A Dialética da Natureza

Friedrich Engels


Apontamentos
Dialética e Ciência


capa

Elaborados entre 1873 e 1882. São aqui reproduzidos tal como estão nos manuscritos. Os apontamentos de págs. 167 a 247 estão dispostos na mesma ordem indicada pela própria numeração de Engels, nas páginas manuscritas. Os demais foram escritos por Engels em folhas soltas, de diversos tamanhos. Conquanto suas datas de elaboração só tenha sido possível determinar-se em poucos casos, são eles apresentados aqui de acordo com seu conteúdo: 1) — Idéias sobre polaridade; 2) — Sobre lógica e filosofia dialética; 3) — Sobre matemática; 4) — Sobre mecânica, física e química; 5) — Uma página que faz um resumo dos principais títulos da matéria tratada. Cada uma dessas seções foi começada em uma nova página. As notas, escritas em uma única folha de papel, foram reproduzidas na ordem em que se encontravam.
(Nota do Instituto Marx-Engels-Lenin)

BÜCHNER (Louis, 1824-1899). Origem da tendência. Dissolução da filosofia alemã no materialismo — abolição do controle sobre a ciência — aparecimento da vulgar popularização materialista, em que o materialismo devia compensar a falta de ciência. Seu florescimento na época da máxima degradação da Alemanha burguesa e da ciência oficial alemã; 1850-60. Vogt (Karl, 1817-1895), Moleschott (Jacob, 1822-1893), Büchner. Seguro Mútuo. Ressurreição do darwinismo, posto novamente em moda e logo alugado por esses cavalheiros.

Poderíamos deixá-los tranqüilos, inteiramente entregues ao seu louvável mas mesquinho ofício de pregar o ateísmo etc., incorporando-o à filosofia alemão, não fosse a seguinte:

  1. — Devido aos insultos à filosofia (citar passagens)(I) que, apesar de tudo, é a glória da Alemanha; e
  2. — A presunção de aplicar a teoria da Natureza à sociedade e de reformar o socialismo.

Por isso, somos forçados a tomar nota deles.

Antes de tudo, que conseguem eles em sua própria esfera? Apenas, citações.

2. Ponto crucial, pp. 170-171. A que é devido esse súbito hegelianismo? Transição à dialética. Duas tendências filosóficas: a metafísica, com categorias fixas; e a dialética (especialmente Aristóteles e Hegel), com categorias fluidas; provas de que esses opostos fixos, antecedente e conseqüente, causa e efeito, identidade e diferença, essência e aparência, são insustentáveis; que a análise nos mostra um pólo, já presente no outro, in nuce; que, num dado ponto, um dos pólos se transforma no outro; e que toda a lógica se desenvolve unicamente a partir dessas contradições progressivas. Isso, no próprio Hegel, encontra-se no terreno místico, porque a categoria aparece como preexistente e a dialética do mundo real como um simples reflexo. Na realidade, é tudo justamente ao contrário: a dialética cerebral é apenas o reflexo das formas de movimento do mundo real, da Natureza como história. Até fins do século passado (na verdade, até 1830), os investigadores da Natureza podiam arranjar as coisas razoavelmente bem por meio da velha metafísica, porque a ciência real só ia um pouco além da mecânica, terrestre e cósmica. No entanto, a confusão havia já sido introduzida pela matemática superior, que considera a verdade eterna da matemática elementar como ponto de vista superado, que freqüentemente afirma o contrário, estabelecendo proposições que, ao matemático elementar, parecem puro disparate. As categorias rígidas, assim, se dissolveram; a matemática chegou a um ponto em que, inclusive relações tão simples como as da simples quantidade abstrata, o mal infinito, assumiam uma forma inteiramente dialética e obrigavam os matemáticos a se tornarem dialéticos, inconscientemente e até mesmo contra a sua vontade. Não há nada mais cômico do que as contorções, subterfúgios e expedientes empregados pelos matemáticos para resolver essa contradição, para reconciliar a matemática superior com a elementar, para convencer a si mesmos de que aquilo que estabeleceram como resultado certo e inegável, não é um simples disparate e, em geral, para explicar racionalmente o ponto de partida, o método e o resultado a que chegou a matemática do infinito.

Agora, porém, é tudo diferente. A química, divisibilidade abstrata dos entes físicos, mal infinito, atomística. A fisiologia: a célula (o processo orgânico do desenvolvimento, tanto do indivíduo como da espécie, por diferenciação, a prova mais evidente da dialética racional); e finalmente, a identidade das forças da Natureza e sua interconversão, pondo um fim a toda a rigidez das categorias. Apesar de tudo, a maioria dos investigadores da Natureza encontra-se ainda atada às velhas categorias metafísicas e se torna impotente quando os fatos atuais que, por assim dizer, demonstram a dialética da Natureza, precisam ser racionalmente explicados e colocados em relação uns com os outros. Neste ponto, é necessário pensar, os átomos e as moléculas, etc., não podem ser observados ao microscópio, mas apenas pelo processo do pensamento. Vejamos os químicos [exceto Schorlemmer (Arthur, 1834-1892) que está a par da doutrina de Hegel; a patologia celular de Virchow (Rudolf von, 1821)], os quais, afina. De contas, ocultam sua impotência sob o disfarce de frases inconsistentes. A dialética, despojada de misticismo, torna-se uma necessidade absoluta para a ciência da Natureza, já que esta abandonou o campo em que eram suficientes as categorias rígidas, isto é, a matemática elementar da lógica e seus recursos domésticos. A filosofia se vinga postumamente da ciência da Natureza, por haver esta última desertado daquela; e, no entanto, poderiam ter visto (inclusive através dos êxitos obtidos pela filosofia, nas ciências naturais) que aquela possuía alguma coisa superior a eles, inclusive em sua própria esfera especial [(Leibnitz, o fundador do cálculo infinitesimal, em contraste com o qual o asno indutivo de Newton(1) não passa de um plagiário e corruptor; Kant, coma teoria da evolução cósmica antes de Laplace; Oken (Lorenz, 1779-1851), o primeiro a adotar, na Alemanha, a teoria da evolução; Hegel, cujo estudo (enciclopédico) e cuja classificação racional das ciências naturais constitui um êxito maior que todos os disparates materialistas reunidos].

A respeito da pretensão de Büchner de emitir opinião sobre o socialismo e os fenômenos econômicos explicando-os por meio da luta pela existência; Hegel, Enciclopédia I, pág. 9, sobre o diletantismo; sobre política e socialismo: a compreensão que o mundo esperava, pág. 11.

Separação, coexistência e sucessão. Hegel, Enciclopédia, pág. 35! Como determinação do sensorial, da imaginação.

Hegel, Enciclopédia, pág. 40. Fenômenos naturais; mas em Büchner não elaborados, simplesmente copiados, donde o supérfluo.

Pág. 42 — A lei de Sólon, “tirou-a de sua cabeça”; Büchner é capaz de fazer o mesmo com a sociedade moderna.

Pág. 43 — Metafísica, a ciência das coisas, não a dos movimentos.

Pág. 53 — Pela experiência ... chega.

Pág. 56 — Paralelismo entre o indivíduo humano e a história = paralelismo entre a embriologia e a paleontologia.

Dialética da Ciência Natural — Tema: a matéria em movimento.

As diferentes formas e variedades da matéria só podem ser reconhecidas por meio do movimento; somente através dele se manifestam as propriedades dos corpos; de um corpo que não se move, nada se pode dizer(2). Por conseguinte, a constituição dos corpos em movimento, resulta das formas de movimento.

1. A forma primeira, a mais simples forma do movimento, é a forma mecânica, a simples mudança de lugar.

a) Movimento de um corpo único: não existe; só há movimento relativo; queda.

b) Movimento de corpos separados: trajetória, astronomia; equilíbrio aparente; afinal, sempre o contato.

c) Movimento dos corpos em contato, relacionados entre si; pressão. Estática. Hidrostática e gases. A alavanca e outras formas da mecânica propriamente dita; todas elas surgem, sob sua forma mais simples, do contato, do atrito e do choque, distintos um do outro apenas como etapas. Mas o atrito e o choque (na realidade, contato) provocam outras conseqüências não consideradas pelos investigadores: produzem, segundo as circunstâncias, som, calor, eletricidade, magnetismo.

2. Essas diferentes forças (com exceção do som): física dos corpos celestes.

  1. Transformam-se uma na outra, substituem-se mutuamente e
  2. mediante certo desenvolvimento quantitativo de cada força, aplicada aos corpos (sob forma diferente, em cada caso), quer sejam compostos químicos ou vários corpos quimicamente mais simples, verificam-se transformações químicas e, assim, entramos no domínio da química. Química dos corpos celestes. Parte cristalográfica da química.

3. A física teve que deixar de lado (ou foi capaz de assim proceder) o corpo físico vivente; somente através da investigação dos compostos orgânicos, pode a química desvendar a verdadeira natureza dos corpos mais importantes e, por outro lado, sintetiza corpos que só se apresentam na natureza orgânica. Nesse terreno, a química conduz à vida orgânica e já conseguiu chegar bastante longe para poder-nos assegurar que somente por esse meio nos poderá explicar a transição dialética ao organismo.

4. A verdadeira transição está, entretanto, na história: do sistema solar, da Terra, a pressuposição real do orgânico.

3. O orgânico.

Divisibilidade. O mamífero é indivisível; o réptil pode voltar a possuir patas; as ondas de éter, divisíveis e mensuráveis até o infinitamente pequeno; cada corpo é divisível dentro de certos limites, por exemplo, na química.

Coesão — negativa já nos gases — transformação de atração em repulsão, esta última sendo real apenas no gás e no éter (?).

Estados de agregação: pontos nodais em que a mudança quantitativa se transforma em qualitativa.

Secchi (Ângelo, 1818-1878) e o Papa.

A atração e a força centrífuga newtonianas: exemplo de pensamento metafísico; o problema não resolvido, mas recentemente exposto e isto aconselhado como sua solução(3). Idem, a respeito da diminuição de calor de Clausius(4).

A teoria de Laplace pressupõe apenas matéria em movimento: a rotação necessária para que todos os corpos flutuem suspensos no espaço universal.

O atrito e o choque produzem um movimento interno nos corpos em que eles intervêm: movimento molecular diferenciado como calor, eletricidade etc., segundo as circunstâncias. Mas esse movimento é apenas temporário: cessante causa, cessat effectus. Em uma determinada etapa, todos eles se transformam, numa permanente modificação molecular: a química(5).

Causa finalis — a matéria e seu movimento inerente. Essa matéria não é uma abstração. Inclusive no Sol, as diferentes substâncias estão dissociadas e não são distinguidas pela sua ação. Mas na esfera gasosa da nebulosa, todas as substâncias, conquanto se apresentem separadamente, se desvanecem sob a forma de matéria pura como tal, unicamente como matéria, não atuando por meio de suas propriedades específicas(6). (Além do mais, já em Hegel, está superada a contradição entre causa efficiens e causa finalis na interação).

A forma do desenvolvimento da ciência natural, na medida em que se manifesta o pensamento, é a hipótese. Observa-se um fato novo, que torna impossível o modo anterior de explicar os fatos pertencentes ao mesmo grupo. A partir desse instante, são necessários novos modos de explicação, a princípio baseados apenas em um número limitado de fatos e observações. O material destinado a observações ulteriores, aperfeiçoa essas hipóteses, deixa de lado umas e corrige outras, até que, finalmente, se estabelece a lei, sob uma forma pura. Se pretendêssemos esperar que o material destinado às observações se apresentasse sob uma forma pura, isso implicaria em suspender o processo do pensamento até esse momento e, justamente por essa razão, a lei nunca seria estabelecida.

A quantidade e as modificações das hipóteses, suplantando umas às outras, dão lugar facilmente (devido à falta de educação lógica e dialética dos investigadores) à idéia de que não podemos conhecer a essência das coisas (Haller e Goethe). Isso não peculiar à ciência natural, uma vez que o conhecimento humano, no seu conjunto, se desenvolve segundo uma curva em espiral ascendente; e também nas ciências históricas, incluindo a filosofia, as teorias se deslocam umas a outras, apesar do que ninguém pode afirmar, por exemplo, que a lógica formal seja um disparate.

A última forma dessa concepção é a coisa em si. Em primeiro lugar, essa afirmação de que não podemos conhecer a coisa em si (Hegel, Enciclopédia, § 44), deixa o campo da ciência para entrar no da fantasia. Em segundo lugar, não acrescenta coisa alguma ao nosso conhecimento científico, uma vez que, se não podemos examinar as coisas, essas deixam de existir para nós. E, em terceiro lugar, trata-se de uma simples frase que jamais se aplica. Tomada no sentido abstrato, nos parece muito natural. Mas apliquemo-la. Que se poderia pensar de um zoólogo que dissesse: um cão tem quatro patas; mas na realidade, não sabemos se tem quatro milhões de patas, ou nenhuma? Ou de um matemático que começasse a definir um triângulo dizendo que possui 3 lados e que, logo depois, confessasse não saber se, de fato, tem 3 ou 25 lados; que 2 x 2 parece que são 4? Mas os homens de ciência procuram não aplicar a frase da coisa em si à ciência natural; só se permitem fazê-lo quando passam ao terreno da filosofia. Esta é a melhor prova da pouca seriedade com que a encaram e o pouco valor que ela possui. Se a levassem a sério, para que investigar o nada? Considerada historicamente, a coisa teria um sentido determinado: só podemos conhecer de acordo com as condições de nossa época e até onde estas possam chegar.

A conversão da atração em repulsão, e vice-versa, é mística sob o ponto de vista de Hegel; mas, na essência, antecipou-a, quanto ao conhecimento científico posterior. No gás, por exemplo, há repulsão entre as suas moléculas; e esta é tanto maior na matéria mais sutilmente dividida, como a cauda de um cometa em que, inclusive, atua comum a força extraordinária. Nesse ponto também Hegel põe a prova o seu gênio ao considerar a atração como qualquer coisa secundária em relação à repulsão, como uma coisa que a precede: um sistema solar só pode ser constituído através da preponderância gradual da atração sobre a repulsão originariamente existente.

Dilatação pelo calor = repulsão. Teoria cinética dos gases.

O caráter contraditório das determinações mentais da razão: a polarização. Da mesma forma que a eletricidade, o magnetismo etc., se polarizam e se movem em virtude de uma oposição, assim também se manifesta o pensamento. Da mesma forma que, nos primeiros, não é possível observar um processo unilateral (o que nenhum homem de ciência ousaria fazer), também quanto ao segundo não o é.

Para aquele que nega a causalidade, toda lei natural representa uma hipótese; e, entre outras, também a análise química dos corpos celestes por meio do espectrógrafo de prisma. Que superficialidade de pensamento permanecer nesse ponto!

Coisa em si: Hegel, Lógica, I, 2, pág. 10 e também, mais adiante, toda uma seção a respeito:

“O ceticismo não se resolveu a dizer é; o idealismo moderno (isto é, Kant e Fichte) não admitiu considerar o conhecimento como sendo o conhecimento da coisa em si... Mas, ao mesmo tempo, o ceticismo admitia múltiplas determinações de sua aparência, ou melhor, sua aparência tinha como conteúdo toda a múltipla riqueza do mundo. Da mesma forma, a aparência do idealismo (isto é, o que o idealismo denomina aparência) compreende todo o conjunto dessas múltiplas determinações... Por conseguinte, é bem possível que não haja ser, coisa, ou coisa em si na base de seu conteúdo: fica para si como é; apenas se traduziu de ser em aparência”.

Portanto, neste caso, Hegel é um materialista muito mais positivo do que os homens de ciência modernos. O próprio Hegel esclareceu a verdadeira natureza das determinações da essência. Enciclopédia, I, § 111, Zuzartz: “Na essência tudo é relativo”. (Por exemplo, positivo e negativo, que só têm sentido se levarmos em conta a sua relação, e não cada um separadamente).

Os chamados axiomas da matemática são as poucas determinações mentais de que a mesma necessita como ponto de partida. A matemática é a ciência das grandezas; seu ponto de partida é o conceito de grandeza. Ele a define erradamente e, em seguida, acrescenta, por fora, como axiomas, as demais determinações elementares de grandeza, não contidas na definição, em que apareciam sem demonstração e, em seguida também, apresentadas como matematicamente indemonstráveis. A análise da grandeza daria todas essas determinações axiomáticas como determinações necessárias da grandeza. Spencer tem razão quando diz que tudo quanto nos é apresentado como evidente nesses axiomas é herdado. São dialeticamente demonstráveis, na medida em que não sejam puras tautologias.

A parte e o todo, por exemplo, já são categorias que se tornam insuficientes na natureza orgânica. A eclosão da semente: o embrião e o animal nascido não devem ser concebidos como uma parte separada do todo; isso constituiria um modo errado de encarar o fato. Somente no cadáver, pode tornar-se parte.

Identidade: abstrata a = a; e, pela negativa, a não é, ao mesmo tempo, igual e desigual a a; igualmente inaplicável na natureza orgânica. A planta, o animal, cada célula é, a cada instante de sua vida, idêntica a si mesma; e, no entanto, vai-se diferenciando de si mesma por absorção e excreção de substâncias, pela respiração, pela morte de células, pelo processo circulatório; em puçás palavras: devido a uma soma de seus resultados evidentes à nossa vista, durante as fases da vida: a vida embrionária, a juventude, a madurez sexual, o processo de reprodução, a velhice e a morte. Isso, além da evolução das espécies. Quando mais se desenvolve a fisiologia, tanto mais importantes se tornam para ela essas mudanças incessantes, infinitamente pequenas(7); e, por conseguinte, tanto mais importante, também, a consideração da diferença, dentro da identidade; e assim, o antigo ponto de vista abstrato da identidade formal, segundo o qual um ser orgânico tem que ser encarado como sendo idêntico a si mesmo, como uma coisa constante(8), tornando-se anacrônico. Entretanto, a maneira de pensar, baseada no mesmo, como também suas categorias, persiste ainda. Mas, inclusive na natureza inorgânica, a identidade como tal, não existe na realidade. Todo corpo está continuamente exposto a influências mecânicas, físicas e químicas, que sempre o modificam mudando a sua identidade. Unicamente na matemática — ciência abstrata e sua oposição à diferença e, mesmo nesse caso, são constantemente superadas (Hegel, Enciclopédia, I, pág. 235). O fato de que a identidade contenha em si mesma a diferença evidencia-se em toda proposição em que o predicado é necessariamente distinto do sujeito; o lírio é uma planta, a rosa é vermelha; seja no sujeito, seja no predicado ou no sujeito (Hegel, Enciclopédia, I, pág. 231).

Torna-se evidente que, em princípio, a identidade de um ente qualquer consigo mesmo, requer, como complemento, a diferença com tudo mais.

A contínua modificação, isto é, a supressão da identidade abstrata, é também encontrada nas denominadas coisas inorgânicas. Sua história é a geologia. Na superfície, modificações mecânicas (erosão, congelamento), modificações químicas (alterações devidas aos agentes atmosféricos); e, internamente, modificações mecânicas (pressão), calor (vulcânico), químicos (água, ácidos, substâncias de aglutinação), os grandes cataclismos, terremotos etc. A ardósia de hoje é fundamentalmente diferente do pântano que lhe deu origem; a greda difere das microscópicas conchinhas de que se compõe; e muito mais as rochas calcáreas que, segundo alguns, são de origem puramente orgânica; e os arenitos silicosos, que são derivados da erosão do granito, etc., não se falando do carvão.

Positivo e negativo — Também lhes podemos dar os nomes opostos: em eletricidade, etc., idem Norte e Sul, se os invertermos alterarmos correspondentemente o resto da terminologia, tudo fica certo. Chamaremos então de Este ao Oeste e de Oeste ao Este. O Sol se levantará no Poente, os planetas girarão de Oeste para Leste, etc.; e somente os nomes terão mudado. Na verdade, em física chamamos de Pólo Norte ao verdadeiro Pólo Sul do ímã, que é atraído pelo Pólo Norte do magnetismo terrestre.

Vida e Morte — Já agora não se aceita como científica nenhuma teoria fisiológica que não considere a morte como um momento essencial da vida (Nota, Hegel, Enciclopédia, I, pág. 112), encontrando-se a negação da vida essencialmente contida na própria vida; de maneira que sempre pensamos na vida em relação com o seu resultado necessário, a morte, que nela está contida em germe. A concepção dialética da vida nada mais é do que isso. E, para quem tenha compreendido isso, uma vez por todas, não haverá mais lugar para a controvérsia sobre a imortalidade da alma. A morte, ou é a dissolução do corpo orgânico de que nada mais restará senão os elementos químicos que constituíram a sua substância; ou então deixará depois de si um princípio vital (mais ou menos alma), que sobreviverá a todos os organismos viventes e não somente aos seres humanos. Por conseguinte, isso deve bastar para invalidar uma antiga superstição e compreender, por meio da dialética, a natureza da vida e da morte. Viver significa morrer.

Mal infinito — O verdadeiro já foi corretamente exposto por Hegel, no espaço e tempo plenos, no processo da Natureza e da história. Também a totalidade da Natureza se resolve agora em história e esta se diferencia da história natural apenas como processo evolutivo dos organismos conscientes. Essa infinita multiplicidade da Natureza e da história contêm a infinidade do espaço e do tempo — mal infinito — apenas como momento superado, essencial mas não predominante. O extremo limite de nossa ciência natural tem sido, até agora, o nosso Universo; e, para obter o conhecimento da Natureza, não temos necessidade dos universos infinitamente numerosos existentes fora do nosso. Com efeito, entre milhões de outros, apenas o nosso Sol, com seu sistema solar, constitui a base essencial de nossas investigações astronômicas. No que refere à mecânica, à física e à química terrestre, estamos mais ou menos limitados à nossa pequena Terra; e, quanto à ciência orgânica, o estamos inteiramente. Apesar disso, não é essencialmente prejudicada a diversidade praticamente infinita dos fenômenos e do conhecimento da Natureza; da mesma forma que também a história não é prejudicada por uma limitação semelhante, talvez até maior, a um período comparativamente curto e a uma pequena porção da Terra.

Simples e composto — Categorias que, no referente à natureza orgânica, perdem o sentido e se tornam inaplicáveis. Um animal não é representado por sua composição mecânica de ossos, sangue, cartilagens, músculos, tecidos; nem por sua composição química, considerados seus elementos componentes. (Hegel, Enciclopédia, I, pág. 256). O organismo não é simples, nem composto por mais complexo que possa ser.

Protomatéria — A concepção da matéria como originalmente existente e, em si, carente de forma, é muito antiga e se encontrando já entre os gregos, acima de tudo na figura mítica do caos, concebido como o fundamento amorfo do mundo existente (Hegel, Enciclopédia, I, pág. 258). Em Laplace encontramos novamente esse caos, mais ou menos uma nebulosa, que também só tem um princípio de forma. A diferenciação veio depois.

A incorreta teoria da porosidade (em que as diversas matérias falsas, o calórico etc., estão situadas em seus poros opostos e no entanto não se penetram entre si) é apresentada por Hegel (Enciclopédia, I, pág. 251), como simples ficção de nossa inteligência. Ver também a Lógica.

Força — Se uma espécie qualquer de movimento se desloca de um corpo para outro, pode-se considerá-lo, uma vez que se transmite, como ativa, como a causa do movimento; e, quando é transmitido, como passivo; e então a sua causa, o movimento ativo, é considerada uma força e o passivo, como sua manifestação. Da lei da indestrutibilidade do movimento se conclui automaticamente que a força é justamente tão grande quanto a sua manifestação, já que, tanto numa como na outra, o movimento é o mesmo. E o movimento que se transfere é mais ou menos determinável quantitativamente, por isso que se manifesta em dois corpos, um dos quais pode servir como unidade de medida, a fim de medir o movimento no outro. A mensurabilidade do movimento lhe confere, por seu valor, a categoria de força que, pelo contrário, não possui. Portanto, na medida em que seja esse o caso, mais aplicáveis assim, principalmente na mecânica, onde as forças se resolvem ainda mais se as considerarmos como compostas, conduzindo-nos freqüentemente a novos resultados, mesmo porque não se deve esquecer que se trata simplesmente de uma operação cerebral; ao aplicar a analogia de forças, que são realmente compostas (como ocorre no paralelogramo de forças), a forças realmente simples, estas últimas nem por isso se tornam realmente compostas. A mesma coisa se verifica na estática. Também na transformação de outras formas de movimento em movimento mecânico (calor, eletricidade, magnetismo na atração do ferro), em que o movimento original pode ser medido por meio do efeito mecânico produzido. Já nesse caso, porém, em que são consideradas simultaneamente diversas formas de movimento, revela-se a limitação da categoria ou abreviatura força. Nenhum professor de física denomina de simples forças a eletricidade, o magnetismo ou o calor, da mesma forma que não as chama de materiais ou imponderabilias. Ao ter conhecimento da quantidade de movimento mecânico em que se converteu uma determinada quantidade de movimento calórico, nada sabemos ainda a respeito da natureza do calor, já que é necessário o exame dessas transformações para que se possa investigar a natureza do calor. O fato de considerá-lo como uma forma de movimento é o último progresso da física e, dessa forma, fica superada nele a categoria força: em certas circunstâncias — nos casos de transição — podem aparecer como forças e podem ser assim medidas. Assim é que o calor pode ser medido pela dilatação que um corpo experimenta ao ser aquecido. Se, neste caso, o calor não passasse de um corpo para outro — o padrão de medida — isto é, se o calor do corpo que atua como padrão de medida não se alterasse, não se poderia falar de medição, de uma modificação de grandeza. Dizemos simplesmente: o calor dilata os corpos; enquanto que dizer: o calor tem a força de dilatar os corpos, seria uma simples tautologia; e dizer: o calor é a força que dilata os corpos, não seria correto, visto como, em primeiro lugar, a dilatação (nos gases, por exemplo), também pode ser produzida por outros meios; e, em segundo, o calor não se caracteriza por esse fato.

Alguns químicos referem-se também à força química como sendo a que provoca e mantém as combinações. Mas, neste caso, não há uma verdadeira transmissão, mas uma combinação do movimento de vários corpos em um só; e, dessa forma, a força chega ao seu limite. No entretanto, é ainda mensurável por meio da produção de calor, mas até agora sem muito resultado. O fato se converte em uma simples frase, como acontece sempre eu, em lugar de investigar formas de movimento não investigadas, inventa-se uma chamada força a fim de lhe dar uma explicação (como, por exemplo, explicar a flutuação da madeira sobre a água por meio de uma força flutuante, a refração da luz por meio de uma força refrativa, etc.) caso em que se obtém tantas forças quantos são os fenômenos inexplicados, com o que o fenômeno externo foi apenas transformado em uma frase interna. (A atração e a repulsão são mais fáceis de desculpar; neste caso, é abrangido, sob um nome comum, que dá uma impressão de conexão interna, um conjunto de fenômenos inexplicáveis para o físico). Finalmente, na natureza orgânica, a categoria força é totalmente insuficiente e, no entanto, é freqüentemente aplicada. Na verdade, é possível caracterizar a ação do músculo, em virtude de seu efeito mecânico, como força muscular e também medi-la; podemos inclusive, conceber como forças outras funções mensuráveis como, por exemplo, a capacidade digestiva de diversos estômagos: mas dessa maneira chega-se rapidamente ad absurdum (como por exemplo, força nervosa); é que, em todos esses casos, nos referimos a forças apenas num sentido muito restrito e figurado (como na frase corrente: recuperar as forças). Esse abuso nos conduziu a falar, inclusive, de uma força vital. Se, com essa denominação queremos significar que a forma de movimento nos corpos orgânicos é diferente da forma mecânica, física ou química, contendo-as a todas sob uma forma superada, então a forma de expressão é imprecisa principalmente porque a força (que pressupõe uma transferência de movimento) nos é apresentada como alguma coisa bombeada no organismo, vindo da parte de fora, não lhe sendo inerente, inseparável dele; e, por esse motivo, a força vital tem sido até agora o último refúgio de todos os supernaturalistas.

