O PCP e a Luta pela Reforma Agrária

Partido Comunista Português


I ENCONTRO DE PEQUENOS E MÉDIOS AGRICULTORES DO BAIXO ALENTEJO (Beja, 16 de Fevereiro de 1975)


CONCLUSÕES GERAIS DO ENCONTRO

SECÇÃO I
CONTRIBUIÇÕES E IMPOSTOS, APOIO TÉCNICO E FINANCEIRO DO MINISTÉRIO DA AGRICULTURA
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1. Contribuições e Impostos

Durante toda a época fascista, os latifundiários e monopolistas utilizaram o aparelho do Estado para fazer pagar mais a quem menos pode. Urge que seja publicada, sem mais demora, nova legislação que faça pagar mais a quem mais tem e que liberte de taxas e impostos os pequenos agricultores.

2. Apoio Técnico

Os serviços técnicos do Estado têm estado ao dispor das grandes empresas desprezando completamente os pequenos agricultores.

Estes serviços devem ser urgentemente saneados e postos ao serviço dos pequenos produtores e das respectivas cooperativas de Produção, de comercialização e de industrialização de produtos.

3. Apoio Financeiro

Durante a época fascista, os grandes agrários chamaram a si toda a ajuda financeira do Estado (créditos e sobretudo subsídios, bónus), deixando os pequenos agricultores entregues à agiotagem, 1 1 ao roubo dos seus bens, da sua saúde e da sua vida. Em vez de investirem na agricultura o que dela colhiam e o Estado lhes dava os agrários compravam prédios de rendimento nas cidades, títulos na Bolsa ou esbanjavam-no em carros de luxo e outros consumos sumptuosos. Deixaram a agricultura empobrecida, as terras abandonadas e incultas, originaram e originam ainda a fuga dos campos para as cidades e para o estrangeiro de centenas de milhar de trabalhadores.

O sector agrário exige um investimento prioritário. É preciso produzir aqui, em Portugal, aquilo que nos custa milhares de contos em impostos. Sem desenvolvimento do sector agrícola não há desenvolvimento económico e social do País. Para fazer romper e avançar com força o processo produtivo é indispensável que o Governo abra urgentemente créditos à agricultura e para isso consideramos imperioso nacionalizar, sem demora, os grandes grupos económicos cujo enorme poder resulta, em grande parte, da espoliação da agricultura.

4. Ministério da Agricultura

Os problemas agrários nacionais têm andado sempre subordinados aos interesses dos grandes grupos industriais e financeiros. A dependência da Secretaria de Estado da Agricultura em relação ao Ministério da Economia contribui para que o sector agrário continue a ser tratado como o filho pródigo e não como sector produtivo, essencial para o progresso do País. Daí a necessidade inadiável de um Ministério da Agricultura ao serviço do Povo.

SECÇÃO II
ARRENDAMENTO RURAL, HERDADES SUBAPROVEITADAS, BALDIOS, HERDADES DO ESTADO, SABOTAGEM ECONÓMICA, REFORMA AGRÁRIA

1. Quanto a arrendamento

  1. As rendas devem ser a dinheiro, sempre que o rendeiro o deseje; a renda deve ser fixa e limitada, tendo em conta a qualidade da terra.
  2. Devem acabar os subarrendamentos.
  3. O contrato de arrendamento deve ser escrito, mesmo para prédios inferiores a 5 hectares.
  4. Os rendeiros devem ser indemnizados pelas benfeitorias feitas.
  5. No caso de terras que foram tornadas produtivas pelos rendeiros, a renda deve referir-se ao valor inicial da terra.
  6. Total abolição de foros e parcerias.

2. — Considerando que muitos destes problemas foram sugeridos para inclusão na lei do arrendamento, quando ela esteve em debate público, e que a referida lei ainda não saiu, torna-se necessário e urgente a sua rápida publicação.

3. — Publicação urgente de legislação sobre terras incultas e subaproveitadas e sobre sabotagem económica.

4. — No caso de terras subaproveitadas e incultas a terra deverá ser arrendada compulsivamente pelo Estado.

5. — No caso de sabotagem económica e de terras valorizadas com o dinheiro do Povo Português (caso dos regadios), a terra deverá ser expropriada sem indemnização.

6. — Nos casos de expropriação e arrendamento compulsivo, a terra deverá ser entregue a quem a trabalha, e a sua forma de exploração deverá ser em cooperativas de produção, ou em herdades colectivas do Estado, devendo a prioridade na utilização das terras ser a seguinte:

  1. — Trabalhadores agrícolas e seareiros.
  2. — Pequenos agricultores sem terra (rendeiros).
  3. — Outros pequenos agricultores.

7. — No processo de ocupação de terras expropriadas e arrendadas compulsivamente, para a constituição de cooperativas de produção ou herdades colectivas do Estado, deverão ser os Sindicatos e as Ligas a conduzir a luta, como garante de intervenção organizada e expressiva da vontade unitária dos trabalhadores agrícolas e pequenos agricultores.

