Sobre Organização

J. Stáline


Apêndice II — Sobre os quadros
(Intervenção de DIMÍTROV em resposta à discussão no VII Congresso Mundial da Internacional Comunista, 1935)


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Camaradas, as nossas melhores resoluções não serão mais que pedaços de papel se não houver os homens que as saibam levar à prática. Ora, infelizmente, é forçoso constatar que uma das questões essenciais, a questão dos quadros, não recebeu quase nenhuma atenção durante o Congresso. O relatório sobre a actividade do Comité Executivo da Internacional Comunista foi discutido durante sete dias. Vários oradores, de diferentes países, tomaram a palavra mas só alguns, e de passagem, tocaram nesta questão extremamente importante para os Partidos Comunistas, e o movimento operário. No seu trabalho prático os nossos Partidos ainda estão longe de compreender que os homens, os quadros decidem tudo. São incapazes de fazer o que o camarada Stáline nos ensina, isto é, cuidar dos quadros «como um jardineiro cuida da árvore de fruto preferida», «apreciar os homens, apreciar os quadros, apreciar todos, os trabalhadores capazes de contribuírem para a nossa causa comum».

A atitude de desdém a respeito do problema dos quadros, tanto mais inadmissível porquanto na luta estamos perdendo constantemente alguns dos nossos mais valiosos quadros. Não somos uma sociedade científica mas um movimento combativo que se encontra constantemente na linha de fogo. Os nossos elementos mais enérgicos, mais corajosos e mais conscientes estão nas fileiras da vanguarda.

É precisamente a estes elementos, a estes combatentes progressistas que o inimigo dá caça, assassina-os, atira-os para as prisões, para os campos de concentração, sujeita-os aos piores suplícios, sobretudo nos países fascistas. Isto cria a necessidade urgente de renovar constantemente as fileiras, desenvolvendo e treinando novos quadros bem como de defender cuidadosamente os quadros existentes.

O problema dos quadros adquire ainda uma acuidade particular porque é sob a nossa influência que se desenvolve o movimento massivo da frente única, que produz milhares e milhares de novos militantes operários. Além disso, não são apenas jovens elementos revolucionários, não são apenas trabalhadores que recentemente se tornaram revolucionários, sem nunca terem participado num movimento político, que afluem às nossas fileiras. Muito frequentemente também se vêm juntar a nós antigos aderentes e militantes dos Partidos social-democratas. Estes, novos quadros exigem uma atenção especial, sobretudo nos Partidos Comunistas ilegais, pela razão de que, no seu trabalho prático, estes quadros, fracamente preparados sob o ponto de vista teórico, defrontam frequentemente sérios problemas políticos, que têm de resolver por si próprios.

A questão da justa política em relação aos quadros é uma questão muito séria para os nossos Partidos, bem como para as Juventudes Comunistas e para todas as outras organizações de massas - para todo o movimento operário revolucionário.

Em que consiste uma justa política em relação aos quadros?

— É necessário conhecer os homens. Em regra geral, não se procede nos nossos Partidos ao estudo sistemático dos quadros. Só nos últimos tempos os Partidos Comunistas da França e da Polónia e, no oriente, o Partido Comunista da. China, conseguiram alguns êxitos nesse sentido. Antes de estar na ilegalidade o Partido Comunista da Alemanha abordou o estudo dos seus quadros. E a experiência destes Partidos mostrou-nos que, quando se começaram a estudar os homens, se descobriram militantes que antes tinham passado despercebidos. Por outro lado os Partidos começaram-se a libertar de elementos estranhos que eram, ideológica e politicamente, prejudiciais. Basta lembrar o exemplo de Célor e Barbé era França, os quais, quando observados com o microscópio bolchevique se revelaram agentes do inimigo de classe e foram expulsos do Partido. Na Polónia e na Hungria, a verificação dos quadros facilitou a descoberta de ninhos de provocadores, agentes do inimigo cuidadosamente mascarados.

— É necessário promover judiciosamente os quadros. A promoção de quadros não deve ser uma coisa acidental mas sim uma das funções normais do Partido.

E mau quando a promoção é feita exclusivamente por razões internas do Partido sem ter em conta se o camarada designado para um cargo está ligado às massas. A promoção deve fazer-se tendo em conta a aptidão do militante para cumprir tal ou tal função, dentro do Partido e a sua popularidade entre as massas.

Temos nos nossos Partidos exemplos de promoções que deram excelentes resultados. No Presidium do nosso Congresso, por exemplo, figura a comunista espanhola Dolores. Há dois anos ela fazia ainda trabalho de base. Desde os seus primeiros conflitos com o inimigo de classe, ela revelou-se excelente agitador e lutador. Eleita em seguida para a direcção do Partido, mostrou-se um dos membros mais dignos desta escolha.

