nossa política prática em relação à questão nacional nas regiões periféricas não esteja em contraste com as exigências da autonomia soviética — que já expusemos — nas suas diversas formas e nos seus diversos graus, no caso de que todas as nossas medidas nos vários lugares favoreçam o objetivo de fazer com que as massas populares das regiões periféricas se aproximem da superior cultura espiritual e material proletária nas formas correspondentes aos costumes e à fisionomia nacional dessas massas.

Isso é garantia do fortalecimento da união revolucionária entre a Rússia Central e as suas regiões periféricas, diante da qual se desfarão todas as maquinações da Entente.

Assinado: J. Stálin.

(veja outra tradução da Editorial Vitória para este texto)


Notas de fim de tomo:

[N109] Chariat (do árabe chariá = o caminho justo): o conjunto das normas que regulam as relações religiosas, civis e jurídicas entre muçulmanos e entre os muçulmanos e os outros povos, em caso de guerra, etc. Esse código, cujas origens remontam ao século VII, formou-se lentamente através dos séculos e serviu ao poder teocrático-militar e às classes dirigentes para manter na escravidão econômica e política as massas muçulmanas. (retornar ao texto)

pcr
Inclusão 18/04/2008