Manual de Economia Política

Academia de Ciências da URSS


Capítulo XII — Renda da Terra. Desenvolvimento do Capitalismo na Agricultura


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O Regime Capitalista na Agricultura e a Propriedade Privada da Terra

Nos países burgueses, o domínio do capitalismo verifica-se não somente na indústria, como também na agricultura. A maior parte da terra acha-se concentrada em mãos da classe dos grandes proprietários de terra. A grande massa da produção mercantil agropecuária origina-se de empresas capitalistas, que empregam trabalho assalariado. Entretanto, nos países burgueses, a forma que predomina numericamente na agricultura continua sendo a pequena economia mercantil camponesa.

São dois os caminhos mais típicos de desenvolvimento do capitalismo na agricultura.

O primeiro caminho consiste em que a antiga economia latifundiária é conservada no fundamental e, mediante a introdução de reformas, vai-se transformando paulatinamente em economia capitalista. Ao passar as formas capitalistas de economia, o latifundiário, ao lado da utilização do trabalho assalariado livre, também recorre aos métodos feudais de exploração. Subsistem na agricultura as formas servis de sujeição dos camponeses aos latifundiários, como os pagamentos em trabalho, a parceria, etc.. Esse caminho de evolução do capitalismo na agricultura c característico da Alemanha, da Rússia de antes da revolução, da Itália, do Japão e de uma série de outros países.

O segundo caminho consiste em que a antiga economia latifundiária é destruída pela revolução burguesa e a agricultura se liberta das travas feudais, operando-se, em consequência disto, um desenvolvimento mais rápido das forças produtivas. Assim, na França, a revolução burguesa de 1789/1794 acabou com a propriedade feudal da terra. As terras confiscadas a nobreza e ao clero foram distribuídas. Tornou-se dominante no país a pequena economia camponesa, mas uma parte considerável das terras caiu em mãos da burguesia. Nos Estados Unidos da América, como resultado da guerra civil de 1861/1865, foi assestado um golpe demolidor sobre os latifúndios escravistas dos Estados do sul, que passaram a ser divididos e arrendados. Nos Estados do oeste, havia grandes extensões de terras devolutas, que foram distribuídas a preços baixos. Como consequência, a agricultura passou a desenvolver-se rapidamente, sob a forma de granjas capitalistas. Os novos pequenos proprietários arruinavam-se, passando a terra para as mãos das sociedades anônimas e dos bancos. A grande propriedade rural renasceu sobre uma nova base, uma base capitalista. Ao mesmo tempo, se bem que a escravidão houvesse sido oficialmente suprimida nos Estados Unidos, conservaram-se, de fato, sobrevivências escravistas, particularmente nos Estados do sul dos Estados Unidos. Os negros foram libertados da escravidão sem que lhes fossem distribuídas terras, motivo por que eram obrigados a arrendar parcelas de terra dos grandes proprietários. A parceria alcançou ampla difusão.

Como fruto da transformação das formas pré-capitalistas da agricultura, a grande propriedade feudal e a pequena propriedade camponesa são cada vez mais deslocadas pela propriedade burguesa da terra. Uma parte sempre crescente das terras latifundiárias e camponesas transfere-se para a propriedade dos bancos, da burguesia rural, dos industriais, comerciantes e usurários.

Os dados que se seguem mostram a concentração da propriedade territorial. Em 1954, nos Estados Unidos, 73,4% das economias granjeiras possuíam apenas 19,6% da superfície das terras, enquanto que 26,6% concentravam em seu poder 80,4% das terras. Ao mesmo tempo, as grandes propriedades territoriais, abarcando mais de mil acres de terras e constituindo 2,7% do número total de economias, concentravam 45,9% das terras.

De acordo com os dados do censo de 1950, na Inglaterra (exclusive a Irlanda do Norte), 75,9% das propriedades ocupavam apenas 20,4% de toda a terra agricultável, enquanto que a 24,1% cabiam 79,6% das terras, e, entre as últimas, 2,3% eram grandes propriedades que dispunham de 34,6% das terras.

Na França, em 1956, 62,7% da terra cultivada concentravam-se em 22,5% das economias.

Na Rússia de antes da revolução, os latifundiários, a família do tzar, os mosteiros e os camponeses ricos possuíam imensas quantidades de terra. Os maiores latifundiários, cada um dos quais possuía mais de 500 deciatinas de terras, eram aproximadamente 30 mil na Rússia europeia em fins do século XIX. Concentravam-se em suas mãos 70 milhões de deciatinas de terras. Ao mesmo tempo, 10,5 milhões de economias camponesas, esmagadas pela exploração semifeudal, possuíam 75 milhões de deciatinas.

Sob o capitalismo existe o monopólio da propriedade privada da terra, a maior parte da qual pertence a classe dos grandes proprietários de terra. O grande proprietário geralmente arrenda uma parte considerável da terra aos capitalistas-arrendatários e aos pequenos camponeses. A propriedade da terra separa-se, assim, da produção agrícola.

Os capitalistas-arrendatários pagam ao proprietário da terra em prazos determinados — um ano, por exemplo —, o arrendamento estabelecido em contrato, isto é, uma determinada soma de dinheiro pela permissão que lhes é dada de aplicar seu capital naquela área de terra. A parte fundamental do arrendamento constitui a renda da terra. Além da renda da terra, o arrendamento também inclui outros elementos. Assim, se na área de terra arrendada foi anteriormente invertido algum capital — por exemplo, em instalações rurais, canais de irrigação, etc. — nesse caso o arrendatário, além da renda da terra, deve pagar ao proprietário um juro anual sobre este capital. Na prática, o capitalista-arrendatário frequentemente cobre parte do arrendamento mediante a redução do salário dos operários.