Defeito: 1) — A força, tratada finalmente como se tivesse existência autônoma. (Hegel, Naturphilosophie, pág. 71).

2) — Força latente, em repouso: explicá-la como sendo a relação entre movimento e repouso (inércia, equilíbrio); tratar também da solicitação.

A indestrutibilidade do movimento, segundo o princípio de Descartes de que o Universo contém sempre a mesma quantidade de movimento. Os homens de ciência expressam esse princípio erradamente referindo-se à indestrutibilidade da força. A afirmação simplesmente quantitativa de Descartes é igualmente insuficiente: o movimento como tal, como atividade essencial, como forma de existência da matéria, indestrutível como esta: a isso se reduz o quantitativo. Por conseguinte, também nesse caso, o filósofo foi confirmado pelo homem de ciência 200 anos depois.

“Sua essência (a do movimento) consiste em ser a unidade imediata de espaço e tempo ... ao movimento correspondem o espaço e o tempo; a velocidade, o quanto de movimento é espaço em relação a um determinado tempo transcorrido”.[(Hegel, Naturphilosophie (Filosofia da Natureza), pág. 65.)] “Espaço e tempo estão preenchidos com matéria ... da mesma forma que não há movimento sem matéria também não há matéria sem movimento” (Pág. 6).

Força (ver mais acima) — A transmissão do movimento se verifica unicamente em presença de todas as diversas condições que, em geral, são muito numerosas e complexas, especialmente no domínio da maquinaria (a máquina a vapor, o fuzil com seu ferrolho, gatilho, espoleta e pólvora). Se faltar uma delas, a transmissão não se verifica enquanto não se realizar a condição em falta. Isso pode ser representado como se a força deva ser antes excitada por meio da introdução dessa última condição, como se estivesse latente em um corpo, o chamado condutor de força (pólvora, carvão), por isso que, na realidade, não só deve estar presente esse corpo, mas também verificar-se todas as demais condições, a fim de provocar exatamente essa transferência especial.

A representação da força surge, perante nós por si mesma, pelo fato de que em nosso próprio corpo possuímos meios para transferir o movimento; aqueles que, dentro de certos limites, podem ser postos em ação por nossa vontade; especialmente os músculos dos braços, por meio dos quais realizamos mudanças mecânicas de lugar e movimento de outros corpos: levantamos, transportamos, lançamos, pegamos etc., efetuando dessa forma determinados efeitos úteis. Neste caso, aparentemente, o movimento é produzido e não se transfere; e isso dá origem à noção de força, em geral, como produtora de movimento. Que a força muscular, também seja uma simples transferência, somente há pouco tempo ficou provado fisiologicamente(9).

Movimento e equilíbrio — O equilíbrio é inseparável do movimento. No movimento dos corpos celestes há movimento em equilíbrio e equilíbrio em movimento (relativo). Mas todo o movimento relativo especial, isto é, neste caso todo movimento independente de corpos individuais, em um dos corpos celestes em movimento, é um tender para o estabelecimento do repouso relativo do equilíbrio. A possibilidade de um corpo ficar em repouso relativo, a possibilidade de estados temporários de equilíbrio, é condição essencial de diferenciação da matéria e, conseqüentemente, da vida. No Sol, não há equilíbrio das diversas substâncias, mas somente da massa em seu conjunto, ou seja, um equilíbrio muito restrito, determinado por consideráveis diferenças de densidade; na sua superfície, há um eterno movimento e inquietude, dissociação. Na Lua, parece prevalecer exclusivamente o equilíbrio, sem movimento relativo algum: morte (Lua = negatividade). Na Terra, o movimento diferenciou-se, tendo-se estabelecido o intercâmbio entre movimento e equilíbrio: o movimento individual tende para o equilíbrio e o movimento, em seu conjunto, destrói mais uma vez o equilíbrio individual. A rocha chegou ao repouso, mas a erosão, a ação das marés, dos rios e dos deslocamentos glaciais, destroem continuamente o equilíbrio. A evaporação e a chuva, o vento e o calor, os fenômenos elétricos e magnéticos, agem também da mesma forma. Por último, no organismo vivente, assistimos a um incessante movimento de todas as suas menores partículas, assim como de seus órgãos principais, donde resulta um continuando equilíbrio. A evaporação e a chuva, o vento e o calor, os fenômenos elétricos e magnéticos, agem também da mesma forma. Por último, no organismo vivente, assistimos a um incessante movimento de todas as suas menores partículas, assim como de seus órgãos principais, donde resulta um continuado equilíbrio do organismo na sua totalidade, durante o período normal de vida e que, no entanto, sempre permanece em movimento, a vivente unidade de movimento e equilíbrio(10).

Todo equilíbrio é apenas temporário e relativo.

Causalidade — A primeira coisa que nos chama a atenção, ao considerar a matéria em movimento, é a interconexão dos movimentos individuais de cada um dos corpos: o fato de estarem todos mutuamente condicionados. Não só verificamos que um movimento particular é seguido de outros, mas também que podemos provocar um movimento particular, caso estabeleçamos as condições em que, na Natureza, os mesmos se verificam; isso porque podemos produzir movimentos que, de forma alguma, ocorrem na Natureza (indústria), pelo menos não sob essa forma, e já que podemos dar a esses movimentos uma direção e extensão predeterminadas. Dessa maneira, devido à atividade dos seres humanos, estabeleceu-se a noção de causalidade a noção de que um movimento é a causa de outro. É verdade que a sucessão regular de certos fenômenos naturais pode dar origem, por si só, à noção de causalidade: o calor e a luz que vem do Sol; mas esse fato não demonstra nada e a esse respeito tinha razão o ceticismo de Hume (David, 1711-76), ao afirmar que um post hoc regular nunca poderá estabelecer um propter hoc. Mas a atividade dos homens constitui a prova da causalidade. Se focalizarmos os raios do Sol por meio de uma lente e os fizermos atuar como os raios de um fogo comum, com isso demonstraremos que o calor é proveniente do Sol. Se, em um rifle, juntarmos a escorva, a carga explosiva e o projétil, e dispararmos a arma, sabemos que se produzirá um determinado efeito (já conhecido de antemão, em virtude de experiências anteriores), porque podemos seguir, em todos os seus detalhes, o processo de ignição, combustão e explosão, esta devida à súbita produção de gases e conseqüente pressão gasosa sobre o projétil. Neste caso, o cético nem sequer poderá dizer que, graças à experiência prévia, não se pode afirmar que ocorra o mesmo na próxima vez. Pode acontecer, com efeito, que às vezes não se dê a mesma coisa: porque a escorva ou a pólvora poderá falhar, o cano rebentar etc. Mas isso demonstra exatamente a causalidade, ao invés de refutá-la; porque podemos encontrar a causa de cada um desses desvios da regra por meio de uma apropriada investigação: decomposição química da escorva, umidade da pólvora, defeito no caso etc. etc.; de maneira que, por assim dizer, a prova da causalidade é, neste caso, dupla.

Tanto a ciência da Natureza, como a filosofia, descuidaram inteiramente, até agora, investigar a influência da atividade humana sobre o pensamento(11); ambas só consideram a Natureza de um lado e o pensamento do outro. Mas é precisamente a modificação da Natureza pelos homens (e não unicamente a Natureza como tal) o que constitui a base mais essencial e imediata do pensamento humano; e é na medida em que o homem aprendeu a transformar a Natureza que a sua inteligência foi crescendo. A concepção naturalista da história — tal como se verifica, por exemplo, em Draper (John William, 1811-1822) e outros homens de ciência — encara o problema como se exclusivamente a Natureza atuasse sobre os homens e como se as condições naturais determinassem, como um todo, o seu desenvolvimento histórico. Essa concepção unilateral esquece que o homem também reage sobre a Natureza, transformando-a e criando para si novas condições de existência. Da natureza da Alemanha dos tempos em que os germanos dali emigraram, resta muitíssimo pouco. A superfície da terra, o clima, a vegetação, a fauna e os próprios seres humanos modificaram-se imensamente, e tudo isso devido à atividade humana: enquanto as modificações que se verificaram na natureza da Alemanha, no decurso do tempo, sem a interferência humana, são incalculavelmente pequenas.

Gravitação Newtoniana — o melhor que se pode dizer a esse respeito é que a mesma não explica, mas visualiza o estado atual dos movimentos planetários. O movimento é dado. Idem, a força atrativa do Sol. Com esses dados, como se pode explicar o movimento? Pelo paralelogramo das forças, por uma força tangencial que, então, se torna um postulado necessário, que devemos aceitar. Quer dizer: supondo-se a eternidade do estado existente, precisamos de um primeiro impulso, Deus. Mas o estado planetário atual não é eterno, nem o movimento é originariamente composto, mas é apenas simples rotação; é, portanto, um erro o paralelogramo de forças aplicado neste caso, visto como não ficou claramente demonstrada qual era a grandeza desconhecida, o x que era preciso ainda ser determinado, já que Newton pretendia não somente expor, mas resolver o problema.

Força — Também o aspecto negativo deve ser analisado: a resistência que se opõe à transmissão do movimento(12).

Interação é a primeira coisa que encontramos, quando consideramos a matéria em movimento, em conjunto, sob o ponto de vista da ciência natural contemporânea. Verificamos uma série de formas de movimento: movimento mecânico, calor, luz, eletricidade, magnetismo, combinação de decomposição químicas, modificações de estados de aglutinação, vida orgânica, todos os quais (embora presentemente continuemos executando a vida orgânica) se transformam uns nos outros, determinam-se mutuamente, aqui são causa, ali efeito, permanecendo sempre a mesma a soma total do movimento em todas as suas formas variáveis (Spinoza: a substância é causa sui, traduz surpreendentemente a ação recíproca). O movimento mecânico se transforma em calor, eletricidade, magnetismo, luz, etc., e vice-versa. A ciência confirma assim o que disse Hegel (onde?): a interação é a verdadeira causa finalis das coisas. Não podemos recuar, indo além do conhecimento dessa interação, pela simples razão de que, por trás dela, não há nada a conhecer. Se conhecemos a forma de movimento da matéria (ao qual, certamente, ainda falta muito em virtude do pouco tempo transcorrido desde que existe a ciência da Natureza), então conhecemos a própria matéria e, dessa maneira, o conhecimento está completo. (Todo o equívoco de Grove a respeito da causalidade, reside no fato de que não consegue ele conceber a categoria interação; possui a coisa, mas não o pensamento abstrato; e daí a confusão — pág. 12-14). Somente por meio dessa interação universal, podemos compreender a verdadeira relação causal. Para que se possa entender cada um dos fenômenos, devemos desembaraçar-nos da interconexão geral, considerando-os isoladamente; e então surgem os movimentos variáveis, um como causa e outro como efeito.

Indestrutibilidade do movimento — Uma bela passagem, em Grove, pág. 22 e seg.

Movimento mecânico — Entre os homens de ciência, o movimento é sempre considerado como se fosse uma coisa evidente, como movimento mecânico, como mudança de lugar. Isso é herança do século XVIII, prequímico, e torna muito mais difícil a clara compreensão dos processos. O movimento, aplicado à matéria, é transformação em geral. Do mesmo equívoco provém também essa fúria de reduzir tudo a movimento mecânico (inclusive Grove “inclina-se fortemente a admitir que as demais propriedades da matéria... são e serão, em última instância, reduzidas a formas de movimento”, pág. 16), o que destrói o caráter específico das demais formas de movimento. É preciso não se interpretar, em face disso, que cada uma das formas superiores de movimento não esteja sempre, necessariamente, conectada a um movimento mecânico real (exterior ou molecular); do mesmo modo que as formas superiores de movimento produzem também, simultaneamente, outras formas. A ação química não se torna possível sem mudanças de temperatura e mudanças elétricas; e a vida orgânica, sem transformações mecânicas, moleculares, químicas, térmicas, elétricas etc. Mas a presença dessas formas subsidiárias não esgota, em cada caso, a essência da forma principal. Algum dia, reduziremos experimentalmente, com toda segurança, o pensamento a movimentos moleculares e químicos, no cérebro; mas por acaso, isso esgotará a essência do pensamento?

Divisibilidade da matéria — Para a ciência, o problema é praticamente indiferente. Sabemos que na química, há um limite definido a essa divisibilidade, além do qual os corpos já não podem atuar quimicamente: o átomo; e que vários átomos sempre estão em combinação: a molécula(13). A mesma coisa na física, onde nos vemos forçados a aceitar (para as investigações físicas) partículas menores, cuja disposição determina a forma e a coesão dos corpos, evidenciando-se suas vibrações em calor, etc. Mas que as moléculas físicas e químicas sejam idênticas ou diferentes, sobre isso nada sabemos(14). Hegel passa muito rapidamente por cima dessa questão da divisibilidade, dizendo que a matéria é, ao mesmo tempo, as duas coisas: divisível e contínua; e, também ao mesmo tempo, nenhuma das duas, o que não é resposta, mas hoje está quase provado.

Pensamento científico — O plano de criação, concebido por Agassiz (Louis, 1827-1873), segundo o qual Deus partiu do geral para o particular, criando primeiramente o vertebrado tal qual é, logo depois o mamífero, o animal de presa, o gato e, finalmente, o leão! Isso quer dizer: conceber, em primeiro lugar, as idéias sob a forma concreta e, em seguida, as coisas concretas!

Indução e dedução — Haeckel (Ernst, 1834-1919), pág. 75 e seg. refere-se ao fato de que Goethe chegou à conclusão indutiva segundo a qual o homem que não tenha normalmente um osso premaxilar, devia possuí-lo; dessa forma por meio de uma indução incorreta, chegou ele a um resultado mais ou menos certo!

Em Oken (Haeckel, pág. 85 e seg.) encontra-se um disparate proveniente do dualismo entre a ciência e a filosofia. Oken descobre, por via do pensamento, o protoplasma e a célula; e a ninguém poderia ocorrer a idéia de que o assunto poderia ser resolvido pelos processos científicos: só o pensamento poderia fazê-lo! E, quando o protoplasma e a célula foram descobertos, Oken caiu no descrédito geral!

Causas finais e eficientes, transformadas por Haeckel (págs. 89-90), em causas atuantes com um fim e causas atuantes mecynicamente, porque, para ele, causa finalis = Deus! Da mesma forma, para ele, mecânico vem a ser, justamente, de acordo com Kant, igual a monista e não igual a mecânico no sentido da mecânica. Em face de tal confusão de linguagem, o disparate é inevitável. O que Haeckel diz a respeito da Crítica do Juízo, não concorda com Hegel, G. d. Phill (História da Filosofia), pág. 603..

Não há lugar nenhum onde se trate tão mal a Deus como entre os homens de ciência que nele crêem. Os materialistas explicam simplesmente as coisas, sem fazer uso de certas frases; fazem-no, sem dúvida, quando crentes piedosos e inoportunos pretendem impor-nos Deus pela força; por isso nos respondem com ouças palavras ou então como Laplaces Sire, je n’avais etc.(15); ou, mais rudemente, à maneira dos mercadores holandeses que, quando os viajantes comerciais alemães queriam impor-lhes suas mercadorias empacotadas, costumavam despachá-los com as seguintes palavras: Ik kan die Zaken niet gebruihen (não sei para que possam servir essas coisas); e, dessa forma, terminava o assunto. Mas como Deus tem que sofrer nas mãos de seus defensores! Na história da moderna ciência da Natureza, Deus é tratado pelos seus defensores tal como foi o Frederico Guilherme III por seus generais e oficiais na campanha de Iena. Uma divisão do exército após outra rende suas armas; uma fortaleza após a outra capitula ante a marcha da ciência, até que, por último, todo o infinito reino da Natureza é conquistado pela ciência, não restando nenhum lugar para o Criador. Newton permitiu-lhe, entretanto, o impulso inicial, embora lhe proibisse qualquer interferência posterior em seu sistema solar. O padre Secchi retirou-o inteiramente do sistema solar (é verdade que com todas as honras canônicas), mas nem por isso menos categoricamente, permitindo-lhe apenas um ato criador no que refere à protonebulosa. E assim em todos os terrenos. Na biologia, seu último Quixote foi Agassiz; este, inclusive lhe atribui um positivo disparate: supõe que, não somente criou os animais reais, mas também animais abstratos, o peixe tal qual é! E, finalmente, Tyndall (John, 1820-1893) proíbe-lhe inteiramente qualquer intromissão na Natureza relegando-o ao mundo dos processos emocionais; admitindo-o unicamente porque, afinal de contas, deve haver alguém que saiba mais a respeito de todas essas coisas (a Natureza), do que J. Tyndall! Que diferença do velho Deus — criador do Céu e da Terra, mantenedor de todas as coisas — sem o qual nem um cabelo pode cair de nossa cabeça.

A necessidade emocional de Tyndall nada prova. O Chevalier dês Grieux também sentia a necessidade emocional de amar e possuir Manon Lescaut, que se vendia (e a ele também, de quando em vez); por sua causa, ele se tornou mesquinho e vulgar; e se por acaso Tyndall pretendesse censurá-lo, ele poderia responder-lhe apelando para sua necessidade emocional.

Deus = néscio; mas ignorantia non est argumentum (Spinoza).

Associações na Natureza — As coletividades de insetos (as mais comuns não são mais do que situações puramente naturais), inclusive um conjunto social. Idem, de animais trabalhadores, muito produtivos (abelhas, castores etc.), mas apenas coisas secundárias e sem efeito de conjunto. Antes disso: colônias de corais e hidrozoários, em que o indivíduo é, quando muito, um estádio intermediário; e a comunidade carnal é principalmente uma etapa do desenvolvimento completo. Ver Nicholson (Henry Alleyne, 1844-1899). Igualmente os infusórios, a forma superior, e em parte muito diferenciada, que pode ser atingida por uma célula única.

Unidade entre Natureza e espírito — Para os gregos era evidente que a Natureza não podia ser irracional e até mesmo hoje os empíricos mais estúpidos provam por seu modo de raciocinar (muito embora equivocado) que estão convencidos, em princípio, de que a Natureza não pode ser irracional ou que a razão seja contrária à Natureza.

Classificação das ciências — Cada uma das quais analisa uma forma de movimento, ou uma série de formas em correspondência (e que se transformam entre), torna-se assim a classificação ou ordenamento dessas mesmas formas de movimento, de acordo com sua sucessão inerente; e nisso consiste sua importância.

Nos fins do século passado, segundo os materialistas franceses, predominantemente mecanicistas, evidenciou-se a necessidade de um estudo enciclopédico de toda a ciência da Natureza, libertando-a dos pontos de vista da velha escola de Newton-Linneu; e dois homens de extraordinário gênio empreenderam essa tarefa: Saint-Simon (de uma forma incompleta) e Hegel. Hoje em dia, quando a nova concepção da Natureza encontra-se completa, em seus aspectos básicos, faz-se sentir a mesma necessidade, havendo algumas tentativas nesse sentido. Mas agora que se deve pôr à mostra a geral interconexão evolutiva, na Natureza, mostra-se tão insuficiente a disposição externa, lado a lado, como as transições dialéticas artificialmente construídas de Hegel. As transições devem ser feitas por si mesmas, devem ser naturais. De maneira semelhante àquela em que uma forma de movimento se origina de outra, seus reflexos, as diversas ciências, devem derivar-se necessariamente um do outro.

Protistas(16). 1) — Seres não celulares, começam por um simples grânulo de proteína que se estende e lança pseudópodes, sob uma ou outra forma, na monera. (As moneras atuais são, por certo, muito diferentes das formas originais já que, em sua maior parte, vivem de matéria orgânica, engolindo diátomos e infusórios, isto é, corpos superiores a elas mesmas e que surgiram depois delas); e como (o mostra) a lâmina I de Haeckel, têm uma história evolutiva e passam pela forma dos enxames de espórios ciliados não celulares.

Neste caso já se evidencia a tendência para a forma que caracteriza todos os corpos albuminóides(17). Essa tendência para a forma é mais pronunciada nos foraminíferos unicelulares que segregam conchas altamente artificiais (antecipam colônias, corais, etc.?) e anunciam, na forma, os moluscos superiores, do mesmo modo que as algas tubulares (sifonáceas) antecipam o tronco, a raiz e a forma da folha das plantas superiores, mesmo quando são apenas albumina carente de estrutura. Por conseguinte, deve separar-se a protoameba da ameba.

2) — Por um lado se estabelece a distinção entre a epiderme (ectosarco) e a camada medular (endosarco) no animalzinho solar Actinophrys sol, Nicholson, pág. 49. A camada epidérmica estende pseudópodes (na Protomyxa aurantiaca essa camada já é de transição já é de transição; ver Haeckel, lâmina I). Ao longo dessa linha de evolução, a proteína não parece ter chegado muito longe.

3) — Por outro lado, na albumina se diferenciam o núcleo e o nucléolo: amebas nuas. A partir daí, o desenvolvimento morfológico marcha rapidamente. De maneira semelhante se verifica o desenvolvimento da célula jovem no organismo (sobre isso, ver Wundt, no começo). No A. Sphaerococcus, como no Protomyxa, a formação da membrana celular constitui apenas uma fase transitória, mas mesmo aí já se encontra o começo da circulação no vacúolo contrátil. Às vezes encontramos, seja uma conchinha de grãos de areia grudados (Difflugia, Nicholson, pág. 47), como nos vermes e nas larvas de insetos; seja uma conchinha genuinamente segregada. Por último:

4) — A célula com membrana celular permanente. Segundo Haeckel (pág. 382), originaram-se dela (conforme a dureza da membrana celular), a planta, ou, no caso de uma membrana mole, o animal (está claro que não se pode admitir uma tal generalização). Com a membrana celular, aparece a forma definida e, ao mesmo tempo, plástica. Aí, verifica-se de novo a distinção entre a membrana celular simples e a concha segregada. Mas (contrastando com o n˚. 3), com essa membrana células e essa concha, termina a extensão de pseudópodes. Repetição de formas anteriores (enxames de espórios ciliados) e diversidade de formas. A transição é constituída pelos Labyrinthyleae (Haeckel, pág. 385), que estendem seus pseudópodes para fora e se arrastam nesse ninho que, dentro de certos limites, se parece com um fuso. As Gregarinae antecipam o modo de vida dos parasitas superiores (alguns já não são células únicas, mas sim cadeias de células) (Haeckel, Pág. 451), conquanto contenham apenas duas ou três células, um pobre aglomerado. O mais alto desenvolvimento do organismo unicelular é o representado pelos infusórios, quando estes eram realmente unicelulares. Aí se verifica uma considerável diferenciação (ver Nicholson). Mais uma vez, colônias e zoófitos (Epistylis). Igualmente, elevado desenvolvimento de forma entre as plantas unicelulares (Desmidiaceae, Haeckel pág. 410)

5) — O seguinte passo à frente é representado pela união de várias células em um corpo, já não em uma colônia. Em primeiro lugar, a Katallaktae de Haeckel, a Magosphaera planula (Haeckel, pág. 384), em que a união das células é apenas uma fase do desenvolvimento. Mas isso também aí já não há pseudópodes (se é que os há como fase de transição, Haeckel não o diz com clareza). Por outro lado, os radiolários, também massas indiferenciadas de células, conservaram seus pseudópodes e desenvolveram ao mais alto grau a regularidade geométrica da concha, sendo que esta, nos rizópodes genuinamente unicelulares, desempenha um papel. A proteína se rodeia, por assim dizer, de sua forma cristalina.

6) — A Magosphaera planula constitui a transição às verdadeiras Planuras, Gástricas etc. Maiores detalhes em Haeckel, pág. 452 e seg.

Indivíduo — Também esse conceito se converteu numa coisa essencialmente relativa. Cormos colônia, tênia; por outro lado, célula e segmento como indivíduos em certo sentido (antropogenia e morfologia).

Repetição das constituições morfológicas em todas as etapas da evolução: formas celulares (as dos essenciais, já na gástrula) — formação de segmentos em certa etapa: anelídeos, artrópodes, vertebrados. Nos girinos dos anfíbios, repete-se a forma primitiva da larva da ascídia. Várias formas de marsupiais que reaparecem entre os placentários(18) (levando em conta apenas os marsupiais existentes).

Devemos aceitar, no que se refere à evolução dos organismos, a lei da aceleração, segundo o quadrado da distancia, em tempo, desde o ponto de partida. G. Haeckel, História da Criação e Antropogenia, as formas em correspondência com os diversos períodos geológicos. Quanto mais elevadas, tanto mais rapidamente evoluem.

A natureza orgânica, na sua totalidade, é uma prova ininterrupta da identidade ou inseparabilidade entre forma e conteúdo. Os fenômenos morfológicos e fisiológicos, a forma e a função, se condicionam mutuamente entre si. A diferenciação da forma (célula) determina a diferenciação da substância dando lugar ao músculo, à pele, aos ossos, ao epitélio etc.; e, por sua vez, a diferenciação da substância, determina a diferenciação da forma.

Teoria cinética dos gases — “Em um gás perfeito ... as moléculas estão já tão distantes entre si que sua interação pode ser desprezada” (Clausius, pág. 6). Que será que enche o espaço intermediário? Idem, a respeito do éter. Por conseguinte, cabe aqui o postulado de uma matéria que não é feita de células moleculares ou atômicas.

A lei da identidade, no velho sentido metafísico, é a lei fundamental da antiga concepção: a = a. Cada coisa é igual a si mesma. Tudo era permanente: o sistema solar , as estrelas, os organismos. Essa lei foi refutada pela ciência da Natureza, pouco a pouco e em cada caso particular, mas continua prevalecendo teoricamente e continua sendo defendida pelos partidários do velho, em oposição ao novo: uma coisa não pode ser, ao mesmo tempo, igual a si mesma e alguma outra. E, no entanto, a ciência natural demonstrou com detalhes (ver mais acima), o fato de que a verdadeira identidade, a identidade concreta, em contra-posição, contém em si a diferença. A identidade abstrata, como toda as categorias metafísicas, é bastante para o uso cotidiano, no qual são examinadas condições em pequena escala ou breves períodos de tempo; os limites dentro dos quais é utilizável diferem em cada caso e são determinados pela natureza do objeto. Para um sistema planetário em que, no cálculo astronômico ordinário, pode-se tomar como forma básica a elipse, sem cometer praticamente erros, são muito mais amplos do eu para um inseto que completa sua metamorfose em poucas semanas (Dar outros exemplos, qual seja a alteração das espécies, que se conta por períodos de muitos milhares de anos). Mas, para a ciência da Natureza, concebida em seu conjunto, e ainda mais em cada um de seus ramos, a identidade abstrata e totalmente insuficiente; e, embora, em conjunto, tenha agora sido abolida na prática, teoricamente continua dominando as cabeças; e a maior parte dos homens de ciências imagina que identidade e diferença são opostos inconciliáveis, em lugar de pólos unilaterais cuja verdade só reside em sua interação, na inclusão da diferença na identidade.

