O PCP e a Luta pela Reforma Agrária

Partido Comunista Português


I CONFERÊNCIA DE CAMPONESES DO SUL (Santarém, 5 de Janeiro de 1975)
CONCLUSÕES DA CONFERÊNCIA


1ª SECÇÃO —CONTRIBUIÇÕES, IMPOSTOS, TAXAS, LICENÇAS, POROS E OUTRAS FORMAS DE TRIBUTAÇÃO

capa
Baixe o arquivo em pdf

— Abolição total dos foros, manifestação medieval e parasitária de propriedade.

— Adopção de um sistema tributário que, através da progressividade do imposto, respeite o princípio PAGA MAIS QUEM MAIS TEM.

— Que seja pesadamente sancionada toda a incúria, desmazelo ou sabotagem económica, nomeadamente a não cultivação, total ou parcial, ou a obtenção de níveis de produtividade inferiores aos consentidos pela aptidão dos solos.

— Supressão de taxas, impostos ou adicionais injustificados, como, por exemplo, a taxa sobre o vinho.

— Revisão da legislação e do sistema fiscal no sector agrário, que atenda aos legítimos anseios do meio rural e que tenha na devida conta o seu atraso e debilidade económica.

— Isenção de contribuições e impostos para os rendimentos não superiores a 30 contos por ano, desde que o proprietário cultive directamente a terra ou a arrende a cooperativas agrícolas.

2ª SECÇÃO — ARRENDAMENTO RURAL, BALDIOS, INCULTOS, SUB-APROVEITAMENTOS

— A renda deve ser a dinheiro, quando o rendeiro assim o deseje; deve ser fixa e limitada, tendo em conta a produtividade da terra e actualizada somente quando isso se torne justificado.

— O contrato de arrendamento deve ser escrito, mesmo para as explorações com dimensão inferior a 5 hectares, desde que o rendeiro o deseje.

— Os arrendamentos devem poder ser indefinidamente prorrogáveis.

— Os herdeiros do rendeiro devem gozar do direito de preferência, por morte ou incapacidade do titular do arrendamento.

— Os arrendamentos devem ser directos, acabando-se com o subarrendamento.

— Deve garantir-se o direito a justa indemnização por benfeitorias.

— As terras incultas tornadas produtivas pelos rendeiros devem estar sujeitas a renda que corresponda ao seu valor inicial e, em caso de venda, o rendeiro deve gozar do direito de preferência pelo preço da terra não desbravada.

— Os incultos e terras subaproveitadas devem ser entregues a quem as trabalhe, ainda que através de arrendamento compulsivo.

— Os baldios devem ser entregues a comissões de trabalhadores que os coloque à disposição dos povos para sua usufruição, sendo livres de decidir da sua forma de gestão e exploração.

— As parcerias devem ser transformadas de forma a que | o parceiro activo possa em cada ano optar pelo pagamento a dinheiro com base na estiva camarária.

— Quem trabalha a terra deve gozar do direito de preferência na sua aquisição.

— Nos contratos de arrendamento, devem ser incluídos os pomares, se os rendeiros o desejarem.

— O proprietário não deve poder desalojar outros rendeiros para arrendar a um único, embora a posição desses rendeiros possa ser transmitida a uma cooperativa em que se integrem.

— Os arrendamentos de campanha devem ser transformados em arrendamentos anuais, se os interessados o desejarem.

— Os rendeiros sazonais devem ter o direito de arrendamento em igualdade de circunstâncias nos anos seguintes.

— As rendas devem ser pagas depois da época da venda dos produtos.

— Relativamente às indemnizações por benfeitorias, devem ter efeito retroactivo, mesmo que o arrendamento tenha cessado há mais de 2 anos.

— Foi no consenso geral que estas medidas respondem aos problemas mais imediatos e que a solução dos problemas de fundo deve ser encarada no ponto de vista da realização de uma reforma agrária.

3ª SECÇÃO — PRODUÇÃO, COMERCIALIZAÇÃO, POLÍTICA DE PREÇOS

— É urgente a reorganização de todo o sector comercial e industrial dos produtos de e para a agricultura.

— A nova estrutura a considerar deve ter por base uma empresa mista por linha de produtos, na qual participem o Estado, as cooperativas de base e, facultativamente, o sector privado, comercial e industrial.

— As cooperativas devem surgir, desde logo, a partir da liquidação rápida dos Grémios da Lavoura e suas federações e devem receber o maior impulso por parte do Estado, como via essencial de desenvolvimento económico e social dos trabalhadores do campo.

