Curso Básico da ORM-PO

Organização Revolucionária Marxista - Política Operária


Aula V - Desenvolvimento Capitalista e as Crises


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Sabemos por experiência própria que o desenvolvimento capitalista significa riquezas para uma minoria e miséria para a grande massa. As riquezas se concentram paulatinamente nas mãos de poucos, enquanto cresce o número daqueles que vivem dos seus salários, isto é, que ganham justamente o suficiente para poder continuar a trabalhar.

Sabemos também que, na sociedade capitalista, a produção não obedece a um plano geral. Ela não se orienta pelas necessidades das massas, mas pela necessidade em que o capital se encontra de render lucros crescentes. O interesse do capitalista é aumentar seu lucro e não corresponder às necessidades das massas. Cada fabricante pode e é obrigado a planejar o processo de produção dentro da empresa. Cada empresa capitalista é dirigida independentemente das demais. Em vez de planificar a produção em seu conjunto, as empresas capitalistas disputam os compradores entre si, lutam pelo mercado. Procuram aumentar sua produção às custas da concorrência.

Com o desenvolvimento capitalista, perguntamos, essa luta aumenta ou diminui? À primeira vista, pode parecer que diminui. Com efeito, o número dos capitalistas diminui em relação à totalidade da população. Os grandes capitalistas devoram os médios e esses devoram os pequenos. Dezenas de pequenos e médios proprietários de empresas lutam ferozmente entre si antes de sucumbir ante as grandes empresas que dominam mercados inteiros. Neste sentido, poder-se-ia acreditar que sendo menor o número de rivais, a luta tende a ser menos encarniçada. É verdade que os rivais são menos numerosos. Porém, cada um deles se tornou incomparavelmente mais poderoso. A luta que se manifesta na concorrência muda de forma, torna-se mais feroz e mais destruidora. E quando uma das partes sucumbe, as consequências sociais são muito mais profundas.

Esse processo da concentração de riquezas nas mãos da uma minoria é acentuado por um fenômeno a que damos o nome de crise cíclica do capitalismo. Essa crise é fruto do modo anárquico, não planificado com que a produção capitalista funciona. Sabemos que o desenvolvimento capitalista é desigual, descontínuo. Num dado período, a produção continua estável e mesmo ascendente. De repente, porém, o patrão começa a despedir operários, explicando que a culpa não é dele, mas sim da crise. Que são essas crises que surgem no sistema capitalista?

Se fizermos essa pergunta ao patrão, ele nos responderá que a crise é a falta de dinheiro ou de crédito ou de compradores para as suas mercadorias. O fato é que produziu demais. Teve de descobrir de um dia para o outro esse fenômeno que estoura em todas as fábricas em todo o país. Produziu demais? Por quê? Então, todo mundo está satisfeito, dispondo de comida suficiente, roupa e outros artigos de primeira necessidade? Não, evidentemente; como sempre, a miséria e as necessidades se acentuam na medida em que o patrão despede operários. Os salários são rebaixados e as atividades econômicas diminuem. Faltam justamente compradores para as mercadorias produzidas.

Nessa situação, muitas empresas fecham suas portas. As mais fracas primeiramente, depois as médias e, não raras vezes, as grandes. Umas desaparecem simplesmente. Outras são compradas por empresas maiores. O processo continua, pois cada indústria depende da outras, cada uma compra de outras, cada uma é credora da outras. Se uma não está em condições de pagar, arrasta outras à bancarrota. Cada empresa que se fecha ou diminui sua produção, despede operários, aumentando o número de desempregados e, por conseguinte, a parte da população que não tem mais dinheiro para comprar aquilo de que necessita. Com essa diminuição da procura de mercadorias, reduz-se ainda mais o nível de produção. A crise prossegue, agravando-se. Às vezes, passam-se anos antes da produção capitalista retomar o ritmo anterior. Quando chega a esse ponto, as empresas fracas já sucumbiram. As mais fortes sobreviveram, tornando-se mais poderosas, uma vez que a concorrência foi eliminada temporariamente. Na crise, portanto, o processo de concentração de capitais se acentua.