Os homens de ciência acreditam que se liberam da filosofia, ignorando-a ou insultando-a. No entanto, ao podem fazer progresso algum sem pensar; e, para pensar, necessitam de certas determinações mentais. Mas a verdade é que recebem essas categorias sem refletir, da consciência comum das pessoas chamadas cultas, aquelas justamente que estão dominadas por uns restos de filosofia há mito tempo caduca; ou então por esse pouquinho de filosofia escutada à força das Universidades (filosofia não só fragmentária mas constituída de uma miscelânea de opiniões de gente que pertence às mais variadas e geralmente piores escolas); ou ainda através de leituras não sistemáticas e acríticas, isto é, escritos filosóficos de toda a espécie. Por conseguinte, não estão eles livres da filosofia, mas sim, desgraçadamente na maioria dos casos, escravizados à pior filosofia; e aqueles eu a insultam são na sua maior parte dominados justamente pelos piores restos vulgarizados dos piores filósofos.

História — A moderna ciência da Natureza (a única de que se pode falar qua ciência, ao contrário das brilhantes intuições dos gregos e das desconexas e esporádicas investigações dos árabes) começa naquela época impetuosa em que o feudalismo foi esmagado pelos habitantes dos burgos. No fundo da luta entre os burgueses das cidades e a nobreza feudal, essa época trouxe à tona os camponeses rebeldes; e, por trás dos camponeses os primeiros indícios revolucionários do proletariado moderno já com a bandeira vermelha na mão e o comunismo nos lábios. Foi essa a época que deu origem às grandes monarquias européias, destruiu a ditadura espiritual do Papa, ressuscitou a antiguidade grega, verificando-se assim o mais elevado desenvolvimento artístico dos novos tempos; rompeu os limites do velho mundo, sendo este afinal realmente descoberto.

Foi essa a maior revolução que até então havia experimentado a Terra. Também a ciência da Natureza vivia e se agitava dentro dessa revolução: era revolucionária de cima até embaixo, marchava mão a mão com o despertar da filosofia moderna dos grandes italianos, fornecendo mártires à fogueira e à prisão. É significativo o fato de que tanto os protestantes como os católicos competiam no afã de persegui-la. Uns queimaram Servet; os outros, Giordano Bruno. Foi uma época que precisava de gigantes e, de fato, estes foram produzidos; gigantes em saber, inteligência e caráter; época a que os franceses denominaram Renascença e a que a Europa protestante, numa limitação unilateral, denominou Reforma.

Nessa época a ciência da Natureza fez também sua declaração de independência, se bem que não de início, da mesma forma que Lutero não se manifestou na primeira hora. O que, no campo religioso, foi a incineração da bula papal por Lutero, na ciência teve seu correspondente na grande obra de Copérnico, na qual, conquanto timidamente, depois de trinta anos de vacilação e, por assim dizer, no seu leito de morte, atirou a luva do desafio à superstição religiosa. A partir de então, a ciência da Natureza emancipou-se, na essência, da religião; apesar do que a tarefa da sua completa separação se tenha prolongado até o presente e, em muitas cabeças, esteja ainda longe de terminar. Mas, desde então, o desenvolvimento da ciência tem marchado a passos de gigante, por assim dizer, proporcionalmente ao quadrado da distância, no tempo, de seu ponto de partida; como se quisesse mostrar ao mundo o fato de que, para desenvolvimento do mais alto produto da matéria orgânica — o espírito humano — deve prevalecer uma lei oposta à do desenvolvimento da matéria inorgânica.

O primeiro período da ciência moderna termina — no domínio do inorgânico — com Newton. Nesse período, foi completamente dominado o material existente; muito se produziu no terreno da matemática, da mecânica, da astronomia, da estática e da dinâmica, devido especialmente a Kepler e Galileu, nos quais Newton se apoiou para chegar a suas conclusões. No domínio do orgânico, entretanto, não se foi muito além de alguns passos adiante. A investigação das formas da vida, que se sucedem historicamente e se substituem entre si, assim como as variáveis condições de vida que lhes correspondem (paleontologia e geologia), ainda não existia. A Natureza não era considerada, de forma alguma, como algo que se desenvolvia historicamente, que tivesse uma história no tempo; levava-se em conta, apenas, a extensão no espaço; as diversas formas não se grupavam umas após as outras, mas sim, tão somente umas ao lado das outras; a história natural era válida para sempre, tal como as órbitas elípticas dos planetas. Para qualquer análise mais profunda da estrutura orgânica, faltavam as duas bases essenciais: a química e o conhecimento da estrutura orgânica fundamental: a célula. A ciência da Natureza, revolucionária em seu início, se defrontava com uma Natureza inteiramente conservadora, na qual tudo era hoje como havia sido no começo do mundo; e na qual, até fim do mundo, tudo continuaria a ser igual ao que fora no começo.

É notável essa concepção conservadora da Natureza, tanto no terreno inorgânico como no orgânico (...)

Astronomia

Geologia

Mecânica

Física

Paleontologia

Matemática

Química

Mineralogia

Fisiologia Vegetal

Fisiologia Animal

Terapêutica

Anatomia

Diagnóstico

1ª. Brecha: Kant e Laplace; 2ª., Geologia e Paleontologia (Lyell, evolução lenta); 3ª., Química orgânica (que prepara corpos orgânicos e demonstra a validade das leis químicas para os corpos viventes); 4ª., Grove, 1842, calor mecânico; 5ª., Darwin, Lamark, a célula etc.; 6ª., o elemento comparativo em anatomia, climatologia (isotermas), expedições científicas desde meados do século XVIII, geografia botânica e animal, geografia física em geral (Humboldt), vinculação do material. Morfologia (embriologia, Baer).

A existência normal dos animais é explicada pelas condições em que vivem e às quais se adaptam; as do homem, tão logo se diferencia do animal, no sentido restrito, até agora nunca estiveram presentes e só se elaboram por meio do ulterior desenvolvimento histórico. O homem é o único animal capaz de desbravar seu caminho a partir do estado simplesmente animal; seu estado normal é aquele que se adapta a sua consciência, isto é, aquela que ele mesmo cria para si.

Contradição do desenvolvimento teórico: do horror vacui se passou, em seguida, ao espaço absolutamente vazio; só mais tarde foi concebido o éter.

Generatio aequivoca(19) — Até agora, todas as investigações estão reduzidas a estas: aos fluidos que contém matéria orgânica em decomposição e acessíveis ao ar, surgem organismos inferiores, protistas, fungos, infusórios. Donde vêm eles? Aparecem por generatio aequivoca, ou são provenientes de germes atmosféricos? Por conseguinte a investigação está limitada a um domínio muito restrito, resumindo-se à questão da plasmogenia.

A suposição de que, por decomposição de organismos viventes, podem surgir outros semelhantes, pertence essencialmente à época em que predominava a doutrina das espécies imutáveis. Naquela época os homens se encontravam diante da necessidade de admitir a origem de todos os organismos, inclusive os mais complicados, por meio da protogênese de substâncias não viventes; e, se não queriam recorrer a ajuda de um ato realizado pelo Criador, chegavam facilmente à conclusão de que esse processo é mais facilmente explicável admitindo-se um material formativo proveniente do mundo orgânico; ninguém acredita, porém, na produção de um mamífero partindo diretamente da matéria orgânica, por meios químicos.

Mas uma tal suposição constitui um verdadeiro atentado às condições em que se encontra a ciência atualmente. A química, mediante a análise do processo de decomposição dos corpos orgânicos já mortos, fornece a demonstração de que, em cada etapa sucessiva, esse processo elabora necessariamente produtos que se aproximam cada vez mais do mundo inorgânico morto, produtos esses que são cada vez menos capazes de serem utilizados pelo mundo orgânico; e que se pode dar uma outra direção a esse processo, tal utilização sendo possível somente quando esses produtos de composição são incorporados a tempo a um organismo apropriado já existente. Precisamente o veículo essencial da formação da célula — a proteína — é o que se decompõe em primeiro lugar e até agora não se conseguiu reconstruí-lo.

Ainda mais: os organismos, de cuja protogênese a partir de líquidos orgânicos, tratam essas investigações, já se encontram (conquanto sejam de ordem comparativamente baixa) essencialmente diferenciados: bactérias, fermentos, etc., com um ciclo de vida composto de diversas fases e, em parte, como no caso dos infusórios, equipados de órgãos bem desenvolvidos. São todos, pelo menos, unicelulares. Mas desde que tivemos conhecimento da monera(20), que carece de estrutura, constitui uma tolice pretender explicar a origem, inclusive de uma célula única, diretamente, a partir da matéria morta, ao invés de fazê-lo a partir da proteína viva amorfa; isso seria acreditar que seja possível, mediante um pouco de água podre, obrigar a Natureza a realizar, em 24 horas, aquilo que lhe custou milhares de anos para produzir.

Os ensaios de Pasteur (Louis, 1822-1895), nesse sentido, são inúteis; para aqueles que acreditam nessa possibilidade, ele jamais será capaz de demonstrar sua impossibilidade mediante essas experiências; mas as mesmas são importantes porque esclarecem muita coisa a respeito desses organismos, sobre a sua vida, seus germes, etc.

Força — Diz Hegel, G.d. Phil. (História da Filosofia), I, pág. 208:

“É melhor dizer que o ímã tem uma alma” (como se expressa Thales) “do que dizer que tem uma força atrativa; a força é uma espécie de propriedade que, separável da matéria, se imagina como sendo um predicado; em contraposição, a alma, sendo seu movimento, é idêntica à natureza da matéria”.

E Haeckel, Anthrop. (Antropologia), pág. 707: “segundo a concepção materialista do mundo, a matéria, ou seja, a substância, esteve presente ANTES do movimento ou força viva; a matéria criou a força”. Isso é tão falso como dizer que a força criou a matéria, uma vez que força e matéria são duas coisas inseparáveis. Donde tirou ele o seu materialismo?

Mayer, Mechanische Theorie der Wärme (Teoria Mecânica do Calor), pág. 328: “Já Kant havia afirmado que o fluxo e refluxo das marés exercem uma pressão retardante sobre o movimento giratório da Terra”. (Segundo cálculos de Adams, a duração do dia sidéreo(21) aumenta agora de 1/100 de segundo em 1.000 anos).

Exemplo de necessidade do pensamento dialético e das categorias e relações flexíveis, na Natureza: a lei da queda dos corpos que, mesmo no caso de alguns minutos, se torna incorreta, visto como então o raio da Terra já não pode ser = ∞, sem erro; e a atração da Terra aumenta, ao invés de permanecer constante como supõe a lei da queda dos corpos de Galileu. Apesar disso, essa lei continua sendo ensinada até hoje, omitindo-se a reserva!

Morriz Wagner, Naturwissenschafttliche Streitfragen (Problemas Controvertidos da Ciência Natural), I, (Augsburger Allgemeine Zeitung, Suplemento 6, 7, 8 de Outubro de 1874).

Manifesto de Liebig a Wagner, em 1868:

“Pelo simples fato de podermos supor que a vida é tão antiga e tão eterna como a própria matéria parece-me que toda a controvérsia a respeito da origem da vida fica anulada por meio dessa simples suposição. Com efeito, porque não poderíamos pensar que a matéria orgânica estivesse presente desde o instante inicial, da mesma forma que o carbono e seus compostos (!), ou, em geral, toda a matéria increável e indestrutível, bem como as forças que estão eternamente ligadas ao movimento da matéria no espaço?”

Liebig dizia mais adiante (Wagner acredita que em novembro de 1868):

“também ele considera aceitável a hipótese de que a vida orgânica tenha sido importada do espaço interestelar para o nosso planeta”.

Helmholtz [Prefácio ao livro de Thomson, Handbuch der theoretischen Physik (Manual de Física Teórica)], Ed. Alemã, parte II:

“Parece-me ser um procedimento correto, caso fracassem todos os nossos esforços no sentido de provocar a produção de organismos por meio da substância inanimada, perguntarmos a nós mesmos se, afinal de contas, a vida surgiu sobre a Terra, já que não é tão antiga quanto a matéria, tendo seus germes sido transportados de um corpo celeste para outro, desenvolvendo-se em toda sas partes onde tenha encontrado condições favoráveis”.

Wagner: “O fato de que a matéria é indestrutível e eterna... que não há força capaz de reduzi-la a nada, basta para que o químico a considere como increável. Mas, segundo a concepção atualmente em voga (?) a vida é considerada exatamente como uma propriedade inerente a certos elementos simples, que constituem os organismos inferiores e que, evidentemente, deve ser tão antiga, isto é, deve ter uma existência originalmente contemporânea dessas mesmas substâncias básicas e seus compostos (!!)”.

Nesse sentido, poderíamos também falar de uma força vital, como o faz Liebig [Chemische Briefe (Cartas sobre Química), 4ª. Ed.]:

“a saber, como um princípio formativo em e com as forças físicas, portanto não atuando fora da matéria. Essa força vital, como propriedade da matéria se manifesta, entretanto... somente em condições apropriadas que existem desde a eternidade, em inumeráveis pontos do espaço infinito; mas que, no decurso dos diferentes períodos de tempo, devem ter variado espacialmente com bastante freqüência”.

Por conseguinte, a vida não é possível na Terra líquida (?) ou no sol gasoso, mas os corpos incandentes têm uma atmosfera enormemente expandida que, de acordo com opiniões recentes, consistem nos mesmos materiais que enchem todo o espaço sob uma forma extremamente rarefeita e que são atraídos pelos corpos. A massa nebulosa giratória, de que resultou o sistema solar, indo além da órbita de Netuno, “continha também toda a água (!) dispersa sob a forma de vapor, numa atmosfera abundantemente impregnada de ácido carbônico (!) até alturas incomensuráveis, assim como as substâncias fundamentais para a existência (?) dos germes orgânicos inferiores”. Nela prevaleciam (nas regiões mais variadas, as temperaturas mais diversas; conseqüentemente se justifica plenamente a suposição de que, em todos os tempos, foram encontradas em alguma parte as condições necessárias à vida orgânica. Assim sendo, as atmosferas de corpo celestes, tais como as massas nebulosas giratórias, tinham de ser consideradas como as câmaras permanentes de conservação da forma animada, como os viveiros eternos dos germes orgânicos”. Nas cordilheiras, abaixo do Equador, ainda se encontram, em grandes quantidades, os menores protistas vivos, com seus germes invisíveis, que enchem a atmosfera até uma altura de 16.000 pés. Diz Perty que são “quase onipresentes”. Só não são encontrados onde os mata o forte calor. Por conseguinte, sua existência (a das Vibrionidae, etc.) pode ser concebida “também na envoltura de vapor de todos os corpos celestes, sempre que forem encontradas condições apropriadas”.

“Segundo Cohn, as bactérias são... tão diminutas que um milímetro cúbico pode conter 633 milhões das mesmas; e 636 milhões pesam apenas um grama. Os micrococos são ainda menores” e talvez não sejam os menores. De formas já muito diferentes, “as Vibrionidae, umas vezes esféricas, outras ovóides, outras em forma de barra ou de espiral” (possuindo, por conseguinte,um considerável grau de forma). “Até agora não foi apresentada nenhuma objeção válida contra a bem fundada hipótese de que todos os múltiplos seres vivos mais altamente organizados, dentre os dois reinos naturais, poderiam e deveriam ter-se desenvolvido no decurso de longuíssimos períodos de tempo, a partir de tais seres primitivos ou de outros semelhantes, extremamente simples (!!), neutros, oscilando entre a planta e o animal... como base da variabilidade individual e da capacidade de transmissão hereditária de caracteres adquiridos, sobre a base da alteração das condições físicas dos corpos celestes e como base da separação espacial das variedades individuais produzidas”.

Essa é uma prova, digna de nota, de como Liebig era diletante em biologia, apesar de ser esta uma ciência limítrofe com a química. Leu Darwin por volta de 1861 e só muito mais tarde as obras biológicas e paleontológico-geológicas que se seguiram a Darwin. “Nunca leu” Lamarck. “Igualmente permaneceram desconhecidas para ele as importantes investigações paleontológicas, aparecidas ainda antes de 1859, de L.V. Buch, d’Orbigny, Münster, Kliptein, Hauer e Quenstedt sobre os cefalópodes fósseis, que esclarecem de maneira notável a conexão genética entre as diversas criações. Todos os homens de ciência mencionados foram impelidos... “obrigados pela força dos fatos e quase contra sua vontade, a admitir a hipótese lamarckiana da descendência” e isso, por certo, antes do livro de Darwin. Por conseguinte,a teoria da descendência havia já, silenciosamente, lançado raízes nas opiniões dos homens de ciência que se ocupavam mais de perto com o estudo comparativo dos organismos fósseis... já em 1832, em seu trabalho Sobre os Amonitas e sua Divisão em Famílias, L.V. Buch havia introduzido, de forma definida, na ciência dos putrefatos (!), A Idéia Lamarckiana do Parentesco Típico das Formas Orgânicas como Sinal de sua Decadência Comum, título de um trabalho lido na Academia de Berlim em 1848. e, neste mesmo ano, baseou-se em suas investigações sobre os amonitas para emitir este ponto de vista: “que o desaparecimento de velhas formas e o aparecimento de outras novas, não é conseqüência da destruição total das criações orgânicas, mas a formação de novas espécies, baseadas em formas anteriores, se produz, provavelmente, devido apenas a condições de vida modificadas”.

Glosas — A hipótese de “vida eterna” e de sua importação, mencionada mais acima, pressupõe:

  1. — A eternidade da proteína;
  2. — A eternidade das formas originais, das quais se pode desenvolver tudo quanto é orgânico. Ambas inadmissíveis.

Ad. 1. — A asserção de Liebig segundo a qual os compostos do carbono são tão eternos como o próprio carbono, é inexata, senão falsa.

  1. — Será simples o carbono?(22) Se não o é, como tal não pode ser eterno.
  2. — Os compostos do carbono são eternos no sentido de que, em idênticas condições de combinação, temperatura, pressão, potencial elétrico etc., sempre se reproduzem. Mas que, por exemplo, somente os compostos mais simples do carbono (CO2 ou CH4) sejam eternos, no sentido de que existem em todos os tempos e mais ou menos em todos os lugares, e não (como é mais provável) que se produzam continuamente e de novo desapareçam (e certamente dos elementos e nos elementos), é uma idéia até agora não defendida por ninguém. Se a proteína viva é eterna no mesmo sentido que os outros compostos de carbono, então, não só deve decompor-se continuamente em seus elementos, como é notório que acontece, mas também deve produzir-se continuamente de novo, tendo por base os elementos e sem a colaboração de proteína preexistente; e isso é exatamente o oposto do resultado a que chegou Liebig.
  3. — A proteína é o mais instável dos compostos de carbono que conhecemos. Decompõe-se tão rapidamente quanto perde a capacidade de desempenhar as funções que lhe são próprias e que chamamos vida; e é de sua natureza o fato de que essa incapacidade se manifeste cedo ou tarde. E é precisamente esse composto que se supõe seja eterno e capaz de resistir a todas as variações de temperatura, de pressão, à falta de alimentos, de ar, etc., no espaço, mesmo quando seu limite máximo de existência da proteína são infinitamente mais complicadas do que as de qualquer outro composto conhecido do carbono; isso, não só porque intervêm funções físicas e químicas, mas também nutritivas e respiratórias, as quais requerem um meio física e quimicamente muito limitado; e é isso o que se tem conservado, desde a eternidade, através de todas as modificações possíveis? Liebig “prefere, ceteris paribus, a mais simples de ambas as hipóteses”; mas uma coisa pode parecer muito simples e, no entanto, ser muito complicada. A suposição de inumeráveis séries contínuas de corpos proteínicos vivos, as quais se sucedem umas às outras, desde a eternidade (e que, em todas as circunstâncias, deixam sempre uma sobre suficiente para que o estoque permaneça bem sortido), é a suposição mais complicada possível. Além do mais, as atmosferas dos corpos celestes e especialmente as das nebulosas, eram, na sua origem, muitíssimo quentes; de sorte que não havia lugar para corpos proteínicos; apesar disso, porém, o espaço deve funcionar como um grande depósito, em que não há nem ar, nem alimento e que apresenta uma temperatura sob a qual, certamente, nenhuma proteína poderá manter-se!

Ad. 2 — Os vibriões, micrococos etc., de que já tratamos, são seres perfeitamente diferenciados: grânulos de proteína(23) que segregaram uma membrana externa, mas sem núcleo. A série de corpos proteínicos capazes de desenvolvimento constitui, no entanto, primeiramente o núcleo, transformando-se em célula; a membrana celular é, portanto, um outro progresso (Amoeba sphaerococcus). Por conseguinte, os organismos de que temos estado tratando pertencem a uma série que, segundo as analogias até aqui examinadas, marcham para um beco sem saída e não podem ser incluídos entre os antecessores dos organismos superiores.

O que diz Helmholtz a respeito da ineficácia das tentativas para produzir a vida artificialmente é, na verdade, pueril. A vida é o modo de existência dos corpos proteínicos, cujo elemento essencial consiste no contínuo intercâmbio metabólico com o meio natural externo; e que cessa no momento em que deixa de existir esse metabolismo, terminando com a decomposição da proteína(II). Se, de qualquer maneira, conseguirmos preparar quimicamente corpos proteínicos, eles exibirão, sem dúvida, o fenômeno da vida e realizarão o metabolismo por mais débeis e efêmeros que sejam(24). Mas é certo que tais corpos poderiam ter, no máximo, a forma da monera mais rudimentar e, provavelmente, formas ainda mais inferiores; de maneira alguma, porém, a forma de organismos que se diferenciaram através de uma evolução milenar e nos quais a membrana celular separou-se do seu conteúdo, assumindo uma forma herdada, definida. Mas, enquanto não soubermos, mais do que hoje, a respeito da composição química da proteína (e, por conseguinte, durante talvez outros 100 anos), não poderemos pensar em sua preparação artificial; é ridículo, portanto, nos queixarmos de que todos os nossos esforços fracassaram.

Contrariando a afirmação anterior de que o metabolismo é a atividade característica dos corpos proteínicos, pode ser que se levante a objeção relativa ao crescimento das “células artificiais” de Traube. Neste caso, porém, há simplesmente a admissão inalterada de um líquido por endosmose, ao passo que o metabolismo consiste na absorção de substâncias cuja composição química varia, que são assimiladas pelo organismo e cujos resíduos são eliminados juntamente com os produtos do próprio organismo e que resultam do processo da vida(III). O significado das “células” de Traube resite em que mostram ser endosmose e o crescimento duas coisas que ocorrem também na natureza inorgânica e que se podem manifestar sem carbono algum.

Os primeiros grânulos de proteínas produzidos devem ter tido a capacidade de nutrir-se no oxigênio, dióxido de carbono, amoníaco e de alguns dos sais dissolvidos na água que os rodeava. Não havia substâncias nutritivas orgânicas(25), já que os grânulos não podiam devorar-se a si mesmos. Isso demonstra o quanto estão por cima deles as moneras atuais, inclusive aquelas destituídas de núcleo, as quais vivem de diatomáceas, etc., e que, portanto, pressupõem toda uma série de organismos diferenciados.

Reação — A mecânica, física (aliás calor etc.) esgota-se a cada ato de reação. A reação química altera a composição do corpo reagente e só se renova se fornecermos uma nova quantidade do mesmo. Somente o corpo orgânico reage independentemente, de certo que dentro de sua esfera de força (sonho) e supondo-se uma provisão de alimento; mas essa provisão de alimento só é eficaz depois de ter sido assimilada e não imediatamente, como nas etapas inferiores; de sorte que o corpo orgânico tem, neste caso, um poder de reação independente, devendo a nova reação ser por ela realizada.

Identidade e diferença — A relação dialética já pode ser entrevista no cálculo diferencial, em que dx é infinitamente pequeno e, no entanto, eficaz e tudo pode fazer.

Matemática — Nada parece descansar em bases mais estáveis do que a diferença existente entre as quatro operações, elementos fundamentais de toda a matemática. E, no entanto, já de início se manifesta a multiplicação como sendo uma soma abreviada; e a divisão, como uma subtração abreviada de um número determinado de grandezas numéricas iguais. E num certo caso — quando o divisor é fracionário — a divisão é efetuada multiplicando-se o dividendo pelo divisor invertido. Mas, no cálculo algébrico se vai muito mais longe. Cada subtração (a — b), pode ser representado como uma soma (- b + a); cada divisão a/b pode transformar-se em um produto a x 1/b. No cálculo com potências, vai-se ainda muito mais longe. Todas as diferenças rígidas entre as espécies de cálculo desaparecem, tudo pode ser representado sob a forma oposta. Uma potência pode ser transformada em uma raiz x² = √x4; uma raiz, como potência √x = x ½ . A unidade, dividida por uma potência ou raiz, pode ser representada como potência do denominador (1/√x = x- ½ ; 1/x³ = x-3). A multiplicação ou divisão das potências de uma grandeza, pode ser convertida na soma ou subtração de seus expoentes. Cada número pode ser concebido e representado, como sendo a potência de qualquer outro número (logaritmos, y = aⁿ). E essa transformação de uma expressão em sua oposta, não é uma brincadeira ociosa: é uma das mais poderosas alavancas da ciência matemática, sem a qual hoje em dia dificilmente se pode realizar um cálculo mais complicado. Se eliminássemos da matemática apenas as potências negativas e fracionárias, até onde poderíamos chegar? (- . - = + , - = + , √-1 etc., fazer antes a exposição).

O momento crítico da matemática é representado pela grandeza variável de Descartes. Com ela surgiu o movimento e a dialética na matemática; e com ela também, imediata e necessariamente, o cálculo diferencial e integral, que vieram em seguida e que, no seu conjunto, foram aperfeiçoados e não criados por Newton e Leibnitz.

Assíntotas — A geometria teve seu início com a noção de que a reta e a curva são opostos absolutos; de que a reta é inteiramente impossível de ser representada pela curva e a curva pela reta; de que ambas são incomensuráveis. E, no entanto, o cálculo do círculo(26) só é possível se expressarmos sua periferia por meio de linhas retas. E nas curvas com assíntotas, o que é retilíneo se resolve perfeitamente por meio do curvilíneo e este por meio daquele; da mesma forma que a noção de paralelismo: as linhas não são paralelas, aproximam-se continuamente e, no entanto, nunca se tocam; o ramo da curva se torna cada vez mais reto, sem nunca chegar a sê-lo por completo; da mesma maneira que, na geometria analítica, a linha reta é considerada como uma curva de primeiro grau, com uma curvatura infinitamente pequena. O x da curva logarítmica(27) pode tornar-se tão grande quanto se queira, mas y jamais poderá tornar = 0.

Potências nulas — de importância na série logarítmica:

0

1

2

3

10º

10¹

10²

10³

log

Todas as variáveis passam, em algum lugar, pela unidade; logo, também as constantes, elevadas a uma potência variável aⁿ = 1, se x = 0. aº = 1 não significa outra coisa senão a concepção da unidade em sua relação com os demais termos da série de potências de a; só assim tem sentido e pode conduzir a resultados(28) (∑ xº = ω/x) de outro modo, não. Daí se segue que também a unidade, embora possa parecer idêntica a si mesma, encerra uma infinita multiplicidade, porquanto pode ser a potência nula de qualquer outro número imaginável; e que essa multiplicidade não é meramente imaginária, pode ser demonstrado sempre que a unidade seja concebida como unidade particular, como um dos resultados variáveis de um processo (como grandeza ou forma momentânea de uma variável) em conexão com esse processo.

