Manual de Economia Política

Academia de Ciências da URSS


Capítulo XIII — A Reprodução do Capital Social e a Renda Nacional


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O Produto Social Total e a Renda Nacional

Toda a massa de bens materiais produzida na sociedade durante um determinado período — por exemplo, em um ano — constitui o produto social total (ou produto bruto).

No processo da reprodução, uma parte do produto social total, igual ao valor do capital constante consumido, é destinada a compensação dos meios de produção gastos. A parte restante do produto social total encarna o novo valor criado no processo da produção. Esta parte do produto social total, na qual se encarna o novo valor criado, é a renda nacional.

Por conseguinte, a renda nacional na sociedade capitalista é igual ao valor do produto social total menos o valor dos meios de produção gastos em um ano, ou, em outras palavras, é igual a soma do capital variável e da mais-valia. Em sua forma natural, a renda nacional abrange toda a massa de objetos de consumo pessoal produzidos e aquela parte dos meios de produção que se destina a ampliação da produção.

Assim, a renda nacional representa, de um lado, a soma do valor criado de novo em um ano e, de outro lado, a massa de diversas espécies de bens materiais, a parte do produto social total em que se encarna o valor criado de novo. Exemplificando: se, num dado país, no curso de um ano, forem produzidas mercadorias no montante de 90 bilhões de dólares ou marcos, dos quais 60 bilhões constituem o valor dos meios de produção gastos em um ano, a renda nacional criada neste ano será igual a 30 bilhões.

No capitalismo existe uma massa de pequenos produtores mercantis — camponeses e artesãos —, cujo trabalho também cria uma parte determinada do produto social total. A renda nacional inclui igualmente o valor criado de novo, em determinado período, pelos camponeses e artesãos.

O produto social total e, consequentemente, a renda nacional são criados pelos trabalhadores ocupados nos ramos da produção material. Aí se incluem todos os ramos em que são produzidos bens materiais: indústria, agricultura, construção, transporte e alguns outros.

A renda nacional não é criada nos ramos improdutivos, que incluem o aparelho do Estado, o crédito, o comércio (com exceção das operações que constituem o prolongamento do processo de produção na esfera da circulação), a instrução pública, a arte e a cultura e as instituições médicas.

Nos países capitalistas, uma parte considerável da população apta para o trabalho, além de não produzir o produto social e a renda nacional, em geral não participa do trabalho social útil. Aí se incluem, antes de tudo, as classes exploradoras e sua criadagem parasitária, o aparelho administrativo, a polícia, o exército e outros órgãos do Estado burguês que defendem o regime capitalista. Grande quantidade de força de trabalho é gasta sem qualquer utilidade para a sociedade. Assim é que imensos gastos improdutivos de trabalho estão relacionados com a concorrência, a especulação, a propaganda extremamente exagerada, etc..

A anarquia da produção capitalista, as crises econômicas periódicas, e o aproveitamento parcial da capacidade produtiva das empresas reduzem grandemente a utilização da força de trabalho. No capitalismo, massas consideráveis de trabalhadores estão privadas da possibilidade de trabalhar.

À medida em que se desenvolve o capitalismo, amplia-se o aparelho do Estado, cresce o número de pessoas que servem a burguesia, diminui a parte da população ocupada na esfera da produção material e aumenta o peso específico das pessoas ocupadas na esfera da circulação. Multiplica-se o exército dos desempregados e cresce a superpopulação agrária. Todos estes fatores limitam o crescimento do produto social total e da renda nacional na sociedade burguesa.

Nos Estados Unidos, o ritmo médio anual de crescimento da renda nacional foi de 4,7% nos últimos 30 anos do século XIX; 1,9% no período de 1900 a 1938; enquanto que nos anos posteriores a Segunda Guerra Mundial (de 1945 a 1956) foi de 2,1%.

O Produto Social Total como Capital. Composição do Produto Social Total

A reprodução capitalista abrange tanto o processo direto de produção como o processo de circulação.

Para que se realize a reprodução, o capital deve ter a possibilidade de realizar sem obstáculos seu ciclo, isto é, de passar da forma monetária a produtiva, da produtiva a mercantil, da mercantil a monetária, e assim por diante. Isto diz respeito não só a cada capital por separado, mas a todos os capitais que existem na sociedade.

“Os ciclos dos capitais individuais entrelaçam-se, todavia, uns com os outros, pressupõem e condicionam uns aos outros e, precisamente graças a este entrelaçamento, formam o movimento de todo o capital social.”(68)

O capital social é o conjunto de todos os capitais individuais, tomados em sua inter-relação e em sua interdependência. Entre as empresas capitalistas, existem laços multilaterais: umas empresas fornecem a outras empresas máquinas, matérias-primas e outros meios de produção, enquanto outras produzem objetos de consumo, que são comprados pelos operários e pelos capitalistas. Cada um dos capitais individuais é independente em relação ,aos outros, e, ao mesmo tempo, todos os capitais individuais estão relacionados entre si e dependem um do outro. Esta contradição manifesta-se no curso da reprodução e da circulação de todo o capital social. As relações multilaterais de interligação e interdependência, que existem entre os capitalistas tomados por separado, manifestam-se espontaneamente em consequência da anarquia da produção inerente ao capitalismo.