Qual é precisamente a causa dessa crise capitalista, dessa falta de comprador, dessa queda periódica da produção? Para compreendermos esse fenômeno temos de retornar a uma importante característica do modo de produção capitalista.

Acumulação capitalista

Vimos que a mais-valia é constantemente criada pelo processo de produção capitalista, isto é, o proprietário consegue sempre, no final de cada ano, ganhar uma quantidade de dinheiro maior do que a empregada por ele. Vimos também que essa quantidade adicional de dinheiro provém da apropriação de uma parte resultante do trabalho operário.

Que acontece com essa quantidade a mais de dinheiro que "aparece" no final de cada ano? É claro que uma parte dela é desviada para o próprio sustento do capitalista, incluindo seus divertimentos, viagens, luxos, etc. Mas uma outra parte da mais-valia, geralmente a maior, é usada para comprar outras máquinas, mais matérias primas e para empregar mais operários. Essa segunda parte é somada ao capital existente, com o que, no final de mais um ano, o capitalista conseguirá uma quantia maior de mais-valia. Em poucas palavras, ele acumula capital. Não se trata de uma mera ambição pessoal. O capitalista não pode agir de modo diferente. Ele é obrigado a acumular capital se quiser sobreviver, se quiser enfrentar a concorrência. Vejamos um exemplo concreto:

Digamos que o dono de uma gráfica movimente um capital de 100 milhões, dos quais 80 milhões são utilizados para comprar papel, papelão, tintas, vernizes, etc. — isto é, aplicados em capital constante — e 20 milhões são aplicados em salários, isto é, em capital variável. Imaginemos que, com a venda de sua produção, o proprietário obtenha, no final do ano, 120 milhões. Se for de 100% a taxa de mais- valia, essa será representada por 20 milhões que aparecerão a mais no final do ano. Com o início de um novo ano, o capitalista investirá novamente capital para a produção. Esse capital será o mesmo que o investido no ano anterior? Normalmente, não. O capitalista usará digamos, metade da mais-valia conseguida antes (10 milhões, neste caso) e a juntará ao capital. Portanto, este cresceu agora para 110 milhões. Conservando a mesma proporção entre capital constante e capital variável, ele disporá de 86 milhões para matérias-primas e de 22 milhões para salários de operários. Conservando as mesmas condições de trabalho, e a mesma taxa de mais-valia (100%), ele venderá as mercadorias produzidas neste segundo ano por 132 milhões. No final deste ano, contentando-se em acumular a metade de mais-valia obtida, passará a ter agora um capital de 121 milhões. Em síntese, quanto mais o capitalista acumula, mais ele pode acumular. Demos acima um exemplo simples de acumulação de capital, supondo que todos os fatores do processo de produção — preços, salários, horas de trabalho — continuem inalterados durante três anos de atividade produtiva. Consideramos que a força produtiva do trabalho durante o processo de acumulação se manteve inalterada. Consideramos também que a proporção entre o capital constante (máquinas, matérias-primas) e o capital variável (salários) tenha continuado a mesma. Na realidade, porém, as coisas não ocorrem assim.

O crescimento do capital no decorrer do processo de acumulação aumenta na realidade a força produtiva do trabalho. Desse modo, o mesmo número, ou um número menor de operários, produzirá quantidades sempre maiores de mercadorias, graças à utilização de novas a mais aperfeiçoadas máquinas.

Na prática, isso significa que a proporção entre o capital constante e o capital variável sofre uma constante alteração durante o processo de acumulação. O capitalista passa a usar as somas crescentes de capital que lhe são postas à disposição para comprar máquinas modernas que barateiem o custo de produção. Uma máquina permite esse barateamento quando sua operação necessita de menos força de trabalho, isto é, de um menor número de operários. Assim, a mesma quantidade ou uma quantidade maior de mercadorias passa a ser produzida por um menor número de trabalhadores, diminuindo o preço de custo de cada uma dessas mercadorias.