O retilíneo e o curvilíneo, em última análise, se igualam no cálculo diferencial(29): no triângulo diferencial, cuja hipotenusa forma a diferencial do arco (no método das tangentes), essa hipotenusa pode ser considerada “como uma pequena linha reta que é, simultaneamente, um elemento do arco e da tangente; pode ser considerada a curva como sendo composta de uma infinidade de linhas retas ou então considerá-la como reta, uma vez eu, sendo infinitamente pequena a distância entre cada ponto M, a última razão entre o elemento da curva e o tangente é evidentemente uma razão de igualdade. Por conseguinte, neste caso, se bem que a relação se aproxime continuamente da igualdade (conquanto assintoticamente, segundo a natureza da curva), já que o contato se limita a um ponto que não tem comprimento, pode-se admitir finalmente que se alcançou a igualdade entre o retilíneo e o curvilíneo”. Bossut (Charles, 1730 — 1814), Calc. Diff. Et intégr., Paris, Na. IV, I, pág. 149. Nas curvas polares, as abscissas diferenciadas imaginárias(30) são consideradas, inclusive, como paralelas às abscissas reais; e as operações se baseiam nesse fato, mesmo quando ambas se encontram no pólo; daí se deduz a igualdade dos triângulos, um dos quais tem um ângulo exatamente no ponto de interseção das duas linhas cujo paralelismo constitui a verdadeira base da igualdade!

Quando a matemática das linhas retas e curvas tenham esgotado seus recursos, abre-se para ela um novo campo, quase infinito, ao conceber-se a curva como reta (o triângulo diferencial) e a reta como curva (curva de primeiro grau, com curvatura infinitamente pequena). Oh, metafísica!

Éter(31) — Se o éter oferece alguma resistência, também deve oferecê-la à luz e, assim sendo, a uma certa distância deve ser impenetrável à luz. Mas o fato de que o éter propague a luz, transformando-se em meio, implica necessariamente em que também deve oferecer resistência à luz, pois do contrário, a luz não poderia pô-lo em vibração. Essa é a solução dos pontos críticos apresentados por Madler e mencionados por Lavrov (Peter, 1823-1900).

Vertebrados — Seu caráter essencial: o agrupamento de todo o seu corpo ao redor do sistema nervoso. Dessa maneira, cria-se a possibilidade do desenvolvimento até a consciência, etc. Em todos os demais animais, sistema nervoso é secundário, nos vertebrados é a base de toda a organização; o sistema nervoso desenvolvido até um certo grau (por alongamento posterior do gânglio da cabeça dos vermes) apossa-se de todo o corpo e o dispõe de acordo com suas necessidades.

Radiação do calor no espaço interestelar — todas as hipóteses citadas por Lavrov, relativas à renovação dos corpos celestes extintos (pág. 109), implicam em perda de movimento. O calor uma vez irradiado, isto é, a parte infinitamente maior do movimento original, se perde e permanece perdido. Heltmholtz calcula que essa perda até agora é de 453/454. por conseguinte, em conclusão, chega-se finalmente ao esgotamento e à cessação do movimento. A questão só pode ser resolvida definitivamente uma vez demonstrada a maneira pela qual se torna o calor irradiado no espaço, novamente utilizável. A teoria da transformação do movimento apresenta essa questão sob uma forma absoluta e não pode fugir a ela prorrogando artificialmente a dívida a pagar e tirando o corpo fora. Mas o fato de que simultaneamente tenham sido dadas as condições para a sua solução, isso é outra coisa. A transformação do movimento e sua indestrutibilidade foram descobertos há 30 anos apenas e só muito recentemente foram analisadas com mais profundidade as suas conseqüências. O problema referente a saber em que se transforma o calor aparentemente perdido, só foi nettement posé a partir de 1867 (Clausius). Não é de estranhar, portanto, que ainda não tenha sido resolvido; é possível que decorra ainda muito tempo até que se chegue a uma solução considerando-se os poucos meios de que dispomos. Mas ele será, por certo, resolvido, já que não há milagres na Natureza e, por conseguinte, o calor original da esfera nebulosa não lhe foi transmitido milagrosamente d’alguma parte fora do universo. Pouca ajuda nos pode trazer também, no sentido de superar as dificuldades de cada caso particular, a afirmação geral de que a quantidade de movimento é infinita; tampouco é suficiente para a ressurreição dos universos mortos, exceto nos casos previstos na hipótese anterior, os quais sempre estão vinculados a uma perda de força e, conseqüentemente, são apenas casos temporários. O ciclo não foi ainda determinado e não o será enquanto não se descobrir como se processa a reutilização do calor irradiado.

O paralelogramo das forças estabelecido por Newton é válido para o sistema solar, pelo menos no que se refere ao momento em que se separam os corpos anulares, já que, então, o movimento de rotação entra em contradição consigo mesmo, manifestando-se, por um lado, como atração e, por outro, como força tangencial. Mas, tão logo se completa a separação, o movimento se unifica novamente. O fato de que essa separação deva ocorrer, é uma prova do processo dialético.

Bathybius — As pedras que se encontram na sua carne são uma prova de que a forma original da proteína, ainda sem as diferenciações de forma, já contém em si o germe e a capacidade necessários à formação do esqueleto.

Inteligência e razão — essa distinção hegeliana, segundo a qual somente o pensamento dialético é racional, tem um sentido definido. Toda a atividade da inteligência; induzir, deduzir e, portanto, abstrair (os conceitos genéticos de Dido(32): quadrúpedes e bípedes), analisar estados desconhecidos (o simples ato de quebrar uma noz constitui um começo da análise), sintetizar (as astutas travessuras dos animais) e, como união de ambos, experimentar (ante obstáculos novos e em situações estranhas). Tudo isso temos em comum com os animais. Quanto a sua natureza, todos esse modos de agir (e, conseqüentemente, todos os meios empregados pela investigação científica que reconhece a lógica ordinária) são absolutamente os mesmos, quer nos homens, quer nos animais superiores. Diferem apenas no grau (de desenvolvimento do método em cada caso). Os traços essenciais do método são os mesmos e conduzem aos mesmos resultados, tanto no homem como no animal, uma vez que ambos trabalham ou se movem unicamente por meio desses meios elementares.

Pelo contrário, o pensamento dialético (exatamente porque pressupõe a investigação da natureza dos conceitos) só é possível ao homem e, mesmo a este, apenas há pouco tempo, num grau relativamente elevado (budistas e gregos), alcançando sua completa evolução ainda muito mais tarde, com a filosofia moderna; e, no entanto, já os gregos obtiveram resultados colossais (!) que anteciparam de muito as investigações.

A química, cuja maneira predominante de investigar é a análise, nada pode fazer sem o seu pólo oposto, a síntese.

Para os pan-indutivistas: com toda a indução do mundo, jamais havíamos conseguido compreender o processo da indução. Isso só poderia ser levado a cabo por meio da análise desse processo.

Indução e dedução se encontram mutuamente ligadas entre si, tão necessariamente como a síntese e a análise. Em lugar de se pretender elevar unilateralmente ao céu uma à custa da outra, devemos tratar de aplicar cada uma delas na devida ocasião; e isso só se pode fazer levando em conta sua correspondência recíproca, o fato de que se complementam mutuamente. Segundo os indutivistas, a indução seria um método infalível. Tanto não é assim que suas conquistas aparentemente mais seguras são diariamente superadas por novas descobertas. Os corpúsculos luminosos e o calórico eram resultados obtidos por meio da indução. Onde estão eles? A indução nos ensinava que todos os vertebrados têm um sistema nervoso central, diferenciado em cérebro e medula espinal, que está encerrada em vértebras cartilaginosas ou ósseas donde deriva inclusive o seu nome. Logo depois se descobriu o Amphioxus vertebrado que possui um cordão nervoso central, indiferenciado e sem vértebras. A indução estabeleceu que os peixes são vertebrados que, durante toda a sua vida, respiram exclusivamente pelas guelras. Descobriram-se, entretanto, animais cujo caráter de peixe é quase universalmente reconhecido, mas que, além das guelras, possuem pulmões bem desenvolvidos; e ainda mais: cada peixe possui um pulmão em estado potencial: a bexiga natatória. Somente por meio de uma audaz aplicação da teoria da evolução, foi que Haeckel pode salvar os indutivistas que se sentiam muito à vontade em meio dessas contradições.

Se a indução fosse na verdade tão infalível, como se poderiam explicar as rápidas e sucessivas revoluções no que diz respeito à classificação no terreno do mundo orgânico? São elas o produto mais característico das teorias da indução, as quais se aniquilam entre si.

A teoria cinética deve comprovar(33) a razão pela qual moléculas que tendem para cima, podem exercer simultaneamente uma pressão para baixo (supondo-se a atmosfera como mais ou menos permanente em relação ao espaço interestelar); como apesar da gravidade, podem afastar-se do centro da Terra; mas, no entanto, a certa distância (mesmo quando a força da gravidade diminui de acordo com o quadrado da distância) são obrigadas por essa força a permanecer em repouso ou a voltar.

Clausius (caso esteja certo) demonstra que o universo foi criado; portanto, que a matéria é criável; portanto, que é destrutível; portanto, que também a força ou movimento é criável e destrutível; portanto, que toda a teoria da conservação da força é um disparate; portanto, que todas as conseqüências daí decorrentes, são também disparatadas.

A noção da matéria quimicamente uniforme como sendo real (que é antiqüíssima) corresponde inteiramente à pueril opinião, muito difundida inclusive até Lavoisier, de que a afinidade química dos corpos depende de cada um deles conter um terceiro corpo que lhes seja comum [Kopp (Hermann, 1818-1892) Entwicklung, pág. 105].

As linhas duras e fixas são incompatíveis com a teoria da evolução; inclusive a linha de separação entre vertebrados e invertebrados, já deixou de ser rígida; e ainda mais a que separa os peixes dos anfíbios; e a que existe entre as aves e os répteis se desvanece cada vez mais. Entre o Compsognathus e o Archaeopterix(34), faltam apenas alguns elos intermediários e, em ambos os hemisférios, surgem bicos de ave dentados. O “isto ou aquilo” se torna cada vez mais insuficiente. Entre os animais inferiores, o conceito de indivíduo não pode ser claramente estabelecido de modo algum. Não somente quanto ao problema de saber se tal animal é um indivíduo ou uma colônia, mas também saber o lugar onde, na cadeia da evolução, termina um indivíduo e começa o outro (nutrizes)(35). Para uma determinada etapa da concepção da Natureza, em que todas as diferenças se fundamentam em etapas intermediárias e em que todos os opostos se acham separados apenas por elos intermediários, o velho método de pensamento metafísico já não basta. A dialética não reconhece linhas duras e fixas, “isto ou aquilo”, imprescindíveis e universalmente válidas; ela ultrapassa as rígidas diferenças metafísicas e ao lado de “isto ou aquilo” reconhece igualmente, em seu justo lugar, o”tanto isto como aquilo” e, conciliando os opostos, é o único método de pensamento adequado ao máximo grau, na etapa atual. Para o uso diário, par ao comércio científico a varejo, a categoria metafísica mantém a sua validade.

A dialética, a chamada dialética objetiva, impera em toda a Natureza; e a dialética chamada subjetiva (o pensamento dialético) são unicamente o reflexo do movimento através de contradições que aparecem em todas as partes da Natureza e que (num contínuo conflito entre os opostos e sua fusão final, formas superiores), condiciona a vida da Natureza. Atração e repulsão. A polaridade começa no magnetismo manifestando-se em um mesmo corpo; sob a forma de eletricidade se distribui entre dois ou mais corpos que se tornam opostamente carregados. Todos os processos químicos se reduzem a manifestações de atração e repulsão químicas. Finalmente, no mundo orgânico, a formação do núcleo da célula deve ser considerada também como uma forma de polarização da substância proteínica viva; e a teoria da evolução demonstra, tendo por base a simples célula, como cada progresso no sentido de uma planta mais complexa, por um lado, e no sentido do homem, por outro lado, obedece a um contínuo conflito entre herança e adaptação. Em face disso, fica evidente como são pouco aplicáveis a tais formas de evolução categorias tais como positivo e negativo. Pode-se conceber a herança como o lado positivo, conservador; e a adaptação como o lado negativo, que destrói continuamente as qualidades herdadas; mas igualmente se pode considerar a adaptação como uma atividade criadora, ativa, positiva, e a herança como atividade resistente, passiva, negativa. Da mesma forma, porém, que na história o progresso é considerado como negação do existente, também neste caso (por motivos de ordem prática) será melhor considerar a adaptação como atividade negativa. Na história, a evolução através dos opostos aparece claramente em todas as fases críticas dos povos condutores. Em tais momentos, um povo só pode escolher entre as duas pontas de um dilema: isto ou aquilo; e certamente a questão se apresenta sempre sob uma forma bem diferente daquela desejada pelos politiqueiros de todos os tempos. Inclusive o filisteu alemão de 1848, encontrou-se súbita e inesperadamente, contra a sua vontade, diante do problema: retorno à velha reação, sob uma forma ainda mais aguda; ou prosseguimento da revolução no sentido da república, talvez até uma república unificada, de fundo socialista. Não perdeu muito tempo, tendo ajudado a levar ao poder a reação chefiada por Manteuffel, uma verdadeira flor do liberalismo alemão. De maneira semelhante, em 1851, a burguesia francesa, quando se defrontou com o dilema que, por certo, não esperada: caricatura de império, pretorianismo e exploração da França por um bando de aventureiros, por um lado; e uma república democrático-social; do outro; baixou a cabeça diante do bando de aventureiros, a fim de continuar explorando os operários sob a proteção daqueles.

Luta pela vida — Até o advento de Darwin, o que punham em evidência seus afeiçoados era justamente a atuação harmoniosa da natureza orgânica: a maneira como o reino vegetal provê de alimentos e oxigênio os animais; e como os animais fornecem aos vegetais o adubo sob a forma de amoníaco e ácido carbônico.

Mas logo depois que as teorias de Darwin foram geralmente aceitas, essa mesma gente mudou de rumo e passou a só ver luta por toda parte. Ambas as concepções se justificam dentro de certos limites, sendo ambas unilaterais e estreitas. A interação dos corpos naturais mortos, encerra harmonia e conflito; a dos corpos viventes, inclui cooperação consciente e inconsciente, do mesmo modo que luta consciente e inconsciente. Por conseguinte, no que respeita a Natureza, não é aceitável arvorar apenas a bandeira unilateral da luta. É também inteiramente pueril pretender resumir toda a múltipla riqueza do desenvolvimento e da complexidade históricos, no magro e unilateral conceito da luta pela vida, que quase nada significa.

Toda a teoria de Darwin baseada na luta pela vida é simplesmente a transferência, da sociedade para a natureza animada, da teoria de Hobbes do bellum omnium contra omnes e mais ainda: da teoria burguesa da livre competição e da teoria malthusiana sobre a superpopulação. Uma vez levada a cabo essa proeza (cuja justificação incondicional é ainda muito problemática, especialmente no que se refere à teoria malthusiana) é muito fácil transferir de volta essas teorias, passando-as da história natural par aa história da sociedade; e, afinal de contas, é uma grande ingenuidade pretender, com isso, haver demonstrado essas afirmações como sendo leis eternas da sociedade.

Aceitemos, por um momento, o conceito da luta pela vida, apenas como argumento. O máximo que faz o animal é colher para consumir; ao passo que o homem produz, cria meios de subsistência no mais amplo sentido do termo, os quais, sem ele, a Natureza jamais produziria. Dessa maneira, torna-se impossível qualquer transferência imediata das leis relativas à vida das sociedades animais para as humanas. A produção faz com que a chamada luta pela existência já não gire ao redor dos meios de existência, mas ao derredor dos meios de conforto e desenvolvimento. Neste caso — no que diz respeito aos meios de desenvolvimento socialmente produzidos — , são inteiramente inaplicáveis as categorias do reino animal(36). Finalmente, sob o modo de produção capitalista, a produção alcança um tal volume que a sociedade já não pode consumir os meios de vida, conforto e desenvolvimento produzidos, isso porque o acesso a esses meios é artificial e violentamente interditados à grande massa daqueles que os produziram; por esse motivo, mais ou menos de dez em dez anos uma crise restaura o equilíbrio, destruindo não somente os meios de vida, conforto e desenvolvimento produzidos, mas também uma grande parte da força de produção; daí a razão por que a chamada luta pela existência assume a seguinte forma: proteger os produtos e as forças produtivas da sociedade capitalista burguesa, do efeito destrutivo, aniquilador dessa mesma ordem capitalista, assumindo a direção da produção e distribuição sociais (arrebatando-a das mãos da classe capitalista dominante) e transferindo-a às massas produtoras; assim é que se realiza a revolução socialista.

A concepção da história como sendo uma série de lutas de classe, tem um conteúdo muito maior e mais profundo do que a sua simples redução ao conceito de luta pela vida.

Luz e obscuridade são, por certo, os opostos mais evidentes e definidos da Natureza; serviram sempre para frases de retórica, desde o quarto Evangelho até as lumières da religião e da filosofia, no século XVIII. Fick (Adolf, 1829-1901), pág. 9: ... “a lei desde algum tempo rigorosamente demonstrada na física ... de que a forma de movimento denominada calor radiante é idêntica, sob todos os aspectos essenciais, à forma de calor a que chamamos luz”. Cl. Maxwell, pág. 14: “Esses raios (de calor radiante) possuem todas as propriedades físicas dos raios luminosos, sendo capazes de se refletir, etc...alguns dos raios calóricos são idênticos aos luminosos, ao passo que outras espécies de raios calóricos não impressionam nossa vista”.

Por conseguinte, existem raios luminosos escuros(37), e assim a famosa oposição entre luz e obscuridade desaparece da ciência natural, como oposição absoluta. Incidentalmente, a mais profunda obscuridade e a luz mais clara e brilhante têm, sobre nossos olhos, o mesmo efeito de deslumbramento e, sendo assim, tornam-se também idênticos para nós.

O fato é que os raios solares produzem efeitos diferentes, segundo a intensidade da vibração: os de maior comprimento de onda comunicam calor; os de onda média, luz; e os de onda mais curta(38), ação química (Secchi, pág. 632 e seg.); os pontos máximos dessas três ações ficam muito próximos entre si; e os mínimos internos do grupo radiante exterior coincidem com o grupo luminoso(39). O que é luz e o que é não-luz dependem da estrutura do olho. Os animais noturnos talvez sejam capazes de ver, inclusive uma parte, não dos raios calóricos, mas dos químicos, uma vez que seus olhos estão adaptados a comprimentos de ondas mais curtas do eu os nossos. Qualquer dificuldade desaparece desde que, em lugar de admitir três espécies de raios, admitamos somente uma (e cientificamente, conhecemos apenas uma, tudo mais sendo simples conclusão apressada), que produz efeitos diferentes mas compatíveis, dentro de estreitos limites, segundo seus comprimentos de onda(40).

Trabalho — Esta categoria é transferida, na teoria mecânica do calor, da economia para a física (apesar de que, nem de longe, foi ainda fisiologicamente determinada sob o ponto de vista científico) e, dessa maneira, fica configurada de uma forma inteiramente diferente, o que se evidencia pelo fato de que apenas uma parte mínima do trabalho econômico (levantamento de pesos, etc.) pode ser expressa em quilogrâmetros. Existe, contudo, uma tendência a transferir a qualificação termodinâmica do trabalho para as ciências das quais foi derivada a categoria, com uma determinação diferente. Pretendem alguns, por exemplo, identificá-la, sem mais nem menos, com o trabalho fisiológico, de acordo com as experiências de Fick Wislicenus (Johannes, 1835-1902), no Faulborn(41), nas quais se supõe que o levantamento de um corpo humano de 60 quilos, digamos à altura de 2.000 metros, isto é, 120.000 quilogrâmetros, expressa o trabalho fisiológico. Mas, no trabalho fisiológico executado pode haver uma enorme diferença em virtude da maneira como foi realizado esse levantamento: se, por meio do levantamento positivo da carga, montando-se escadas verticais, se ao longo de uma estrada ou escada com uma rampa de 45º (o que corresponde a um terreno militarmente impraticável); ou se ao longo de uma estrada com uma rampa de 1/18 e, conseqüentemente, com o comprimento de uns 36 quilômetros (mas isto é problemático se admitirmos o mesmo tempo em todos os casos). De qualquer maneira, entretanto, em todos os casos praticáveis, ao levantamento corresponde um movimento de avanço, certamente, quando a estrada é plana, sua extensão será considerável e, como trabalho fisiológico, não pode ser considerado igual a zero. Em certas ocasiões parece, inclusive, existir um desejo não pequeno de repor a categoria termodinâmica de trabalho na da economia(42), da mesma forma que a teoria da luta pela vida entre os darwinistas, a qual só poderia produzir disparates. Converta-se qualquer trabalho qualificado em quilogrâmetros e tente-se, depois, por esse meio, determinar o salário! Encarando fisiologicamente, o corpo humano contém órgãos cujo conjunto pode ser considerado, em certo sentido, como uma máquina termodinâmica à qual é fornecido calor que, por sua vez, se converte em movimento(43). Mas, inclusive pressupondo condições constantes no que respeita aos demais órgãos do corpo, é problemático saber se o trabalho fisiológico executado, inclusive o levantamento, pode ser expresso, sem mais nem menos, em quilogrâmetros, já que, no corpo se verifica simultaneamente um trabalho interno, que não é acusado dos resultados(44). O corpo não é uma simples máquina a vapor, que experimenta apenas atrito e desgaste. O trabalho fisiológico só é possível quando, no próprio corpo, se produzem contínuas transformações químicas, as quais dependem também do processo respiratório e do trabalho cardíaco. Em cada contração e distensão musculares verificam-se, nos nervos e nos músculos, transformações químicas que não podem ser consideradas semelhantes à queima do carvão na máquina a vapor. É certo que podemos comparar dois trabalhos fisiológicos executados em iguais condições; mas não podemos medir o trabalho físico do homem da mesma forma que se mede o de uma máquina a vapor, etc.: seus resultados exteriores, sim; mas não os respectivos processos, sem serem feitas grandes restrições.

(Rever com muito cuidado tudo isto)(45).

Indução e análise — Um exemplo notável do que há de injustificado na pretensão segundo a qual a indução é a forma única ou ainda predominante da investigação científica, pode ser encontrado no terreno da termodinâmica: a máquina a vapor constituía a demonstração mais assombrosa de que, do calor, é possível extrair-se movimento mecânico. Mas a verdade é que 100.000 máquinas a vapor não o demonstram melhor que uma: criam apenas, para os físicos, a necessidade cada vez maior de explicar o fenômeno. Sadi Carnot foi o primeiro que se propôs a fazê-lo com seriedade. Mas não por meio da indução. Estudou a máquina a vapor, analisou-a, e verificou que o processo de seu funcionamento, aquilo que nela interessava, não se encontrava sob uma forma simples, mas encoberto por uma série de processos secundários; pôs de lado todas as circunstâncias estranhas ao processo essencial e construiu uma máquina a vapor, ideal (ou máquina a gás), de construção, por certo tão difícil como, por exemplo, uma linha ou superfície geométrica, mas que, de certa maneira, presta o mesmo serviço que essas abstrações matemáticas: apresentava o processo sob uma forma simples, independente, não adulterada. E topou, de repente, com o equivalente mecânico do calor (ver o significado de sua função C), que ele não conseguiu compreender e ver, justamente porque acreditava na substância calórica. Eis aqui, novamente, uma demonstração dos prejuízos produzidos pelas falsas teorias.

Estudar o desenvolvimento sucessivo de cada um dos ramos da ciência da Natureza, separadamente.

Em primeiro lugar, a astronomia que, fosse embora em razão das estações, era absolutamente necessária aos povos pastoris e agrícolas. A astronomia só pode desenvolver-se com a ajuda da matemática. Por conseguinte, esta também tem que ser estudada.

Mais tarde, em certo estágio da agricultura e em certas regiões (elevação da água para irrigação, no Egito) e principalmente com o surgimento das cidades, as grandes obras de construção e o desenvolvimento do artesanato: a mecânica. Logo depois, foi esta necessária também para a navegação e a guerra.

Ela também precisa da ajuda da matemática e, dessa maneira, promove o desenvolvimento desta. De sorte que, desde o princípio, o desenvolvimento das ciências é condicionado pela produção.

A investigação verdadeiramente científica ficou restrita, durante toda a Antigüidade, a essas três atividades e, certamente, no início do período pós-clássico (os alexandrinos, Arquimedes, etc.) surge na qualidade de investigação exata e matemática. Na física e na química, que apenas se encontravam separadas nos cérebros (teoria elementar, ausência da idéia de elemento químico); na botânica na zoologia, na anatomia humana e animal, até então só era possível colecionar fatos e, na medida do possível, ordená-los sistematicamente. A fisiologia constituía para adivinhação; circunscrevia-se apenas às coisas mais tangíveis (a digestão e as secreções, por exemplo), o que não podia deixar de acontecer, porquanto nem sequer era conhecido o fenômeno da circulação sangüínea.

No fim desse período, aparece a química sob a sua forma primitiva: a alquimia.

Se as ciências, depois da escura noite medieval, reaparecem subitamente e com uma força insuspeitada, desenvolvendo-se com uma velocidade quase milagrosa, isso é devido novamente a essa maravilha que é a produção. Em primeiro lugar, desde as cruzadas, a indústria se havia desenvolvido enormemente, produzindo uma quantidade de novas invenções mecânicas: a tecelagem, a relojoaria, moinhos; químicas: tinturaria, metalurgia, álcool; e físicas: as lentes. Esses fatos, não somente forneciam um volumoso material de observação, como também por si mesmos, proviam outros meios de experimentação inteiramente diferentes dos que existiam até então, permitindo assim a construção de novos instrumentos. Pode-se mesmo dizer que foi justamente nessa época que se tornou possível o surgimento da ciência experimental propriamente dita. Em segundo lugar, toda a Europa Ocidental e Central, inclusive a Polônia, desenvolvia-se, de uma forma coordenada, muito embora a Itália continuasse à testa desse movimento, em virtude da antiga civilização por ela herdada. Em terceiro lugar, os descobrimentos geográficos (realizados exclusivamente com a finalidade do lucro e, conseqüentemente, em última análise, visando à produção) forneciam um material ilimitado, e até então inacessível, nos domínios da meteorologia, na zoologia, da botânica e da fisiologia (do homem). Em quarto lugar, estava colocada a imprensa.

Foi então que (excetuadas a matemática, a astronomia e a mecânica, que já existiam) a física se separa definitivamente da química [Torricceli (Evangelista, 160-1647) e Galileu]; o primeiro, dedicado a obras hidráulicas industriais, foi quem iniciou o estudo a respeito do movimento dos fluídos (ver Clerk Maxwell). Boyle lançou os fundamentos da química como ciência. Harvey os da fisiologia, com o descobrimento da circulação sangüínea (humana e animal). A zoologia e a botânica permaneceram, a princípio, como simples ciências coletoras, até que apareceu em cena a paleontologia (Cuvier) e, pouco depois, deu-se o descobrimento da célula e o desenvolvimento da química orgânica. Dessa forma, foi possível o advento da morfologia e da fisiologia comparadas, tornando-se ambas, a partir de então, verdadeiras ciências. A geografia teve assentadas suas bases nos fins do século passado e, mais recentemente, a mal denominada antropologia, que torna possível a incorporação da morfologia e da fisiologia do homem e suas raças à ciência da história. Estudar mais detalhadamente e desenvolver este ponto.