Ao examinarmos o processo de reprodução e de circulação de todo o capital social, a fim de não complicar a questão, faremos duas suposições. Em primeiro lugar, supõe-se que toda a economia do país opera em bases capitalistas, ou seja, que a sociedade é constituída apenas de capitalistas e operários. Em segundo lugar, supõe-se que todo o capital constante é consumido no decorrer do ano e que seu valor transfere-se integralmente ao produto anual. Em face desses pressupostos, o produto social total não é senão o capital social (com o incremento representado na mais-valia), que sai do processo de produção em forma mercantil.

Para que a produção possa prosseguir, o produto social deve passar através do processo de circulação. No processo de circulação, cada parte do produto social inicialmente muda a forma mercantil pela monetária, e depois a forma monetária pela mercantil, que é necessária para o prosseguimento da produção. A realização do produto social consiste nesta mudança de formas: da mercantil pela monetária e, depois, da monetária pela nova forma mercantil.

Como foi demonstrado acima, todo o produto social divide-se, quanto ao valor, em três partes: a primeira compensa o capital constante, a segunda compensa o capital variável e a terceira representa a mais-valia. Assim, o valor do produto social é igual a c + v + m. Estas diversas partes do produto social desempenham papéis diferentes no curso da reprodução. O capital constante está predestinado a continuar servindo no processo da produção. O capital variável transforma-se em salário, que é gasto pelos operários na satisfação de suas necessidades, ou seja, na reprodução da força de trabalho. A mais-valia é inteiramente consumida pelos capitalistas na reprodução simples e, na reprodução ampliada, em parte é consumida pelos capitalistas, e em parte é gasta na compra de meios de produção complementares e na contratação de força de trabalho complementar.

Quanto a sua forma natural, todo o produto social consiste de meios de produção e objetos de consumo. Em conformidade com isto, toda a produção social divide-se em duas grandes seções: a primeira seção (I) — produção de meios de produção, e a segunda seção (II) — produção de objetos de consumo. Os objetos de consumo, por sua vez, dividem-se em meios de existência necessários, que se destinam a satisfação das necessidades da classe operária, das massas trabalhadoras, e artigos de luxo, que são consumidos pelas classes exploradoras e sua criadagem.

A divisão do produto social segundo sua forma natural, por sua vez, predetermina as suas diversas partes de diferentes papéis no curso da reprodução. Assim, por exemplo, os teares estão predestinados a produção de tecidos e não podem ser utilizados para nenhuma outra finalidade; de outro lado, a roupa feita deve servir ao consumo pessoal.

Ao analisarmos o ciclo e a rotação do capital individual, pusemos de lado o problema de saber onde e como será vendido o produto, onde comprarão os operários os objetos de consumo, e os capitalistas, os meios de produção, como problema que não se relacionava com aquela análise. Ao examinarmos a reprodução e a circulação de todo o capital social, a forma natural das mercadorias produzidas na sociedade possui uma significação essencial: para a renovação ininterrupta do processo de produção, é necessário que se tenham em presença determinadas quantidades de meios de produção e de objetos de consumo, é necessário que eles sejam produzidos em determinadas correlações (proporções).

Surge, assim, a questão: de que maneira, nas condições de anarquia da produção capitalista, se dá a realização do produto social? Lênin indicava que

"a questão da realização também consiste nisto — em analisar a compensação de todas as partes do produto social, quantoao valor e a forma material."(69)

Por conseguinte, trata-se de saber como se encontra, para cada parte do produto social segundo o valor (capital constante, capital variável e mais-valia) e segundo a forma natural (meios de produção, objetos de consumo), a outra parte do produto que a substitua no mercado.

No exame da reprodução ampliada, aqui se agrega ainda a questão de saber como ocorre a transformação da mais-valia em capital, isto é, de onde se tomam os meios de produção adicionais e os artigos de consumo para os operários adicionais, necessários a ampliação da produção.

As Condições da Realização Sob a Reprodução Simples Capitalista

Examinemos antes de tudo as condições necessárias para a realização do produto social na reprodução simples capitalista, quando toda a mais-valia se destina ao consumo pessoal dos capitalistas. Estas condições podem ser ilustradas pelo seguinte exemplo.

Suponhamos que, na primeira seção, isto é, na produção de meios de produção, o valor do capital constante expresso, por exemplo, em milhões de libras esterlinas, é igual a 4 000, o capital variável, a 1000, e a mais-valia, a 1000. Suponhamos que, na segunda seção, isto é, na produção de objetos de consumo, o valor do capital constante é igual a 2000, o capital variável, a 500, e a mais-valia, a 500. Em tal suposição, o produto social anual consistirá nas seguintes partes:

Partes integrantes
do valor do
produto social
c v m Soma
Seção I 4000 1000 1000 6000
Seção II 2000 500 500 3000

Consequentemente, o valor de todo o produto que é produzido na primeira seção, e que existe sob a forma de máquinas, matérias-primas, materiais, etc., perfaz 6 000. Para que o processo de produção possa renovar-se, parte desse produto, igual a 4000, deve ser vendida as empresas da própria primeira seção, a fim de renovar o capital constante desta seção. A parte restante do produto da primeira seção representa o valor reproduzido do capital variável (1000) e a mais-valia recém-produzida (1000), existindo sob a forma de meios de produção. Ela é vendida as empresas da segunda seção em troca de objetos de consumo, que se destinam ao consumo pessoal dos operários e capitalistas da primeira seção. Por sua vez, os capitalistas da segunda seção necessitam de meios de produção no valor de 2000, para a renovação de seu capital constante.