— As empresas mistas a criar devem beneficiar da extinção dos organismos de coordenação económica, saneando-os sem decora dos elementos reaccionários e corruptos ainda neles insulados.

— As empresas mistas a constituir devem, eventualmente, integrar empresas do sector comercial e industrial privado. Tais empresas mistas não devem servir para concorrer com o sector Privado, mas a elas deve caber uma posição progressivamente dominante no ramo comercial em causa.

— As empresas mistas devem ficar com a atribuição do exclusivo das aquisições à produção e de colocação dos produtos no mercado, assim como no comércio com o estrangeiro.

— As empresas mistas em referência devem fornecer ao produtor: escoamento dos produtos na melhor época do ano; pagamento imediato; preços remuneradores e garantidos com a possível antecipação; créditos para trabalho de campanha e outros; assistência técnica. E garantir-lhes: preços favoráveis; abastecimento na devida altura; qualidade de produtos.

— Todos os produtos para a agricultura (adubos, rações, etc.) devem ter preços devidamente marcados, ainda quando em fracções, devendo ser intensificada a fiscalização sobre os preços praticados.

— É necessário lutar energicamente contra toda a fabricação de vinho «a martelo».

— Impõe-se o fomento da pecuária, na base de forragens essencialmente nacionais e melhores sementes.

— Fomento da produção florestal, designadamente a partir das terras baldias.

— Fomento de cooperativas de pequenos e médios produtores, como nova forma de organização da produção, a fim de reduzir custos, aumentar produções e melhorar o nível de vida dos produtores, como meio essencial de construir uma nova sociedade em que tenham um justo lugar os que trabalham a terra. I

4ª SECÇÃO — APOIO TÉCNICO E FINANCEIRO

— O apoio do Estado deve ser prioritariamente canalizado para as associações dos pequenos e médios produtores agrícolas.

— Deve ser concedido crédito imediato para encargos já existentes, para arrendamento de terras e para aquisição de instrumentos agrícolas.

— Os créditos devem ser concedidos a curto, a médio ou a longo prazo, tendo em conta os fins a que se destinam e a reprodutividade da sua aplicação.

— Os créditos a curto prazo devem ser concedidos sem juro ou a juro muito reduzido. Quando a médio ou a longo prazo, indo de 2,5 a 5% .

— Não devem ser exigidas garantias reais (hipoteca, penhor) para a concessão do crédito, sendo antes utilizada a garantia pessoal com base em planos de utilização dos créditos e da capacidade de trabalho.

— O plano de amortização deve ser de acordo com a rendibilidade da exploração.

— O crédito deve ser concedido pela actual banca privada, devidamente controlada pelo Estado e pelas Caixas de Crédito Agrícola, depois de reformuladas e saneadas as actuais direcções, devendo ter aqui papel importante as Associações de Pequenos e Médios Agricultores.

— Os subsídios em dinheiro devem ser substituídos por subsídios em espécie.

— Devem ser estabelecidos seguros agrícolas que na pecuária cubram as mortes acidentais e as doenças epidémicas e que na sementeira cubram os prejuízos causados por acidentes naturais.

5ª SECÇÃO — ORGANIZAÇÕES DE PEQUENOS E MÉDIOS AGRICULTORES

— Os interesses dos pequenos e médios agricultores são antagónicos aos dos grandes senhores da terra e do capital.

— As Ligas e os Sindicatos são aliados naturais na luta que se trava no mundo rural contra o inimigo comum.

— Devem incentivar-se amplas reuniões de pequenos e médios agricultores em todas as freguesias e concelhos com vista à formação de Comissões Pró-Liga.

— As instalações e outros meios dos Grémios devem ser postos ao serviço das Ligas.

— As Ligas, com a colaboração dos Sindicatos dos Operários Agrícolas devem inventariar as terras incultas e mal aproveitadas, com vista a apresentar ao Governo propostas concretas parai a sua exploração.

— Torna-se necessário o intercâmbio e a troca de informações e de experiências entre as várias Ligas, com vista à definição de objectivos gerais.

— Deve ser obrigatória a assistência técnica e jurídica às Ligas por parte do Estado.

— A actividade da Liga conjuntamente com os Sindicatos dos Operários Agrícolas deve ter como um dos objectivos mais importantes contribuir para uma profunda transformação das estruturas agrárias na direcção da Reforma Agrária.

