Superados pela Revolução

J. V. Stálin

4 de maio de 1917


Primeira publicação: “Pravda” (“A Verdade”), n.° 48. 4 de maio de 1917. Assinado: K. Stálin.
Fonte: J. V. Stálin, Obras. Editorial Vitória, Rio de Janeiro, 1953, págs. 63-68.
Tradução: Editorial Vitória, da edição italiana G. V. Stálin - "Opere Complete", vol. 3 - Edizione Rinascita, Roma, 1951.
HTML: Fernando Araújo.
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A revolução caminha. Aprofundando-se e estendendo-se, passa de um campo para outro, revolucionando radicalmente toda a vida econômico-social do país.

A revolução, irrompendo na indústria, estabelece o problema do controle e da direção da produção por parte dos operários (bacia do Donetz).

A revolução, estendendo-se à agricultura, impele os camponeses a lavrar coletivamente as terras incultas e a munir-se de instrumentos de trabalho e de animais de tração (distrito de Schlüsselburg).(1)

Pondo a nu as pragas da guerra e o esfacelamento econômico agravado durante a guerra, a revolução irrompe no campo da distribuição, criando, de um lado, o problema do abastecimento alimentar da cidade (crise alimentar) e, do outro, o problema do abastecimento do campo com produtos industriais (crise comercial).

Para resolver todos estes problemas e outros problemas semelhantes, já chegados à maturação, é necessário que as massas revolucionárias dêem prova da máxima iniciativa, que os Soviets dos Deputados Operários intervenham ativamente na obra de edificação de uma nova vida, que, enfim, todo o poder passe para as mãos de uma nova classe capaz de conduzir o país na ampla estrada da revolução.

As massas revolucionárias da província já se colocam nessa estrada. Em alguns lugares os organismos revolucionários já tomaram nas mãos o poder (Urais, Schlüsselburg), pondo de lado os chamados “comitês de salvação pública”.

Entrementes, o Comitê Executivo do Soviet dos Deputados de Petrogrado, ao qual compete a tarefa de dirigir a revolução, marca passo, impotente, ficando para trás e desligando-se das massas, e substitui a questão fundamental da tomada de todo o poder pela fútil questão das “candidaturas” ao governo provisório. Ficando para trás em relação às massas, o Comitê Executivo mantém-se, ao mesmo tempo, em atraso relativamente à revolução e dificulta-lhe o avanço.

Temos diante de nós dois documentos do Comitê Executivo: o Memorial para os delegados dos operários, que foram levar presentes aos soldados na frente, e o Apelo aos soldados na frente. Pois bem, que nos dizem esses documentos? Precisamente que o Comitê Executivo ficou para trás, uma vez que ele, nesses documentos, dá as mais antirrevolucionárias e mais revoltantes respostas às principais questões do momento.

A questão da guerra

Enquanto o Comitê Executivo disputa com o governo provisório a respeito das anexações e das indenizações, enquanto o governo provisório fabrica “notas” e o Comitê Executivo se compraz em fazer o papel do “vencedor”, enquanto a guerra de agressão contínua como dantes, a vida das trincheiras, a verdadeira vida dos soldados, criou um novo instrumento de luta: a confraternização em massa. Não há dúvida de que a confraternização não é outra coisa, em si mesma, senão uma forma espontânea de aspiração à paz. Isso não obstante, a confraternização, posta em prática de maneira organizada e consciente, pode tornar-se um instrumento poderoso nas mãos da classe operária para atear a revolução nos países beligerantes.

Qual é a atitude de Comitê Executivo relativamente à confraternização?

Escutai:

“Camaradas soldados! Com a confraternização não obtereis a paz... Aqueles que vos asseguram que a confraternização é o caminho para atingir a paz, levam à ruína a liberdade da Rússia e a vós próprios. Não acrediteis neles” (vide Apelo).

Ao invés da confraternização, o Comitê Executivo propõe aos soldados que “não se recusem a efetuar as operações ofensivas que a situação militar pode exigir” (vide Apelo). Segundo parece, a questão é que a defensiva, “a defesa no sentido político, não exclui em nada as ofensivas estratégicas, a ocupação de novos territórios, etc. No interesse da defesa... é absolutamente indispensável passar à ofensiva, ocupar novas posições” (vide Memorial).

Em suma: para obter a paz é preciso atacar e conquistar “territórios” estrangeiros.

Assim raciocina o Comitê Executivo.

Mas em que se distinguem esses raciocínios imperialistas do Comitê Executivo da “ordem” contrarrevolucionária do general Alexéiev, na qual a confraternização na frente é declarada “traição” e se ordena aos soldados que “travem uma luta desapiedada contra o inimigo”?

Ou ainda mais: em que se distinguem esses raciocínios do discurso contrarrevolucionário com o qual Miliukov, na conferência do Palácio Mariinski, exigia que os soldados “efetuassem operações ofensivas” e observassem a disciplina no interesse da “unidade da frente”?...