O valor de todo o produto que é produzido na segunda seção, e que existe sob a forma de objetos de consumo (pão, carne, roupa, sapatos, etc., e também artigos de luxo), perfaz 3 000. Parte dos objetos de consumo produzidos na segunda seção, no valor de 2 000, é trocada pelo salário e pela mais-valia da primeira seção. A parte restante do produto da segunda seção, representada pelo valor reproduzido do capital variável (500) e pela mais-valia recém-produzida (500), é realizada dentro da própria segunda seção e se destina ao consumo pessoal dos operários e capitalistas desta seção.

Por conseguinte, nas condições da reprodução simples, entram nas trocas entre as duas seções: 1) o capital variável e a mais-valia da primeira seção, que devem ser trocados pelos objetos de consumo produzidos na segunda seção, e 2) o capital constante da segunda seção, que deve ser trocado pelos meios de produção que são produzidos na primeira seção. A condição de realização na reprodução simples capitalista é a seguinte igualdade: o capital variável mais a mais-valia da primeira seção devem ser iguais ao capital constante da segunda seção: (v + m)I = cII. Em outras palavras, esta condição pode ser formulada assim: a soma de todo o valor produzido de novo, no decorrer de um ano, nas duas seções, deve ser igual ao valor de todo o produto da segunda seção: (v + m)I + (v + m)II = (c + v + m)II.

Esta condição da reprodução simples pode expressar-se ainda da seguinte maneira. Toda a massa de mercadorias, produzida durante um ano na primeira seção — pelas empresas que produzem meios de produção — deve Ser igual, pelo valor, a massa de meios de produção que é consumida anualmente nas empresas de ambas as seções, ou seja: cI + vI + mI = cI + cII. Toda a massa de mercadorias produzida durante um ano na segunda seção — pelas empresas que fabricam objetos de consumo — deve ser igual, pelo valor, a soma dos ingressos dos operários e capitalistas de ambas as seções, ou seja: cII + vII + mII = vI + vII + mI + mII.

Condições de Realização sob a Reprodução Ampliada Capitalista

A reprodução ampliada capitalista pressupõe a acumulação de capital. O capital de cada seção consiste de duas partes — o capital constante e o capital variável. Por isso, a parte acumulada da mais-valia divide-se também em duas partes: uma parte destina-se a compra de meios de produção adicionais, outra parte destina-se ao pagamento de força de trabalho adicional. Daí se conclui que o produto anual da primeira seção deve conter um excedente acima da quantidade de meios de produção que é necessária para a reprodução simples. Em outras palavras, a soma do capital variável e da mais-valia da primeira seção deve ser maior do que o capital constante da segunda seção: I (v + m) deve ser maior do que II c. Esta é a condição fundamental da reprodução ampliada capitalista.

Vejamos as condições de realização na reprodução ampliada capitalista.

Suponhamos que, na primeira seção, o valor do capital constante é igual a 4 000, o valor do capital variável, a 1000, e a mais-valia, a 1000; suponhamos que, na segunda seção, o valor do capital constante é igual a 1500, o do capital variável, a 750, e a mais-valia, a 750. Em tal suposição, o produto social anual consistirá das seguintes partes:

Partes integrantes
do valor do
produto social
c v m Soma
Seção I 4000 1000 1000 6000
Seção II 1500 750 750 3000

Suponhamos que, na primeira seção, da mais-valia igual a 1000 são acumulados 500. De acordo com a composição orgânica do capital na primeira seção (4:1), a parte acumulada da mais-valia divide-se do seguinte modo: 400 destina-se ao aumento do capital constante, e 100 ao aumento do capital variável. O capital constante adicional (400) existe no próprio produto da primeira seção, sob a forma de meios de produção; enquanto o capital variável adicional (100) deve ser obtido por troca na segunda seção, que, por conseguinte, também deve acumular. Os capitalistas da segunda seção trocam parte de sua mais-valia, igual a 100, por meios de produção, e utilizam estes meios de produção como capital constante adicional. Assim, em correspondência com a composição orgânica do capital na segunda seção (2:1), o capital variável nesta seção deve crescer de 50. Consequentemente, na segunda seção, da mais-valia igual a 750, a acumulação exige 150.

Como na reprodução simples, a segunda seção deve trocar com a primeira seu capital constante, igual a 1 500, e a primeira seção deve trocar com a segunda seção seu capital variável, igual a 1000, e a parte da mais-valia consumida pelos capitalistas, igual a 500.