A renda capitalista da terra exprime as relações entre três classes da sociedade burguesa: os operários assalariados, os capitalistas e os proprietários de terras. A mais-valia criada pelo trabalho dos operários assalariados vai, em primeiro lugar, para as mãos do capitalista-arrendatário. Parte da mais-valia, sob a forma de lucro médio sobre o capital, permanece com o arrendatário. Outra parte da mais-valia, que constitui um excedente sobre o lucro médio, o arrendatário é obrigado a entregar ao proprietário da teria sob a forma de arrendamento. A renda capitalista da terra é aquela parte da mais-valia que resta depois do desconto do lucro médio correspondente ao capital invertido na economia e que é paga ao proprietário da terra. Não raro, o dono da terra prefere, ele próprio, contratar operários e dirigir a economia, ao invés de arrendar a terra. Nesse caso, tanto a renda como o lucro permanecem com ele.

Devem ser distinguidos dois tipos de renda da terra: diferencial e absoluta.

A Renda Diferencial

Na agricultura, tal como ocorre na indústria, o empresário só investe o seu capital na produção se isto lhe assegurar o lucro médio. Os empresários que aplicam o seu capital em condições de produção mais favoráveis, por exemplo, nas áreas de terra mais férteis, além do lucro médio sobre o seu capital, ainda aufere um lucro suplementar.

Na indústria, o lucro suplementar é auferido por aqueles industriais que aplicam uma técnica mais avançada em comparação com o nível técnico médio no ramo industrial considerado. O lucro suplementar na indústria não pode ser um fenômeno permanente. Logo que este ou aquele aperfeiçoamento técnico, introduzido numa empresa isolada, alcance ampla difusão, esta empresa ver-se-á privada do lucro suplementar. Já na agricultura, o lucro suplementar mantém-se durante um período mais ou menos prolongado. Isto se explica pelo fato de que na indústria é possível construir qualquer quantidade de empresas dotadas das máquinas mais modernas. Na agricultura, porém, não é possível criar um número qualquer de áreas de terra, já sem falar nas terras mais férteis, uma vez que a extensão das terras é limitada e todas as melhores terras para a agricultura já estão ocupadas por economias privadas. A extensão limitada das terras e sua ocupação por economias privadas condicionam o monopólio da exploração capitalista da terra, ou monopólio sobre a terra como objeto de economia.

Mais ainda. Na indústria, o preço de produção da mercadoria é determinado pelas condições médias de produção. De outra maneira são formados os preços da produção das mercadorias agrícolas. O monopólio de exploração capitalista da terra como objeto de economia faz com que o preço comum regulador da produção (isto é, o custo de produção mais o lucro médio) dos produtos agrícolas seja determinado pelas condições de produção, não nas melhores e sim nas piores terras cultivadas, de vez que a produção das terras melhores e médias é insuficiente para atender a procura da sociedade. Se o capitalista-arrendatário, que inverte o seu capital nas piores áreas de terra, não recebesse o lucro médio, ele transferiria esse capital para qualquer outro ramo de atividade.

Os capitalistas, que exploram as terras melhores e médias, produzem mercadorias agrícolas mais baratas, ou, em outras palavras, o seu preço individual de produção é inferior ao preço geral de produção. Aproveitando-se do monopólio da terra como objeto de exploração, estes capitalistas vendem suas mercadorias pelo preço geral de produção e auferem, desse modo, um lucro suplementar. É esse lucro que forma a renda diferencial. A renda diferencial surge não porque haja a propriedade privada da terra; ela se forma em consequência do fato de que as mercadorias agrícolas produzidas em diferentes condições de produtividade do trabalho, são vendidas por um mesmo preço de mercado, preço que é determinado pelas condições de produção nas piores terras. Os capitalistas-arrendatários são obrigados a entregar a renda diferencial ao proprietário de terra, retendo consigo o lucro médio.

A renda diferencial é o excedente de lucro sobre o lucro médio, excedente auferido nas economias onde são mais favoráveis as condições de produção; a renda diferencial representa a diferença entre o preço geral de produção, determinado pelas condições de produção nas piores áreas de terra, e o preço individual de produção nas terras melhores e médias.

Este lucro suplementar, da mesma forma que toda a mais-valia na agricultura, é criado pelo trabalho dos operários agrícolas. As diferenças no grau de fertilidade da terra são apenas a condição para a mais alta produtividade do trabalho nas melhores terras. Entretanto, no capitalismo cria-se a falsa aparência, de que a renda apropriada pelo dono da terra é, supostamente, um produto da terra e não do trabalho. Na realidade, porém, a única fonte da renda da terra é o trabalho suplementar, a mais-valia.

“Para uma exata concepção da renda é preciso, naturalmente, antes de tudo compreender que a renda origina-se não do solo, mas do produto da agricultura, isto é, do trabalho, do preço do produto do trabalho, por exemplo, do trigo, do valor do produto agrícola, do trabalho invertido na terra e não da própria terra.”(64)

Há duas formas de renda diferencial.

A renda diferencial I está ligada as diferenças no grau de fertilidade do solo e a localização das áreas de terra em relação aos mercados de venda.

Na área mais fértil de terra, com um dispêndio igual de capital, obtém-se uma colheita mais copiosa. Tomemos, para exemplificar, três áreas de terra de iguais dimensões, mas diferentes em fertilidade.