A questão da terra

Todos conhecem o conflito surgido entre os camponeses e o governo provisório. Os camponeses querem cultivar logo as terras abandonadas pelos latifundiários, julgando que esse passo é o único meio de se assegurar o pão não só à população na retaguarda, como também ao exército na frente. Em resposta, o governo provisório declarou resolutamente guerra aos camponeses, pondo fora da “lei” o movimento agrário, e além disso enviou para o local comissários com a tarefa de defender os interesses dos latifundiários, dos “atentados” dos camponeses “que cometem arbitrariedades”. O governo provisório convidou os camponeses a se absterem de confiscar a terra até à convocação da Assembleia Constituinte: esta decidirá tudo.

Que atitude assume o Comitê Executivo sobre esta questão? Apoia os camponeses ou o governo provisório?

Escutai:

“A democracia revolucionária sustentará do modo mais resoluto na próxima Assembleia Constituinte... a expropriação sem indenização... das terras dos latifundiários. Hoje, considerando que o confisco imediato das terras dos latifundiários poderia gerar... no país uma séria comoção econômica... a democracia revolucionária previne os camponeses de qualquer solução arbitrária da questão da terra, uma vez que as desordens agrárias serão vantajosas não para os camponeses mas para a contrarrevolução”, pelo que se propõe “que não se apossem arbitrariamente dos bens dos latifundiários até às decisões da Assembleia Constituinte” (vide Memorial).

Estas são as declarações do Comitê Executivo.

Evidentemente o Comitê Executivo não apoia os camponeses, mas o governo provisório.

Não será talvez evidente que o Comitê Executivo, assumindo essa posição, acabou aceitando a palavra de ordem contrarrevolucionária de Chingariov: “Reprimir os camponeses!”

De um modo geral, desde quando os movimentos agrários tornaram-se “desordens agrárias”, e é inadmissível “a solução arbitrária” das questões? Que são os soviets, inclusive o Soviet de Petrogrado, senão um organismo surgido “arbitrariamente”? Talvez pense o Comitê Executivo que passou o tempo dos organismos e das decisões arbitrários”?

O Comitê Executivo agita o espantalho da “crise alimentar” como consequência do cultivo arbitrário das terras dos latifundiários. Mas eis que o Comitê revolucionário distrital de Schlüsselburg, surgido “arbitrariamente”, decidiu, com o objetivo de melhorar o abastecimento da população, que,

“para obter maior quantidade de produtos cerealíferos, cuja falta se faz sentir grandemente, as comunidades camponesas devem cultivar as terras incultas pertencentes às igrejas, aos mosteiros, as que já constituem apanágio e as dos proprietários privados.”

Que tem para dizer o Comitê Executivo contra essa decisão “arbitrária”?

Que pode contrapor a esta sábia decisão senão expressões vazias sobre as “arbitrariedades”, sobre as “desordens agrárias”, sobre as “soluções arbitrárias”, etc., tomadas por empréstimo aos decretos do senhor Chingariov?

Não será talvez evidente que o Comitê Executivo ficou para trás em relação ao movimento revolucionário da província e, tendo permanecido para trás, assumiu uma posição em contraste com o próprio movimento?...

Assim, um quadro novo abre-se diante de nós. A revolução desenvolve-se em amplitude e profundidade, abarca novos campos, penetrando na indústria, na agricultura, no campo da distribuição, formulando a questão da tomada de todo o poder. A província marcha à frente do movimento. Petrogrado, que marchava à frente durante os primeiros dias da revolução, agora começa a ficar para trás. Tem-se por isso a impressão de que o Comitê Executivo de Petrogrado tende a ficar parado na posição já atingida.

Mas em um período revolucionário é impossível ficar-se parado no mesmo lugar; só o movimento é possível: para a frente ou para trás. Por isso, quem tender a permanecer parado durante a revolução, ficará inevitavelmente para trás e quem fica para trás não é poupado: a revolução o impelirá para o campo contrarrevolucionário.


Notas de fim de tomo:

(1) O Comitê Popular Revolucionário do distrito de Schlüsselburg, eleito para o Congresso dos representantes das comunas e dos burgos agrícolas, para resolver a questão agrária decidiu: 1.°) — mandar lavrar pelas comunidades camponesas as terras livres pertencentes às igrejas, aos conventos, à família do tzar e aos proprietários privados; 2.°) — apoderar-se, mediante compensação mínima, dos animais de tração e instrumentos agrícolas necessários, pertencentes aos grandes proprietários, etc. De conformidade com essa deliberação, os comitês das comunas agrícolas tomaram sob seu controle todas as terras dos respectivos territórios, fizeram o recenseamento de todos os animais e utensílios agrícolas, providenciaram no sentido da proteção e preservação dos bosques, organizaram o lavramento das terras incultas, etc. (retornar ao texto)

Inclusão: 18/02/2024