Assim, a primeira seção deve trocar:

parte do produto, que reproduz o valor do capital variável 1000
parte da mais-valia acumulada, que se incorpora ao capital variável 100
parte da mais-valia, consumida pelos capitalistas 500
Total 1600

A segunda seção deve trocar:

o capital constante 1500
parte da mais-valia acumulada, que se incorpora ao capital constante 100
Total 1600

A troca entre as duas seções pode ter lugar somente no caso de igualdade entre estas duas grandezas. Desse modo, a condição de realização, na reprodução capitalista ampliada, é a seguinte igualdade; o valor do capital variável mais a parte da mais-valia destinada ao consumo pessoal dos capitalistas mais a parte da mais-valia acumulada, que se incorpora ao capital variável da primeira seção, deve ser igual ao valor do capital constante mais a parte da mais-valia acumulada, que se incorpora ao capital constante da segunda seção.

Na reprodução ampliada, a soma do capital variável e da mais-valia da primeira seção deve crescer mais rapidamente que o capital constante da segunda seção, e o crescimento do capital constante da primeira seção deve ainda mais ultrapassar o crescimento do capital constante da segunda seção.

Em qualquer regime social, o desenvolvimento das forças produtivas expressa-se no fato de que a parte do trabalho social destinada a produção de meios de produção cresce mais rapidamente em comparação com a parte que se destina a produção de objetos de consumo. Lênin denominou de lei econômica da reprodução ampliada o crescimento prioritário da produção de meios de produção em relação com a produção de objetos de consumo. O capitalismo cria uma técnica incomparavelmente mais alta em relação com os modos de produção precedentes. O progresso técnico se reflete na eliminação crescente do trabalho manual pelo trabalho com máquinas; isto leva ao crescimento acelerado da produção de meios de produção: máquinas, metais, carvão, etc.. No capitalismo, o crescimento mais rápido da produção de meios de produção, em comparação com a produção de objetos de consumo, expressa-se no crescimento mais rápido do capital constante em relação ao capital variável, isto é, na elevação da composição orgânica do capital.

Esclarecendo as condições da realização na reprodução capitalista simples e ampliada, Marx pôs de lado o aumento da composição orgânica do capital, com o objetivo de simplificar a análise. O esquema da reprodução apresentado por Marx, em O Capital, tem como ponto de partida uma composição orgânica do capital imutável. Lênin desenvolveu a teoria da reprodução de Marx e elaborou um esquema da reprodução ampliada tomando em consideração o crescimento da composição orgânica do capital. Este esquema demonstra que

“cada vez mais rapidamente, cresce a produção de meios de produção para os meios de produção, em seguida, a produção de meios de produção para os meios de consumo e, cada vez mais lentamente, a produção de meios de consumo.”(70)

O esquema de Lênin ilustra claramente a ação da lei do crescimento prioritário da produção dos meios de produção no curso da reprodução ampliada capitalista. Esta ação se expressa na ruptura espontânea das proporções estabelecidas entre os ramos da produção, na desigualdade de desenvolvimento dos diversos ramos, no retardamento do consumo das massas populares em relação ao crescimento da produção, devido a que a elevação da composição orgânica do capital leva inevitavelmente ao crescimento do desemprego, ao agravamento da exploração da classe operária.

O Problema do Mercado. As Contradições da Reprodução Capitalista

As mercadorias produzidas nas empresas capitalistas devem ser realizadas, isto é, encontrar mercado. O conceito de mercado, como indica Lênin, é de todo inseparável do conceito de divisão social do trabalho, deste fundamento comum de toda produção mercantil e, consequentemente, capitalista. O mercado surge e amplia-se com o aparecimento e o crescimento da produção mercantil, em particular com o desenvolvimento do capitalismo, que aprofunda a divisão social do trabalho e decompõe os produtores diretos em capitalistas e operários. Como resultado da divisão social do trabalho, cresce o número de ramos especiais da produção, aumenta a especialização do trabalho na sociedade. O volume do mercado está ligado indissoluvelmente com o grau de especialização do trabalho social.

O desenvolvimento de uns ramos amplia o mercado para as mercadorias produzidas por outros ramos, antes de tudo para as matérias-primas, máquinas e outros meios de produção, como consequência da ação da lei do crescimento prioritário da produção de meios de produção em relação com a produção de objetos de consumo. Ao mesmo tempo, o progresso da técnica no capitalismo conduz a socialização do trabalho, que exige necessariamente a especialização de diferentes funções do processo de produção, a transformação dessas funções desmembradas, separadas, que se repetem em cada pequena empresa isolada, em funções socializadas, concentradas em grandes empresas.

Como já foi demonstrado, a diferenciação de classe dos pequenos produtores mercantis, o crescimento do número de operários e a elevação dos lucros dos capitalistas conduzem ao aumento da venda de objetos de consumo e contribuem para a expansão do mercado. O pequeno produtor, que se converte em operário assalariado, vive da venda de sua força de trabalho; ele precisa agora comprar os artigos de consumo necessários. De outro lado, os meios de produção se concentram nas mãos de uma minoria insignificante, transformam-se em capital, e o produto fabricado destina-se ao mercado. Assim, o grau de desenvolvimento do mercado interno é o grau de desenvolvimento do capitalismo no país.