Poderia citar numerosos casos análogos em outros países. Contudo na maioria dos casos a promoção faz-se de maneira inorganizada e acidental e, por consequência nem sempre judiciosa. Por vezes são confiados postos de direcção a palradores e fraseadores que prejudicam directamente a causa.

— É necessário utilizar judiciosamente os quadros. É preciso saber avaliar e utilizar convenientemente as qualidades preciosas de cada militante. Não há homens perfeitos: é preciso aceitá-los tais como são e corrigir as suas fraquezas e defeitos. Conhecemos dentro dos nossos Partidos exemplos flagrantes da errada utilização de bons e honestos comunistas que poderiam ser de uma grande utilidade se estivessem encarregados dum trabalho que melhor lhes conviesse.

— É necessário distribuir judiciosamente os quadros. É preciso, antes de tudo, que nos escalões essenciais do movimento sejam colocados homens firmes, ligados às massas, saídos do seu seio, cheios de iniciativa e seguros. É preciso que nos grandes centros haja um número suficiente de tais militantes. Nos países capitalistas a deslocação dos quadros dum lado para o outro não é coisa fácil. Uma tal tarefa defronta um certo número de obstáculos e dificuldades, como questões de ordem material, problemas familiares, etc., dificuldades que devem ser tomadas em conta e resolvidas correctamente. Mas habitualmente descuidamo-nos inteiramente de fazer isto.

— É necessário dar uma ajuda sistemática aos quadros. Esta ajuda deve consistir em instruções minuciosas, controle fraternal, rectificação das deficiências e erros, orientação concreta e diária.

— É necessário velar pela conservação dos quadros. É preciso saber retirar para a rectaguarda, rapidamente, os militantes do Partido, sempre que as circunstâncias o exigem, e substituí-los por outros. Sobretudo em relação aos Partidos ilegais devemos exigir das suas direcções a maior responsabilidade no que respeita à conservação dos quadros. A conservação judiciosa dos quadros supõe também a organizarão conspirativa mais séria dentro do Partido. Em alguns dos nossos Partidos, são numerosos os camaradas que pensam que os Partidos estão preparados para a ilegalidade pelo facto de se terem reagrupado segundo um esquema puramente formal. Tivemos de pagar caro o facto de não se ter começado o reagrupamento efectivo senão depois da passagem à ilegalidade, sob os golpes directos e duros do inimigo. Lembrai-vos o preço que nos custou a passagem à ilegalidade do Partido Comunista da Alemanha. Este exemplo deve ser um sério aviso para aqueles dos nossos Partido que hoje são legais mas que amanhã podem perder a sua legalidade.

Só uma justa política em relação aos quadros permitirá aos nossos Partidos desenvolver e utilizar ao máximo as forças dos quadros existentes e tirar do imenso reservatório do movimento de massas os melhores elementos activos que constantemente surgem.

Que critério essencial deve inspirar-nos na escolha dos quadros?

— A dedicação mais profunda à causa da classe operária, a fidelidade ao Partido, comprovada nas lutas, na prisão, perante o tribunal, face a face com o inimigo de classe.

— A ligação mais estreita com as massas. Os camaradas devem estar totalmente absorvidos pelos interesses das massas, sentir pulsar a vida das massas, conhecer o seu estado de espírito e as suas aspirações. A autoridade dos dirigentes das organizações do Partido deve ser antes de tudo, fundada sobre o facto de que as massas vêem neles os seus chefes e estão convencidas, pela sua própria experiência, da sua capacidade como dirigentes, da sua determinação e do seu espírito de sacrifício na luta.

— A capacidade de as orientar por si próprio em todas as situações e não temer tomar a responsabilidade das suas resoluções. Quem receia assumir responsabilidades não é um dirigente. Quem é incapaz de ter iniciativa, quem diz «Não farei senão aquilo que me disserem» não é um bolchevique. Só é um verdadeiro dirigente bolchevique quem não perde a cabeça nos momentos de derrota, quem não deixa que os êxitos lhes subam à cabeça, quem mostra firmeza inquebrantável no cumprimento das resoluções. Os quadros desenvolvem-se e formam-se melhor quando colocados perante a necessidade de resolver por si próprios os problemas concretos da luta e quando sentem pesar sobre eles a responsabilidade das suas decisões.

— O espírito de disciplina e a têmpera bolchevique tanto na luta contra o inimigo de classe como na intransigência acerca de todos os desvios da linha bolchevique.