— Deve ser apressado o saneamento dos quadros técnicos do IRA.

— Além dos quadros técnicos do IRA, deve ser feito o saneamento em todas as repartições e serviços da Secretaria de Estado da Agricultura que de alguma forma interferem nos problemas da agricultura, como seja, por exemplo, a Junta Nacional das Frutas, a Junta Nacional do Vinho, o Instituto dos Cereais, e etc.

— No novo projecto de reforma da Secretaria de Estado da Agricultura, deve consignar-se que a direcção das Brigadas Técnicas pertencerá não a um chefe mas a uma direcção colegial em que participem engenheiros agrónomos, regentes agrícolas e práticos agrícolas, serviços administrativos e, ainda, representantes das Ligas e dos Sindicatos.

— Através da Secretaria de Estado da Agricultura, das Ligas e dos Sindicatos devem ser tomadas medidas imediatas, através de comissões eleitas, para o saneamento das Brigadas Técnicas.

— Dentro do quadro do Decreto-Lei sobre o aproveitamento dos terrenos incultos ou subaproveitados, datado de Novembro de 1974, exige-se: que todas as herdades do Estado e as terras incultas ou subaproveitadas sejam entregues às cooperativas de pequenos e médios agricultores e aos Sindicatos dos Trabalhadores Agrícolas.

— Os Grémios da Lavoura e suas Federações devem ser imediatamente extintos, para o que se fará:

  1. Nomeação de Comissões Gestoras e Liquidatárias compostas por 2 elementos nomeados pela Liga, 1 pelo Sindicato dos Operários Agrícolas e 1 outro eleito pela Comissão Administrativa da Câmara.
  2. Ajuda dos concelhos mais organizados aos mais atrasados a fim de se constituir a Comissão Liquidatária com a composição atrás referida, em reuniões amplas com esse objectivo.

6ª SECÇÃO — SINDICATOS DOS ASSALARIADOS AGRÍCOLAS

— Os Sindicatos dos Operários Agrícolas devem abranger todos os assalariados agrícolas e seareiros que durante cerca de metade do ano trabalham por conta de outrem e pequenos camponeses cuja exploração os obrigue a trabalhar seis meses como assalariados.

— Os operários agrícolas devem organizar-se em Comissões de Freguesia, Concelhia e posteriormente em Comissão Distrital com a formação do Sindicato Distrital.

— É urgente que, à semelhança do que sucede já em vários distritos do Sul, sejam dados passos para a criação de Sindicatos onde ainda não existam.

— É urgente que os Sindicatos dos Operários Agrícolas do Sul se reúnam e criem uma organização onde regularmente discutam os seus problemas e tomem medidas de actuação comum face aos problemas da classe e tendo em vista a unidade sindical.

— É necessário fazer aprovar convenções de trabalho onde as não haja e fazer cumprir as já existentes.

— Face aos graves problemas que neste momento afectam os assalariados rurais, é necessário que se realize o mais rapidamente possível um Encontro de Operários Agrícolas a nível Nacional, para se analisarem e debaterem todos os problemas (e são muitos e dos mais variados) que neste momento os afectam.

7.ª SECÇÃO — SEGURANÇA SOCIAL

— Alargamento imediato aos assalariados rurais do esquema geral da Previdência e estudo do alargamento do mesmo aos pequenos e médios agricultores.

— Criação de um seguro para acidentes de trabalho agrícola que abranja os camponeses.

— Criação de um seguro de desemprego para os trabalhadores.

— Reforma condigna para os trabalhadores rurais.

— Abono de família para os trabalhadores agrícolas igual ao das outras profissões.

— Criação de lares para pessoas idosas e deficientes próximo dos locais onde habitam os familiares, aproveitando as estruturas existentes funcionando sob gestão democrática.

— Melhoria das condições de assistência nas Casas do Povo enquanto não forem os camponeses integrados na Previdência geral.

— Transferência dos fundos das Casas do Povo para a gestão das Caixas de Previdência e respectiva unificação de serviços.

— Alargamento dos períodos de consulta nas Casas do Povo de 2 para 4 horas.

— Utilização de médicos militares em comissão de serviço para cobertura médico-sanitária dos meios rurais.

— Democratização do ensino, facilitando e estimulando o acesso às escolas dos filhos dos trabalhadores, pequenos e médios agricultores, principalmente no que respeita às escolas ligadas à agricultura.

continua>>>
Inclusão 29/05/2019