Como se verifica da exposição precedente, para a realização do produto social são necessárias determinadas correlações (proporções) entre suas partes separadas e, consequentemente, entre os ramos de produção. No capitalismo, onde a produção é efetuada por proprietários privados isolados, que se guiam pela caça ao lucro e não conhecem as necessidades da sociedade em relação as mercadorias por eles produzidas, estas proporções não podem deixar de sofrer constante violação.

A ampliação da produção ocorre de maneira desigual, devido a que as antigas proporções entre os ramos são constantemente violadas e as novas proporções se estabelecem espontaneamente, por meio da transfusão de capitais de uns ramos para outros. Por isso, a proporcionalidade entre os ramos separados constitui uma casualidade e a constante violação da proporcionalidade é a regra geral na reprodução capitalista.

Investigando as condições do curso normal da reprodução capitalista simples e ampliada, Marx indica que elas

“se transformam em tantas outras numerosas condições de um curso anormal de reprodução, em tantas outras numerosas possibilidades de crises, porque o equilíbrio — em vista do caráter espontâneo desta produção — constitui, ele próprio, um acaso.”(71)

No capitalismo, o equilíbrio entre a produção e o consumo (entre a oferta e a procura) alcança-se somente em meio a inúmeras violações desse equilíbrio. Além disso, quanto maior a produção, quanto mais amplo o círculo de consumidores a que ela é destinada, tanto mais acentuadas são as violações do curso da reprodução. Nas condições da anarquia da produção capitalista, a realização do produto social ocorre somente através de constantes embaraços e oscilações, que se tornam cada vez mais graves a medida em que se desenvolve o capitalismo.

Uma significação especial possui também a circunstância de que a ampliação da produção capitalista e, consequentemente, a formação do mercado interno se efetua não tanto a custa dos objetos de consumo quanto a custa dos meios de produção. O caráter da reprodução capitalista é determinado pelo fato de que o objetivo da produção no capitalismo consiste na obtenção de lucros em proporções crescentes, e o meio para alcançar tal objetivo é a ampliação da produção. Neste sentido, Marx escreveu sobre a “produção pela produção” e a “acumulação pela acumulação”, como características do capitalismo.

Entretanto, a produção de meios de produção não pode desenvolver-se de modo inteiramente independente da produção de objetos de consumo e sem qualquer ligação com esta, pois as empresas que empregam estes meios de produção lançam ao mercado um volume crescente de mercadorias destinadas ao consumo. Deste modo, em última análise, o consumo produtivo (consumo de meios de produção) está sempre ligado ao consumo pessoal, depende sempre dele. Contudo, o volume do consumo pessoal das massas fundamentais da população na sociedade capitalista está limitado pelos marcos estreitos da procura solvente dos trabalhadores, em consequência da ação da lei econômica do empobrecimento da classe operária e dos camponeses. Devido a isto, a ampliação do mercado interno no capitalismo conjuga-se a limitação do consumo da imensa maioria da população.

As mercadorias são produzidas, afinal de contas, não para a produção, mas para a satisfação das necessidades das pessoas. Por isso, também na sociedade capitalista não pode deixar de crescer a parte da produção social que fabrica objetos de consumo. O desenvolvimento do capitalismo acarreta o crescimento do nível de necessidades de toda a população, inclusive do proletariado. O crescimento das necessidades é condicionado pelo desenvolvimento da produção e das trocas, pela elevação da quantidade de proletários, pela coesão e organização crescentes da classe operária, as quais lhe dão a possibilidade de uma luta vitoriosa contra as tendências exploradoras dos empresários capitalistas. Ao mesmo tempo, porém, os capitalistas, em sua caça ao lucro, além de não assegurarem a satisfação das necessidades crescentes dos trabalhadores, ainda se esforçam, por todos os meios, no sentido de rebaixar seu nível de vida, de limitar o consumo da classe operária. Ao capitalismo é inerente a profunda contradição antagônica entre a produção e o consumo.

A contradição entre a produção e o consumo, própria do capitalismo, consiste em que a riqueza nacional cresce ao lado do pioramento da situação dos trabalhadores, as forças produtivas da sociedade aumentam sem uma elevação correspondente do consumo popular. Esta contradição representa uma das formas por que se manifesta a contradição fundamental do capitalismo — a contradição entre o caráter social da produção e a forma capitalista privada de apropriação. O desenvolvimento da produção de meios de produção apenas prolonga esta contradição, sem eliminá-la. Ela só pode ser eliminada com a eliminação do próprio modo de produção capitalista.

A oposição entre a cidade e o campo, entre a indústria e a agricultura, inerente ao capitalismo, é um fator importante para a inevitável violação das correlações necessárias no curso da reprodução capitalista. Esse fenômeno é próprio de todos os países capitalistas. Constitui uma das causas mais profundas da violação da proporcionalidade entre os diferentes ramos da economia nacional.