A proporção entre capital constante e capital variável é chamada COMPOSIÇÃO ORGÂNICA DO CAPITAL. Na medida em que, no processo de acumulação o capitalista investe somas sempre maiores em máquinas sempre mais modernas, ele aumenta a parte constante do capital em relação à parte variável. Assim, como conclui Marx, a composição orgânica do capital cresce no decorrer do processo de acumulação.

Quais são os efeitos práticos desse crescimento da composição orgânica do capital? Quais são os efeitos desse aumento dos investimentos em instalações e máquinas, feito às custas da força de trabalho humana?

Primeiramente, o aumento da composição orgânica do capital cria um desemprego latente, um exército de reserva de trabalho que exerce pressão sobre os salários, pois, para cada operário despedido, pode ser empregado outro com remuneração mais baixa. Portanto, do ponto de vista dessa força de trabalho prejudicada, as inovações técnicas do capitalismo são usadas para baixar o nível de vida das massas e aumentar a miséria. Mas há uma consequência mais radical ainda, que é responsável pelas crises cíclicas.

Superprodução e capacidade aquisitiva

Sabemos que o capitalista tende a produzir o máximo que seu equipamento permite, pois só assim o capital continua a crescer através do processo de acumulação. A produção capitalista não visa mais do que o crescimento do próprio capital.

Entretanto, o processo produtivo se caracteriza pela existência de duas fases, uma dependente da outra. Na primeira destas fases, a mercadoria produzida deve ser vendida, ou seja, trocada por dinheiro. Na segunda fase, o capitalista usará este dinheiro para comprar mercadorias, para continuar a produzir. Desde que consiga trocar suas mercadorias por dinheiro, não terá maiores problemas para realizar a segunda etapa de processo. Porém, se demorar em vender suas mercadorias, ou não conseguir vendê-las, também demorará em comprar, ou desistirá de comprar mercadorias nas demais fábricas.

Uma fábrica vende para outra e para terceira, que, por sua vez, também repete a operação. Essa circulação de mercadorias em forma de produtos acabados, semi- acabados ou matérias-primas, perfaz grande percentagem da produção bruta de um país. Mas toda esta produção de máquinas, matérias-primas, produtos semi- acabados e demais elementos da produção só tem sentido dentro de um esquema que acaba na fabricação de artigos para o consumo da massa. O cidadão que compra uma escova de dente ou um rádio, está pagando uma parcela de um enorme investimento de capital feito em diversas e sucessivas indústrias que participam tanto da produção das matérias-primas como do produto final e de todas as instalações necessárias requeridas pelo conjunto do processo de produção.

O capitalista gasta muito individualmente, mas a satisfação das suas necessidades não consome o suficiente para impulsionar a produção das grandes indústrias. Apesar de ser grande o consumo feito pelos próprios capitalistas, ele é satisfeito por uma parcela pequena do que essas indústrias produzem. Essas indústrias dependem, isto sim, de uma grande massa de consumidores que, na sociedade burguesa, é constituída de assalariados. Quanto mais desenvolvida a sociedade, maior a participação dos operários no consumo geral.

Porém, como já vimos, no decorrer da acumulação de capital, decresce justamente aquela parte do capital — o capital variável — que é destinada aos salários. É então inevitável a contradição: tomando-se a acumulação de capital durante um ano, isto é, o conjunto dos capitais investidos no processo de produção anual — só a parte variável deste capital (salários) está disponível para a aquisição dos produtos de consumo em massa. Porém a venda desses produtos tem de repor tanto o capital constante quanto o variável. Finalmente, tem de obter o lucro esperado, sem o qual não haveria produção capitalista.

Nestas circunstâncias, poderia parecer que a produção capitalista deveria entrar em colapso ao final de cada ano, na hora do balanço. Evidentemente, isto não acontece pelas razões já expostas: grande parte das empresas compra de uma e vende para outras empresas capitalistas. E cada ciclo de investimentos adia a solução do problema do produto final da indústria de artigos de massa. Todavia, periodicamente, a crise vem à tona. Depois de tanto investimento, descobre-se que os mais variados artigos de grande consumo estão parados nas prateleiras das casas de comércio. Descobre-se que o mercado está saturado. Em outras palavras, descobre-se que os salários no mundo capitalista não conseguem absorver a produção. As máquinas são paralisadas à espera de "tempos melhores".