Áreas de terra Investimentos de capital
(em dólares)
Lucro médio
(em dólares)
Produção obtida
(em quintais)
Preço individual de produção Preço geral de produção Renda diferencial I
(em dólares)
Toda a produção
(em dólares)
Toda a produção
(em dólares)
Um quintal
(em dólares)
Toda a produção
(em dólares)
I 100 20 4 120 30 30 120 0
II 100 20 5 120 24 30 150 30
III 100 20 6 120 20 30 180 60

O arrendatário de cada uma dessas áreas inverte na contratação de operários, na compra de sementes, máquinas, implementos, na manutenção de gado e em outras despesas 100 dólares. O lucro médio é de 20%. O trabalho aplicado em áreas de fertilidade diferente produz, numa das áreas, uma colheita de 4 quintais; na outra, de 5, e na terceira de 6 quintais.

O preço individual de produção de toda a massa produzida em cada área é o mesmo. Esse preço será de 120 dólares (custo de produção mais o lucro médio). O preço individual por unidade produzida em cada área é diferente. O quintal de produção agrícola originário da primeira área deverá ser vendido por 30 dólares, o da segunda área por 24 e o da terceira por 20 dólares. Mas, como o preço geral de produção das mercadorias agrícolas é o mesmo e determinado pelas condições de produção nas piores áreas de terra, cada quintal produzido em qualquer das áreas será vendido por 30 dólares. O arrendatário da primeira área (a pior terra) receberá por sua colheita de 4 quintais 120 dólares, isto é, uma quantia igual ao seu custo de produção (100 dólares) mais o lucro médio (20 dólares). O arrendatário da segunda área receberá pelos seus 5 quintais 150 dólares. Acima do custo de produção e do lucro médio, receberá ele 30 dólares de lucro suplementar, que são exatamente os que constituem a renda diferencial. Por fim, o arrendatário da terceira área obterá 180 dólares pelos seus 6 quintais. Neste último caso, a renda diferencial será de 60 dólares.

A renda diferencial I também está relacionada com as diferenças na localização das áreas de terra. As áreas situadas nas proximidades dos pontos de venda (cidades, estações ferroviárias, portos marítimos, silos, etc. ), economizam considerável quantidade de trabalho e de meios de produção no transporte dos produtos, em comparação com aquelas que se acham mais distantes desses pontos. Vendendo sua produção pelos mesmos preços, as economias situadas próximas aos mercados de venda obtêm um lucro suplementar, que forma a renda diferencial decorrente da localização.

A renda diferencial II surge como resultado da inversão suplementar de meios de produção e de trabalho numa mesma área de terra, isto é, da intensificação da agricultura. Diferentemente da economia extensiva, que cresce mediante a ampliação da área cultivada ou das pastagens, a economia intensiva desenvolve-se através do emprego de máquinas aperfeiçoadas, de adubos sintéticos, de obras de beneficiamento, da introdução de espécies de gado mais produtivos, etc.. Permanecendo invariável a técnica, a intensificação da agricultura pode ser obtida através da inversão de uma maior quantidade de trabalho naquela área de terra. Como consequência, é obtido um lucro suplementar, que forma a renda diferencial II.

Voltemos ao nosso exemplo. Na terceira área de terra, a melhor pelo grau de fertilidade, foram invertidos inicialmente 100 dólares, que produziram uma colheita de 6 quintais, o lucro médio foi de 20 dólares e a renda diferencial de 60 dólares. Suponhamos que, mantidos os preços anteriores, seja feita uma segunda inversão, mais produtiva, de capital, de outros 100 dólares, com o objetivo de melhorar a técnica, empregar mais adubos, etc.. Como resultado desta segunda inversão, obtém-se uma colheita adicional de 7 quintais, o lucro médio sobre o novo capital invertido será de 20 dólares e o excedente em relação ao lucro médio será de 90 dólares. Este excedente de 90 dólares constitui a renda diferencial II. Enquanto continuar em vigor o mesmo contrato de arrendamento, o arrendatário paga pela terra uma renda diferencial de 60 dólares, e o excedente sobre o lucro médio, auferido com a segunda inversão, com a inversão suplementar de capital, permanece consigo. Entretanto, a terra é arrendada por um período determinado. Ao renovar o contrato de arrendamento, o proprietário da terra já leva em conta aquela vantagem proporcionada pela inversão suplementar de capital e aumenta em 90 dólares o arrendamento da sua área de terra. Com este objetivo, os proprietários de terras procuram concertar contratos de arrendamento por prazos curtos. Daqui decorre o fato de que os capitalistas-arrendatários não estejam interessados em fazer grandes investimentos, que só produzem resultado depois de longo tempo, pois que, em última análise, são os proprietários da terra que colhem as vantagens de tais investimentos.

A exploração intensiva capitalista da agricultura tem por objetivo a obtenção de um lucro maior. Na caça a um alto lucro, os capitalistas exploram a terra de uma maneira predatória. A produção dessas ou daquelas culturas agropecuárias modifica-se na dependência das flutuações dos preços de mercado. Tal circunstância impede uma correta realização da rotação de culturas, que constitui o fundamento do elevado nível técnico da agricultura. A propriedade privada da terra impede a introdução de grandes obras e benfeitorias, cuja amortização só pode efetuar-se depois de alguns anos. Dessa maneira, o capitalismo dificulta a introdução de um sistema racional na agricultura.