Desmascarando os serviçais da burguesia, que ocultam as profundas contradições da realização capitalista, Lênin acentuou que

“mesmo no caso de uma reprodução e circulação de todo o capital social idealmente harmoniosa e proporcional, é inevitável a contradição entre o crescimento da produção e os marcos limitados do consumo. Mas na realidade, demais disso, o processo de realização não se dá com uma proporcionalidade idealmente harmoniosa, mas apenas em meio a “dificuldades”, “oscilações”, “crises”, etc..”(72)

Quando a produção capitalista atinge um alto grau de desenvolvimento, já não pode satisfazer-se com o mercado interno. Ao lado do mercado interno (venda de mercadorias dentro de um determinado país), adquire uma importância crescente o mercado externo (venda de mercadorias no exterior). A socialização do trabalho pelo capitalismo manifesta-se no fato de que se desfaz a anterior dispersão das pequenas unidades econômicas e se efetua a unificação dos pequenos mercados locais em um vasto mercado nacional e, depois, mundial.

No exame do processo de reprodução e circulação de todo o capital social, o papel do mercado externo é posto de lado, pois a inclusão do comércio exterior apenas transfere a questão de um país para alguns países, em nada sendo modificada, com isso, a essência do processo de realização. Isto não significa, entretanto, que o mercado externe não possua uma importância essencial para os países capitalistas.

Na caça ao lucro e sob a influência da concorrência, os capitalistas ampliam a produção por todos os meios e procuram os mercados mais vantajosos para a venda maciça de mercadorias produzidas. Os mercados externos, com frequência, resultam ser particularmente vantajosos. A luta pelos mercados externos, por sua conquista, divisão e redistribuição desempenha um grande papel no agravamento das contradições entre os Estados capitalistas, suscita agudos antagonismos e gera inúmeros conflitos entre esses Estados.

Estas contradições e dificuldades da realização capitalista estão indissoluvelmente ligadas ao sistema de distribuição da renda nacional inerente ao regime burguês.

A Distribuição e Redistribuição da Renda Nacional

A distribuição da renda nacional no capitalismo é determinada pelo fato de que a propriedade dos meios de produção está concentrada nas mãos dos capitalistas e latifundiários, que exploram o proletariado e os camponeses. Em consequência disso, a distribuição da renda nacional não se realiza no interesse dos trabalhadores, e sim no interesse das classes exploradoras.

No capitalismo, a renda nacional criada pelo trabalho dos operários acha-se inicialmente a disposição dos capitalistas industriais (inclusive dos empresários capitalistas na agricultura). Ao realizarem as mercadorias produzidas, os capitalistas industriais obtêm toda a soma do seu valor, inclusive o capital variável e a mais-valia. O capital variável transforma-se em salário, que os capitalistas industriais pagam aos operários ocupados na produção. A mais-valia fica nas mãos dos capitalistas industriais sob a forma de lucro, do qual se formam os ingressos de todas as classes e grupos exploradores. Como resultado da distribuição desse lucro entre os diferentes grupos da burguesia, os capitalistas industriais obtêm o lucro industrial, os capitalistas comerciais — o lucro comercial, e os possuidores de capital de empréstimo — o juro. Os capitalistas industriais que arrendam a terra entregam parte de seu lucro (o excedente sobre o lucro médio) a classe dos grandes proprietários de terra, sob a forma de renda da terra.

Esta distribuição da renda nacional entre diferentes classes da sociedade capitalista e diversos grupos da burguesia pode ser representada, esquematicamente. em bilhões de dólares ou marcos, da seguinte maneira:

Esta distribuição da renda nacional entre diferentes classes da sociedade capitalista e diversos grupos da burguesia pode ser representada, esquematicamente. em bilhões de dólares ou marcos, da seguinte maneira

Inclui-se também na distribuição a parte da renda nacional que é criada em determinado período pelo trabalho dos camponeses e artesãos: uma parte dela é recebida pelos próprios camponeses e artesãos, outra fica com os capitalistas (camponeses ricos, açambarcadores, comerciantes, banqueiros, etc. ), e uma terceira parte, com os proprietários de terra.

Os ingressos dos trabalhadores são baseados em seu trabalho pessoal e representam ingressos resultantes do trabalho. A fonte dos ingressos das classes exploradoras é o trabalho dos operários e também dos camponeses e artesãos. Os ingressos dos capitalistas e latifundiários são baseados na exploração do trabalho alheio e constituem ingressos não resultantes do trabalho.

Após a distribuição dos ingressos entre as classes fundamentais da sociedade capitalista — proletariado, capitalistas e grandes proprietários territoriais —, realiza-se a redistribuição dos ingressos. Como resultado dessa redistribuição, ocorre o aumento dos ingressos das classes exploradoras, não resultantes do trabalho. Parte dos ingressos da população principalmente das classes trabalhadoras — é redistribuída através do orçamento estatal e utilizada segundo os interesses das classes exploradoras. Assim é que parte dos ingressos dos operários e camponeses, entrando no orçamento estatal sob a forma de impostos, transforma-se, posteriormente, em ingressos complementares dos capitalistas e no ingresso dos funcionários públicos.