Devemos insistir na necessidade destas condições na escolha judiciosa dos quadros, porque na prática dá-se muitas vezes preferência a um camarada que, por exemplo, escreve bem e fala bem mas que não é um homem ou mulher da acção e que não é tão capaz para a luta como um outro camarada que talvez não escreva e fale tão bem mas que é um camarada firme, com iniciativa, ligado às massas, capaz de se lançar na luta e de conduzir os outros na luta. Já tem havido demasiados casos de sectários, doutrinadores, palradores, terem tomado o lugar de dedicados dirigentes de massas, verdadeiros dirigentes revolucionários da classe operária.

Os nossos quadros dirigentes devem aliar o conhecimento do que devem. fazer com a firmeza bolchevique, a força de carácter revolucionária e a força de vontade necessária para levar as tarefas à prática.

Camaradas, como se sabe, a melhor educação dos quadros obtém-se no decurso da luta, nos esforços feitos para vencer dificuldades e suportar provações, tanto nos exemplos positivos como negativos.

Temos centenas de exemplos de esplêndido comportamento no decorrer de greves e manifestações, na prisão, perante o tribunal. Temos milhares de exemplos de heroísmo mas, infelizmente, também registamos muitos casos de cobardia, de falta de firmeza, e mesmo de deserção. Frequentemente esquecemo-nos destes exemplos, quer dos bons quer dos maus. Não tiramos proveito deles para fins educativos, não mostramos o que é preciso imitar e o que é preciso rejeitar.

Devemos estudar a conduta dos camaradas e dos operários activos durante os conflitos de classe, quando dos interrogatórios da polícia, nas prisões e campos de concentração, perante os tribunais, etc, Os bons exemplos devem ser destacados e apresentados como modelos para serem seguidos e tudo o que é podre, não bolchevique, pequeno burguês, deve ser posto de lado.

Desde o julgamento de Leipzig temos tido um grande número de camaradas cujos depoimentos ante tribunais burgueses e fascistas têm mostrado que numerosos quadros se desenvolveram com uma excelente compreensão daquilo que realmente constitui uma conduta bolchevique no tribunal.

Mas quantos, mesmo de entre nós, delegados ao Congresso, conhecem os detalhes do julgamento dos ferroviários da Roménia, sabem do julgamento de Fiete Schulz, que foi depois decapitado pelos fascistas na Alemanha, do julgamento do nosso valente camarada japonês Itikawa, do julgamento dos soldados revolucionários búlgaros e de muitos outros julgamentos em que foram dados exemplos admiráveis de heroísmos proletário?

Estes dignos exemplos de heroísmo proletário devem ser popularizados, devem-se pôr em contraste com a cobardia, o espírito pequeno-burguês, a podridão e fraqueza de toda a espécie que se manifestam nas nossas fileiras e nas da classe operária. Estes exemplos devem ser apontados mais largamente para educação dos quadros do movimento operário.

Camaradas: Os dirigentes dos nossos Partidos queixam-se muitas vezes de que não há gente; de que têm falta de gente para o trabalho de agitação e propaganda, para os jornais, para os sindicatos, para o trabalho entre os jovens e entre as mulheres. Não há gente, não há gente, tal é o grito. Nós é que não conseguimos arranjar as pessoas. A isto podíamos responder com estas velhas mas eternamente jovens palavras de Lénine:

«Não há homens — e há homens em massa. Há homens em massa porque cada ano que passa se destaca das fileiras da classe operária e das mais diversas camadas da sociedade, um número crescente de descontentes que querem protestar, que estão prontos a dar todo o auxílio que puderem à luta contra o absolutismo cujo domínio insuportável não é ainda claro para todos mas que é no entanto cada vez mais agudamente sentido por massas crescentes de pessoas. Ao mesmo tempo não há homens porque não temos dirigentes, dirigentes políticos, não temos organizadores com talento para organizarem um trabalho amplo, coordenado e harmonioso, que permita a aplicação de todas as forças; mesmo as mais insignificantes.»

Estas palavras de Lénine devem ser integralmente compreendidas pelos nossos Partidos e servir de guia para o seu trabalho diário. Não há falta de homens. O que é preciso é descobri-los nas nossas próprias organizações, durante as greves e manifestações, nas várias organizações de massas, nas organizações da frente única. Devemos ajudá-los a desenvolverem-se no decorrer do trabalho e da luta, devem ser postos numa situação em que possam realmente ser úteis à causa operária.

Camaradas, nós, comunistas, somos homens de acção. É nosso o problema da luta prática contra a ofensiva do capital, contra o fascismo e a ameaça de guerra imperialista, a luta pelo derrubamento do .capitalismo. É precisamente esta tarefa prática que exige dos quadros comunistas o armarem-se com a teoria revolucionária. Porque, como Stáline, esse grande mestre da acção revolucionária, nos ensinou, a teoria dá aos que estão empenhados num trabalho prático a capacidade de orientação, a clareza de visão, a segurança no trabalho, a fé na vitória da nossa causa.