“Todo progresso da agricultura capitalista não é apenas um progresso na arte de espoliar o trabalhador, mas também na arte de espoliar o solo; todo progresso na elevação de sua fertilidade num determinado período de tempo é, ao mesmo tempo, um progresso na destruição das fontes permanentes dessa fertilidade.”(65)

Os defensores do capitalismo, tentando dissimular as contradições da agricultura capitalista e justificar a miséria das massas, afirmam que a agricultura estaria submetida a ação de uma “lei da fertilidade decrescente do solo”, também supostamente uma lei eterna e natural e segundo a qual todo trabalho suplementar invertido na terra produziria menor resultado que o anterior.

Esta invencionice da economia política burguesa tem como ponto de partida a falsa suposição de que a técnica na agricultura permanece invariável e de que os progressos técnicos verificados constituem uma exceção. Na realidade, porém, as inversões suplementares de meios de produção numa mesma área de terra estão vinculadas ao desenvolvimento da técnica, a introdução de métodos novos e melhorados de produção agropecuária, o que acarreta a elevação da produtividade do trabalho agrícola. A verdadeira causa do esgotamento da fertilidade natural na agricultura capitalista não é a “lei da fertilidade decrescente do solo”, fruto da imaginação dos economistas burgueses, mas sim as relações capitalistas e, antes de tudo, a propriedade privada da terra, que freia o desenvolvimento das forças produtivas na agricultura. Na realidade, o que aumenta no capitalismo não e a dificuldade na produção dos produtos agrícolas, mas a dificuldade de que os operários os adquiram em face da contração de sua capacidade aquisitiva.

A Renda Absoluta. O Preço da Terra

Além da renda diferencial, o proprietário da terra também recebe a renda absoluta. Sua existência esta relacionada com o monopólio da propriedade privada da terra.

Ao ser examinada a renda diferencial, partimos da suposição de que o arrendatário da pior área de terra, ao vender as mercadorias produzidas, recebe apenas o custo de produção mais o lucro médio, isto é, de que ele não paga a renda da terra. Mas, na realidade, os proprietários mesmo das piores terras não as entregam gratuitamente para que sejam cultivadas. É óbvio, portanto, que o arrendatário da pior área de terra deve obter um excedente sobre o lucro médio para pagar o arrendamento. E isto, por sua vez, significa que o preço de mercado dos produtos agrícolas deve situar-se acima do preço de produção na pior terra.

De onde sai este excedente? No regime capitalista é acentuado o atraso da agropecuária em relação a indústria, no sentido técnico-econômico. Na agricultura, a composição orgânica do capital é mais baixa do que na indústria. Suponhamos que, em média, a composição orgânica do capital na indústria seja a seguinte: 80 c + 20 v. A uma taxa de mais-valia de 100%, para cada 100 dólares de capital são produzidos 20 dólares de mais-valia e o preço de produção será de 120 dólares. Já na agricultura, a composição orgânica do capital seria, por exemplo, a seguinte: 60 c + 40 v. Aqui, para cada 100 dólares são produzidos 40 dólares de mais-valia e o valor das mercadorias agrícolas será de 140 dólares. O capitalista-arrendatário, da mesma forma que o capitalista industrial, obtém sobre o seu capital um lucro médio de 20 dólares. De acordo com isto, o preço de produção das mercadorias agrícolas será igual a 120 dólares. Nestas condições, a renda absoluta será de 20 dólares (140 dólares menos 120 dólares). Segue-se daí que o valor das mercadorias agrícolas é superior ao preço geral de produção e a grandeza da mais-valia na agricultura é maior que o lucro médio. Este excedente da mais-valia sobre o lucro médio é precisamente a fonte da renda absoluta.

Se não existisse a propriedade privada da terra, tal excedente entraria na repartição geral entre os capitalistas e os produtos agrícolas seriam então vendidos por seus preços de produção. Entretanto, a propriedade privada da terra impede a livre concorrência, a deslocação de capitais da indústria para a agricultura e a formação de um lucro médio comum as empresas agrícolas e industriais. Eis porque os produtos agrícolas são vendidos por preços correspondentes ao seu valor, determinado pelas condições de produção nas piores áreas de terra, isto é, por preços superiores ao preço geral de produção. Em que medida esta diferença pode ser realizada e transformada em renda absoluta, depende do nível de preços do mercado, estabelecido pela concorrência.

O monopólio da propriedade privada da terra é, desse modo, a causa da existência da renda absoluta, paga por cada área de terra, independentemente de sua fertilidade ou localização. A renda absoluta é o excedente do valor sobre o preço geral de produção, criado na agricultura em consequência de uma composição orgânica do capital mais baixa, relativamente a indústria, e do qual se apropriam os donos das terras em virtude da propriedade privada da terra.

No capitalismo, além das rendas diferencial e absoluta, também existe a renda de monopólio. A renda de monopólio é a renda suplementar obtida através da elevação do preço acima do valor da mercadoria produzida em condições naturais, particularmente favoráveis. Trata-se, por exemplo, da renda da terra onde podem ser produzidas culturas agrícolas raras em quantidades limitadas (tipos especialmente solicitados de uvas, cítricos, etc. ), ou da renda da terra pela utilização da água, onde a agricultura é feita pelo sistema de irrigação. As mercadorias produzidas em tais condições são geralmente vendidas a preços superiores ao seu valor, isto é, a preços de monopólio. A renda de monopólio na agricultura é paga pelos consumidores.

