Uma prova de descaramento

J. V. Stálin

15 de outubro de 1917


Primeira publicação: “Rabótchi Put” (“O Caminho Operário”), n.° 37. 15 de outubro de 1917. Editorial.
Fonte: J. V. Stálin, Obras. Editorial Vitória, Rio de Janeiro, 1953, págs. 364-366.
Tradução: Editorial Vitória, da edição italiana G. V. Stálin - "Opere Complete", vol. 3 - Edizione Rinascita, Roma, 1951.
HTML: Fernando Araújo.
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Levado à parede pela pressão revolucionária, o governo dos favoritos da burguesia procura sair do aperto jurando mentirosamente que não teve a intenção de fugir de Petrogrado e de abandonar a capital.

Ainda ontem comunicava-se publicamente (Izvéstia!) que o governo “transferir-se-ia” para Moscou, julgando “insatisfatória” a situação da capital. Ainda ontem falava-se abertamente (“Comissão para a defesa”!)(1) na “entrega” de Petrogrado e além disso o governo exigia o afastamento da artilharia dos pontos de acesso à capital. Ainda ontem o latifundiário Rodzianko, sócio de Kerenski e de Kornílov no complô contra a revolução, aplaudia a decisão do governo sobre a “entrega”, augurando a ruína de Petrogrado, da frota e dos soviets. Ainda ontem “Londres” associava-se a essa decisão, augurando ao governo que pudesse desfazer-se rapidamente de Petrogrado e da frota. Tudo isso acontecia ainda ontem... E hoje os favoritos do governo, espavoridos, retiram-se em desordem diante da frota e da guarnição, que estão decididas a defender a capital; eles, confundindo-se e contradizendo-se uns aos outros, tentam vilmente dissimular os fatos, tentam justificar-se perante a revolução que procuravam ontem trair de maneira tão canhestra e infeliz.

Além disso, a declaração “categórica” de Kerenski, sobre o adiamento da “transferência” para a primavera, é desmentida por uma declaração igualmente categórica de Kíchkin, segundo a qual algumas instituições do governo “podem ser transferidas imediatamente para Moscou. E B. Bogdánov, relator da “Comissão para a Defesa” (e de maneira nenhuma bolchevique!), declara também categoricamente que “foi manifestada por parte do governo a vontade de abandonar Petrogrado; além disso amplas camadas da democracia viram na partida do governo a eventualidade da entrega de Petrogrado” (Izvéstia). Nem falemos sequer do fato de que, segundo as informações dos jornais da tarde, “os fautores da partida do governo provisório para Moscou tinham... a maioria dos votos” (Rússkie Viédomosti).

Mesquinhos e míseros seres do governo provisório! Eles, que sempre enganaram o povo, podiam contar com algo que não fosse mistificar de novo as massas, com o que se esforçam por mascarar sua retirada desordenada?

Mas os favoritos não seriam favoritos se se limitassem à mistificação. Kerenski retira-se e entrincheira-se por trás da mistificação, lança uma série de acusações nas [quais aponta o nosso Partido e deblatera sobre “reconhecimento dos pogroms” e sobre “perigosos inimigos da revolução”, sobre “chantagem” e sobre “corrupção das massas”, sobre as “mãos manchadas com o sangue de vítimas inocentes”, etc.

E é Kerenski quem esbraveja contra os “inimigos da revolução”, o mesmo Kerenski que juntamente com Kornílov e com Sávinkov organizou o complô contra a revolução e contra os soviets, fazendo marchar mediante o ludibrio o terceiro corpo de cavalaria sobre a capital!…

E é Kerenski quem esbraveja contra o “renascimento dos pogroms”, o mesmo Kerenski que com o aumento do preço do pão impeliu o campo aos pogroms e aos incêndios! Lede o jornal dos social-revolucionários defensistas, o Vlast Naroda, e julgai vós mesmos:

“Alguns de nossos correspondentes escrevem que as últimas desordens devem ser relacionadas com o aumento dos preços fixos. Os novos preços provocaram imediatamente um aumento geral do custo da vida. Disso resultou descontentamento, irritação, excessivo nervosismo, pelo que a multidão recorre mais facilmente que antes aos pogroms.”… (N.° 140).

E é Kerenski quem esbraveja contra a “corrupção das massas”, o mesmo Kerenski que maculou a revolução e perverteu-lhe os puros costumes fazendo reviver as instituições da espionagem e da polícia secreta com os infames Vonliarliarski e Chtchúkin!...

E é Kerenski quem esbraveja contra a “chantagem”, o mesmo Kerenski cujo regime é todo ele uma chantagem contra a democracia, e que abertamente fez chantagem na “Conferência Democrática” com o inexistente desembarque nas costas da Finlândia, fazendo com vantagem para si concorrência ao general Khabalov!…

E é Kerenski quem fala nas “mãos manchadas com o sangue de vítimas inocentes”, o mesmo Kerenski cujas mãos estão efetivamente manchadas com o sangue inocente de dezenas de milhares de soldados, vítimas daquela aventura que foi a ofensiva iniciada na frente em junho deste ano!…

Diz-se que neste mundo tudo tem um limite. Mas não será talvez evidente que o descaramento dos favoritos da burguesia não tem limite?

O Izvéstia noticia que os membros do “Conselho da República” acolheram Kerenski “com aplausos fragorosos e prolongados, provenientes de todos os setores.” Não esperávamos outra coisa de um Antiparlamento servil, parido pelos kornilovistas e levado a batismo por Kerenski.

Mas saibam esses senhores, saibam também todos os que preparam secretamente as repressões contra os “elementos de esquerda” e os que aplaudem antecipadamente essas repressões, saibam eles que quando soar a hora decisiva deverão todos responder da mesma maneira perante a revolução que eles querem trair, porém que não conseguirão enganar.


Notas de fim de tomo:

(1) A Comissão (ou Comitê Executivo) para a defesa do país foi criada pela Conferência para a defesa, convocada em 7 de agosto de 1917 pelo Comitê Executivo Central do Soviet dos Deputados Operários e Soldados, composto de social-revolucionários e mencheviques. O Comitê Executivo para a defesa do país apoiou as providências militares do governo provisório, tomadas no interesse da contrarrevolução (afastamento das tropas revolucionários de Petrogrado, etc.). (retornar ao texto)

Inclusão: 18/02/2024