O segundo teorema de Clausius, etc., pode ser formulado da maneira que quisermos. Procura ele demonstrar que se perde energia qualitativa, mas não quantitativa. A entropia não pode ser destruída por meios naturais, mas, em compensação, pode ser criada. É preciso que se dê corda ao relógio do mundo para que ele continue andando até alcançar o equilíbrio; a partir daí, somente um milagre poderá pô-lo novamente em movimento. A energia empregada para lhe dar corda desapareceu, pelo menos qualitativamente; e só poderá ser restaurada por meio de um impulso exterior. Por conseguinte, o impulso exterior foi também necessário, na origem de tudo; portanto, a quantidade de movimento ou energia existente no universo não é sempre a mesma; logo, a energia deve ter sido criada; ela é, pois, criável; e, assim, é destrutível. Ad absurdum!

Diferença entre a situação na última fase do Mundo Antigo, ca. 300 e nos fins da Idade Média, 1453:

1 — Em lugar de uma delgada faixa de civilização ao longo da costa do Mediterrâneo (que estendia esporadicamente seus braços para o interior, chegando até a costa atlântica de Espanha, França e Inglaterra e que, assim, podia ser facilmente destruída pelos alemães e eslavos do Norte, e pelos árabes, do Sudoeste) havia agora uma região civilizada, fechada, compreendendo toda a Europa Ocidental, e tendo a Escandinávia, a Polônia e a Hungria como postos avançados.

2 — Em lugar do contraste entre gregos ou romanos e os bárbaros, existem agora seis povos civilizados (possuindo línguas civilizadas) sem contar os escandinavos, etc., todos os quais se haviam desenvolvido em tal grau que podiam participar do impetuoso movimento literário que se verificou no século XV, criando uma cultura muito mais variada do que a das línguas grega e latina, já em decadência e agonia nos fins da Antigüidade.

3 — Um desenvolvimento muitíssimo maior da produção industrial e do comércio, graças à atividade da burguesia medieval: por um lado, uma produção mais aperfeiçoada, mais variada e em massa; por outro, um comércio mais intenso, uma navegação mais ousada desde o tempo dos saxões, frígios e normandos; e, finalmente, uma quantidade de descobertas, bem como a importação de invenções orientais que, não só tornaram possíveis, pela primeira vez, a importação e a difusão da literatura grega, dos descobrimentos marítimos e das revoluções religiosas burguesas, mas também lhe deram um raio de ação muito diferente e de maior rapidez de propagação. E ainda mais: produziram uma grande soma de conquistas científicas, conquanto ainda desordenadas, jamais realizadas pela Antigüidade (agulha magnética, imprensa, tipografia, o papel de fibra vegetal já conhecido pelos árabes e pelos judeus espanhóis desde o século XII; o papel de algodão já conhecido desde o século X e mais difundido nos séculos XIII e XIV, tendo desaparecido o papiro que vinha desde o tempo da civilização egípcia); a pólvora, as lentes, os relógios mecânicos, grandes adiantamentos, tanto na medição do tempo como na mecânica.

(No que respeita às invenções, ver mais abaixo).

Além do mais, o material fornecido pelas viagens (Marco Polo, ca. 1272 etc.) .

A educação geral, embora ainda má, muito mais difundida através das universidades.

Com o advento de Constantinopla e a queda de Roma, termina a Antigüidade; o fim da Idade Média está indissoluvelmente ligado à queda de Constantinopla. Os tempos novos se iniciam com o retorno aos gregos. Negação da negação!

Material histórico — Invenções.

(A.C.): bomba contra incêndios, relógio de água, ca. 200 a.C.; pavimentação (Roma).

Pergaminho, ca. 160.

(D.C.) — Moinho de água, no Mosela, ca. 340, na Alemanha, nos tempos de Carlos, o Grande.

Primeiros sinais de vidro para janelas; iluminação pública, em Antioquia, ca. 370.

Bicho da seda, na Grécia, proveniente da China, ca. 550.

Penas de escrever, no século VI.

Papel de algodão que, no século IX, passa da China par aos árabes da Itália.

Órgãos hidráulicos, na França, no século VIII.

Minas de prata no Hartz, exploradas desde o século X.

Moinhos de vento (por volta de 1000).

Sericicultura, na Itália (por volta de 1100).

Relógios de rodas, idem.

Agulha magnética (dos árabes, aos europeus) ca. 1180.

Pavimentação, em Paris, 1184.

Segunda metade do século XIII

Lentes, em Florença, espelhos de vidro.

Relógios sonoros, papel de algodão, na França.

Salga do arenque; represas.

Papel de panos velhos: começos do século XIV.

Letras de câmbio: meados do século XIV.

Primeira fábrica de papel, na Alemanha (Nürember), 1390.

Iluminação pública, em Londres: começos do século XV.

Correios, em Veneza: começos do século XV.

Clichês e impressão: começos do século XV.

Gravação em cobre: meados do século XV.

Posta de cavalos, na França, 1469.

Minas de prata, nos Erzgebirge da Saxônia, 1471.

Invenção do piano de pedal, 1472.

Relógios de bolso; espingarda a ar comprimido; ferrolho de fuzil: fins do século XV.

Torno: 1530.

Sinos para mergulhadores: 1538.

Dialética da Natureza — Referências.

Nature, n˚. 294 e ss. Allmann (Georges James, 1812-1898), sobre os infusórios. Unicelularidade, importante. Croll (James, 1821-190), sobre período glacial e tempo geológico.

Nature, n˚. 326. Tyndall, sobre generatio. Putrefação especifica e experiências sobre fermentação.

Mädler — estrelas fixas.

Halley (Edmons, 1656-1742), em princípios do século XVIII, foi o primeiro a sugerir a idéia do movimento próprio, mediante a diferença entre os dados de Hiparco (de Nicéia, ca. 160-125 A.C.) e Flamsteed (John, 1646-1719), sobre três estrelas, pág. 410. Catálogo Britânico de Flamsteed, o primeiro, de certa maneira, exato e amplo, pág. 420; em seguida, ca. 1750, Bradley (James, 1692-1762), Maskelyne (Nevil, 1732-1811) e Lalande (Joseph de, 1732-1807).

A teoria maluca a respeito do alcance dos raios luminosos, no caso de corpos enormes e os cálculos de Mädler baseados na mesma; tão insensata quanto qualquer concepção da filosofia da Natureza, de Hegel. Págs. 424-425.

O movimento próprio (aparente) mais forte de uma estrela: 701”, em um século = 11’41” = 1/3 do diâmetro do Sol; menos a média de 921 estrelas telescópicas: 8,65” e algumas, 4”.

Via Láctea, uma série de anéis, todos com um centro de gravidade comum, pág. 434.

O grupo das Plêiades e o de Alcione, Touro, centro do movimento do nosso Universo “até as mais remotas regiões da Via Láctea”, pág. 448. Período de revolução, dentro do grupo das Plêiades, em média ca. 2 milhões de anos, pág. 449. Em derredor das Plêiades, grupos anelares alternativamente pobres e ricos em estrelas. Secchi levanta dúvidas quanto à possibilidade de ser, desde já, fixado um centro.

Sírio e Prócion descrevem, segundo Bessel, além do movimento comum, uma trajetória ao derredor de um corpo escuro, pág. 450.

Eclipse de Algol, cada três dias, duração de oito horas, comprovado pela análise espectral, Secchi, pág. 786.

Na região da Via Láctea, mas muito no seu interior, um denso anel de estrelas de magnitudes entre 7 — 11; muito afastados desse anel, os anéis concêntricos da Via Láctea, uns dezoito milhões de estrelas visíveis com telescópio; as que estão dentro do anel compreendem uns dois milhões ou mais; por conseguinte, somam elas um total de mais de 20 milhões. Além do mais, na Via Láctea há sempre um resplendor não muito nítido, inclusive por detrás das estrelas nítidas; portanto, talvez muitos outros anéis ocultos pela perspectiva? Págs. 451-452.(46)

Alcione dista do Sol 573 anos-luz(47). Diâmetro do anel da Via Láctea, das estrelas visíveis separadas, pelo menos 8.000 anos-luz. Págs. 462-463.

A massa dos corpos celestes que se movem dentro do raio Sol-Alcione, de 573 anos-luz, é calculado em 118 milhões de massas solares, pág. 462; de maneira nenhuma está de acordo com o máximo de dois milhões de estrelas que se movem dentro dela. Corpos escuros? Seja como for, há qualquer coisa errada. Demonstração do quanto são ainda falhas nossas premissas de observação.

Para o anel mais afastado da Via Láctea, Mädler admite uma distância de milhares ou talvez centenas de milhares de anos-luz.

Ótimo argumento contra a chamada absorção da luz.

“Em todo caso, existe uma distância tal (a partir da qual já não nos chega luz nenhuma), mas a razão é muito outra. A velocidade da luz é finita; desde o momento da criação até os nossos dias, transcorreu um tempo finito, e, portanto, só podemos perceber os corpos celestes até a distância percorrida pela luz nesse espaço finito”. Pág. 466.

O fato de que a luz (que se debilita segundo o quadrado da distância) deve chegar a um ponto em que já não seja visível aos nossos olhos (por mais que estes se tenham aguçado o equipado), torna-se evidente e basta(48) para refutar a opinião de Olbers segundo a qual somente a absorção da luz pode explicar a obscuridade existente no espaço interestelar, uma vez que este, em todas as direções e até uma distância infinita, está cheio de estrelas. Isso não quer dizer que não exista uma distância além da qual o éter já não deixe mais penetrar a luz.

Nebulosas — Apresentam todas as formas: rigorosamente circulares, elíticas ou irregulares e dentadas. Com todos os graus de nitidez, até que submergem numa falta de nitidez total, em que só se pode distinguir uma condensação nas proximidades do centro. Em algumas das mais nítidas pode-se perceber até 10.000 estrelas, cujo centro mais denso, na maioria dos casos, raramente é uma estrela central de maior brilho. Mas o telescópio gigante de Rosse (William, 1800-1867) tornou nítidas muitas delas. Herschel I(49) contou 197 aglomerações de estrelas e 2.300 nebulosas, às quais se devem acrescentar as catalogadas por Herschel II no céu austral. As irregulares devem ser universos longínquos(50), cujas massas de vapor só podem existir em equilíbrio sob a forma esférica ou elipsoidal. Em sua maioria são também apenas visíveis por meio de telescópios muito potentes. Seja como for, as redondas podem ser massas de vapor: há 78 delas entre as 2.500 mencionadas. Herschel supõe que sejam 2 milhões; Mädler (admitindo um diâmetro real de 8.000 anos-luz)calcula que estejam a uma distância de nós igual a 30 milhões de anos-luz. Considerando que a distância entre qualquer sistema astronômico e outro mais próximo alcança, pelo menos, cem vezes o diâmetro do sistema, a distância entre nosso universo e o outro mais próximo seria, pelo menos, 50 vezes 8.000 anos-luz, ou sejam, 400.000 anos-luz; nesse caso, portanto, levando em conta os vários milhares de nebulosas, chegamos muito além dos milhões de Herschel I, pág. 492.

Secchi: as nebulosas bem nítidas(51) apresentam um espectro contínuo e outro estelar ordinário. Mas as nebulosas verdadeiras “apresentam um espectro contínuo, em parte, como o da névoa de Andrômeda, muito embora apresentem, geralmente, um espectro que consta de uma ou poucas linhas brilhantes, como as nebulosas de Orion, Sagitário, Lira, bem como as conhecidas pelo nome de nebulosas planetárias (redondas)”. Pág. 787. (Segundo Mädler, pág. 495, a névoa de Andrômeda não é nítida. A de Orion é irregularmente franjada, estendendo uma espécie de braços, pág. 495. As de Lira e da Cruz são apenas elípticas, pág. 498). Huggins encontrou, no espectro da nebulosa n˚. 4.374 de Herschel, três linhas brilhantes; “daí se conclui que essa nebulosa não é constituída de um aglomerado de estrelas individuais, mas sim que ela é uma verdadeira névoa, uma substância incandescente em estado gasoso”. As linhas pertencem ao nitrogênio (1) e ao hidrogênio (1), sendo a terceira desconhecida. A mesma coisa aconteceu na névoa de Orion. Inclusive névoas que contêm pontos luminosos (Hidra e Sagitário) possuem essas linhas brilhantes, de maneira que as massas estelares, em curso de aglutinação, não são ainda sólidas ou líquidas, pág. 789. A nebulosa de Lira apresenta apenas uma linha de nitrogênio, pág. 789. O lugar mais denso da nebulosa de Orion é 1º; sua extensão total, 4º.

Secchi: Sírio.

“Onze anos depois (de acordo com os cálculos de Bessel, Mädler, pág. 450)... Não somente foi descoberto o satélite de Sírio sob a forma de uma estrela, com luz própria, de sexta grandeza, mas também ficou demonstrado que sua trajetória coincide com a determinada por Bessel. Desde então, foram também determinadas, por Auwers, as órbitas de Prócion e de seu companheiro, conquanto seu satélite não tenha ainda sido visto”. Pág. 793.

Secchi: estrelas fixas: “Considerando que as estrelas fixas, com exceção de duas ou três, não possuem paralaxe perceptível, então pelo menos a uns 30 anos-luz distantes de nós, pág. 799. Segundo Secchi, as estrelas de 16ª. grandeza (visíveis por meio do grande telescópio de Herschel), estão a 7.560 anos-luz e as visíveis com o telescópio de Roses, pelo menos a 20.900 anos-luz, pág. 802”.

Secchi, à pág. 810 faz a seguinte pergunta: se o Sol e todo o seu sistema se congelassem, “será que existem forças, na Natureza, capazes de devolver o sistema morto ao seu estado original de nebulosa incandescente e devolver-lhe a vida? Não o sabemos”.

★★★

Transformação da quantidade em qualidade = concepção “mecânica” do mundo: a transformação quantitativa, altera a qualidade. Disso, nunca suspeitaram esses senhores!

Identidade e diferença, necessidade e contingência, causa e efeito: os principais opostos que, encarados separadamente, se transformam um no outro.

E, nesse caso, é preciso que se apele para os princípios.

Da mesma forma que Fourier não é mais do que um poema matemático(52) que, apesar de tudo, continua em uso, Hegel é um poema dialético.

Hegel concebe a força e sua manifestação, a causa e o efeito, como sendo idênticos; o que está demonstrado pela mudança de forma da matéria, em que a equivalência é matematicamente provada. Isso havia sido já reconhecido no que respeita à medida. A forma medida pro sua manifestação; a causa, pelo efeito.

O desenvolvimento de um conceito, por exemplo, o de relações conceituais (positivo e negativo, causa e efeito, substância e acidente) relaciona-se, na história do pensamento, com seu desenvolvimento no cérebro de cada um dos pensadores dialéticos, da mesma forma que a evolução de um organismo, em paleontologia, está vinculada ao seu desenvolvimento no terreno da embriologia (ou melhor, na história e no embrião individual). Que isso se passa assim, foi descoberto por Hegel, no que se refere aos conceitos. A casualidade desempenha certo papel no desenvolvimento histórico e, tanto no pensamento dialético como no desenvolvimento do embrião, ela está incluída na necessidade.

Abstrato e concreto. A lei geral da mudança de forma do movimento é muito mais concreta que cada um de seus exemplos concretos.

Significado dos nomes. Na química orgânica, o significado de um corpo e, portanto, também o seu nome não são determinados apenas por sua composição, sendo-o muito mais devido à sua posição na série a que pertencem. Por conseguinte, se acharmos que um corpo pertence a uma determinada série, seu antigo nome se torna um obstáculo ao seu reconhecimento e deve ser substituído por um nome da série(53) (parafina, etc.).

Um disparate de Haeckel: indução contra dedução. Como se não fosse a dedução = a concluir, e, conseqüentemente, a indução também uma dedução. Isso provém do hábito de polarizar.

Há cem anos estabeleceu-se, por indução, que os caranguejos e as aranhas eram insetos e que todos os animais inferiores eram vermes. Por meio da indução, verificou-se hoje que isso é inteiramente disparatado e que existem x classes. Onde se encontra, pois, a vantagem da chamada conclusão indutiva, cujo fundamento é a classificação?

A indução jamais poderia provar a existência de um mamífero sem glândulas mamárias. As mamas foram sempre uma característica do mamífero. No entanto, o platypus não as tem.

Toda essa confusão em torno da indução foi estabelecida pelos ingleses (Whewell, Inductive Sciences), tomando em consideração unicamente o aspecto matemático; e daí a oposição à dedução. A lógica, tanto a velha como a nova, nada sabem a esse respeito. Todas as formas de conclusão que partem do individual são experimentais e, portanto, se baseiam na experiência; é certo que a conclusão indutiva parte inclusive de A — E — B (em geral).

É também característico de nossos homens de ciência o fato de Haeckel se tornar um fanático partidário da indução, justamente no momento em que os resultados da indução — as classificações — são, de maneira geral, postos em dúvida (Limulus(54), uma aranha; Ascidia(55), um vertebrado ou cordado e os Dipnoi(56), peixes; todos eles em oposição à definição original dos anfíbios) descobrindo-se diariamente novos fatos que derrubam por terra todas as classificações até agora estabelecidas por meio da indução. Que ótima confirmação da tese de Hegel segundo a qual a conclusão indutiva é essencialmente problemática! É certo que, inclusive toda a classificação dos organismos, foi realizada indutivamente, por meio da teoria da evolução, voltando-se à dedução, à herança (deduzindo-se inteiramente uma espécie através da outra, por herança), sendo impossível comprovar a teoria da evolução por meio da simples indução, uma vez que ela é rigorosamente antiindutiva. Os conceitos de acordo com os quais opera a indução — espécie, gênero, classe — se fluidificaram em face da teoria da evolução e, dessa maneira, se tornaram relativos; e, com conceitos relativos, não é possível induzir.

Indução e dedução. Haeckel, Schöpfungsgeschichte (História da Criação), págs. 76-77. A conclusão polarizada em indução e dedução!

Polarização — No modo de ver de J (akob) Grimm (1785-1863), estava firmemente estabelecida a lei segundo a qual um dialeto alemão devia ser uma de duas: ou alto alemão ou baixo alemão. Em face disso, perdia inteiramente de vista o dialeto da Francônia. Apesar de que o franco escrito do período carolíngio superior era alto alemão (uma vez que a transposição de consoantes lhe havia sido transmitida pelo franco do Sudeste), segundo sua representação, o franco se transformava, aqui em alto alemão antigo e, ali, em francês. Assim ficava, então, absolutamente inexplicada a fonte do dialeto holandês das antigas regiões sálicas. O franco só foi descoberto depois da morte de Grimm: o sálico, no seu rejuvenescimento como dialeto holandês, e o ripuário, um dos dialetos do Rheno médio e inferior, (que, em parte, e por etapas, se destacaram do alto alemão e, em parte, se conservaram como baixo alemão), constituíram a sua base; de maneira que o franco é um dialeto tanto do alto como do baixo alemão.

Polaridade — Um ímã, ao ser cortado, polariza a parte neutra de seu meio; mas isso se passa de tal maneira, que os pólos anteriores são mantidos. Por outro lado, um verme, ao ser cortado, conserva, no pólo positivo, a boca receptiva; e forma, na outra ponta, um novo pólo negativo, com um ânus excretório; mas o velho pólo negativo (ânus), torna-se agora positivo (transforma-se em boca) e, no extremo cortado, forma-se um novo ânus, ou pólo negativo(57). Eis aí um exemplo de transformação do positivo em negativo.

Outro exemplo de polaridade, em Haeckel: mecanicismo = monismo; e vitalismo ou teologia = dualismo. Já em Kant e Hegel, o propósito interno é um protesto contra o dualismo. O mecanicismo aplicado à vida é uma categoria inútil; no máximo, podemos falar de quimismo, se não quisermos renunciar a qualquer compreensão dos nomes. Finalidade: Hegel, V. pág. 205: “O mecânico se manifesta como um tênder da totalidade, quando busca compreender para si a Natureza, como um todo que não requer outra coisa para sua idéia: uma totalidade que não se encontra no propósito e no entendimento extraterrestre a ele vinculado”. Mas a questão é que o mecanicismo (como também o materialismo do século XVIII) não se liberta da necessidade abstrata e, por conseguinte, tampouco da casualidade. O fato de que o cérebro humano pensante seja uma conseqüência da matéria, para ele é uma simples casualidade, muito embora, quando ocorra, seja necessariamente determinada passo a passo. Mas, na verdade, faz parte da natureza da matéria avançar no sentido da evolução do ser pensante e, assim sendo, isso também acontece necessariamente sempre que existam as condições que lhe são necessárias (não necessariamente idênticas, sempre e em toda parte).

Continua Hegel, V, pág. 206: “Este princípio (o do mecânico), proporciona, pois, em virtude de sua vinculação com a necessidade externa, a consciência da infinita liberdade, ao contrário da teologia que estabelece, como uma coisa absoluta, as trivialidades e inclusive os aspectos desprezíveis de seu conteúdo; e na qual, o pensamento de ordem mais geral só se pode encontrar enormemente limitado e, mais ainda, asquerosamente afetado”.

Neste caso, verifica-se novamente o colossal desperdício de substância e movimento na Natureza. No sistema solar, há talvez apenas três planetas nos quais podem existir a vida e seres pensantes (nas atuais condições). E, por causa disso, toda essa enorme ostentação!

A finalidade interna opera, pois, no organismo (segundo Hegel, V, pág. 244), através da tendência. Pás trop fort. É de supor que a tendência arraste cada um dos seres vivos para a harmonia com seu conceito. Por aí se vê em que medida toda a finalidade interna é a mesma na determinação ideológica. E, no entanto, Lamarck está de acordo com isso.

Preciosa autocrítica da coisa em si kantiana, o fato de que o próprio Kant arremeta contra o eu pensante e nele descubra igualmente uma coisa em si incognoscível (Hegel, V, págs. 256 e ss.).

Quando Hegel estabeleceu a transição da vida ao conhecimento através da cópula (propagação), surgiu, em germe, a teoria da evolução; o fato de que, uma vez criada a vida orgânica, deve a mesma desenvolver-se evolutivamente, através das gerações, na direção de um gênero de seres pensantes.

Demonstrar a teoria darwinista, como comprovação prática da concepção de Hegel a respeito da conexão interna entre necessidade e contingência.

O que Hegel denomina interação é o corpo orgânico que, por conseguinte, estabelece também a transição à consciência, isto é, da necessidade à liberdade, à idéia (Ver Lógica, II, Conclusão).

Transformação da quantidade em qualidade: exemplo mais simples: o oxigênio e o ozônio, os quais, na proporção de 2:3, adquirem propriedades inteiramente distintas, inclusive o odor. A química explica igualmente os demais corpos alotrópicos(58) unicamente em razão de uma diferença no número de átomos da molécula.

Se Hegel considera a Natureza como sendo a manifestação da Idéia eterna em sua alienação, e se isso é um grave delito, que se deve então dizer do morfologista Richard Owen: “a idéia arquétipo encarnou-se, sob diversas modalidades, sobre este planeta, muito anteriormente à existência das espécies animais que atualmente a exemplificam”? [Nature of Limbs (Natureza dos Membros), 1849]. Se isso é dito por um naturalista místico, que nada insinua por esse meio, tudo continua no mesmo; mas se um filósofo disser a mesma coisa, com uma determinada intenção (e tendo, no fundo, alguma coisa de certo embora sob uma forma equivocada), então se trata de um delito místico inaudito.

A simples observação empírica jamais poderá comprovar suficientemente a necessidade. Post Hoc, mas não propter hoc (Enciclop., I, pág. 84). Isso é tão certo como, pelo fato do Sol sair durante todos os dias da semana, não se pode concluir que amanhã voltará a sair; e, de fato, sabemos agora que chegará um dia em que o Sol não sairá pela manhã. Mas a prova da necessidade reside na atividade humana, na experiência, no trabalho: se eu posso fazer o post hoc este se torna idêntico ao propter hoc.

Azar e necessidade — Outra oposição em que se acha enredada a metafísica é a de casualidade e necessidade. Que pode ser mais agudamente contraditório do que essas duas determinações do pensamento? Como é possível que ambas sejam idênticas, que o casual seja necessário e o necessário também casual? O senso comum e, com ele, a maioria dos homens de ciência, tratam a necessidade e a casualidade como determinações que se excluem mutuamente e para sempre. Uma coisa, uma relação, um processo, ou é casual, ou é necessário; mas não as duas coisas simultaneamente. Em vista disso, ambas existem lado a lado, na Natureza; esta contém toda a classe de objetos e processos, entre os quais, uns são casuais e outros necessários; o que interessa, portanto, é não confundir ambas as classes. Assim, por exemplo, são admitidos como necessários os caracteres específicos decisivos, considerando-se como acidentais as diferenças entre indivíduos da mesma espécie; e isso prevaleceu tanto para os cristais, como para os vegetais e os animais. Dessa maneira, o grupo inferior se torna, de novo, acidental em relação ao superior, considerando-se então, como acidental, o problema relativo a quantas espécies diferentes estão incluídas no gênero Felis(59) ou no Agnus; ou de quantos gêneros ou ordens há em uma classe(60); ou quantos indivíduos há em cada uma dessas espécies; ou quantas espécies diferentes de animais há em determinada região; ou como é, em geral, a fauna e a flora. E então se declara o necessário como a única coisa que interessa cientificamente, considerando-se o casual como coisa alheia à ciência. Isso quer dizer: o que se pode traduzir em leis, o que, por conseguinte, se conhece, é interessante; o que não pode ser reduzido a leis, portanto, o que não se conhece, é indiferente, pode ser desprezado. Em face disso, já não pode mais haver ciência, uma vez que esta deve investigar justamente o que não conhecemos. Isto é: aquilo que se pode reduzir a leis gerais é considerado necessário; e aquilo que não se pode é considerado casual. Qualquer pessoa vê que essa é a mesma espécie de ciência que proclama natural o que pode explicar, atribuindo a causas sobrenaturais aquilo que não pode explicar; para a coisa propriamente dita, tanto faz que eu denomine Deus ou casualidade à causa do que é inexplicável. Ambas não são mais do que a simples expressão do eu não sei; e, conseqüentemente, não pertencem à ciência. Esta termina justamente onde deixa de existir a relação de necessidade.

Em posição contrária a essa opinião, está o determinismo, que se transferiu do materialismo francês para a ciência e que procura liquidar a casualidade, desconhecendo-a. Segundo essa concepção, na Natureza impera apenas a necessidade simples e direta. Que esta vagem de ervilhas contenha cinco ervilhas e não quatro ou seis; que a cauda deste cão tenha cinco polegadas de comprimento e nem um centímetro de mais ou de menos; que esta flor de trevo tenha sido fecundada este ano por uma abelha e a outra não; e justamente por uma abelha determinada, nesta época determinada; que esta semente de dente de leão tenha germinado e a outra não; o fato de que, esta noite, às quatro da madrugada, uma pulga me tenha mordido e não às três ou cinco; e justamente do lado direito do ombro e não da barriga da perna esquerda: todos esses são fatos produzidos por uma irrevogável concatenação de causa e efeito, por uma irremovível necessidade e, certamente, duma tal maneira que a esfera gasosa da qual se originou o sistema solar estava já constituída de forma que esses fatos teriam que se verificar assim e não de outro modo. A verdade é que, com essa espécie de necessidade, não nos libertamos da concepção teológica da Natureza. Quer a chamemos, com Agostinho e Calvino, eterno decreto de Deus, quer a chamemos de necessidade, para a ciência é tudo a mesma coisa. Em nenhum desses casos se trata de acompanhar a concatenação causal; por conseguinte, somos tão sábios num caso como no outro; a chamada necessidade continua sendo uma frase vazia e, assim sendo, o azar continua também sendo o que era. Enquanto não possamos demonstrar em que reside a quantidade de ervilhas encerradas na vagem, a mesma continua sendo casual; e, com a afirmação de que esse caso já estava previsto quando da constituição original do sistema solar, mesmo assim não teremos dado um passo à frente. Ainda mais: a ciência que se propusesse a tarefa de determinar a cadeia causal dessa particular vagem de ervilhas, já não seria uma ciência, mas sim uma simples aventura; pois essa mesma vagem de ervilhas possui ainda, por si só, outras inúmeras propriedades individuais que aparecem como casuais: o matiz de sua coloração, espessura e dureza de sua casca, tamanho das ervilhas, não se falando das peculiaridades individuais que se manifestam ao microscópio. Essa vagem de ervilhas já apresentaria, pois, maior número de conexões causais a serem observadas do que as que poderiam ser resolvidas por todos os botânicos do mundo.