A classe dos grandes proprietários de terra, que nenhum vínculo possuem com a produção material, devido ao monopólio da propriedade privada da terra utiliza as conquistas do progresso técnico na agricultura para enriquecer. A renda da terra é um tributo que, sob o capitalismo, a sociedade é obrigada a pagar aos grandes proprietários de terras. A existência das rendas absoluta e de monopólio encarece os produtos agrícolas, que constituem alimento para os trabalhadores e matéria-prima para a indústria. A existência da renda diferencial priva a sociedade de todas as vantagens decorrentes da elevação da produtividade do trabalho nas terras mais férteis. Estas vantagens aproveitam aos proprietários de terra e aos fazendeiros capitalistas. Até que ponto a renda da terra é onerosa para a sociedade prova-o o fato de que nos Estados Unidos, consoante dados de 1935/1937, ela constituía de 26 a 29% do preço do milho e de 26 a 36% do preço do trigo.

Enormes recursos são desviados de uma aplicação produtiva na agricultura com a compra da terra. Se forem excluídas as benfeitorias realizadas (construções, canais de irrigação, drenagem, fertilizantes), a terra, em si mesma, nenhum valor possui, uma vez que ela não é um produto do trabalho humano. A terra, porém, não tendo valor, é sob o capitalismo um objeto de compra e venda e tem um preço. Tal fato se explica porque a terra constitui propriedade privada dos proprietários de terra.

O preço da terra é determinado de acordo com a renda anual, que ela proporciona, e com a taxa de juros que os bancos pagam pelos depósitos. O preço de uma área de terra é igual a quantia que, depositada num banco, proporcionaria a título de juros um ingresso da mesma grandeza que a renda da área de terra em apreço. Suponhamos que a área de terra proporcione uma renda anual de 300 dólares e que os bancos pagam juros de 4% sobre os depósitos. Em tal caso, o preço da área de terra será igual a 300x100/4 = 7500 dólares. Dessa maneira, o preço da terra é a renda capitalizada. O preço da terra será tanto mais elevado quanto maior for a renda e quanto menor for a taxa de juros.

Com o desenvolvimento do capitalismo, aumenta a magnitude da renda. Isto faz com que aumente sistematicamente o preço da terra.

O preço da terra também cresce em consequência da redução da taxa de juro.

As cifras que são alinhadas a seguir dão uma ideia da elevação do preço da terra. O preço total das granjas nos Estados Unidos cresceu em dez anos (de 1900 a 1910) em mais de 20 bilhões de dólares. Desta cifra, o aumento do valor dos implementos, benfeitorias, etc., constituía apenas 5 bilhões de dólares. Os restantes 15 bilhões de dólares correspondiam a um aumento no preço da terra. No curso do decênio seguinte, o preço total das granjas aumentou em 37 bilhões de dólares e, desta cifra, mais de 26 bilhões de dólares corresponderam ao aumento do preço da terra.

A Renda na Indústria Extrativa. A Renda das Áreas Edificáveis

Não é só na agricultura que existe a renda da terra. Também a recebem os proprietários das terras de cujo subsolo se extraem matérias úteis (minérios, carvão, petróleo, etc. ) e também os proprietários de terrenos para construção nas cidades e centros industriais, quando nesses terrenos são edificadas residências, empresas industriais e comerciais, edifícios públicos, etc..

A renda na indústria extrativa forma-se do mesmo modo que a renda da terra. As minas de carvão e minérios, as jazidas de petróleo, distinguem-se umas das outras pela riqueza das reservas, a profundidade da jazida e a distância dos pontos de venda; não são iguais os capitais nelas invertidos. Por isso, o preço individual de produção de cada tonelada de minério, carvão ou petróleo é diferente do preço geral de produção. No mercado, porém, cada uma destas mercadorias é vendida pelo preço geral de produção, que é determinado pelas piores condições de produção. O lucro suplementar obtido, graças a isto, nas minas e jazidas melhores e médias forma a renda diferencial, que é embolsada pelo proprietário da terra.

Além disto, os donos das terras retiram do seu terreno também a renda absoluta, independentemente da riqueza dos minerais úteis que haja no subsolo. A renda absoluta, como foi dito, é formada pelo excedente do valor sobre o preço geral de produção. A existência desse excedente explica-se pelo fato de que, na indústria extrativa, a composição orgânica do capital é inferior a média na indústria, devido ao nível relativamente baixo da mecanização e a ausência de gastos na aquisição de matérias-primas. A renda absoluta eleva os preços dos minérios, do carvão, do petróleo, etc..

Por último, na indústria extrativa existe a renda de monopólio, naquelas áreas de terra onde são obtidos minerais raros, cuja venda é feita por preços superiores ao valor de sua extração.

A renda da terra auferida pelos grandes latifundiários donos das minas de carvão, das jazidas de minérios e de petróleo é um obstáculo ao aproveitamento racional do subsolo. A propriedade privada da terra condiciona a dispersão das empresas da indústria extrativa, o que dificulta a mecanização e acarreta o encarecimento da produção.

A renda dos terrenos para construção é paga ao proprietário da terra pelos empresários que a arrendam para a construção de residências, empresas industriais, comerciais e outras. Nas cidades, a massa fundamental da renda da terra é constituída pelos terrenos sobre os quais estão edificadas as residências. A localização das áreas de construção influi em enorme escala sobre a grandeza da renda diferencial dos terrenos para construção. A renda mais alta é paga pelos terrenos próximos ao centro da cidade ou as empresas industriais.