Essas crises de superprodução ocorrem periodicamente na sociedade capitalista. Houve uma época em que elas se deram com regularidade. De dez em dez anos, eclodia uma dessas crises. As guerras mundiais e as destruições em massa alteraram esse ciclo, mas não o aboliram. Em 1929, o mundo passou pela mais profunda das crises conhecidas até hoje. O medo ante a possibilidade de se repetir este fenômeno domina a política e a economia capitalistas. Depois da segunda grande guerra, houve um período em que as crises, embora não eliminadas, apareceram de forma atenuada, devido às imensas dificuldades criadas pela destruição e desgaste dos parques industriais de países inteiros. A industrialização de vastas regiões do mundo subdesenvolvido, a chamada "segunda revolução industrial", o aproveitamento da descoberta da energia nuclear e da eletrônica e, finalmente, a corrida armamentista, influíram igualmente nesta expansão econômica. Porém, cada um destes fatores contribuiu para aumentar mais ainda a capacidade produtiva da sociedade, capacidade esta que não é acompanhada pelo aumento da capacidade aquisitiva dos homens que vivem na sociedade capitalista.

Os economistas burgueses também já conhecem essa realidade. Em vista disto, os reformadores de sociedade capitalista propõem aumentar a capacidade de consumo das massas, como remédio contra as futuras crises. O remédio é antigo e ineficaz. Cada crise — já observou Engels — é justamente precedida por uma fase de prosperidade, fase em que os salários atingem o ponto mais alto e o desemprego é reduzido ao mínimo, isto é, fase em que a capacidade aquisitiva das massas atinge o ponto máximo possível na sociedade capitalista. Porém isto não impede, ao contrário, condiciona o desenvolvimento da próxima fase da crise. Poder-se-ia dizer que esse desencadeamento é inevitável: as fases da expansão industrial aumentam a capacidade das forças produtivas, a produtividade do operário. Ora, na sociedade capitalista, isto quer dizer que cresce a exploração do operário. Amplia-se a parte do trabalho que é apropriada pelo capitalista. Apesar de todos os aumentos de salários — possíveis nesta fase de prosperidade — cresce a desproporção entre salários o os montantes investidos em máquinas e matérias- primas, isto é, cresce a desproporção entre capital variável e capital constante.

É essa a contradição fundamental da economia capitalista, que existe entre o caráter social do trabalho e o caráter individual da apropriação desse mesmo trabalho. Enquanto toda a sociedade trabalha e se divide no processo do trabalho, os resultados do esforço comum são apropriados por uma minoria de capitalistas.

Em todas as fases da produção capitalista existe essa contradição. Mesmo nas fases de maior expansão industrial e econômica, há mercadorias à espera de compradores e há massas necessitadas que não podem comprar estas mercadorias. Depois da segunda grande guerra — durante uma fase de prosperidade inédita na economia capitalista, colheitas inteiras de trigo apodreceram em armazéns nos Estados Unidos, enquanto milhões de brasileiros morrem de subnutrição. Nós mesmos conhecemos o fenômeno de depósitos cheios de milhões de sacas de café enquanto grande parte da humanidade não toma café ou toma somente aos domingos. No período de crise, esta contradição se aguça e toma dimensões desastrosas. Imensas quantidades de bens de consumo e de bens de produção são desvalorizadas e destruídas, enquanto cresce a miséria e a fome das massas, enquanto é reduzida e paralisada a produção, à espera de que o capital empregado dê novamente lucro. O lucro é a força motriz da economia capitalista e o único motivo da sua razão de ser e de produzir.