Neste caso, portanto, a casualidade não pode ser explicada pela necessidade; melhor ainda: a necessidade é degradada à condição do simplesmente acidental. Se o fato de uma determinada vagem de ervilhas conter seis ervilhas, e não cinco ou sete, é do mesmo tipo da lei do movimento do sistema solar ou da lei da transformação de energia; então, nos fatos observados, o azar não é elevado à condição de necessidade, mas sim esta é degradada à condição de casualidade. Ainda mais: embora se ponha grande empenho em afirmar que a multiplicidade das espécies orgânicas e inorgânicas, bem como a dos indivíduos existentes lado a lado, em um determinado lugar, resultam numa irrefragável necessidade — para cada uma das espécies e para cada um dos indivíduos, continua sendo o que era: casual. Para o animal individual, o lugar em que nasceu é casual, bem como o meio que encontra para viver e quais e quantos são os inimigos que o ameaçam. Para a planta-mãe é casual até mesmo o lugar onde o vento possa espalhar suas sementes; para a planta-filha, o lugar onde possa encontrar solo para germinar a semente donde provém, e se nos asseguram que, também neste caso, tudo repousa numa irrefragável necessidade, isso não nos convence. A confusão dos objetos naturais em uma dada região e, mais ainda, em toda a Terra, continua sendo, apesar de todas as determinações ditadas pela eternidade, aquilo que sempre foi: casual.

Contrariando ambas essas concepções, apareceu Hegel com as proposições, até então inauditas, segundo as quais o casual tem fundamento pelo fato de ser casual e, do mesmo modo, também não tem fundamento por isso que é casual; que o casual é necessário, que a necessidade se determina a si própria como casualidade e que, por outro lado, este azar é, talvez, uma necessidade absoluta (Lógica, II, Livro III, 2: A Realidade). A ciência continuou ignorando, simplesmente, essas proposições, considerando-as apenas um jogo de paradoxos(61), como disparates intrinsecamente contraditórios; e, teoricamente, persistiu, por um lado, nas vacuidades mentais da metafísica de Wolff segundo a qual uma coisa, ou é casual, ou é necessária, mas não ambas ao mesmo tempo; ou então, por outro lado, nesse pouco menos vazio determinismo mecânico: o que nega o azar, em geral por meio de palavras, para acabar reconhecendo-o na prática, em cada caso particular.

Enquanto a investigação da Natureza persistiu em pensar dessa maneira, que fez através da pessoa de Darwin?

Darwin, em sua obra, que fez época, apóia-se na mais ampla base de azar que se possa imaginar. São exatamente as infinitas, acidentais diferenças existentes entre os indivíduos, dentro de cada uma das espécies — diferenças que vão aumentando até a ruptura do caráter da espécie e cujas causas, mesmo as imediatas, são demonstráveis apenas em pouquíssimos casos — as que o obrigam a discutir as bases anteriores de toda a regularidade em biologia, conceito de espécie na sua anterior rigidez e invariabilidade metafísicas. Mas, sem o conceito de espécie, nada pode ser feito em ciência. Todos os seus ramos necessitam do conceito de espécie, como seu fundamento: a anatomia humana e a comparada, a embriologia, a zoologia, a paleontologia, a botânica, etc., que seriam sem o conceito de espécie? Todos os seus resultados não seriam apenas discutidos, mas imediatamente suspensos. O azar põe abaixo a necessidade tal como era concebida até agora (o material referente a sucessos casuais, colecionado nesse interregno, esmagou e destruiu a velha noção de necessidade). A idéia que até agora se tinha a respeito da necessidade, está perdendo a força. Conservá-la significa impor à Natureza, como lei, uma determinação humana arbitrária, em contradição consigo mesma e com a realidade; significa, por outro lado, negar qualquer necessidade interna na Natureza vivente; significa proclamar, por toda parte, como única lei da Natureza vivente, o reino caótico do azar.

Gilt nichts mehr der Tausves Jontof!(62), gritavam, muito conseqüentemente, os biólogos de todas as escolas.

Darwin.

Luta pela vida — Antes de tudo deve ser limitada estritamente às lutas provocadas pela superpopulação de plantas e animais, as quais, efetivamente, se verificam em determinadas etapas do desenvolvimento das plantas e dos animais inferiores. Mas deve ser mantida rigorosamente afastada das condições em que se modificam as espécies, desaparecendo as velhas e tomando o seu lugar outras novas, desenvolvidas, sem que se verifique essa superpopulação: por seu exemplo, na migração de animais e plantas para novas regiões, onde novas condições de clima, solo etc., proporcionem essas modificações. Se aí sobreviverem e, por uma adaptação em permanente aumento, os indivíduos adaptados continuarem a desenvolver-se, chegando a constituir uma nova espécie enquanto os demais indivíduos, mais estáveis, vão morrendo e acabam por se extinguir (e com eles, as etapas intermediárias imperfeitas), então tudo pode marchar e marcha, sem qualquer espécie de malthusianismo; e se, por acaso, esse interferisse, em nada alteraria o processo, podendo, quando muito, acelerá-lo.

O mesmo acontece no que diz respeito à gradual alteração das condições geográficas, climáticas etc.,numa determinada região (dessecação da Ásia Central, por exemplo). Neste caso, é indiferente que os membros da população animal ou vegetal exerçam mútua pressão ou deixem de exercê-la: os processos de evolução dos organismos, dentro de tais condições, continuará seu curso. A mesma coisa se verifica no que respeita à seleção, nesse caso também sendo posto de lado o malthusianismo.

Daí se conclui que a teoria da adaptação e herança de Haeckel pode também determinar todo o processo evolutivo, sem necessidade de seleção(63) e malthusianismo.

O erro de Darwin consiste precisamente em que confunde, como sendo uma só, duas coisas absolutamente diferentes(64): a seleção natural e a sobrevivência do mais apto.

1. Seleção devida à pressão da superpopulação; em que os mais fortes sobrevivem, talvez em primeiro lugar, mas podendo sobreviver também os mais fracos em muitos sentidos.

2. Seleção devida a uma maior capacidade de adaptação a certas circunstâncias modificadas, em que os sobreviventes são mais apropriados a essas circunstâncias, mas em que essa adaptação pode significar, em conjunto, tanto um progresso como um retrocesso (por exemplo: a adaptação à vida parasitária é sempre um retrocesso).

O principal é isto: que todo o progresso da evolução orgânica é, ao mesmo tempo, um retrocesso, desde que seja fixada uma evolução unilateral, excluindo a possibilidade de evolução em muitas outras direções(65).

E esta é uma lei fundamental.

A lógica dialética, em contraposição à velha lógica, meramente formal, não se limita, como esta, a enumerar e por uma ao lado da outra, desconchavadamente, as formas de movimento do pensamento, isto é, as diferentes formas de julgamento e de conclusão. Pelo contrário, procura ligar essas formas uma à outra, subordinando-as entre si, ao invés de coordená-las, desenvolvendo as formas superiores a partir das mais inferiores. Fiel a sua divisão da lógica, Hegel agrupa os julgamentos em:

1. Julgamento de existência, a forma mais simples do julgamento, em que se considerada, afirmativa ou negativamente, a propriedade geral de um determinado objeto (julgamento positivo: a rosa é vermelha; negativo a rosa não é azul; infinito: a rosa não é um camelo);

2. Julgamento determinativo, em que se atribui ao sujeito uma determinação de relação; julgamento singular: este homem é mortal; particular: alguns, muitos homens são mortais; universal: todos os homens são mortais ou: o Homem é mortal;

3. Julgamento de necessidade, em que se atribui ao sujeito uma certeza substancial; julgamento categórico: a rosa é uma planta; julgamento hipotético: quando o Sol sai é dia; alternativo: a lepidossirene, ou é um peixe, ou é um anfíbio;

4. Julgamento de conceito em que, a respeito do sujeito, se considera em que medida corresponde a sua natureza geral ou, como diz Hegel, a seu conceito; julgamento assertivo: esta casa é má; problemático: quando uma casa é construída desta ou daquela maneira, é boa; apodíctico: a casa construída de tal ou qual maneira, é boa.

1. Julgamento singular; 2. (?); 3. Particular; 4. Geral.

Por mais rígido que isso possa parecer, e por mais arbitrária que pareça, à primeira vista, essa classificação dos julgamentos, quem quer que haja estudado o genial desenvolvimento da Lógica, Hegel [Werke (Obras Completas, Ed. Al. 1832-45, N.T.), V, 63-115], compreenderá a verdade e a necessidade internas desse agrupamento. Para mostrar quão bem fundado é ele, não só quanto às leis do pensamento, mas também quanto às naturais, daremos aqui um exemplo muito conhecido, alheio a essa conexão.

Que o atrito produz calor é coisa que, praticamente, já sabiam os homens pré-históricos, visto como o fogo por fricção foi descoberto há talvez uns 100.000 anos(66). E, mesmo antes disso, já se aqueciam atritando as partes finas do corpo. Mas daí à descoberta de que o atrito é, em geral, uma fonte de calor, transcorreram não se pode saber quantos milênios. Já é suficiente o fato de que chegasse o dia em que o cérebro humano se tivesse desenvolvido a tal ponto que lhe fosse possível formular o seguinte julgamento: o atrito é uma fonte de calor, julgamento de existência e, certamente, positivo.

No entanto, muitos outros milênios transcorreram até que, em 1842, Mayer, joule e Colding investigaram esse processo especial em sua relação com outros processos de tipo semelhante, isto é, no que dizia respeito a suas condições gerais imediatas e formularam o julgamento correspondente: todo movimento mecânico é capaz de converter-se em calor por meio do atrito. Muito tempo e uma quantidade enorme de conhecimentos empíricos foram necessários para que pudéssemos dar esse passo, no conhecimento do objeto, do anterior julgamento positivo de existência, a esse julgamento universal determinativo.

E, a partir de então, a coisa marchou rapidamente. Apenas três anos depois, pode Mayer, pelo menos em substância, colocar o julgamento determinativo no nível em que se encontra hoje: toda forma de movimento, sob condições determinadas em cada caso, pode e é compelida a transformar-se, direta ou indiretamente, em qualquer outra forma de movimento: julgamento de conceito e certamente apodíctico, a forma mais elevada do julgamento em geral.

Por conseguinte, o que em Hegel apareceu como um desenvolvimento da forma mental do julgamento como tal, apresenta-se aqui como um desenvolvimento de nosso conhecimento teórico (empiricamente formulado) da natureza do movimento em geral. Isso mostra, porém, que a lei do pensamento e a lei natural concordam necessariamente entre si, desde que sejam corretamente conhecidas.

Podemos conceber o primeiro julgamento como sendo de singularidade: registra-se o fato isolado de que o atrito produz calor. O segundo julgamento, como sendo de particularidade: uma forma especial de movimento — o mecânico — apresenta a propriedade de se transformar, sob condições especiais (pelo atrito), em outra forma de movimento, segundo está comprovado, pode e é compelida a transformar-se em qualquer outra forma de movimento. Sob esta forma, a lei alcançou sua expressão final. Mediante novas descobertas, poderemos dar novos exemplos dela, poderemos dar-lhe um conteúdo novo e mais rico. Mas a própria lei, assim formulada, já nada mais podemos acrescentar. A sua generalidade, igualmente geral na forma e no conteúdo, não é suscetível de ampliação: trata-se de uma lei absoluta da Natureza.

Lamentavelmente continuamos a manquejar no que se refere ao movimento da proteína, aliás vida, enquanto não nos for possível produzi-la(67).

Individualidade, particularidade, generalidade: estas são as três determinações dentro das quais se move toda a teoria do conceito. De acordo com essas linhas mestras, podemos progredir, não de uma, mas de várias modalidades, indo do individual para o particular e deste para o geral, processo de Hegel exemplifica freqüentemente, segundo a linha: indivíduo — espécie — gênero. E, depois disso, apresentam-se os Haeckel com a sua indução e proclamam como uma grande proeza para o particular e, em seguida, para o geral; do indivíduo para a espécie e, só então, para o gênero; e, daí, chegam a conclusões dedutivas que, segundo supõem, podem conduzir muito mais longe. Essa gente aferrou-se de tal maneira à idéia de oposição entre indução e dedução, que, ao proceder assim, 1) sob esses nomes, empregam inconscientemente formas de conclusão inteiramente diferentes; 2) privam-se de toda a riqueza proveniente das formas de conclusão, quando estas não se deixam comprimir dentro dessas duas; 3) dessa maneira, convertem ambas essas formas — a indução e a dedução — em um puro absurdo.

O que fica aí dito demonstra além do mais, que corresponde aos julgamentos, não só a força de raciocínio, de Kant, mas também uma força de raciocínio.

Hofmann (August Wilhelm Von, 1818-1892) (Um Século de Química sob os Hohenzollern), refere-se à Filosofia da Natureza, apresentando citações de Rosenkranz (Karl, 1805-1879), o literato em quem nenhum verdadeiro hegeliano reconhece autoridade. Atribuir a Rosenkranz qualquer responsabilidade no que se refere à Filosofia da Natureza é um absurdo tão grande quanto responsabilizar os Hohenzollern pela descoberta do açúcar de beterraba, feita por Marggraf (Andréas, 1709-1782)

As leis eternas da Natureza se transformam, cada vez mais, em leis históricas. O fato de que a água se apresente no estado líquido entre 0˚ e 100º C é uma lei natural eterna, mas para que seja válida é necessário haver: 1) água; 2) determinada temperatura; 3) pressão normal(68). Na Lua não há água, no sol existem apenas seus elementos; para esses corpos celestes a lei, portanto, não existe.

Também as leis da meteorologia são eternas, mas somente para a Terra ou para um corpo do tamanho, densidade, inclinação axial e temperatura iguais aos dela; tudo isso sob a condição ainda de que tenha uma atmosfera constituída da mesma mistura de oxigênio e nitrogênio, bem como se evaporem e precipitem as mesmas quantidades de vapor de água. A Lua não tem atmosfera e o Sol a tem, mas constituída de vapores metálicos incandescentes; a primeira não possui meteorologia e o segundo a tem completamente diferente da nossa.

Toda a nossa física, toda a química e toda a biologia oficiais são exclusivamente geocêntricas, concebidas e calculadas apenas para a Terra. Nada sabemos ainda sobre as condições de tensão elétrica e magnética no Sol, nas estrelas fixas, nas nebulosas e, inclusive, nos planetas de densidade diferente do nosso(69). No Sol, devido a sua elevada temperatura, as leis de combinação química dos elementos, não prevalecem ou só operam momentaneamente, nos limites da atmosfera solar, dissociando-se os compostos novamente, ao aproximarem-se do Sol. Mas a química do Sol está em vias de surgir e, embora deva ser muito diferente da química terrestre, não lançará esta abaixo, devendo ser apenas diferente dela. Nas nebulosas, talvez não existem sequer todos aqueles 65 elementos que conhecemos(70), os quais, por sua vez, poderão ser de natureza composta. Por conseguinte, se quisermos falar de leis naturais gerais, uniformemente aplicáveis a todos os corpos — desde a nebulosa até o homem -, só nos restam a gravidade e talvez a forma mais geral da teoria referente à transformação da energia, isto é, a teoria mecânica do calor(71). Mesmo esta teoria, entretanto, se converte (com sua aplicação lógica geral a todos os fenômenos naturais) em uma representação histórica das sucessivas modificações que se verificam num sistema celeste, desde a sua origem até o seu desaparecimento; por conseguinte, numa história em que, em cada etapa, imperam leis diferentes, isto é, diferentes formas fenomênicas do mesmo movimento universal; e, sendo assim, não resta outra coisa, constante e universalmente válida, senão o movimento.

Conhecer — As formigas possuem olhos diferentes dos nossos: podem ver os raios luminosos químicos (?)(72) (Nature, 8 de junho de 1882, Lubbock), mas, no que diz respeito ao conhecimento desse raios, invisíveis para nos, estamos muito mais adiantados que as formigas: somente o fato de que possamos demonstrar que as formigas vêem coisas para nós invisíveis, e que essa demonstração repousa apenas em percepções obtidas através de nossos olhos, só isso basta para mostrar que a constituição especial do olho humano não representa uma barreira absoluta ao conhecimento humano.

Aos nossos olhos se acrescentam, não somente os demais sentidos, mas também nossa atividade mental. Com esta, ocorre exatamente a mesma coisa que com os olhos. Para saber até que ponto se pode aprofundar o nosso pensamento, é inútil pretender descobrir, 100 anos depois de Kant, o alcance do pensamento mediante a crítica da razão, ou procedendo à investigação do instrumento do conhecer. Isso seria o mesmo que se Helmholtz empregasse a imperfeição de nossa vista (que, por certo é necessária, muito embora um olho que pudesse ver todos os raios, não veria, por isso mesmo, absolutamente nada)(73), e se baseasse na constituição do olho, que restringe nossa visão a determinados limites e, mesmo assim, não proporcionando uma reprodução muito correta para provar eu nossos olhos nos informam incorreta ou inseguramente a respeito daquilo que vêem. Até onde pode alcançar o nosso pensamento, vemo-lo muito mais através daquilo que já alcançou e daquilo que, diariamente descobre. E isso é bastante, tanto em quantidade como em qualidade. Por outro lado, a investigação a respeito das formas de pensamento, das determinações do pensamento, é muito proveitosa e necessária; e, desde Aristóteles, somente Hegel empreendeu-a de maneira sistemática.

Não obstante, jamais descobriremos como se afiguram, às formigas, os raios químicos(74). Nada podemos fazer por aqueles que se afligem por esse motivo.

Os homens de ciência podem adotar a atitude que quiserem, mas estarão sempre dominados pela filosofia. Trata-se apenas de saber se querem ser dominados por uma filosofia que, embora má, está na moda; ou por uma forma de pensamento teórico fundado sobre a familiaridade com a história do conhecimento e de suas aquisições.

“Física, toma cuidado com a metafísica” — é uma advertência correta, mas em sentido oposto.

Os homens de ciência concorrem para que a filosofia prolongue uma vida artificial, ao fazerem uso de tudo quanto resta da velha metafísica. Logo que a ciência da Natureza e da História tenham incorporado a si a doutrina dialética, toda essa miscelânea filosófica — com exceção da teoria pura do pensamento — será supérflua e se dissolverá no corpo da ciência positiva.

Hegel, Geschichte der Philosophie ( História da Filosofia); Grieshische Philofophie (Naturanschauung der Alten), Filosofia Grega (Concepção da Natureza segundo os Antigos), t.I.

Aristóteles (Metafísica, I, 3) diz a respeito dos primeiros filósofos:

“... aquilo de que consiste todo ser e do qual se originaram e no qual, finalmente, se dissolvem, permanecendo a substância ousia no variar suas modalidades padesi, dizem que isto é o elemento stoikheion e o princípio arkhe de todos os seres... Donde concluem que nada nasce oute gignestai ouden nem perece, porque sempre subiste a mesma Natureza”. Pág. 198.

Aí já está contido, por conseguinte, todo o materialismo de origem naturalista que, com toda simplicidade, considera como evidente, no seu começo, a unidade da infinita multiplicidade dos fenômenos naturais e busca, em alguma coisa definitivamente corpórea, uma coisa especial, como faz Thales com relação à água.

Cícero diz:

“Thales de Mileto... declara que a água é o princípio de todas as coisas, mas que Deus o é de nossa mente, que é feita de água”. [De Natura Deorum (Da Natureza dos Deuses), I, 10]. Hegel sustenta, com muita razão, que se trata de um aditamento de Cícero e acrescenta: “Em nada nos interessa, neste caso, a questão de saber se Thales, além do mais, acreditava em Deus; aqui não se trata de fazer suposições, nem de crença, nem de religião popular... E, se ele se referiu a Deus como sendo o criador de todas as coisas, tendo como ponto de partida a água, em razão disso nada mais ficamos sabendo a respeito desse ser... trata-se de uma palavra vazia, sem sua idéia”. Pág. 209 (ca. 600-605).

Os filósofos gregos mais antigos eram, ao mesmo tempo, investigadores da Natureza: Thales, geômetra, fixou o ano em 365 dias e dele se diz que predisse um eclipse solar; Anaximandro construiu um relógio de sol, uma espécie de mapa das terras e mares, bem como diversos instrumentos astronômicos; Pitágoras foi matemático.

Anaximandro de Mileto, segundo Plutarco, Quest.: Conviv., VII, Pág. 8 admite “originar-se o homem de um peixe, que passou da água para a terra”, pág. 213. Para ele, o apkhe khai stoikheion to ipeiron(75), sem determiná-la como ar, água ou qualquer outra coisa (diorison); Diógenes Laertius, II, § 1. Isso é reproduzido por Hegel, de maneira infinitamente correta, como a matéria indeterminada (ca. 580).

Anaxímenes de Mileto considera o ar como princípio e elemento fundamental, sustentado que o mesmo é infinito (Cícero, Natura Deorum, I, Pág. 10) e que tudo provém dele e nele tudo volta a dissolver-se (Plutarco, De Platicis Philos., I, 3). Assim sendo, o ar aer = pneuma: Do mesmo modo que nossa alma, que é ar, nos mantém unidos, todo se mantém unido por um espírito (pneuma) e ar. Espírito e ar têm o mesmo sentido. (Plutarco). Alma e ar concebidos como meio geral (ca. 555).

Já Aristóteles dizia que esses primeiros filósofos apresentavam a essência primitiva sob a forma de matéria: ar e água (e Anaximandro talvez sob uma forma intermediária entre ambos); mais tarde, Heráclito, sob a forma de fogo; mas nenhum sob a forma de terra, devido a sua múltipla composição (dià tén megaloméjeian), Metafísica, I, 8, pág. 217.

De todos eles dizia Aristóteles, com razão, que deixaram sem explicação a origem do movimento (Pág. 218 e ss.).

Pitágoras de Samos (ca. 540): o número é o princípio fundamental: “que o número é a essência de todas as coisas; e a organização do universo, em geral, em suas determinações, é um sistema harmônico de números e suas relações” (Aristóteles, Metafísica, I, 5 passim). Hegel chama justamente nossa atenção para “a audácia de tal linguagem que, de um golpe, põe abaixo tudo quanto a imaginação considera como existente ou como essencial (verdadeiro) e aniquila a essência sensorial”, colocando a essência numa determinação do pensamento, por mais restrita e limitada que esta seja. O universo está sujeito a leis definidas, do mesmo modo que o número; dessa maneira foi expressa, pela primeira vez, sua legalidade. A Pitágoras é atribuída a redução das harmonias musicais e relações matemáticas. Igualmente: “Os pitagóricos puseram o fogo no meio, mas a Terra como um astro que gira, segundo um círculo, ao derredor desse corpo central”. (Aristóteles, Metafísica, I, 5). Esse fogo, porém, não é o Sol; trata-se, pois, da primeira suspeita de que a Terra se move.

Hegel, sobre o sistema planetário:

“... o harmônico, com o qual se determinam as distâncias: a matemática não foi ainda capaz de dar-lhe fundamento. São conhecidos exatamente os números empíricos; mas tudo tem a aparência do azar e não da necessidade. Conhecemos apenas uma regularidade aproximada das distâncias; e, por sorte, descobrimos maior número de planetas entre Marte e Júpiter, onde logo foram descobertos Ceres, Vesta, Pallas, etc.; mas uma série lógica em que haja razão, entendimento, ainda não foi descoberta pela astronomia. Prefere olhar com desprezo a apresentação regular dessa série; e, no entanto, esse ponto é, para ela, enormemente importante, não se devendo abandoná-lo” (Pág. 267).

Em todas as concepções, de conjunto, materialistas ingênuas, dos gregos mais antigos, encontra-se já o germe da futura divisão. Já em Thales, a alma é uma coisa especial , diferente do corpo (da mesma forma que atribui uma alma ao ímã); em Anaximenes, a alma é ar (como no Gênese); para os pitagóricos, ela é imortal e migratória, sendo o corpo, a seu ver, puramente acidental. Para os pitagóricos, a alma é também “uma centelha do éter (apóspasma orshéros). Diógenes Laertius, VIII, pág. 26/28, em que o éter frio constitui o ar e o éter mais denso, o mar e a umidade”.

Aristóteles censura também os pitagóricos pelo fato de, com seus números, “não dizerem como é produzido o movimento e como, sem mudança, pode haver aparecimento e desaparecimento; ou estados e atividade das coisas celestes”. (Metafísica, I, 8).

Supõe-se que Pitágoras tenha estabelecido a identidade da Estrela d’Alva e da Estrela Vespertina; que a Lua recebe sua luz do Sol; e finalmente, o teorema pitagórico(76). Conta-se que, ao estabelecer esse teorema, Pitágoras provocou uma hecatombe... E pode parecer curioso que sua alegria fosse tão grande que ele tivesse ordenado a realização de uma estrondosa festa para a qual foram convidados os ricos e todo o povo; valia a pena. Era em gozo, alegria do espírito (conhecimento)... à custa dos bois. (Pág. 279).

Eleáticos

1. Em Hegel, o progresso infinito é um deserto vazio, porque só é apresentado como uma eterna repetição da mesma coisa: 1 + 1 + 1 etc..

2. Na realidade, porém, não é repetição mas sim desenvolvimento, avanço ou retrocesso; e daí surge uma forma necessária de movimento. Isso, além de que não é infinito: o fim da vida sobre a Terra já pode ser previsto agora. Mas a Terra tampouco é todo o universo. No sistema de Hegel, era excluído todo o desenvolvimento da história temporal da Natureza, pois, do contrário, esta não seria a exteriorização do espírito. Na história humana, porém, o progresso infinito de Hegel é considerado como a única forma verdadeira de existência do espírito; apenas há o seguinte: é que, fantasticamente, se supõe que esse desenvolvimento tem um fim: o aparecimento da filosofia de Hegel.

3. Existe também o conhecer infinito: questa infinitá che lê cose non hanno in progresso, la hanno in giro(77). Assim, a lei da mudança de forma é infinita, incluindo-os e ela em si mesma. Mas tais infinidades estão novamente atadas à finitude e só ocorrem esporadicamente. O mesmo 1/r².

Quantidade e qualidade — O número é a mais pura determinação quantitativa que conhecemos. Mas está cheio de diferenças qualitativas. 1. Hegel, número e unidade, multiplicar, dividir, elevar a potências, diferenças qualitativas: números primos e produtos, raízes simples e potências; 16 não é apenas a soma de 16 unidades, mas também o quadrado de 4 e a quarta potência de 2. mais ainda: os números primos transmitem novas e bem determinadas qualidades aos números deles derivados por multiplicação por outros números: somente os números pares são divisíveis por 2; e para o 4 e o 8 existe uma determinação idêntica; no 3 aparece a soma de seus algarismos, o mesmo acontecendo com o 9 e o 6, neste último caso, combinado com o número par. Para o 7 há uma regra especial. É nisso que se fundam os truques numéricos, incompreensíveis para os profanos. Por conseguinte, o que diz Hegel (quantum, pág. 237), a respeito da ausência de pensamento na aritmética, é incorreto. Apesar de tudo, comparar medida.