Além da renda diferencial e da renda absoluta, os proprietários de terrenos urbanos impõem a sociedade um tributo sob a forma de renda de monopólio, que eleva enormemente os aluguéis. Tal fato decorre da extrema limitação dos terrenos em muitas cidades e centros industriais. a medida que cresce a população urbana, os proprietários inflacionam a renda dos terrenos para construção e com isto freiam a construção de residências. A desmedida elevação da renda é uma das causas pelas quais na maioria das cidades dos países capitalistas existem casas super-habitadas, ruas estreitas, etc.. Parte considerável da população operária vê-se obrigada a viver amontoada em tugúrios. Os aluguéis cada vez mais altos rebaixam o salário real dos operários.

O monopólio da propriedade privada da terra estorva o desenvolvimento da indústria. Para construir sua empresa industrial, deve o capitalista inverter improdutivamente recursos para a compra da terra ou para o pagamento da renda da terra pela área ocupada. A renda da terra constitui um dos itens mais importantes nas despesas da indústria de transformação.

Até que ponto é elevada a renda da terra nos terrenos para construção, testemunha-o o fato de que do total dos 155 milhões de libras esterlinas, recebidos cada ano pelos proprietários de terra, na Inglaterra, nos anos 30 do século XX, nada menos de 100 milhões de libras corresponderam a renda da terra urbana. Nas grandes cidades, aumenta rapidamente o preço dos terrenos.

A Grande e a Pequena Produção na Agricultura

As leis econômicas do desenvolvimento do capitalismo atuam tanto na indústria como na agricultura. A concentração da produção na agricultura, da mesma forma que na indústria, acarreta a deslocação das pequena economias pelas grandes economias capitalistas, fato que, inevitavelmente, aguça as contradições de classe. Os defensores do capitalismo empenham-se em dissimular e esconder este processo. Falsificando a realidade, criaram eles a falsa teoria da “estabilidade da pequena propriedade”. Segundo essa teoria, a pequena economia camponesa supostamente conservar-se-ia estável na luta contra a grande propriedade.

Na realidade, porém, a grande produção, na agricultura, detém uma serie de vantagens decisivas em comparação com a pequena produção. A superioridade da grande produção reside, antes de tudo, em que ela tem a possibilidade de empregar amplamente máquinas de elevado custo, o que eleva em muitas vezes a produtividade do trabalho. O emprego dessas máquinas é inacessível a massa de pequenas e pequeníssimas economias camponesas.

A grande produção goza de todas as vantagens da cooperação capitalista e da divisão do trabalho. As grandes empresas agrícolas desfrutam de muitas vantagens em relação as pequenas na venda da produção, na obtenção de créditos e de diferentes tipos de subsídios estatais, etc.. Tudo isto, ao lado do largo emprego de máquinas, condiciona um custo de produção mais baixo nas grandes empresas, relativamente as pequenas, que não resistem a concorrência e se arruínam.

Uma importante vantagem da grande produção é seu elevado índice de produção mercantil. As grandes empresas agrícolas dos Estados Unidos fornecem a esmagadora maioria de toda a produção mercantil da agricultura. Ao mesmo tempo, a massa fundamental dos granjeiros produz, essencialmente, para o próprio consumo.

“A pequena propriedade agrícola, por sua própria natureza, exclui o desenvolvimento das forças sociais produtivas do trabalho, as formas sociais do trabalho, a concentração social dos capitais, a pecuária em vasta escala, a aplicação progressista da ciência.”(66)

Entretanto, o processo de crescimento da grande produção e de liquidação da pequena produção na agricultura, que é característico do capitalismo, também apresenta suas peculiaridades. As grandes empresas agrícolas capitalistas desenvolvem-se principalmente mediante a exploração intensiva. Frequentemente sucede que um pequeno estabelecimento, assim considerado segundo a superfície de terra por ele ocupada, é, porém, uma grande empresa capitalista pelo volume de sua produção global e mercantil. A concentração da produção agrícola em grandes economias capitalistas não raro se faz acompanhar pelo aumento do número de economias camponesas muito pequenas. A existência de uma considerável quantidade dessas pequeninas economias, nos países capitalistas altamente desenvolvidos, explica-se pelo fato de que os capitalistas têm interesse em que sejam conservados assalariados com uma pequena parcela de terra, a fim de explorá-los.

O desenvolvimento da grande produção agrícola capitalista acentua o processo de diferenciação no seio do campesinato, o aumento da dependência, o empobrecimento e a ruína de milhões de pequenas e médias economias camponesas.

Na Rússia tzarista, as vésperas da Revolução de Outubro, entre as economias camponesas, contavam-se 65% de economias de camponeses pobres, 20% de camponeses médios e 15% de camponeses ricos. Na França, o número de proprietários de terras reduziu-se de 7/7,5 milhões em 1850 para 3,4 milhões em 1892 para 2,7 milhões em 1929 e para 1,5 milhões em 1946, mediante a expropriação das pequenas economias camponesas.

A pequena economia agrícola mantém-se ao preço de incríveis privações e do saque do trabalho do agricultor e de sua família. E, apesar do camponês esfalfar-se no trabalho para salvar sua aparente independência, ainda assim perde a terra e se arruína.

Um importante papel no despojamento do camponês de sua terra é desempenhado pelo crédito hipotecário, isto é, o empréstimo garantido pela terra e os bens imóveis. Quando o agricultor, que possui sua própria terra, tem necessidade de dinheiro para efetuar pagamentos inadiáveis (para o pagamento de impostos, por exemplo), recorre ao banco solicitando um empréstimo. Frequentemente, o empréstimo é feito para a compra de uma parcela de terra. O banco entrega-lhe determinada quantia sob a garantia da parcela de terra. Se o dinheiro não retorna no prazo, a terra passa para as mãos do banco. De fato, mesmo antes o banco se transforma no verdadeiro proprietário da terra, de vez que o agricultor-devedor é obrigado a pagar-lhe, sob a forma de juros, urna parte considerável do ingresso que tira da terra. Sob a forma de juros, o camponês paga ao banco, na realidade, a renda da terra da parcela de terra que lhe pertence.