Além disso, parte da renda nacional é empregada no pagamento dos chamados serviços em ramos improdutivos (por exemplo, pela utilização da assistência médica, pelas empresas de espetáculos, pelos estabelecimentos de serviços públicos, etc. ). Como já foi dito, nestes ramos não se cria produto social e, consequentemente, não se produz renda nacional; mas os capitalistas, explorando os trabalhadores assalariados neles ocupados, obtêm parte da renda nacional criada nos ramos da produção material.

Dessa renda, os capitalistas — proprietários das empresas dos ramos improdutivos — pagam os salários aos trabalhadores assalariados, cobrem as correspondentes despesas materiais (de local, equipamento, calefação, etc. ), e obtêm o lucro.

O pagamento dos serviços deve compensar os gastos dessas empresas e assegurar a taxa média de lucro, pois que, de outro modo, os capitalistas não empregarão seu capital nestes ramos. Em busca de lucros altos, os capitalistas se esforçam por elevar o pagamento dos serviços, o que conduz a queda do salário real dos operários e dos ingressos leais dos camponeses.

A maior parte da renda nacional dos países capitalistas é constituída pelos ingressos das classes exploradoras. Além disso, com o desenvolvimento do capitalismo, decresce a parte dos trabalhadores na renda nacional e se eleva a parte dos exploradores.

Os economistas burgueses deformam a verdadeira distribuição da renda nacional na sociedade capitalista. Tentam demonstrar que ocorre um pretenso processo de “nivelamento das rendas” das diversas classes e que, quanto mais alto o nível dos lucros dos capitalistas, tanto melhor a situação dos operários. Mas os fatos demonstram outra coisa. Assim é que, nos países capitalistas, aos trabalhadores, que constituem a maioria esmagadora da população, cabe menos da metade da renda nacional, enquanto que mais da metade da renda nacional é apropriada pela classe dos capitalistas.

A renda nacional é empregada, em última análise, para o consumo e a acumulação. A utilização da renda nacional nos países burgueses é determinada pelas leis econômicas do capitalismo e reflete o parasitismo crescente das classes exploradoras.

A parte da renda nacional que se destina ao consumo pessoal dos trabalhadores, a principal força produtiva da sociedade, está limitada em marcos muito estreitos. Camadas consideráveis de operários e camponeses trabalhadores são obrigados a privar-se, juntamente com suas famílias, do mais necessário a existência, a viver em choças, a deixar os filhos sem instrução.

Grande parte da renda nacional destina-se ao consumo improdutivo dos capitalistas e proprietários de terra. Somas consideráveis são gastas pelos capitalistas e proprietários territoriais na compra de artigos de luxo e também na manutenção de numerosa criadagem.

No capitalismo, a parte da renda nacional que se destina a ampliação da produção é relativamente diminuta em comparação com as possibilidades e as necessidades da sociedade.

O volume relativamente pequeno da acumulação no capitalismo é condicionado pelo fato de que uma parte considerável da renda nacional, como foi dito, destina-se ao consumo parasitário dos capitalistas, as despesas improdutivas. Assim é que atingem grandes proporções os gastos puros de circulação, que se destinam a manutenção do aparelho comercial e creditício, a conservação de reservas excedentes, as despesas com publicidade, a especulação na bolsa, etc.. Nos Estados Unidos, no período entre a Primeira e a Segunda Guerras Mundiais, os gastos puros de circulação absorveram 17 a 19% da renda nacional.

Uma parte cada vez maior da renda nacional, no capitalismo, destina-se as despesas militares, a corrida armamentista, a manutenção do aparelho estatal.

Na superfície dos fenômenos da sociedade capitalista, os ingressos e suas fontes aparecem sob forma desfigurada, fetichista. Manifesta-se a aparência enganosa de que o próprio capital gera o lucro, a terra produz a renda e os operários criam apenas um valor igual ao do seu salário.

Estas representações fetichistas constituem a base das teorias burguesas da renda nacional. Com a ajuda de tais teorias, os economistas burgueses tentam criar confusão sobre o problema da renda nacional, de acordo com os interesses da burguesia. Eles se empenham em demonstrar que a renda nacional é criada tanto pelos operários e camponeses como pelos capitalistas e proprietários territoriais, e também pelos funcionários públicos, policiais, corretores da bolsa, clero, etc..

Além disto, os economistas burgueses representam de modo falso a distribuição da renda nacional. Eles diminuem a parte da renda obtida pelos capitalistas e proprietários territoriais. Assim, por exemplo, os ingressos das classes exploradoras são determinados a base de cálculos muito reduzidos, apresentados pelos próprios pagadores de impostos; não são levados em conta os enormes honorários dos capitalistas, recebidos por muitos deles na qualidade de diretores das sociedades anônimas; não são computados os ingressos da burguesia rural, etc.. Ao mesmo tempo, os ingressos dos trabalhadores são aumentados artificialmente pelo fato de que se incorporam aos operários os altos funcionários, os diretores de empresas. de bancos, de firmas comerciais, etc., que recebem altos ordenados.