Tão logo a matemática começou a falar de infinitamente grande e infinitamente pequeno, estabeleceu uma diferença quantitativa que, inclusive, adquiriu a forma de uma oposição qualitativa irreconciliável. Quantidades com tão grandes diferenças entre si que toda a relação racional, toda a comparação entre elas é impossível; que se tornam quantitativamente incomensuráveis. A comum incomensurabilidade da circunferência e da reta, é também uma diferença dialética qualitativa; mas, neste caso, é a diferença, em quantidade, de grandezas da mesma espécie, que aumenta a diferença qualitativa até o ponto de torná-la incomensurável.

Número — O número, isoladamente considerado, adquire uma qualidade, já no sistema numérico; e essa qualidade depende deste. O número 9 não é apenas 1 somado nove vezes, mas também a base de 90, 99, 900.000 etc. Todas as leis numéricas dependem do fato de eu são determinadas pelo sistema adotado. Nos sistemas de base 2 e base 3(78), 2 x 2 não é = 4, mas = 100 ou = 11. Em todo sistema que tem por base um número ímpar, deixa de haver diferença entre números pares e ímpares; por exemplo, no sistema de base 5, tem-se 5 = 10, 10 = 20, 15 = 30(79). Igualmente, no mesmo sistema, a soma dos dígitos 3n, de produtos de 3 ou 9 (6 = 11, 9 = 14)(80). O número-base determina, pois, não somente a sua própria qualidade, mas também a de todos os demais números.

No que diz respeito à potenciação, a coisa vai mais longe: cada número deve ser concebido como potência de outro; há tantos sistemas logarítmicos como números inteiros e fracionários.

√ - 1. As grandezas negativas, na álgebra, apenas são reais quando se relacionam com grandezas positivas e unicamente dentro da relação com estas; fora dessa relação, consideradas em si mesmas, são puramente imaginárias. Na trigonometria e na geometria analítica, bem como nos ramos da matemática superior fundados sobre as mesmas, indicam uma determinada direção de movimento, oposta à positiva; mas, é possível contar o seno e a tangente da circunferência, tanto a partir do quadrante superior direito, como a partir do inferior direito, invertendo-se assim os sinais mais e menos. Da mesma forma, na geometria analítica, as abscissas(81) podem ser calculadas, na circunferência, a partir da periferia ou do centro; é certo que, em todas as curvas, as abscissas podem ser contadas na direção correntemente anotada com o sinal menos ou em qualquer direção desejada, obtendo-se sempre uma exata equação racional da curva. Neste caso, o mais somente existe como complemento do menos e vice-versa. Mas a abstração algébrica a encara como uma grandeza positiva real e independente, inclusive fora da relação com uma grandeza maior.

Aplicação da matemática: na mecânica dos corpos rígidos, é absoluta; na dos gases, aproximada(82); na dos fluídos, muito mais difícil; na física, mais de ensaio e relativa; na química, simples equações do primeiro grau e da natureza mais elementar; na biologia = 0.

O cálculo diferencial tornou possível, pela primeira vez, que a ciência representasse, matematicamente, processos e não apenas estados: movimento.

O fato de que o positivo e o negativo possam igualar-se, sem se levar em conta qual seja o lado positivo e qual o negativo: não somente na geometria analítica, ainda mais na física (ver Clausius, pág. 87 e ss.)

O zero não deixa de ter conteúdo pelo fato de ser a negação de qualquer quantidade determinada. Pelo contrário, o zero tem um conteúdo perfeitamente definido. Como fronteira entre todas as grandezas positivas e negativas, como único número realmente neutro, que não pode ser + nem -, não é somente um número perfeitamente definido, mas também, por si mesmo, mais importante que todos os outros números por ele delimitados. O zero tem, na realidade, um conteúdo maior que qualquer outro número. Posto à direita de qualquer outro empresta-lhe, em nosso sistema numérico, um valor dez vezes maior. Em lugar do zero, poder-se-ia empregar, para isso, qualquer outro sinal; mas somente sob a condição de que esse sinal, considerado em si mesmo, signifique zero, isto é, que seja = 0. Por conseguinte, na própria natureza do zero reside a razão de seu emprego e o fato de que só ele possa ser empregado assim. O zero anula qualquer outro número pelo qual seja multiplicado; unido a qualquer outro número como divisor ou como dividendo, torna-o infinitamente grande, no primeiro caso e, no segundo, infinitamente pequeno; é o único número cuja relação com qualquer outro, é infinita; 0/0 pode expressar qualquer número entre - ∞ e + ∞; e, em cada caso representa uma grandeza real.

O verdadeiro conteúdo de uma equação se torna perfeitamente claro, logo que todos os seus termos são colocados de um lado da igualdade, que fica assim igual a zero, como acontece com as equações quadradas e, como regra quase geral, álgebra superior. Uma função (x, y) = 0 pode ser igualmente igualada a z e este z, mesmo quando seja igual — 0, pode diferenciar-se como uma variável dependente ordinária, determinando-se sua derivada parcial(83).

O nada de qualquer quantidade continua sendo, entretanto, quantitativamente determinado e, só por esse motivo, é possível calcular com o zero. Até mesmo os matemáticos que calculam tranqüilamente com o zero, sob a forma mencionada, isto é, que operam com ele como conceito quantitativo determinado, estabelecendo relações quantitativas entre ele e outros conceitos quantitativos, põem as mãos na cabeça quando lêem, em Hegel, sob a forma generalizada: o nada de alguma coisa é um nada determinado.

Mas passemos agora ao terreno da geometria analítica. Aí, o zero é um ponto determinado, a partir do qual, sobre uma linha, mede-se positivamente num sentido e negativamente, noutro. Neste caso, portanto, o ponto zero, não só tem tanto significado como qualquer outro ponto assinalado por uma grandeza positiva ou negativa, mas também um significado muito maior que todos eles: é o ponto do qual dependem todos os demais, com o qual todos eles estão relacionados, pelo qual todos são determinados. Em muitos casos pode ser estabelecido de maneira inteiramente arbitrária. Mas, uma vez adotado, continua sendo o ponto central de toda a operação, determinando, freqüentemente, inclusive a direção da linha sobre a qual devem ficar situados os outros pontos, os pontos terminais das abscissas. Se, por exemplo, a fim de estabelecer a equação da circunferência, escolhermos como ponto 0, um ponto qualquer da periferia, então o raio vector deve passar pelo centro da circunferência. Tudo isso encontra sua aplicação igualmente na mecânica, onde também o cálculo dos movimentos do ponto tomado em cada caso como zero, constitui o ponto principal e o eixo de toda a operação. O ponto zero do termômetro é o limite inferior, perfeitamente determinado, da seção de temperaturas que são divididas em qualquer número de graus, servindo assim como medida, tanto das graduações de temperatura, dentro da seção, como de temperaturas superiores ou inferiores. Por conseguinte, neste caso também trata-se de um ponto essencial. O zero absoluto do termômetro não representa, inclusive, de maneira nenhuma, uma simples negação abstrata, mas um estado perfeitamente determinado da matéria: o limite dentro do qual desaparece o último vestígio de movimento molecular independente, passando a matéria a atuar unicamente como massa. Toda vez que topamos com um zero, verificamos que este representa alguma coisa perfeitamente determinada; e sua aplicação prática na geometria, na mecânica etc., demonstra que — como limite — é mais importante do que todas as grandezas reais por ele separadas.

Um — Nada parece mais simples do que a unidade quantitativa; e, no entanto, nada é mais múltiplo do que ela, desde que a examinemos em relação com a correspondente pluralidade e de acordo com os diversos modos pelos quais a mesma se origina. Em primeiro lugar, o número um é a base de todo o sistema de números positivos e negativos, todos os demais se formando por meio da adição sucessiva de si mesmo.

O um é uma expressão de todas as potências positivas, negativas e fracionárias de 1: 1², √ 1 são todos iguais a 1. É o conteúdo de todos os quebrados cujo numerador e denominador são iguais. É a expressão de todo o número elevado à potência zero e, assim sendo, o único número cujo logaritmo é igual em todos os sistemas, isto é, = 0. O um é assim, a fronteira que divide em duas partes todos os sistemas possíveis de logaritmos. Se a base for maior que um, os logaritmos de todos os números maiores que 1, são positivos e os dos n úmeros menores que 1, são negativos; se a base for menor que 1, dá-se justamente o inverso.

Por conseguinte, se todo número contém em si a unidade, quando composto de vários uns somados, a unidade contém igualmente todos os demais números. Não somente como possibilidade, quando podemos constituir todo o número com simples uns, mas também na realidade, constituir todo o número com simples uns, mas também na realidade, quando o um é uma potência determinada de qualquer outro número. Mas esses mesmos matemáticos que, sem o menor esforço, interpolam em seus cálculos, quando lhes convém, X° = 1, ou uma fração cujo numerador e denominador são iguais e que, em conseqüência, representa também a unidade; e que, por conseguinte, aplicam matematicamente a pluralidade contida na unidade, esses matemáticos torcem o nariz e fecham a cara quando lhes dizemos, em termos gerais, que unidade e pluralidade são coisas inseparáveis, são conceitos que se interpenetram; e que a unidade não está mais contida na pluralidade do que a pluralidade contida na unidade. E quanto isso é verdade, podemos verificar logo que abandonamos o campo dos números puros. Já no caso da medição de linhas, superfícies e volumes de corpos, verificamos que podemos tomar como unidade qualquer grandeza desejada, da ordem correspondente; e a mesma coisa acontece no que se refere à medição do tempo, do peso, do movimento etc. Para a medição de células, o milímetro e o miligrama são ainda demasiado grandes; para a medição de distâncias estelares ou da velocidade da luz, inclusive o quilômetro se torna incomodamente pequeno, da mesma forma que o quilograma para as massas planetárias e também solares. Neste caso, salta à vista a multiplicidade e a pluralidade contidas no ceito de unidade, tão simples à primeira vista.

Matemática — Para o senso comum, parece um absurdo resolver uma grandeza determinada, por exemplo um binômio, numa série infinita; em conseqüência, em alguma coisa determinada. Mas, onde estaríamos sem as séries infinitas e sem o teorema do binômio?

Conservação da energia — A constância quantitativa do movimento já foi enunciada por Descartes e, por certo, quase com as mesmas palavras que atualmente por ... (Clausius, Robert Mayer?). Por outro lado, a mudança de forma do movimento foi descoberta logo depois de 1842 e isto (e não a lei da constância quantitativa) é o que há de novo.

Força e conservação da força — Empregar contra Helmholtz os pontos de vista de J. R. Mayer, em suas duas primeiras comunicações.

Trigonometria — Depois que a geometria sintética esgotou todas as propriedades de um triângulo considerado em si mesmo, e quando já não tem nada mais de novo para dizer, abre-se um horizonte mais dialético. O triângulo já não é considerado em si e para si, mas sim em relação com outra figura — a circunferência. Todo triângulo retângulo pode ser considerado como pertencendo a um círculo: se a hipotenusa é = raio, então, os catetos são sen e cos;se um cateto = r, então o outro = tang e a hipotenusa = sec. Dessa maneira, os lados e ângulos adquirem relações determinadas muito diferentes, as quais seria impossível descobrir e utilizar sem essa relação agora existente entre o triângulo e a circunferência; e assim se desenvolve uma teoria completamente nova no que se refere ao triângulo, a qual ultrapassa de muito a velha, sendo universalmente aplicável, já que todo triângulo pode ser decomposto em dois triângulos retângulos. Esse desenvolvimento da trigonometria a partir da geometria sintética é um bom exemplo da dialética, pelo modo de considerar as coisas segundo suas conexões em lugar de fazê-lo, considerando-as isoladamente.

O desgaste de energia cinética, como tal, apresenta sempre, dentro da dinâmica, uma dupla natureza e um duplo resultado: 1) o trabalho cinético executado, produção de uma quantidade correspondente de energia potencial que, no entanto, é menor do que a energia cinética aplicada; 2) superação — além da gravidade — de resistência resultantes de atritos etc., que convertem em calor o resto da energia cinética consumida. A mesma coisa se passa na conversão: segundo a maneira em que esta se verifique, uma parte da perda por atrito etc., é dispendida como calor; e tudo isso é antiqüíssimo!

No movimento dos gases — no processo de evaporação — o movimento de massas se transforma diretamente em movimento molecular. Por conseguinte, neste caso é preciso fazer a transição.

Hegel, Enciclopédia, I, págs. 205/6, opiniões proféticas a respeito dos pesos atômicos, em contraste com as concepções físicas então predominantes; e também sobre o átomo e a molécula como determinações mentais, a respeito das quais o pensamento tem que decidir.

A gravidade, como a determinação mais geral da materialidade, tal como é comumente aceita, isto é a atração, é uma propriedade necessária da matéria, ao contrário da repulsão. Mas a atração e a repulsão tão inseparáveis como o positivo e o negativo. Daí se segue que, inclusive através da própria dialética, e torna-se claro, que a verdadeira teoria a respeito da matéria deve conceder à repulsão um lugar tão importante como aquele ocupado pela atração; que uma teoria sobre a matéria baseada unicamente na atração, é falsa, insuficiente, unilateral(84). Na realidade, verificam-se inúmeros fenômenos que demonstram isso antecipadamente. Embora seja apenas por causa da luz, não podemos dispensar o éter. E o éter será material? Se é que existe, deve estar incluído no conceito de matéria. Mas o fato é que não é afetado pela gravidade(85). As caudas dos cometas são consideradas materiais. Denunciam uma poderosa repulsão. O calor, em um gás, provoca repulsão, etc.

Choque e atrito — A mecânica considera os efeitos do choque como sendo puramente transitórios. Mas, na realidade, as coisas se passam de outro modo. Em cada choque que se verifica, uma parte do movimento mecânico se transforma em calor; e o atrito nada mais é senão uma forma de choque, a qual converte continuamente movimento mecânico em calor (o fogo produzido pelo atrito é conhecido desde os tempos mais remotos).

Descartes descobriu que o fluxo e o refluxo das marés, são causados pela atração da Lua. Descobriu também, simultaneamente com Snellius, a lei fundamental da refração da luz, certamente que sob uma forma peculiar a ele e, portanto, diferente da de Snellius.

Teoria e empirismo — A forma achatada apresentada pela Terra foi teoricamente estabelecida por Newton. Mas durante muito tempo, depois disso, os Cassinis e outros franceses, baseando-se em suas medições empíricas, sustentavam que a Terra tem a forma elipsoidal, sendo o eixo polar o mais longo.

Aristarco de Samos, 270 A.C., sustentava já a teoria copernicana sobre o movimento da Terra em derredor do Sol. Mädler, pág. 44; Wolf, pág. 35-37.

Demócrito havia já suspeitado de que a Via Láctea remete-nos a luz combinada de inumeráveis pequenas estrelas (Wolf, pág. 313).

Belo exemplo de dialética da natureza é a forma pela qual as teorias atuais explicam a repulsão de pólos magnéticos iguais por meio da atração de corrente elétrica iguais (Guthrie, pág. 264).

O desprezo dado aos gregos pelos empíricos torna-se perfeitamente claro quando se lê (por exemplo, th. Thomson On Electricity) que homens como Davy e inclusive Faraday tateam na obscuridade (faíscas elétricas, etc.) e realizam experiências que lembram nitidamente as histórias de Aristóteles e de Plínio a respeito das relações físico-químicas. Justamente nesta nova ciência os empíricos reproduzem inteiramente o cego tatear dos antigos. E sempre que o genial Faraday se encontra no caminho certo é exatamente quando se manifesta contra ele o filisteu Thomson (pág. 397).

Atração e gravitação — Toda a teoria da gravitação repousa na afirmação de que a atração é a essência da matéria. Isso é evidentemente falso. Onde há atração, esta deve ser provocada pela repulsão. Por esse motivo, Hegel tem toda a razão ao dizer que a essência da matéria é constituída pela atração e pela repulsão. De fato, cada vez mais nos vemos obrigados a reconhecer que a dispersão da matéria tem um limite, além do qual a atração se converte em repulsão; e, reciprocamente: a condensação da matéria repelida tem um limite, além do qual a repulsão se converte em atração(86).

Como regra, a primeira concepção, embora ingênua, é mais correta do que a posterior, que é metafísica. Assim é que Bacon (e, depois dele, Boyle, Newton e quase todos os ingleses) já sustentava que o calor é movimento (e Boyle chegou mesmo a dizer que era movimento molecular). Logo no início do século XVIII surgiu, na França, a teoria do calórico, que foi mais ou menos aceita no Continente.

O ponto de vista geocêntrico, em astronomia, constitui uma limitação e, com justo motivo, foi posto de lado. Mas, quanto mais avançamos na investigação, mais e mais ele se afirma. O Sol etc., servem à Terra: Hegel, Naturphil., pág. 157. (O Sol, em toda a sua imensa grandeza, existe apenas por causa dos pequenos planetas). A nós é vedado cogitar de outras coisas que não de física, de química, de biologia, de meteorologia, etc., geocêntricas; e nada se perde com a frase segundo a qual tudo isso é apenas válido tendo em vista a Terra, o que é claramente relativo. Se levarmos isso a sério e exigirmos uma ciência destituída de centro, toda a ciência ficará parada; (basta-nos isso) com saber que, nas mesmas condições, há o mesmo em todas as partes...(87).

No 0° absoluto, nenhum gás é possível; cessa todo movimento das moléculas, não havendo a menor pressão e, conseqüentemente, sua própria atração as une. Daí o fato de ser impossível a existência de um gás permanente(88).

Fica demonstrada também a validade do mv² para as moléculas dos gases, de acordo com a teoria cinética dos gases. Por conseguinte, para o movimento molecular prevalece a mesma lei que para o solar; neste caso a diferença entre ambos está superada.

  1. Movimento em geral.
  2. Atração e repulsão. Transferência de movimento.
  3. Conservação da energia aplicada a isto. Repulsão + atração — adição de repulsão = energia.
  4. Gravidade — corpos celestes — mecânica terrestre.
  5. Física, calor, eletricidade.
  6. Química.
  7. Resumo.
  1. Antes de 4: linha matematicamente infinita e + e — iguais.
  2. Em astronomia: execução de trabalho pelas marés.

Duplo cálculo ............................. em Helmholtz, II, pág. 120

Forças ........................................ em Helmholtz, II, pág. 190

Conclusão a que chegaram Thomson, Clausius, Loschmidt (Joseph, 1821-1895): a reversão consiste em que a repulsão se repele a si mesma, voltando assim, do meio, aos corpos celestes extintos. Nisto, porém, reside também a demonstração de que a repulsão é o lado realmente ativo do movimento e que a atração é o passivo.

1) Movimento dos corpos celestes. Equilíbrio aproximado entre atração e repulsão no movimento.

2) Movimento sobre um corpo celeste. Massa. Na medida em que esta tem causas puramente mecânicas, também equilíbrio. As massas estão em repouso por sua causa. Isso é aparentemente completo, na Lua. A atração mecânica superou a repulsão mecânica. Do ponto de vista da mecânica pura, não sabemos o que aconteceu à repulsão; e tampouco a mecânica pura explica donde provêm as forças por meio das quais, por exemplo. As massas terrestres se movem contra a ação da gravidade. Admite o fato como dado. Neste caso, por conseguinte, simples comunicação de movimento local repulsivo e afastador de massa para massa, no qual atração e repulsão são iguais.

3) A enorme maioria de todos os movimentos terrestres, no entretanto, consiste na conversão de uma forma de movimento em outra, da forma mecânica em calor, eletricidade, movimento químico e vice-versa; por conseguinte, pode ser também a transformação de atração em repulsão (a conversão é a transformação do movimento mecânico original, de levantamento,em calor, e não de movimento de queda, este apenas aparente).

4) Toda a energia atualmente ativa, na Terra, é calor solar transformado(89).

Quão pouco pode ser Comte o autor de sua classificação enciclopédica das ciências (que copiou de St. Simon), é coisa que se faz evidente pelo fato de que, na mesma, só demonstra o propósito de classificar os meios de instrução e de ensino, conduzindo-nos dessa maneira ao insensato enseignement intégral (ensino integral) em que se esgota o estudo de uma ciência antes de iniciar o de outra qualquer; em que um pensamento, no fundo, correto, é transformado num absurdo matemático.

Fisiografia — Uma vez que tenhamos feito a transição do terreno da química ao da vida, será preciso analisar, em primeiro lugar, as condições em que a mesma se produziu e nas quais existe a vida; por conseguinte, em primeiro lugar, a geologia, a meteorologia e tudo mais. Em seguida, as diversas formas de vida, as quais, por certo, se tornam incompreensíveis se não houver esses cuidados preliminares.

Com a atomística, iniciou-se uma nova época na história da química (Dalton foi, portanto, e não Lavoisier, o verdadeiro pai da química moderna), simultaneamente, na física, com a teoria molecular (que surgiu sob outra forma, porém representando, essencialmente, apenas o outro lado desse processo, uma vez descoberta a conversão das diversas formas de movimento). A atomística moderna diferencia-se de todas as anteriores pelo fato de não pretender (pondo à parte os burros) que a matéria seja puramente discreta, sustentando, ao contrário, que as partes discretas são etapas diferentes (átomos de éter, átomos químicos, massas, corpos celestes), são distintos pontos nodais(90) que determinam as diferentes formas qualitativas de existência da matéria geral, descendo até a ausência de peso e a repulsão.

Hegel estabeleceu a teoria da luz e das cores, por meio do pensamento puro e, dessa maneira, foi arrastado ao mais grosseiro empirismo (se bem que com algum direito, já que esse ponto não estava ainda esclarecido), quando, por exemplo, aduzia, contrariando Newton, as misturas de cores dos pintores (Pág. 314, em baixo).

Eletricidade estática e dinâmica — A eletricidade estática ou a de atrito é a colocação em estado de tensão da eletricidade que se encontra na Natureza, a que já existe sob a forma de eletricidade, mas em estado de equilíbrio, neutro. O desaparecimento dessa tensão acontece em conseqüência (sempre que e na medida em que a eletricidade possa propagar-se por condução) de um golpe, por uma fagulha, que restabelece o estado neutro.

A eletricidade dinâmica ou voltaica é, pelo contrário, eletricidade produzida por meio da conversão de movimento químico em eletricidade. Em certas e determinadas condições é produzida pela solução de zinco, cobre etc. Neste caso, a tensão não é aguda, mas sim crônica. A qualquer momento é produzida nova carga de eletricidade + e -, a partir de outra forma de movimento e não na separação de uma eletricidade ± já existente, em + e —. O processo é contínuo e, portanto, também o seu resultado — a eletricidade — não é tensão e descarga instantâneas, mas uma corrente contínua que, nos pólos, pode voltar a converter-se no movimento químico do qual proveio — o que se denomina eletrólise. Nesse processo, tanto como na produção de eletricidade por combinações químicas (em que é liberada eletricidade, ao invés de calor e, por certo, tanta eletricidade como calor, em outras condições, Grove, pág. 210), pode-se acompanhar a corrente no líquido (intercâmbio de átomos com moléculas vizinhas: a corrente é isso)(91).

Essa eletricidade, justamente pelo fato de ter a natureza de corrente, não pode ser diretamente convertida em eletricidade estática. Mas, por meio da indução, a eletricidade neutra, já existente como tal, pode desneutralizar-se. De acordo com a natureza do processo, a eletricidade induzida deverá acompanhar a indutora e, por conseguinte, deverá constituir também uma corrente. Por outro lado, verifica-se claramente, neste caso, a possibilidade de condensar a corrente e transformá-la em eletricidade estática, ou melhor, em uma forma superior, que sintetize as propriedades da corrente e as da tensão. Isso está demonstrado pela máquina de Ruhmkorff. Esta pode produzir uma eletricidade de indução que produz esse resultado.

Quando Coulomb se referiu a “partículas de eletricidade que se repelem na razão inversa do quadrado de sua distância”, Thomson admitiu o fato como perfeitamente demonstrado, pág. 358. Idem, pág. 366, quanto à hipótese de que a eletricidade é constituída de dois fluidos — o positivo e o negativo -, cujas partículas se repelem entre si; que a eletricidade, num corpo carregado, é nele retida simplesmente pela pressão atmosférica. Faraday estabeleceu a sede da eletricidade nos pólos opostos dos átomos [ou moléculas ainda (ambos os conceitos) muito misturados], expressando assim, pela primeira vez, a realidade científica segundo a qual a eletricidade não é um fluido, mas sim uma forma de movimento, uma força. Pág. 378. O que não consegue entrar na cabeça do velho Thomson e justamente o fato de ser a faísca de natureza material!

Já em 1822, Faraday havia descoberto que a corrente momentânea induzida — tanto a primeira como a segunda, invertidas — “participa mais da natureza da corrente produzida pela descarga da garrafa de Leyden do que da produzida pela bateria voltaica”, exatamente o que constituía todo o mistério. Pág. 385.

A respeito da faísca foi elaborada toda espécie de histórias fantásticas, que são atualmente conhecidas como casos especiais ou ilusões; dizia-se que a faísca proveniente de um corpo positivo era “um feixe de raios, uma espécie de cone”, cuja ponta é o ponto de descarga; e que, pelo contrário, a faísca negativa era uma estrela. Pág. 369. Que uma faísca curta é sempre branca e uma longa é geralmente vermelha ou violeta (belos disparates de Faraday a respeito das faíscas. Pág. 400). Que a faísca desprendida do condutor primário por meio de uma esfera metálica é branca; a que sai pela ponta, cor púrpura; e vermelha a da unidade. Pág. 405. que a faísca, isto é, o efeito luminoso, não é “inerente à eletricidade, mas simplesmente resultado da compressão do ar. Que o ar é violeta e subitamente COMPRIMIDO, quando atravessado por uma faísca, é um fato demonstrado pela experiência de Kinnersley, da Filadélfia, segundo as quais, a faísca produz “uma súbita RAREFAÇÃO do ar existente no tubo”, impulsionando a água par aos tubos. Pág. 407. Na Alemanha, há trinta anos, Winterl e outros acreditavam que a faísca ou a luz elétrica era da mesma natureza do fogo e consistia e resultada da união das duas eletricidades. Contrariando isso, Thomsom demonstrou que o lugar onde se unem ambas as eletricidades é justamente o mais pobre de luz, localizando-se a 2/3 do terminal positivo e a 1/3 do negativo! (Págs. 409-410). Salta à vista que o fogo, neste caso, é ainda considerado como coisa inteiramente mítica.

Com a mesma seriedade é relatada a experiência de Dessaignes, segundo a qual, ao subir o barômetro e baixar a temperatura, o vidro, a resina, a seda, etc., ao serem submersos no mercúrio, tornam-se eletricamente negativos; e que, ao baixar o barômetro e subir a temperatura, e no verão, se tornam positivos por meio do aquecimento e negativos pelo esfriamento, ocorrendo o contrário no inverno; que, quando o barômetro está alto e sopra o vento Norte, tornam-se “fortemente elétricos”: positivos com a temperatura em ascensão e negativos com a temperatura em dissensão, etc., pág. 416.

