O governo provisório

J. V. Stálin

18 de abril (1 de maio) de 1917


Primeira publicação: Discurso proferido no comício na ilha de Vassilievski a 18 de abril (Primeiro de Maio) de 1917. “Soldátskaia Pravda” (“A Pravda do Soldado”), n.º 6. 25 de abril de 1917. Assinado: K. Stálin.
Fonte: J. V. Stálin, Obras. Editorial Vitória, Rio de Janeiro, 1953, págs. 46-49.
Tradução: Editorial Vitória, da edição italiana G. V. Stálin - "Opere Complete", vol. 3 - Edizione Rinascita, Roma, 1951.
HTML: Fernando Araújo.
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Dois poderes surgiram no país no curso da revolução: o governo provisório eleito pela Duma de 3 de junho e o Soviet dos Deputados Operários e Soldados eleito pelos operários e pelos soldados.

As relações entre esses dois poderes tornam-se cada vez mais tensas, a colaboração que antes existia entre eles desaparece, e seria criminoso de nossa parte dissimular esse fato.

A burguesia foi a primeira a formular o problema da dualidade do poder, a primeira a formular o dilema: ou o governo provisório, ou o Soviet dos Deputados Operários e Soldados. Não seria digno de nossa parte eximirmo-nos de dar resposta a uma pergunta formulada com clareza. Os operários e os soldados devem dizer de modo claro e preciso qual é o seu governo: o governo provisório ou o Soviet dos Deputados Operários e Soldados?

Fala-se de confiança no governo provisório, da necessidade dessa confiança. Porém, como se pode ter confiança em um governo que, nas questões mais importantes e fundamentais, não tem confiança no povo? Atualmente estamos em guerra. A guerra trava-se à base dos tratados com a Inglaterra e a França, concluídos pelo tzar à revelia do povo e que o governo provisório sancionou sem o consenso do povo. O povo tem o direito de conhecer o conteúdo desses tratados, os operários e os soldados têm o direito de saber por que se derrama seu sangue. Como respondeu o governo provisório à solicitação apresentada pelos operários e soldados no sentido de serem publicados os tratados?

Declarando que os tratados permanecem em vigor.

Mas até hoje não publicou nem se dispõe a publicar os tratados! Não será talvez evidente que o governo provisório esconde do povo os verdadeiros fins da guerra e, escondendo-os, obstina-se em não ter confiança no povo? Como podem os operários e os camponeses ter confiança no governo provisório que de sua parte não mostra ter confiança neles nas questões mais importantes e essenciais?

Fala-se de apoio ao governo provisório e da necessidade desse apoio. Mas julgai vós mesmos: em período revolucionário é possível apoiar um governo que desde o seu início vive a criar obstáculos à revolução? Até agora sucedeu que a iniciativa revolucionária e as medidas democráticas vieram do Soviet dos Deputados Operários e Soldados e somente deste. O governo provisório, após haver recalcitrado e resistido, se pôs de acordo com o Soviet só de maneira secundária, e além disso só em parte e em palavras, ao passo que na prática interpunha obstáculos. Até agora a coisa andou assim. Porém, como é possível, no apogeu da revolução, apoiar um governo que dificulta e impele para trás a revolução? Não será melhor formular a questão: que o governo provisório não crie dificuldades ao Soviet dos Deputados Operários e Soldados na obra que este último realiza visando à democratização do país?

No país estão se mobilizando as forças contrarrevolucionárias. Desenvolvem estas uma agitação no exército. Desenvolvem uma agitação entre os camponeses e a pequena burguesia das cidades. A agitação contrarrevolucionária é dirigida, antes de mais nada, contra o Soviet dos Deputados Operários e Soldados. Cobre-se ela com o nome do governo provisório. E o governo provisório tolera manifestamente os ataques contra o Soviet dos Deputados Operários e Soldados. Perguntamos: por que, então, apoiar o governo provisório? Talvez pela sua tolerância com relação à agitação contrarrevolucionária?!

Iniciou-se na Rússia o movimento agrário. Os camponeses solicitam cultivar por iniciativa própria as terras deixadas sem cultivo pelos latifundiários. Se não se cultivarem essas terras, o país poderá achar-se à beira da fome. Vindo ao encontro dos camponeses, a Conferência dos Soviets de toda a Rússia(1) decidiu “apoiar” o movimento dos camponeses dirigido no sentido de confiscar as terras dos latifundiários. Que faz agora o governo provisório? Declara “arbitrário” o movimento camponês, proíbe aos camponeses cultivar as terras dos latifundiários, baixa instruções “a propósito” aos seus comissários (vide o Riétch de 17 de abril). Perguntamos: por que então apoiar o governo provisório? Talvez porque declara guerra aos camponeses?

Diz-se que a falta de confiança no governo provisório abalará a unidade da revolução, afastará desta os capitalistas e os latifundiários. Mas quem ousará afirmar que os capitalistas e os latifundiários apoiam ou podem apoiar efetivamente a revolução das massas populares?

O Soviet dos Deputados Operários e Soldados, introduzindo a jornada de trabalho de oito horas não terá talvez afastado de si os capitalistas, unindo em torno da revolução amplas massas de operários? Quem ousará sustentar que a dúbia amizade de um punhado de industriais tem mais valor para a revolução que a amizade real de milhões de operários, cimentada com sangue?

Ou ainda mais: a Conferência dos Soviets de toda a Rússia, decidindo apoiar os camponeses, não terá talvez afastado de si os latifundiários, ligando as massas camponesas à revolução? Quem ousará afirmar que a dúbia amizade de um punhado de latifundiários tem mais valor para a revolução que a real amizade de muitos milhões de camponeses pobres, que vestem agora a farda?

A revolução não pode contentar a todos. Sempre, por um lado contenta as massas trabalhadoras e por outro golpeia os inimigos ocultos e ostensivos dessas massas.

Por isso aqui é preciso escolher: ou com os operários e com os camponeses pobres pela revolução, ou com os capitalistas e com os latifundiários contra a revolução.

Então: nós, a quem apoiaremos?

Que governo podemos considerar como nosso: o Soviet dos Deputados Operários e Soldados ou o governo provisório?

É evidente que os operários e os soldados somente podem apoiar o Soviet dos Deputados Operários e Soldados, que elegeram.


Notas de fim de tomo:

(1) A Conferência dos Soviets dos Deputados Operários e Soldados de Toda a Rússia, convocada pelo Comitê Executivo do Soviet de Petrogrado, realizou-se em Petrogrado de 29 de março a 3 de abril de 1917; nela predominaram os mencheviques e os social-revolucionários. (retornar ao texto)

Inclusão: 18/02/2024