Crises Cíclicas Capitalistas

Só as economias socialistas, as economias daqueles países que passaram por uma revolução proletária vitoriosa, superaram essa contradição. Na União Soviética, na China, em Cuba, se produz conforme as necessidades das massas. Não se conhece mais o fenômeno da "superprodução". Ao contrário, a economia destes países enfrenta a dificuldade de suprir os seus povos com todos os bens que o crescente nível de vida requer. Trata-se de países que fizeram as suas revoluções enquanto ainda estavam numa fase de subdesenvolvimento, com suas economias pobres. Têm de recuperar o tempo perdido e fazer a industrialização básica que as suas derrubadas burguesias não conseguiram fazer no passado. Eles a estão fazendo em bases socialistas, sem crises de superprodução, num progresso contínuo, que indica o futuro caminho da humanidade. As crises capitalistas desenvolveram-se no século passado a espaços regulares que foram alterados pelo mecanismo das guerras, que as antecipou, adiou ou abreviou. Sua cronologia é a seguinte:

A crise de 1929 é tomada como exemplo mais claro das crises capitalistas, principalmente pelas repercussões mais profundas que teve, como por exemplo, o desemprego: em 1929, havia 5 milhões e 900 mil desempregados em 32 países capitalistas; em 1932, como consequência da estagnação de 1929, este número havia subido a 26 milhões e 400 mil. Quanto à produção em geral, sua queda foi de 44% em todo o mundo capitalista, entre 1929 e 1932. Neste mesmo período, a produção caiu em 46% nos Estados Unidos, enquanto o desemprego aumentou de 2.500.000 para 13.200.000.

Crise de 1937

Essa crise, a propósito da qual se esperavam proporções maiores que as de 1929, foi "salva" pela necessidade de investimentos bélicos em geral solicitados pela segunda guerra mundial. O desemprego, que em 1937 havia baixado para 14 milhões, voltou em 1938 a atingir 18 milhões. Quanto à produção, esta havia caído em 1929, em 19,3% nos Estados Unidos. Em 1937, sua queda é de 21,9%. Na Inglaterra, o confronto entre estes dois anos assinala uma queda de produção de 8% em 1929 e de 9,5% em 1937. Os dados relativos à França são respectivamente: 11,4% o 15,5%. Se dermos o índice 100 para a produção industrial dos Estados Unidos em 1929, veremos que, depois de certa recuperação em 1937 — quando esta produção chegou a 103 — o índice cai novamente para 98 em 1939, isto é, abaixo inclusive dos fracos índices de 1929. Baseada, sobretudo nos investimentos bélicos, a produção norte-americana se recupera para chegar ao índice de 215 em 1943. Após a guerra, o caminho é o seguinte: retorno a uma certa depressão que se concretizará na próxima crise.

Crise de 1949

A evolução da produção norte-americana nos anos anteriores foi a seguinte:

Em seguida, a economia norte-americana retoma seu desenvolvimento até 1953.

Crise de 1953

Eis o quadro da produção norte-americana entre 1950 e 1953:

Crise de 1958

Foi esta a última das crises cíclicas do capitalismo observadas até agora(NOTA5). A produção norte-americana, entre 1955 e 1958, apresentou o seguinte desenvolvimento:

Através das diversas tentativas para conter ou sair das crises, o regime vai distanciando cada vez mais o seu potencial de produção de fato, o que destaca claramente a contradição entre as forças produtivas e as relações de produção.

O quadro abaixo apresente a relação entre o potencial da indústria de transformação norte-americana e a sua produção:

ANO POTENCIAL DE PRODUÇÃO PRODUÇÃO
1950 100 100
1954 126 112
1955 134 124
1956 142 127
1957 151 127

Mesmo tomando-se o ano de 1950 como um momento em que se igualava o potencial de produção e a produção de fato, sete anos são suficientes para comprovar a tendência incontível de distanciamento de um índice em relação ao outro.

Brasil

A crise econômica destes últimos anos no país é uma crise capitalista gerada no interior do próprio sistema. Se anteriormente as crises eram um reflexo dos ciclos das sociedades capitalistas avançadas (de que a depressão de 29 é o exemplo mais marcante), esta última se deu em pleno momento de apogeu da economia norte- americana.