Como iam as coisas no que se refere ao calor: “a fim de produzir efeitos termoelétricos, não é necessário lançar mão do calor. Qualquer coisa que altere a temperatura, em certa parte da cadeia, pode também provocar um desvio na declinação do ímã”. Por exemplo: o esfriamento de um metal por meio do gelo ou por evaporação do éter! Pág. 419.

A teoria eletro-química, aceita como sendo “pelo menos, muito engenhosa e plausível”. Pág. 438.

Fabroni e Wollaston, há algum tempo, e Faraday, mais recentemente, defenderam o ponto de vista segundo o qual a eletricidade voltaica era simples conseqüência de processos químicos; sendo que Faraday apresentou, inclusive, uma correta explicação sobre o deslocamento de átomos, que se verifica no líquido; e estabeleceu que a quantidade de eletricidade devia ser medida pela quantidade de produto eletrolítico.

Apoiado nessas conclusões, Faraday estabelece a lei: “que todo átomo deve estar naturalmente rodeado pela mesma quantidade de eletricidade; de maneira que, nesse sentido, calor e eletricidade se parecem”!

Eletricidade — No que diz respeito às histórias fantásticas de Thomson, cf. Hegel, págs. 346-347, verifica-se exatamente o mesmo. Por outro lado, Hegel já conhece, com perfeita clareza, a eletricidade por atrito como tensão, contrariando a teoria do fluído e da matéria elétrica. Pág. 347.

A divisão de Hegel (a primitiva): mecanismo, quimismo, organismo, perfeita nessa época. Mecânica: o movimento de massas; química: o movimento molecular (por conseguinte, incluída também a física; e ambas, de certo, pertencentes à mesma ordem), e o movimento atômico; organismo: o movimento dos corpos, no qual ambos são inseparáveis. Pois o organismo é, certamente, a unidade superior que reúne, dentro de si, como um todo, a mecânica, a física e a química, e no qual essa trindade já não é separável. No organismo, o movimento mecânico se efetua diretamente, por meio de transformações físicas e químicas, sob a forma de nutrição, respiração, secreção etc., bem como por meio de simples movimento muscular.

Cada grupo é, por sua vez, duplo. Mecânica: 1 — celeste; 2 — terrestre; movimento molecular: 1 — física, 2 — química; organismo: 1 — vegetais, 2 — animais.

Eletroquímica — Ao descrever o efeito da faísca elétrica sobre a decomposição e síntese químicas, Wiedemann declara que isso interessa mais à química. Em casos semelhantes, os químicos declaram que isso concerne mais à física. De sorte que, no ponto de contato da ciência molecular com a atômica, ambos se declaram incompetentes, enquanto que é justamente daí que podemos esperar os melhores resultados(92).

Mostrar como os antigos e cômodos métodos, adequados à anterior experiência corrente, se transferiram para outros ramos da ciência e, nelas, constituem um obstáculo ao progresso: na química, o cálculo da composição em porcentagens, que era o método mais indicado, dentro todos, para impossibilitar a descoberta das leis da proporção constante e da proporção múltipla na combinação e que, por certo, tornou impossível o seu estabelecimento durante muitíssimo tempo(93).

1. Introdução história: a concepção metafísica tornou-se impossível, na ciência da natureza, devido ao próprio desenvolvimento desta.

2. Curso de desenvolvimento teórico, na Alemanha, a partir da Hegel (antigo prefácio). O retorno à dialética verificou-se inconscientemente; portanto, contraditória e lentamente.

3. A dialética como ciência do conjunto das conexões. Leis principais: transformações da quantidade em qualidade; interpenetração dos opostos polares e transformação de uns nos outros, quando levados ao extremo; desenvolvimento através da contradição, ou negação da negação; forma espiral do desenvolvimento.

4. Interconexão das ciências. Matemática, mecânica, física, química, biologia; Comte, St. Simon e Hegel.

5. Resumos das ciências particulares e de seu conteúdo dialético:

  1. Matemática: dialética do instrumento e da aplicação; o infinito matemático ocorrera na realidade.
  2. Mecânica celeste: resolvida atualmente em um processo. Mecânica: partida da inércia, que nada mais é do que a expressão negativa da indestrutibilidade do movimento.
  3. Física: conversão dos movimentos moleculares uns nos outros. Clausius e Loschmidt.
  4. Química: teorias, energia.
  5. Biologia: Darwinismo. Necessidade e azar.
  6. As fronteiras do conhecimento. Dubois-Reymond e Nägeli; Helmholtz, Kant, Hume.
  7. A teoria mecânica. Haeckel.
  8. A alma do plastídulo(94). Haeckel e Nägeli (Karl Wilhelm v., 1817-1891).
  9. Ciência e ensino(95). Virchow.
  10. O estado celular. Virchow.
  11. Política e sociologia darwinianas. Haeckel e Schmidt. Diferenciação do homem pelo trabalho. Aplicação da economia à ciência da Natureza. O “trabalho” de Helmholtz (Populäre Vorträge, II).

Notas de rodapé:

(I) — Büchner só conhece a filosofia sob o aspecto dogmático, uma vez que ele próprio é um dogmático no que se refere aos reflexos mais irrelevantes Enciclopedismo alemão, que quase não se deteve no movimento intelectual dos grandes materialistas franceses (cf. Hegel a esse respeito); da mesma forma que Nicolai (Christoph Friedrich, 1733-1811) e Voltaire. Spinoza, esse cão morto de Lessing, Enciclopédia, Prefácio, pág. 19. (N. de Engels) (retornar ao texto)

(1) É impossível traduzir a expressão de Engels — Induktionsesel. Em alemão, asno pode significar louco, grande trabalhador, ou ambas as coisas. Por conseguinte, pode implicar em elogio ou desprezo, ao mesmo tempo. Provavelmente, o sentido da frase é que Newton realizou grandes trabalhos sobre a indução, mas temia, sem razão, as hipóteses. A frase podia ser livremente traduzida assim: “Newton, que andava aos tropeços, sob uma carga de induções”. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(2) Isto está inteiramente confirmado pela moderna teoria atômica. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(3) A teoria geral da relatividade, de Einstein, deu pelo menos mais um passo no sentido da solução. Une a gravidade e a força centrífuga, em diferentes exemplos de um fenômeno essencialmente semelhante. Demonstrou a correção de sua teoria ao predizer dois novos fatos logo depois observados: a deflexão da luz e a transformação de seu calor devido a campos gravitantes. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(4) Clausius (Rodolf, 1822-1888), físico alemão, assinalou que, de acordo com a teoria física existente, as outras formas de movimento terminarão por converter-se em calor, irradiando-se este segundo uma temperatura uniforme. Assim terminaria toda a espécie de transformações (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(5) Por exemplo: se atritarmos suavemente um fósforo, este se aquece e, logo depois, esfria; mas se o atritarmos com mais força, ele se acende. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(6) No Sol (exceto alguns poucos compostos de suas camadas exteriores), toda a matéria se encontra dissociada em átomos, sendo que os átomos podem perder alguns elétrons. De sorte que todas as espécies de matéria possuem as mesmas propriedades mecânicas inerentes a um gás quente. Podem ser distinguidas pelos seus espectros, isto é, pela espécie de luz que emitem. Numa nebulosa gasosa não se pode fazer essa distinção, com exceção de uma infinitesimal fração de átomos que, em qualquer momento, possuem suficiente energia para poder irradiar. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(7) Essas transformações constituem objeto da bioquímica que, atualmente, se ocupa, em primeiro lugar, não em descobrir substâncias nos seres vivos (como na época de Engels), mas sim estuda suas transformações. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(8) Isso é perfeitamente demonstrado por meio de um filme do crescimento de uma planta, em que um dia ou uma semana são comprimidos em um minuto. Dessa maneira, se verá que a folha, por nós considerada como uma coisa dada, é apenas a etapa de um processo. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(9) A origem química da energia muscular é agora conhecida com muito maior detalhe; e os primeiros passos em relação a esse problema mais difícil, que é o referente à origem da energia libertada no cérebro, conduziram a importantes progressos quanto ao tratamento da loucura. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(10) A verdade dessa afirmação é de novo e freqüentemente demonstrada. Por exemplo: ficou provado que, durante a vida orgânica, os ossos, que nos parecem ser sólidos, fazem um constante intercâmbio de átomos de fósforo com o sangue. (N. de Haldane). (retornar ao texto)

(11) Desde a época de Engels, os físicos começaram a pensar em termos de operações (atividades humanas), em lugar de se considerarem a si próprios como simples observadores passivos. Mas, fora do terreno da física, essa tendência ainda não se desenvolveu apreciavelmente. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(12) Novamente neste caso, o progresso da física foi dialético. Quanto maior for a soma de energia contida num corpo (movimento, no sentido mais amplo), tanto maior terá sua inércia, isto é, sua resistência a ser movimentado. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(13) Isto não é rigorosamente certo como, em geral, se acreditava há cinqüenta anos. Alguns poucos elementos, por exemplo, o néon, e o mercúrio, existem como átomos a temperaturas ordinárias; e todos existem dessa maneira a temperaturas muito elevadas. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(14) Sabemos agora que isso é certo em relação a algumas substâncias, mas não para todas. Por exemplo: um metal deve suas propriedades mecânicas ao fato de que é constituído de pequeníssimos cristais, cada um dos quais contém milhões de átomos. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(15) Quando Napoleão lhe perguntou por que razão Deus não aparecia em seu Sistema do Mundo, Laplace respondeu-lhe: “Não tive necessidade de recorrer a semelhante hipótese, Majestade.” (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(16) Todo esse trecho fundamenta-se em observações apenas parcialmente corretas. O desenvolvimento da técnica microscópica demonstrou que os organismos mais simples, suficientemente grandes para que sejam visíveis, são bem estruturados. Todos os organismos que Engels incluía nos grupos 1 e 2 demonstraram ter núcleos. Por outro lado, alguns dos vírus ultramicroscópicos evidenciou-se que eram moléculas únicas de proteína. Isso significa que não têm estrutura, executada a composição química que lhe é própria na sua qualidade de proteínas. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(17) As moléculas de proteína podem agrupar-se sob a forma de cristais, fibras ou daquilo a que se denomina de tactóides, que se parecem com as estruturas orgânicas e de que são exemplos muitas estruturas orgânicas da célula. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(18) Por exemplo: há marsupiais muito semelhantes ao cão e à toupeira. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(19) Essa frase se traduz, geralmente, por geração espontânea. Toda a secção que segue é extraordinariamente moderna. Com exceção de alguns poucos detalhes, a argumentação de Engels ainda é válida hoje em dia, tendo-se descoberto muitos fatos que a confirmam. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(20) As moneras não necessitam de estrutura. Na realidade, a lacuna existente, por um lado, entre os protozoários e as bactérias; e, por outro, entre os vírus filtráveis, é maior do que aquela mencionada por Engels. Sua teoria foi, portanto, reforçada. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(21) Isto é, o tempo contado entre duas passagens sucessivas da mesma estrela fixa pelo meridiano, em um ponto determinado. Este é, aproximadamente, muito mais constante que o dia ordinário ou solar; conseqüentemente, pode ser também medido com muito maior exatidão. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(22) É digno de nota o fato de que Engels punha em dúvida a eternidade dos elementos químicos. Hoje, sem dúvida, constitui um lugar-comum o fato de que os mesmos se podem transformar; e é, pelo menos, concebível que todo o carbono foi formado tendo por base o hidrogênio e os nêutrons. (retornar ao texto)

(23) Esses organismos incluem outras substâncias (por exemplo, graxas e ceras) além das proteínas. Mas o argumento é perfeitamente correto, quando aplicado aos vírus, muito menores. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(II) Também nos corpos orgânicos pode verificar-se espécie de metabolismo; e, de um modo geral, ocorre em todas as partes, uma vez que as reações químicas se produzem, por mais lentas que sejam em todas as partes. A diferença, entretanto, é que os corpos inorgânicos são destruídos por esse metabolismo, enquanto nos orgânicos constitui a condição necessária de sua existência. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(24) Atualmente duvidamos de que todas as proteínas poderiam fazê-lo. Já foi possível isolar um certo número delas, mas ainda não se conseguiu produzir nenhuma, tendo por base os seus elementos. No entanto, algumas delas apresentam certas características da vida. A hemoglobina absorve oxigênio, a pepsina digere outras proteínas e o vírus da nucleoproteína, inclusive, pode reproduzir-se num meio favorável. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(III) N.B.: Assim como temos que nos referir a vertebrados invertebrados, neste caso também o grânulo não organizado, amorfo, indiferenciado da proteína, se denomina organismo; dialeticamente, isso é admissível porque, do mesmo modo que a medula espinal implica a coluna vertebral, assim também no grânulo de proteína originário está encerrada em si, em germe, toda a infinita série dos organismos superiores. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(25) Agora já parece provável que, no oceano primordial, encontravam-se substâncias orgânicas simples, sintetizadas pelos raios ultravioleta da luz solar que, na ausência de oxigênio e ozônio, eram menos absorvidos pela atmosfera superior. As mesmas não haviam sido destruídas, por ausência de bactérias e, portanto, serviram de alimento para os primeiros seres viventes (ou semiviventes). (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(26) Quer dizer: a expressão do comprimento de sua circunferência, em termos de seu raio. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(27) Quer dizer: a hipérbole eqüilátera xy = c. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(28) A expressão entre parêntesis carece de sentido, tal como está. Mas a letra de Engels é muito difícil de ser compreendida e, assim, não podemos estar seguros do que escreveu, na realidade. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(29) Isso foi escrito, certamente, antes de que, na maioria dos livros de cálculo diferencial, fossem introduzidas provas rigorosas, baseadas na teoria da passagem ao limite. Engels tem razão relativamente ao cálculo diferencial tal como era ensinado no seu tempo. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(30) Na terminologia moderna — raios vetores. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(31) Poucos físicos acreditam hoje no éter, tal como nele se acreditava há cinqüenta anos. A noção primitiva teve que ser abandonada, quando ficou demonstrado que não se podia revelar o movimento dos corpos em relação ao éter. Por conseguinte, a nota de Engels só tem validez como comentário às idéias físicas de seu tempo. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(32) Engels tinha um cão chamado Dido. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(33) Isso já foi realizado. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(34) Compsognathus, um réptil fóssil, parecido com uma ave; Archaeopteryx, uma ave fóssil, com dentes, longa cauda óssea e esporões nas asas (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(35) Por exemplo, células ou órgãos cuja função consiste em alimentar outra célula ou órgão. Algumas partes da placenta depois do parto são de origem materna e outra,s de origem fetal. Deve ser considerado como um indivíduo isolado o endosperma de um grão de milho que serve de alimento ao embrião? É provável que sim, uma vez que pode herdar caracteres diferentes daqueles do embrião. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(36) Em particular, essa deixa de ser uma luta darwiniana pela vida. Levando em conta, inclusive, sua menor mortalidade infantil, a burguesia procria mais lentamente que a classe operária e, assim, se acaso ganha a luta pela riqueza, perde, por outro lado, a luta pela vida. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(37) Atualmente denominados raios infravermelhos, já que suas freqüências são menores do que as da luz vermelha. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(38) Quer dizer: radiação ultravioleta. Os raios X têm, evidentemente, um comprimento de onda ainda mais curto. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(39) Quer dizer: os raios visíveis produzem fracos efeitos calóricos e químicos. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(40) Isso é correto, por certo. Há uma série contínua de raios, desde os da radiotelefonia, até os raios gama, na qual uma certa mudança quantitativa no comprimento de onda, dá em resultado grandes mudanças qualitativas. Mas isso só foi descoberto depois da morte de Engels. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(41) Esses dois fisiólogos observaram seu metabolismo (juntando urina, etc.), ao escalarem essa montanha. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(42) Cf. os trabalhos do professor Soddy, em nosso tempo. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(43) Isso era o que, geralmente, prevalecia na época de Engels; mas agora se sabe que não tem fundamento. A energia química não se transforma em calor antes de transformar-se na energia do movimento muscular. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(44) Assim é que um músculo isolado pode ter uma eficiência de aproximadamente 50%, isto é, converter mais ou menos a metade da energia química disponível, em trabalho; mas a eficiência do corpo, em seu conjunto, raramente alcança os 25%. (retornar ao texto)

(45) Inclusive, sessenta anos depois requer uma pequena revisão no que diz respeito aos seus aspectos científicos, com a exceção de que poderiam ser apresentadas cifras exatas que provem a correção de todas as afirmações de Engels, menos uma (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(46) Quer dizer: as demais formas de energia se degradam em calor; e o calor a elevada temperatura, em calor a baixa temperatura. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(47) O cálculo de Mädler é inexato. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(48) A argumentação de Engels, neste caso, é incorreta. Se o espaço estivesse uniformemente cheio de estrelas, que brilhassem sem cessar com a mesma intensidade das que estão próximas de nós (e se não houvesse absorção), seríamos assados pela luz das estrelas. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(49) Os números romanos se referem aos dois Herschel, pai e filho, ambos astrônomos de primeira categoria. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(50) Quer dizer: sistemas de estrelas semelhantes à nossa Via Láctea. Os números atuais diferem, certamente, desses dados, de maneira apreciável; mas são da mesma ordem geral. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(51) Quer dizer: corpos que parecem nebulosas, por meio dum pequeno telescópio, mas que, com um grande, se revelam grupos de estrelas. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(52) A teoria matemática do calor, de Fourier, coma qual fundou a moderna análise harmônica. Muitos de seus teoremas eram falsos, segundo afirma Engels. Mas, não só eram de grande beleza, como também de grande valor prático. Agora foram formulados de maneira correta ou, pelo menos, mais aproximadamente correta. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(53) Os investigadores da química tentaram levar isso a cabo num congresso realizado em Genebra, em 1892. Assim, o ácido valeriânico (originariamente chamado dessa forma porque era feito com valeriana) pode ser denominado ácido pentanóico, par amostrar que pode ser obtido do pentano de parafina, com cinco carbonos oxidando seu átomo terminal de carbono. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(54) O límulo, que Ray Lankester (amigo de Marx) demonstrou ser um aracnídeo, isto é, aparentado com as aranhas e com os escorpiões, se bem que, como é claro, não seja uma aranha. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(55) Um tunicado do mar. Apesar do adulto ser séssil, a larva é semelhante a um girino. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(56) Subclasse de peixes que respira por meio de guelras e pulmões. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(57) Esse é um tipo pouco comum de regeneração. Um verme se comporta mais geralmente como um ímã. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(58) Quer dizer: diferentes formas da mesma substância, por exemplo, grafito e diamante. Acredita-se agora que essa explicação só é válida em alguns casos. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(59) Por exemplo: Felis catus, gato; Felis leo, leão; Felis onça, jaguar (onça). (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(60) Isso adquiriu importância através dos trabalhos de Willis e outros, que estabeleceram leis definidas que governam esses números. (N. de Haldane). (retornar ao texto)

(61) A parte da ciência que se relaciona com a mecânica quântica está começando agora a focalizar essas questões: e, sem dúvida, encontrará uma forma de expressá-las de maneira menos paradoxal que a de Engels. Enquanto isso, parece haver pouca dúvida a respeito de que muitas das leis da física ordinária são conseqüências estatísticas de certos sucessos que, por acaso, se verificam nos átomos. Mas esses sucessos aleatórios são necessários uma vez que, embora não possamos predizer que poderá fazer um determinado átomo, podemos predizer, no entanto, quantos (dentre um grande número deles) tomarão parte em um dado processo. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(62) “Já não prevalece a autoridade da lei e dos profetas.” Verso de um dos poemas de Heine. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(63) A maioria dos biólogos atualmente põe isso em dúvida. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(64) Por exemplo: os coelhos norte-americanos estão sujeitos a um ciclo de onze anos, durante os quais a superpopulação conduz a uma epidêmica matança recíproca. Durante o período de um ano ou dois de superpopulação, lutam entre si e, durante o resto do ciclo, há lugar para todos. Engels destacou os efeitos evolutivos muito diferentes desses dois tipos de luta. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(65) Por exemplo: o cavalo possui apenas uma úngula em cada pé; de maneira que esta não pode evoluir até se transformar em um órgão capaz de pegar, trepar ou nadas, como poderia fazê-lo, por exemplo, o rato, muito embora o cavalo seja, sem dúvida, melhor corredor que o rato. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(66) Inclusive o Sinanthropus pekinensis, que viveu provavelmente há mais de 100.000 anos (sendo anatomicamente muito diferente do homem moderno), já empregava o fogo. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(67) Ainda não podemos fazer proteínas, mas podemos preparar algumas delas sob a forma pura e, embora não sejam vivas, são vivazes. Assim é que a proteína pura da pepsina poderá dissolver outra proteína numa quantidade pelo menos igual a seu próprio peso, por segundo; e pode dissolver uma quantidade de proteínas igual a cem milhões de vezes o seu peso, antes de desgastar-se. Outras podem realizar outros processos semelhantes. Ao fazer essas coisas, começamos a estudar a sua forma de movimento. Se soubéssemos o suficiente a respeito de sua estrutura, de modo a poder produzi-las, isso seria mais fácil evidentemente. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(68) Hoje em dia poderíamos acrescentar uma quarta condição. A água deve ser a mistura normal de água leve e pesada. Pois agora sabemos que a água comum é uma mistura de, pelo menos, seis compostos ligeiramente distintos. Não resta dúvida de que nossos descendentes descobrirão ainda outras condições. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(69) Sabemos agora muita coisa a respeito dessas questões, graças ao espectógrafo. Sabemos, por exemplo, que muitos dos átomos da atmosfera solar, que absorvem luz, são eletricamente carregados; que as manchas solares possuem campos magnéticos, etc. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(70) São conhecidos agora 92 elementos (sem contar os isótopos). Apenas alguns poucos foram já revelados nas nebulosas gasosas, mas é possível que nelas faltem muitos deles. (retornar ao texto)

(71) Atualmente podemos estender essa lista a algumas leis que regem o comportamento dos átomos, se bem que, mesmo neste caso, os gases das nebulosas emitam luz de acordo com certas leis bastante diferentes das que regem na Terra, devido a que seus átomos, sendo muito afastados entre si, raramente se chocam. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(72) Quer dizer: o que atualmente denominamos radiação ultravioleta. As abelhas não somente podem vê-la como também, dentro dela, podem distinguir as cores. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(73) Pois apenas certos raios podem ser focalizados por meio de uma lente. Se nossa retina fosse sensível às ondas de rádio e aos raios X, não poderíamos saber a direção donde vinham e, pelo menos, teríamos nossa visão bastante perturbada. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(74) Isso talvez não seja absolutamente certo. Podemos observar que certos processos físicos que se verificam no cérebro humano estão sempre associados a um tipo particular de sensação; e processos semelhantes podem ser observados nas formigas. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(75) “Começo e elemento são o infinito”. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(76) Isto é, o teorema segundo o qual o quadrado do lado maior de um triângulo retângulo é igual à soma dos quadrados dos lados menores, por exemplo: 5² = 3² + 4². (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(77) “Essa infinidade que as coisas não têm em progresso, têm-na em rotação. Galiani, Della Moneta, 1803. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(78) Quer dizer: sistemas em 2 ou 3 e não 10 constitui a base; de maneira que 100 significa, no sistema de base 2, um 4 mais nenhum dois, mais nenhuma unidade; e 11, no sistema de base três, significa um 3 mais uma unidade. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(79) Em cada caso, o primeiro número do par está na notação ordinária; e o segundo, no sistema de base 5. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(80) Isto é, a regra válida na escala ordinária de base dez, segundo a qual se um número é divisível por 3 ou por 9 também o é pela soma de seus algarismos, não prevalece no sistema de base 5. (Neste sistema, um número par pode ser determinado porque a soma de seus algarismos é um número par. Por exemplo: 10032, no sistema de base 5 (642, no de base 10) é par porque 1 + 0 + 0 + 3 + 2, dá um número par. Pode-se determinar um múltiplo de 3; por exemplo: 10032 é divisível por 3 porque 1 + 0 + 2 = 0 + 3). (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(81) Na terminologia moderna, raios em coordenadas polares. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(82) Isso era certo na ocasião em que Engels o escreveu; mas deixou de sê-lo agora. Há uma matemática exata dos gases, se bem que estes sejam abstrações da realidade, tal como os corpos rígidos. A química é, hoje em dia, altamente matemática e a biologia, em grau moderado. Inclusive em psicologia, na parte que trata de testes de inteligência e coisas parecidas, torna-se necessária a matemática superior. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(83) Isso se consegue, procurando os pontos duplos de uma curva cuja equação é dada. Por exemplo: se z = x² + y² - 3axy = 0 é a equação de uma curva, esta se cruza consigo mesma na origem, porque dz/dx = 3x² - 3ay.dz/dy.3y² = 3ax e ambas são a zero, quando x e y se anulam. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(84) Isso acontece, incontestavelmente, na física moderna. Podemos evitar a noção de atraso, introduzindo a de curvatura do espaço-tempo na teoria da relatividade geral e também a noção de intercâmbio entre partículas imperceptíveis. Mas a noção de repulsão permanece como um caso particular do princípio de exclusão de Pauli, como parte da própria natureza das partículas finais. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(85) O ceticismo de Engels quanto à realidade do éter foi integralmente confirmado, com o desenvolvimento da física. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(86) Isso foi assombrosamente confirmado pela física moderna. As nebulosas espirais parecem afastar-se entre si. Alguns físicos atribuem o fato a uma gravitação repulsiva atuando a distâncias muito grande. E os núcleos atômicos, que se repelem enquanto não estão muito próximos entre si, podem juntar-se, constituindo núcleos mais pesados, caso se aproximem suficientemente. Esses dois fatos eram inteiramente desconhecidos quando Engels servia sua obra (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(87) A última linha do manuscrito é indecifrável. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(88) Depois da morte de Engels, ficou demonstrado que todos os gases podem ser liquefeitos a temperaturas muito baixas. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(89) Trata-se de um cálculo aproximado, mas não inteiramente exato. A energia das marés é um movimento relativo transformado, da Terra e da Lua. A dos vulcões resulta, em parte, da radioatividade. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(90) Isto também foi inteiramente confirmado pelas modernas descobertas. O átomo é uma unidade para os fins da química comum; mas se empregarmos forças consideráveis, muito diferentes das usadas em química, podemos unir ou desagregar os átomos. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(91) Esta afirmação teria que ser consideravelmente revisada em face dos mais coberta do elétron e da estrutura atômica. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(92) Este é um exemplo do grande poder do método dialético. Foi justamente o estudo dos átomos e moléculas eletricamente carregados que conduziu à descoberta do elétron e da estrutura atômica (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(93) Por exemplo: a relação entre o monóxido e o dióxido de carbono se torna obscura quando dizemos que o primeiro contém 42,9% de carbono e 57,1% de oxigênio; e o segundo 27,3% de oxigênio; mas torna-se clara, se dissermos que o primeiro contém 1 parte de carbono para 1,33 de oxigênio; e o segundo, 1 de carbono para 2,67 de oxigênio. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(94) O plastídulo era uma unidade vivente primitiva menor do que a célula postulada por Haeckel com fundamento muito inseguro e que antecipava, até certo ponto, o gene. Supunha-se que o mesmo possuía alma. (N. de Haldane) (retornar ao texto)

(95) Engels refere-se, neste ponto, ao folheto de Virchow, Die Freiheit der Wissenchaft im modernen Staat (A Liberdade da Ciência no Estado Moderno), publicado em Berlim, em 1877; e também à réplica de Haeckel, Freie Wissenschaft und freie Lehre (Ciência Livre e Ensino Livre). (N. de Haldane) (retornar ao texto)

Inclusão 26/06/2019