A dívida hipotecária dos granjeiros norte-americanos era, em 1910, de 3,2 bilhões de dólares, em 1940, de 6,6 bilhões de dólares, e, a 1º de janeiro de 1958, elevava-se a 10,5 bilhões de dólares. Em virtude da crescente carga tributária, dos juros pagos por dívidas e do pagamento dos arrendamentos aos latifundiários, reduziu-se fortemente a renda líquida dos granjeiros. De 53,4%, em 1937, a renda líquida dos granjeiros reduziu-se em 1956 a 34,2% da renda agrícola total.

A dívida aos bancos constitui um verdadeiro flagelo para a pequena produção na agricultura. O número de granjas devedoras nos Estados Unidos passou de 28,2% de todas as granjas, em 1890, para 43,8%, em 1940.

Todos os anos é vendido em leilões uma massa de economias camponesas hipotecadas. Os granjeiros arruinados fogem do campo. O aumento da dívida das granjas é um reflexo do processo de separação entre a propriedade da terra e a produção agrícola, um reflexo da concentração da propriedade em mãos dos grandes proprietários de terra e da transformação do produtor independente em arrendatário ou em operário assalariado.

Um número imenso de pequenos camponeses toma em arrendamento aos grandes proprietários pequenas parcelas de terra, em condições contratuais leoninas. A burguesia rural arrenda a terra a fim de produzir para o mercado e obter lucros. Este é o arrendamento de empresário. O pequeno camponês-arrendatário é obrigado a arrendar uma parcela de terra para se alimentar. É o chamado arrendamento para comer ou de fome. Nas pequenas parcelas de terra, o arrendamento de cada hectare é, em geral, consideravelmente mais elevado do que nas grandes áreas. O arrendamento ao pequeno camponês frequentemente absorve não apenas todo o trabalho suplementar do camponês, como, ainda, uma parte do seu trabalho necessário. Aqui, as relações de arrendamento entrelaçam-se com as sobrevivências feudais. No capitalismo, uma das sobrevivências feudais mais difundidas é a parceria, segundo a qual o camponês-arrendatário paga em espécie, a título de arrendamento, até metade e mais da colheita.

Em 1954, entre os granjeiros dos Estados Unidos, havia 57,4% de proprietários de terras e 24% de arrendatários. Além disso, 18,2% de todos os granjeiros eram “proprietários parciais”, isto é, viam-se também obrigados a tomar em arrendamento determinada parte da terra por eles trabalhada. Cerca de 80% dos arrendatários eram parceiros. É sobretudo nos Estados do Sul que o sistema semifeudal da parceria encontra uma difusão particularmente grande. Os negros-parceiros pagam até metade da sua colheita pelo arrendamento da terra.

Na França há um grande número de arrendatários-parceiros. Além do pagamento da renda em espécie, que se eleva a metade da colheita, e em casos isolados até a mais, são eles não raro obrigados a abastecer os donos da terra com produtos de sua propriedade, como queijo, manteiga, ovos, galinhas, etc..

Aprofundamento da Oposição Entre a Cidade e o Campo.

Consequência inevitável do desenvolvimento do capitalismo é o crescente atraso da agricultura em relação a indústria, o aprofundamento e a acentuação da oposição entre a cidade e o campo.

“A agricultura, em seu desenvolvimento, atrasa-se em relação a indústria — fenômeno inerente a todos os países capitalistas e que constitui uma das causas mais profundas da violação da proporcionalidade entre os diferentes ramos da economia nacional, das crises e da carestia.”(67)

No capitalismo, a agricultura atrasa-se relativamente a indústria, sobretudo no que se refere ao nível das forças produtivas. O desenvolvimento da técnica na agricultura processa-se mais lentamente do que na indústria. As máquinas são introduzidas nas grandes economias, enquanto que as pequenas economias camponesas produtoras de mercadorias, ou não podem empregá-las, de modo nenhum, ou então utilizam-se apenas máquinas muito simples. Ao mesmo tempo, o emprego capitalista das máquinas acarreta a intensificação da exploração e a ruína da pequena produção. O fato de ser barata a mão-de-obra, decorrência da superpopulação agrária, constitui um freio a ampla utilização das máquinas na agricultura.

O capitalismo acentua o atraso do campo, em relação a cidade, no domínio da cultura. As cidades são centros científicos e artísticos. Nas cidades, estão concentrados as escolas superiores, os museus, os teatros. Os frutos dessa cultura são colhidos principalmente pelas classes exploradoras. Somente em pequena escala podem as massas proletárias ter acesso as conquistas da cultura urbana. A massa fundamental da população camponesa dos países capitalistas acha-se a margem dos centros urbanos, relegada a uma situação de atraso cultural.

A base econômica da oposição entre a cidade e o campo, no capitalismo, é a exploração dos trabalhadores do campo pelos latifundiários e capitalistas, bem como a ruína de amplas massas da população rural. A burguesia urbana, juntamente com os granjeiros capitalistas e os latifundiários, explora a numerosa massa do campesinato. São variadas as formas desta exploração: a burguesia industrial e os comerciantes exploram o campo através dos altos preços das mercadorias industriais e dos preços relativamente baixos das mercadorias agrícolas, os bancos e os usurários exploram o campo mediante o crédito extorsivo, e o Estado burguês, por meio de todos os impostos possíveis. As imensas quantias percebidas pelos grandes proprietários agrários através da renda e da venda da terra e também os recursos carreados para os bancos em forma de juros sobre os empréstimos hipotecários, etc., transferem-se do campo para a cidade, onde vão alimentar o consumo parasitário das classes exploradoras.