SECÇÃO III
POLÍTICA DE PREÇOS. COMERCIALIZAÇÃO. EXTINÇÃO DOS GRÉMIOS DA LAVOURA. COOPERATIVAS. EMPRESAS PÚBLICAS OU MISTAS. PRODUÇÃO AGRÁRIA.

1. Comercialização

1. O sector comercial de produtos para a agricultura (máquinas, adubos, rações, pesticidas, etc.) deve ser urgentemente reorganizado de modo a que deixe de ser aparelho dominado pelas grandes empresas e ao serviço destas.

1.2 O fascismo instalou, neste importante sector, Grémios da Lavoura e Federações, viciadas associações ditas cooperativas e organismos de coordenação dita económica que têm constituído um violento dispositivo de roubos e estrangulamento dos pequenos produtores.

1.3 Essa corrompida e parasitária estrutura comercial que sempre tem favorecido as classes privilegiadas, deve ser colocada rapidamente ao serviço das classes populares, dos produtores e dos consumidores.

1.4. Para isso devem ser simplificados, encurtados e barateados os circuitos comerciais:

1.5 Estas empresas mistas devem actuar em cada ramo comercial (máquinas, adubos, rações, cereais, leite, carne, etc.) e passar a assegurar o exclusivo ou o essencial na compra dos produtos aos produtores.

1.6 Ao pequeno produtor deve ser assegurado:

  1. aos produtos que vende:
  1. nos produtos que compra:

2. Produção

2.1 As grandes linhas de produção agrária foram desviadas Pelos grandes agrários e pelo governo fascista só para favorecer as grandes empresas.

Com essa orientação não só foram prejudicadas as pequenas empresas com a produção nacional, a qual tem vindo sempre a declinar, em especial após o 25 de Abril, com a generalizada sabotagem económica.

2.2. Urge que toda a produção agrária seja fomentada de modo a favorecer decididamente os trabalhadores do campo e a economia geral do País.

SECÇÃO IV
LIGAS DE PEQUENOS AGRICULTORES DIFERENÇA ENTRE LIGAS E COOPERATIVAS

1. A Liga dos Pequenos Agricultores deve ser uma realidade. Como associação de classe deve agrupar pequenos e médios agricultores e deverá ser a comissão de freguesia respectiva que se encarregará de definir quem deverão ser os agricultores a fazer parte da Liga.

2. Devem ser os próprios pequenos agricultores a buscar as soluções para os seus problemas.

3. Deverão constituir-se comissões de freguesia e comissões de concelho. Das comissões de concelho deverá formar-se a Comissão Distrital e desta o respectivo Secretariado da Liga.

4. A Liga dos Pequenos Agricultores deverá ser uma associação forte, aberta a todos os elementos técnicos que voluntariamente queiram colaborar na organização, mas estes não terão capacidade de decisão.

5. A Liga dos Pequenos Agricultores declara-se em total aliança com o Sindicato dos Trabalhadores Rurais.

6. As Ligas são associações de classe bem distintas das cooperativas, que são associações de carácter económico.

7. Os pequenos agricultores não devem, isoladamente, desencadear formas de luta sem o controlo e a discussão prévia na Liga dos Pequenos Agricultores. Deverá existir uma unidade perfeita dentro da Liga, a fim de não serem permitidos actos isolados que eventualmente possam ser inconsequentes.

8. A Liga dos Pequenos Agricultores deve exigir que os técnicos agrícolas dos gabinetes de Lisboa venham para os campos ajudar os pequenos agricultores, como consultores técnicos.

SECÇÃO V
PREVIDÊNCIA E SEGURANÇA SOCIAL

Nesta secção foi aprovada por unanimidade a seguinte moção:

«Considerando que os pequenos agricultores, como trabalhadores da terra, não têm no campo da Previdência e Segurança Social qualquer regulamento, como seja a assistência na doença, na invalidez e na velhice bem como qualquer subsídio familiar;

Considerando que dentro das preocupantes condições que afectam as populações se encontra a falta de assistência;

Considerando que o estado sanitário lastimoso da grande maioria das populações rurais como seja a existência de fossas, estrumeiras, poços por limpar, etc., nos arredores ou mesmo dentro das povoações;

Considerando que apenas têm acesso à medicina os filhos dos agrários ricos em prejuízo da profissão enquanto as populações carecem de assistência;

A Assembleia concluiu, aprovou e adoptou para os pequenos agricultores:

  1. — As conclusões já apresentadas e aprovadas na Conferência dos Trabalhadores Rurais em Évora, em 9-2-75;
  2. — A socialização da medicina, que ponha todos os médicos ao serviço de toda a população e não apenas ao serviço de alguns privilegiados».

Inclusão 29/05/2019