Conselhos de Desempregados em São Petersburgo em 1906

Sergei Malyshev


Um novo atraso


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Nesse momento já tínhamos razões para suspeitar que a Duma não iria cumprir com suas decisões do dia 12 de Abril. Todas as Centúrias Negras começaram a se organizar energicamente contra o Conselho de Desempregados. A imprensa, tanto a liberal quando a ligada às Centenas Negras, começou a nos criticar severamente e a instigar sentimentos contra os desempregados. Toda a imprensa capitalista tomou vantagem da nossa recusa em aceitar os empregos em forma de cooperativa para atacar os Bolcheviques, e argumentou que nós, os Bolcheviques, estávamos usando este movimento de desempregados para nossos objetivos políticos.

O Conselho de Desempregados aproveitou cada oportunidade para expor a conduta insolente da imprensa capitalista, em especial da imprensa Cadete, e suas tentativas de defender os interesses da burguesia de tal forma que estavam dispostos a desfazer os empregos públicos que já haviam sido decididos na Duma de São Petersburgo.

Mas alguns jornais ainda estavam do nosso lado e nós tínhamos nosso jornal Bolchevique, o Volna, e outros para continuar com a luta. Através deles, particularmente através do Volna, nós expusemos a conduta monstruosa da imprensa Cadete e liberal e fomos de certa forma bem sucedidos em afastar esse problema.

Todo o mês de Maio passou. Ao começo de Junho o estado da organização dos empregos públicos havia mudado pouco e o problema ainda não havia sido resolvido. A única saída para o Conselho de Desempregados, e seu Comitê Executivo, foi começar, com ajuda do Partido Bolchevique, uma campanha ativa nas fábricas com objetivo de fazer pressão na Duma Municipal através das massas de trabalhadores no governo e dos grupos pequeno- burgueses. Desde que nossa organização começou a crescer e se fortalecer e se tornou capaz de fazer pressão contínua nas autoridades de São Petersburgo, a Duma precisou eleger conselheiros adicionais para a Comissão. Em 29 de Maio, foi comissionado a este Comitê Executivo expandido a organização e administração de empregos públicos onde quer que houvesse trabalho a ser feito na cidade.

Nesta época o dinheiro liberado pela Duma Municipal para a manutenção dos refeitórios e outras formas de auxílio aos desempregados havia acabado. Mas a Duma não fez novas concessões. Rumores eram de que o Ministério do Interior havia instruído a Duma Municipal a não fazer tantas concessões aos desempregados. A situação ficava muito séria.

Nós aumentamos nossa pressão na comissão através da imprensa. Adotamos outras medidas. Começamos a tornar o movimento de desempregados mais ativista.

Os desempregados estavam em uma posição muito grave. Nós forçamos a comissão da Duma a relatar para a Duma Municipal a seriedade da situação e a exigir, ou “implorar”, fundos para manter os refeitórios funcionando durante o verão. O grupo administrando os refeitórios estimou que 180 mil rublos fossem necessários para três meses servindo 18 mil refeições ao dia, a 15 kopeks por refeição. Somado a isso, nós fizemos a comissão ir à Duma pedir por dinheiro para ajudar os desempregados a pagar seus alugueis — 12 mil famílias por três meses — 180 mil rublos. Exigimos no total 360 mil rublos para o verão. A comissão de desemprego escreveu seu relatório baseado nesses pontos e o apresentou à Duma.

Mas a Duma não pretendia aceitá-lo; nem apressou o começo dos trabalhos. Nós nos levantamos na comissão e exigimos que uma reunião especial fosse realizada. A reunião especial foi realizada e através dela nós pudemos pressionar a Duma a liberar dinheiro para o auxílio dos desempregados e, principalmente, para a organização de empregos públicos.

Finalmente, perto do fim de Maio, os conselheiros municipais incondicionalmente recusaram a tomar qualquer responsabilidade pelos empregos e exigiram que nós encontrássemos alguma maneira de organizar os empregos de modo que nós fossemos os responsáveis por eles. E no dia 29 de Maio, a Duma, após ouvir o relatório da comissão de desemprego e a decisão dos conselheiros municipais sobre ele, aprovou um número de resoluções que pareciam aceitáveis. Elas eram:

  1. Reafirmar o direito da comissão executiva à dar todo trabalho já contratado, ou que não necessite de autorização da Duma, para os desempregados.
  2. Propor para o conselho da cidade e para a comissão executiva que apenas trabalho que a comissão de organização dos empregos públicos não acredite poder realizar por si própria sejam licitados no futuro.