De tal maneira, as causas do atraso da agricultura em relação a indústria e o aprofundamento e agravamento da oposição entre a cidade e o campo têm suas raízes no próprio sistema capitalista.

A Propriedade Privada da Terra e a Nacionalização da Terra

À medida que o capitalismo se desenvolve, a propriedade privada da terra assume um caráter cada vez mais parasitário. A classe dos grandes proprietários de terra abocanha, sob a forma de renda da terra, uma parte enorme dos ingressos obtidos da agricultura. Vultosos recursos são desviados da agricultura e vão cair nas mãos dos grandes proprietários agrários, através do preço da terra. Tudo isto freia o desenvolvimento das forças produtivas e encarece os produtos agropecuários, o que constitui uma pesada carga sobre os ombros dos trabalhadores. A liquidação da grande propriedade privada da terra transformou-se numa necessidade social. Uma das formas mais radicais de solução deste problema é a nacionalização da terra. A nacionalização da terra é a transformação da propriedade privada da terra em propriedade estatal.

Ao fundamentar a nacionalização da terra, Lênin tomou como ponto de partida a existência de dois tipos de monopólio — o monopólio da propriedade privada da terra e o monopólio da terra como objeto de exploração. A nacionalização da terra significa a supressão do monopólio da propriedade privada da terra e da renda absoluta, que lhe está ligada. A supressão da renda absoluta teria como consequência a redução dos preços dos produtos agrícolas. Entretanto, a renda diferencial continuaria a existir, relacionada que é ao monopólio da terra como objeto de exploração. Nas condições do capitalismo, com a nacionalização da terra, a renda diferencial ficaria a disposição do Estado burguês. A nacionalização da terra removeria uma série de obstáculos ao desenvolvimento do capitalismo na agricultura, criados pela propriedade privada da terra, e libertaria o campesinato das sobrevivências feudais.

Na época do capitalismo desenvolvido, quando está colocada na ordem-do-dia a realização da revolução socialista, a nacionalização da terra não pode ser levada a termo nos marcos da sociedade burguesa, devido a uma série de razões. Em primeiro lugar, a burguesia não está disposta a suprimir a propriedade privada da terra, temendo que, com o crescimento do movimento revolucionário do proletariado, isto possa abalar os alicerces da propriedade privada, em geral. Em segundo lugar, os próprios capitalistas adquiriram propriedades territoriais. Os interesses da classe dos burgueses e os da classe dos proprietários de terra entrelaçam-se cada vez mais. Na luta contra o proletariado e contra o campesinato, eles atuam sempre em conjunto.

Lênin relacionava a nacionalização da terra com determinadas condições históricas do desenvolvimento dos diferentes países. Assim, por exemplo, na Rússia das vésperas da primeira revolução russa (1905/1907), imperava a agricultura feudal-latifundiária. O campesinato, que se encontrava subjugado pelas sobrevivências feudais, estava interessado na nacionalização da terra. Em relação com isto, no programa agrário do Partido Comunista da Rússia, foi inserida a reivindicação de nacionalização de toda a terra. A nacionalização da terra pressupunha a tomada sem indenização (confisco) das terras dos latifundiários e dos burocratas e sua entrega ao campesinato para que nelas trabalhasse. Fundamentando teoricamente o programa agrário dos partidos comunistas, considerava Lênin que o confisco da grande propriedade de tipo latifundiário é condição necessária e obrigatória para a completa liquidação de todas as sobrevivências do feudalismo. Ao mesmo tempo, indicava ele que, sob determinadas condições históricas, as terras confiscadas aos latifundiários podem ser repartidas entre os camponeses, como propriedade privada destes. Lênin partia do fato de que a supressão da propriedade latifundiária e de todas as sobrevivências feudais fortalece a aliança do proletariado com as massas fundamentais do campesinato e deixa limpo o campo para a luta de classe entre o proletariado e a burguesia. Isto torna mais fácil ao proletariado, em aliança com o campesinato pobre, a luta pela revolução socialista.

Todo o curso do desenvolvimento histórico confirma que, na sociedade burguesa, as massas fundamentais do campesinato, impiedosamente exploradas pelos capitalistas, latifundiários, usurários e comerciantes, estão condenadas a ruína e a miséria. Sob o capitalismo, os pequenos camponeses não podem esperar a melhoria de sua situação. Aguça-se inevitavelmente no campo a luta de classes.

Os interesses vitais das massas fundamentais do campesinato coincidem com os interesses do proletariado. Nisto reside a base econômica para a aliança do proletariado com o campesinato trabalhador na sua luta comum contra o regime capitalista.


Notas de rodapé:

(64) K. Marx, Teorias da Mais-valia (t. IV de O Capital), parte II, 1957, p. 138. (retornar ao texto)

(65) K. Marx, O Capital, t. I, 1955, p. 509. (retornar ao texto)

(66) K. Marx, O Capital, t. III, 1955, p. 820. (retornar ao texto)

(67) V.I. Lênin, Novos Dados Sobre as Leis do Desenvolvimento do Capitalismo na Agricultura, Obras, t. XXII, p. 81. (retornar ao texto)

Inclusão 24/03/2015