Martov

Leon Trótski

março de 1919


Primeira edição: World Revolution (Revolução Mundial), vol.1, 18 de março de 1919 – 24 de abril de 1922.

Fonte para a tradução: seção inglesa do Arquivo Marxista na Internet.

Tradução: Vinícius Azevedo.

HTML: João Victor Bastos Batalha.

Creative Commons


Sem dúvida, Martov representa uma das figuras mais trágicas do movimento revolucionário. Escritor talentoso, político engenhoso, mente perspicaz e graduado pela escola do marxismo, Martov entrará, no entanto, para a história da revolução operária como um enorme ponto negativo. Seu pensamento carecia de coragem, sua perspicácia carecia de vontade. A tenacidade não foi suficiente para compensar isso. Ela o destruiu. O marxismo é um método de análise objetiva e, ao mesmo tempo, um pré-requisito para a ação revolucionária. Ele pressupõe um equilíbrio entre pensamento e vontade, capaz de comunicar força física ao próprio pensamento e disciplinar a vontade com a coordenação dialética do subjetivo e do objetivo. Privado da mola propulsora da vontade, o pensamento de Martov direciona consistentemente toda a força de sua análise para justificar teoricamente a linha de menor resistência. Dificilmente existe ou poderia existir em qualquer momento outro político socialista que pudesse explorar o marxismo com tanto talento para justificar desvios e traições diretas a ele. Nesse aspecto, Martov poderia ser chamado, sem qualquer ironia, de virtuoso. Hilferding, Bauer, Renner e o próprio Kautsky, embora mais instruídos em seus próprios campos, eram, em comparação com Martov, apenas aprendizes desajeitados quando se tratava da falsificação política do marxismo, ou seja, da apresentação teórica da passividade, da adaptação e da capitulação como as formas supremas da luta de classes irreconciliável.

Sem dúvida, havia um instinto revolucionário em Martov. Sua primeira reação a grandes eventos sempre revelava uma aspiração revolucionária. Mas, após cada esforço desse tipo, seu pensamento, não sendo sustentado pela mola propulsora da força de vontade, desintegrava-se e recuava. Isso pôde ser observado nos primeiros sinais das ondas da revolução (Iskra), depois em 1905, novamente no início da guerra imperialista e, em parte, mais uma vez no início da revolução de 1917. Mas foi em vão. A criatividade e a flexibilidade de seu pensamento foram totalmente gastas em evitar as questões fundamentais e buscar ainda mais pretextos a favor do que era indefensável. A dialética tornou-se em suas mãos a casuística mais refinada. Uma tenacidade incomum, quase felina, a obstinação da indecisão e a teimosia da hesitação permitiram-lhe, durante meses e anos a fio, aderir às posições mais contraditórias e insolúveis. Embora revelasse, diante dos tremores históricos decisivos, um desejo de assumir uma posição revolucionária e despertasse esperanças, ele sempre se decepcionava: seus pecados não eram perdoados. E, como resultado, ele deslizou ainda mais ladeira abaixo. Finalmente, Martov tornou-se o político mais culto, mais refinado, mais evasivo e mais incisivo da intelectualidade pequeno-burguesa estúpida, banal e covarde. E o fato de ele próprio não ter visto nem compreendido isso indica como sua perspicácia mosaica ria impiedosamente dele. Hoje em dia, em um período das maiores tarefas e possibilidades que a história já abriu e apresentou, Martov está dividido entre Longuet e Tchernov. Basta mencionar esses nomes para avaliar a profundidade da queda ideológica e política desse homem que era mais talentoso do que muitos outros.