A contrarrevolução e os povos da Rússia

J. V. Stálin

13 de agosto de 1917


Primeira publicação:Proletári” (“O Proletário”), n.° 1. 13 de agosto de 1917. Artigo não assinado.
Fonte: J. V. Stálin, Obras. Editorial Vitória, Rio de Janeiro, 1953, págs. 207-210.
Tradução: Editorial Vitória, da edição italiana G. V. Stálin - "Opere Complete", vol. 3 - Edizione Rinascita, Roma, 1951.
HTML: Fernando Araújo.
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Durante as jornadas da revolução e das transformações democráticas, o movimento marchava sob a bandeira da emancipação.

Os camponeses emancipavam-se do poder absoluto dos latifundiários. Os operários emancipavam-se das imposições das administrações de fábrica. Os soldados emancipavam-se do arbítrio dos generais….

Esse processo de emancipação não podia deixar de atingir também os povos da Rússia que o tzarismo oprimia há séculos.

O decreto sobre a “igualdade de direitos” dos povos e a destruição de fato das restrições nacionais, os congressos dos ucranianos, dos finlandeses, dos bielorrussos e a questão da república federativa, a proclamação solene do direito das nações à autodeterminação e as promessas oficiais no sentido de “não interpor obstáculos”: todos esses fatos atestavam a existência de um grande movimento de libertação dos povos da Rússia.

Isso acontecia durante as jornadas da revolução, quando os latifundiários haviam desaparecido da cena e a burguesia imperialista era apertada no torniquete da democracia.

Com o retorno ao poder dos latifundiários (os generais!) e com a vitória da burguesia contrarrevolucionária, modificou-se completamente o quadro da situação.

“Os grandes discursos” sobre a autodeterminação e as solenes promessas no sentido de “não interpor obstáculos” são esquecidos. Interpõem-se os obstáculos mais inverossímeis e chega-se até à ingerência direta na vida interna dos povos. Dissolve-se a Dieta finlandesa(1) e ameaça-se “pôr a Finlândia em estado de sítio, se for necessário” (Vietchérneie Vremia, 9 de agosto). Abre-se uma campanha contra a Rada ucraniana e contra a sua Secretaria(2) com a intenção evidente de decapitar o regime autônomo da Ucrânia. Simultaneamente voltam à baila os infames velhos métodos de provocar conflitos entre as nacionalidades e de semear criminosas suspeitas de “traição” com o fim de, uma vez desencadeadas as forças chovinistas contrarrevolucionárias, afogar em torrentes de sangue a própria ideia da libertação nacional, de cavar um abismo entre os povos da Rússia e de semear entre eles o ódio, para que se alegrem os inimigos da revolução.

Graças a isso é infligido um golpe de morte à causa da unificação desses povos em uma única família harmônica.

De fato, é óbvio que a política dos “litígios” nacionais não une, mas divide os povos, reforçando entre eles as tendências “separatistas”.

De fato, é óbvio que a política da opressão nacional posta em prática pela burguesia contrarrevolucionária ameaça “desagregar” a Rússia, coisa contra a qual investe com tanta falsidade e hipocrisia a imprensa burguesa.

De fato, é óbvio que a política que tem por fim incitar as nacionalidades umas contra as outras é a mesma política infame que, reforçando a desconfiança recíproca e o ódio entre os povos, divide as forças do proletariado de toda a Rússia, minando as próprias bases da revolução.

Justamente por isso todas as nossas simpatias vão para os povos oprimidos e menosprezados em seus direitos, que naturalmente lutam contra essa política.

Justamente por isso apontamos nossas armas contra aqueles que, pretextando a “autodeterminação” do povo, põem em prática a política das anexações imperialistas e da “união” forçada.

Não somos absolutamente contrários à união dos povos em um Estado único. Não queremos absolutamente o despedaçamento dos grandes Estados em pequenos. De fato, é óbvio que a união dos pequenos Estados em grandes Estados é uma das condições que facilitam a causa da aplicação do socialismo.

Mas queremos em tudo e por tudo que essa união seja voluntária, uma vez que somente uma união desse tipo é efetiva e duradoura.

Mas para obter isso é indispensável antes de mais nada o reconhecimento pleno e sem reservas do direito dos povos da Rússia à autodeterminação, que pode levar até à sua separação da Rússia.

É indispensável, além disso, confirmar com fatos esse reconhecimento verbal, deixando logo aos povos a liberdade de definir seu território e as formas de sua organização política," mediante Assembleias Constituintes próprias.

Essa é a única política que pode reforçar a confiança e a amizade entre os povos.

Essa é a única política que pode desimpedir o caminho para a união efetiva dos povos.

É fora de dúvida que os povos da Rússia não são infalíveis e podem cometer determinados erros ao organizar sua vida. O dever dos marxistas russos é indicar-lhes esses erros, antes de mais nada aos proletários, para conseguirem que os corrijam através da crítica, através da persuasão. Mas ninguém tem o direito de intrometer-se à força na vida interna das nações e de “corrigir” à força seus erros. As nações são soberanas nos assuntos que dizem respeito à sua vida interna e têm o direito de organizar-se segundo sua vontade.

Essas são as reivindicações fundamentais dos povos da Rússia, proclamadas pela revolução e tripudiadas agora pela contrarrevolução.

Não se pode pensar em realizar essas reivindicações enquanto a contrarrevolução estiver no poder.

O único caminho de libertação dos povos da Rússia da opressão nacional é a vitória da revolução.

A conclusão é uma só: a questão da libertação da opressão nacional é a questão do poder. As raízes da opressão nacional escondem-se no domínio dos latifundiários e da burguesia imperialista. Transferir o poder para as mãos do proletariado e do campesinato revolucionário significa justamente obter a libertação completa dos povos da Rússia da opressão nacional.

Ou os povos da Rússia apoiam a luta revolucionária dos operários pelo poder, e então obterão a libertação, ou não apoiam essa luta, e então é matematicamente certo que não verão a libertação.


Notas de fim de tomo:

(1) A Dieta finlandesa, convocada em fins de março de 1917, reivindicou a autonomia da Finlândia. A 5 de julho de 1917, após negociações prolongadas com o governo provisório, negociações que deram em nada, a Dieta aprovou a “lei sobre o poder supremo”, segundo a qual o seu poder estendia-se a todos os campos da vida da Finlândia, exclusive as questões de política externa, de legislação e administração militar, as quais permaneciam da alçada dos organismos centrais de toda a Rússia. A 18 de julho de 1917 o governo provisório declarou que a lei aprovada pela Dieta substituía-se à vontade da Assembleia Constituinte e dissolveu a Dieta. (retornar ao texto)

(2) A Rada central ucraniana foi constituída em abril de 1917 por grupos e partidos burgueses e pequeno-burgueses. Na véspera das jornadas de julho foi organizada a Secretaria geral da Rada, como órgão administrativo supremo na Ucrânia. Reprimida a demonstração de julho em Petrogrado, o governo provisório, pondo em prática uma política de opressão nacional, tirou da Ucrânia a bacia do Donetz, a região de Iekaterinoslav e alguns outros distritos. O poder supremo passou então para um comissário especial designado pelo governo provisório. Não obstante, os chefes da Rada, diante da ameaça da revolução proletária, conciliaram-se bem depressa com o governo provisório e a Rada tornou-se o baluarte da contrarrevolução nacionalista burguesa na Ucrânia. (retornar ao texto)

Inclusão: 18/02/2024