Mas logo descobrimos que essa decisão afetava apenas trabalhos de manutenção, e a organização dos empregos públicos, mesmo após a aprovação desta excelente resolução, não seguiu adiante.

Dias e semanas passaram. Assembleias gerais semanais dos desempregados, e especialmente dos trabalhadores em fábricas e usinas, eram realizadas para discutir a situação, e foram aprovadas resoluções repreendendo a conduta vergonhosa da Duma Municipal em relação aos desempregados. A Duma tendia a atrasar e anular todos os esforços para que esses empregos fossem criados.

A comissão executiva se tornou tão atrevida que decidiu não convidar os representantes do Conselho de Desempregados para os encontros.

O Conselho de Desempregados, em seu encontro do dia 31 de Maio de 1906, decidiu dar fim a esse assunto. Uma resolução foi aprovada, chamando por uma reunião conjunta da comissão executiva, dos representantes do Conselho de Desempregados, do sindicato de engenheiros e do escritório central de sindicatos.

Essa resolução foi transmitida à comissão executiva, mas, sobre o controle das Centenas Negras, foi ignorada. Novamente uma assembleia geral municipal do Conselho de Desempregados foi chamada. Novamente foi decidido exigir da comissão executiva que ela se pronunciasse se iria criar ou não os empregos públicos. Mas a comissão de desemprego ignorou essas resoluções e decisões do proletariado.

Os desempregados ficavam mais impacientes e a indignação crescia. Os distritos começaram a exigir que o Conselho tomasse medidas mais efetivas para forçar a Duma e a comissão executiva a agir. O Conselho de Desempregados tentou prevenir que grupo individuais de desempregados fizesse qualquer movimentação provocativa, ao mesmo tempo em que tentava tudo que podia para pressionar a Duma Municipal. O ânimo nos distritos estava tão acirrado que o Conselho de Desempregados teve que distribuir panfletos para todos trabalhadores de São Petersburgo pedindo que mantivessem a calma. Isso foi em 10 de Junho de 1906. Neste panfleto o Conselho dizia:

“O Conselho de Desempregados não esconde das massas que a Duma está enrolando, brincando com os desempregados, sem a intenção de manter qualquer das suas promessas. Mas o Conselho não rompeu seu contato com a Duma porque fazer isso significaria participar do jogo daqueles que querem provocar os trabalhadores a tomarem medidas prematuras. Isso é exatamente o que os inimigos da classe trabalhadora, sedenta pelo sangue do proletariado, estão esperando.

No presente, a provocação aos desempregados chegou ao nível mais alto. O Ministério do Interior deu ordens especiais à Duma e aos conselheiros municipais para não fazer concessões aos desempregados. Seu objetivo é bem claro: levar os desempregados a ações prematuras num momento em que seus camaradas empregados não estão prontos para ajudá-los, e a Duma, é claro, faz instantaneamente o que o Ministério quer que ela faça. Porém, não devemos permitir que nós sejamos provocados pela Duma. Nós sabemos muito bem que a visão de sangue de trabalhadores não assusta nossos inimigos, mas os alegra. Nós sabemos muito bem que ações não pensadas permitiriam que aqueles que querem nosso sangue esfregassem suas mãos e dissessem: ‘nosso plano deu certo. Os trabalhadores não se esquecerão dessa lição, não se recuperarão rápido, não vão renovar sua organização tão cedo.

Nós não devemos dar aos provocadores esse prazer. Nada drástico deve ser feito enquanto o Conselho de Desempregados não nos chamarem para assim fazer.

Isso deve ser a primeira regra seguida por todos os desempregados. Mas o Conselho de Desempregados, entendendo a seriedade da situação, não falhará em tomar essa decisão quando o tempo chegar e nós o faremos bem juntos às massas trabalhadoras.”

Quando o rascunho desse panfleto foi lido no Conselho de Desempregados, algumas seções do Conselho, de espírito mais anarquista, social-revolucionário, não estavam satisfeitas; eles não acharam o panfleto firme o suficiente. Havia uma divisão. Eles exigiam que o Conselho tomasse ações mais firmes, forçasse a Duma, etc., etc. Mas a poeira levantada pelos anarquistas social-revolucionários foi varrida quando a votação foi chamada.


Inclusão: 05/12/2019