Mas a verdadeira teoria revolucionária é o inimigo intransigente da loucura vã de teorizar, de todo o jogo estéril com definições abstractas. Lénine costumava dizer: «A nossa teoria não é um dogma, é um guia para a acção». É esta a teoria de que os nossos quadros precisam e precisam tanto dela como do pão de cada dia, do ar ou da água.

Quem quiser, na realidade, libertar o nosso trabalho de esquemas rígidos que matam, da escolástica perniciosa, deve queimá-los com um ferro em brasa, quer por meio da luta prática, activa, travada juntamente com as massas e à cabeça das massas, quer por um trabalho incansável para assimilar a vigorosa, fecunda e toda poderosa doutrina de Marx, Engels, Lénine e Stáline.

A este propósito, considero especialmente necessário chamar a vossa atenção para o trabalho das nossas escolas do partido. Não são pedantes, palradores ou mestres de citações que as nossas escolas devem formar. Não! São combatentes práticos da vanguarda da causa da classe operária que devem sair dessas escolas. Combatentes de vanguarda, não somente pela sua coragem prontidão para se sacrificarem, mas também porque vêm mais longe que os militantes de base e sabem melhor do que eles o caminho que conduz à emancipação dos trabalhadores. Todas as secções da Internacional Comunista devem, sem mais demoras, dedicarem-se seriamente à organização das escolas do Partido onde possam ser forjados estes quadros combatentes.

Parece-me que a tarefa principal das nossas escolas do Partido consiste em ensinar os membros do Partido e das Juventudes Comunistas a aplicar o método marxista-leninista à situação concreta de cada país, a condições definidas, não para a luta contra um inimigo «em geral» mas contra um inimigo determinado, definido. Isto torna necessário um estudo não meramente dos escritos do leninismo mas do seu espírito vivo, revolucionário.

Há duas maneiras de preparar os quadros nas escolas do Partido

— Preparar as pessoas duma maneira teórica, abstracta, tentar dar-lhes a maior dose possível de conhecimentos áridos, ensiná-las a escrever teses e resoluções duma forma literária, e só acidentalmente tocar nos problemas do país em questão, do seu movimento operário, a sua história e tradições, e da experiência do Partido Comunista em questão. Só acidentalmente!

— Uma preparação teórica onde a assimilação dos princípios fundamentais do marxismo- leninismo é baseada sobre o estudo prático, pelo estudante, dos problemas principais da luta do proletariado no seu próprio país. Voltando ao seu trabalho prático, o estudante será então capaz de se orientar por si e de se tornar um organizador prático independente e um dirigente capaz de levar as massas à luta contra os inimigos de classe.

Nem todos os que saíram das nossas escolas do Partido deram provas de capacidade. Há uma grande quantidade de frases, abstracções, conhecimentos livresco e exibição de sabedoria. Mas nós precisamos de verdadeiros, reais organizadores bolchevique e dirigentes de massas. E necessitamos fortemente deles, hoje mesmo. Não importa se tais estudantes não tão capazes de escrever boas teses (embora também precisemos muitíssimo disso) mas o que eles devem saber é como organizar e dirigir, tem recuar diante das dificuldades, capazes de as vencer.

A teoria revolucionária é a experiência totalizada, generalizada, do movimento revolucionário. Os comunistas devem utilizar cuidadosamente nos seus países não só a experiência do passado mas também a da luta actual de outros destacamentos do movimento operário internacional. Porém o utilização correcta dessa experiência não quer dizer de forma nenhuma transposição mecânica de formas e métodos de luta de um conjunto de condições para outro, de um país para outro, como tantas vezes acontece nos nossos Partidos.

A pura imitação, a simples cópia de métodos e formas de trabalho, mesmo do Partido Comunista da União Soviética, em países onde domina ainda o capitalismo, pode, apesar da todas as boas intenções, ser não útil mas prejudicial, como se tem visto frequente mente na realidade. É precisamente a partir da experiência dos bolcheviques russos que devemos aprender a aplicar, de maneira viva e concreta, às particularidades de, cada país, a linha internacional única na luta contra o capitalismo; que devemos aprender a afastar sem piedade, a estigmatizar, a ridicularizar perante as massas toda a actividade dos fraseadores, o uso das fórmulas feitas, o pedantismo e o doutrinarismo.

É necessário aprender, camaradas, aprender sempre, a cada passo, no decorrer da luta, em liberdade e na prisão. Aprender e lutar, lutar e aprender. É preciso saber ligar a grande doutrina de Marx, Engels, Lénine e Stáline com a firmeza stalinista no trabalho e na luta, Com a intransigência stalinista nas questões de princípio em relação ao inimigo de classe de e aos desvios da linha bolchevique, com a audácia stalinista em face das dificuldades, com o realismo revolucionário stalinista.


Inclusão 07/06/2019