A crise foi causada pelo esgotamento relativo da acumulação capitalista que se vinha dando no Brasil. A produção nacional na década de 50 alcançou a taxa média de crescimento anual de 5,2%, apontando sinal de declínio a partir de 1962; cresceu em apenas 1,4% em 1963 (menos do que o crescimento da população, que tem tido a taxa média anual de 3%), decresceu em 3% em 64 e permaneceu estagnado em 1965. É que o surto de desenvolvimento da década anterior, fazendo aumentar grandemente a procura dos meios de produção (matérias-primas, máquinas, trabalhadores), criou condições para que estes meios de produção tivessem aumentados os seus preços. O aumento dos preços dos produtos agrícolas, dos equipamentos importados para a indústria, a resistência crescente dos operários à sua exploração, fizeram diminuir a taxa de lucro e desencadearam os mecanismos das crises.

No ano de 1966, justamente como efeito da intensificação da exploração da classe operária a da concentração e centralização de capitais, a produção apresentou uma relativa recuperação, ainda que bem diminuta, em virtude mesmo, do envelhecimento precoce do capitalismo brasileiro.(NOTA6)


Notas de rodapé:

(NOTA5) A crise de 1958 não foi a última do sistema capitalista. Em 1971, para evitar a sistemática desvalorização de sua moeda, os EUA anunciaram o fim da conversão do dólar em ouro. Caia por terra o Acordo de Bretton Woods e com ele o velho sistema monetário que regulava os fluxos financeiros e o comércio internacional do pós-guerra.
Entre 1973/76 ocorreu uma nova crise mundial de grandes proporções. A negativa dos produtores de petróleo em fornecer aos países industrializados sua matéria prima a preços baixos precipitou a crise cíclica. Até hoje não foi superada inteiramente. A partir da década de 1980, como reação à crise, a acumulação capitalista passa a articular-se em dois focos de dinamismo: um, na esfera do capital produtivo e outro numa expansão relativamente autônoma na esfera financeira (Meyer, V. 1999). Desde então, o capital fictício cresce rapidamente em movimento aparentemente autônomo, descolado da esfera da produção. Cresce, sem conseguir evitar crises, como as que ocorreram na Ásia em 1987, no México em 1994, na América Latina ao final dos anos 90 e, mais recentemente, em 2007, nos EUA, no coração do sistema. Já o capital produtivo é levado a adaptar os processos de trabalho para obter aumento de produtividade e manter o movimento dos trabalhadores contido e desmobilizado.
Ver: Meyer, V. (1999) O Estado Capitalista de Volta às Origens? (Uma abordagem crítica ao estado contemporâneo), Rev. Sitientibus, n. 21, Feira de Santana, jul/dez 1999. (retornar ao texto)

(NOTA6) Nesse ponto específico é importante reler o que foi escrito por Erico Sachs, já na década de 80, quando reavaliava a importância do Programa Socialista para o Brasil. Com relação a caracterização da crise cíclica de 1963/66, Sachs revê:
"Finalmente, neste contexto, é preciso constatar que os autores do PSB não facilitaram muito a tarefa, quando falaram do 'bloqueio' do desenvolvimento capitalista do Brasil e tomaram a política do regime militar como sintoma de 'estagnação'. É verdade que o PSB não estava sozinho com esta interpretação; economistas como Celso Furtado, incorreram em erro análogo. O que facilitou esse equívoco foi o fato de a crise cíclica de 1963/66 ainda não ter sido superada. Isso, em grande parte, foi o responsável pelo nosso despreparo frente ao 'milagre econômico'."
Após o esclarecimento de Sachs, continuamos relembrando que após a crise cíclica de 1963/66 houve o crescimento acelerado da economia em parte da década de 70 (o chamado "milagre econômico") e sua posterior crise, agravada pelo choque do petróleo. Finalmente, a partir da década 1980, o Brasil entra na crise da dívida e durante mais de uma década apresenta crescimento e crises em um período a rigor de estagnação com graves picos inflacionários.
Ver: Erico Sachs (2009) O PSB e a fase atual da luta de classes, in POLOP, Uma Trajetória de Luta Pela Organização Independente da Classe Operária no Brasil, Centro de Estudos Victor Meyer. (retornar ao texto)

Inclusão 14/08/2019