Por fim, os economistas burgueses deformam o quadro real da distribuição di renda nacional porque não distinguem as despesas com o consumo das classes exploradoras e com os gastos puros de circulação, reduzem a parte das despesas militares, mascaram de todas as formas o gasto improdutivo de uma parte enorme da renda nacional.

O Papel do Orçamento Estatal na Redistribuição da Renda Nacional

Para o cumprimento de suas funções, o Estado burguês possui um aparelho ramificado: exército, polícia, órgãos punitivos e judiciais, serviço de informações, diversos órgãos administrativos e de ação ideológica sobre as massas. Este aparelho é mantido as custas do orçamento estatal. As fontes de recursos para o orçamento estatal são, principalmente, os impostos e empréstimos.

O orçamento estatal é um instrumento de redistribuição de parte da renda nacional de acordo com os interesses das classes exploradoras. Apresenta-se na forma de uma previsão anual da receita e despesa do Estado. Marx escreveu que o orçamento do Estado capitalista

“é um orçamento de classe, o orçamento da burguesia.”(73)

Os seguintes dados evidenciam o crescimento da parte da renda nacional que é redistribuída através do orçamento estatal: nos Estados Unidos esta parte representava 6,5% em 1913, 19,3% em 1938 e 35,4% em 1956: na Inglaterra, 15,6%, 28,6% e 43,3%, respectivamente.

As despesas do Estado capitalista, em sua maioria esmagadora, são improdutivas.

Uma parcela imensa dos recursos do orçamento estatal, no capitalismo, destinam-se a preparação e a realização de guerras. Com este fim se relacionam também despesas com pesquisas científicas no campo da produção e do aperfeiçoamento de novas armas de extermínio em massa e com atividades de sapa em países estrangeiros.

Outra grande parcela das despesas do Estado capitalista está ligada a manutenção do aparelho de opressão dos trabalhadores.

“O militarismo contemporâneo é resultado do capitalismo. Em ambas as suas formas, ele é uma “manifestação viva” do capitalismo: como força militar, utilizada pelos Estados capitalistas em seus conflitos externos... e como arma nas mãos das classes dominantes para o esmagamento de qualquer gênero de movimento do proletariado (econômico e político).”(74)

O Estado gasta uma soma muito vultosa, particularmente em épocas de crises e guerras, com o fim de apoiar diretamente empresas capitalistas e assegurar-lhes altos lucros. Frequentemente, os subsídios concedidos aos bancos e aos industriais têm o objetivo de salvá-los da bancarrota, especialmente nas épocas de crise. Lucros adicionais de bilhões são drenados para os bolsos dos grandes capitalistas mediante as encomendas estatais, realizadas as custas do orçamento.

As despesas com a cultura e a ciência, com a instrução e a saúde pública, constituem uma parcela insignificante nos orçamentos estatais dos países capitalistas.

O Estado capitalista obtém a massa fundamental da sua receita por meio dos impostos.

Nas condições do capitalismo, os impostos são uma forma de exploração adicional dos trabalhadores por meio da redistribuição de parte de seus ingressos em proveito da burguesia, através do orçamento.

Como já foi dito, nos orçamentos dos países burgueses, atualmente, subtrai-se através dos impostos cerca de um terço do salário dos operários e empregados. Impostos elevados são cobrados dos camponeses, agravando sua ruína.

Os impostos denominam-se diretos, quando gravam os ingressos de pessoas por separado, e indiretos, quando gravam mercadorias vendidas (principalmente artigos de amplo consumo) ou serviços (por exemplo, bilhetes de cinema e teatro, passagens nos transportes urbanos, etc.). Os impostos indiretos elevam os preços das mercadorias e dos serviços. Na realidade, os impostos indiretos são pagos pelos compradores, principalmente pelos trabalhadores. Os capitalistas transferem para eles também uma parte de seus impostos diretos, mediante a elevação dos preços das mercadorias ou serviços.

A política do Estado burguês é orientada no sentido de reduzir, por todos os meios, as obrigações tributárias das classes exploradoras. Os capitalistas fogem ao pagamento de impostos, ocultando as verdadeiras proporções de suas rendas. A política de impostos indiretos é particularmente vantajosa para as classes possuidoras.

“A tributação indireta, recaindo sobre os objetos de consumo das massas, caracteriza-se pela máxima iniquidade. Ela incide com todo o seu peso sobre os pobres, criando privilégios para os ricos. Quanto mais pobre uma pessoa, tanto maior a parte de sua renda que entrega ao Estado sob a forma de impostos indiretos. A massa de poucos recursos e sem nenhum recurso constitui 9/10 de toda a população, consome 9/10 de todos os produtos tributados e paga 9/10 do total de impostos indiretos.”(75)

A carga tributária, lançada pelas classes exploradoras sobre os trabalhadores, cresce rapidamente.

Na Inglaterra, no fim do século XIX, os impostos constituíam 6 a 7% da renda nacional, 11% em 1913, 23% em 1924, 38% em 1950; na França, 10% no fim do século XIX, 13% em 1913, 21% em 1924, 28% da renda nacional em 1950.

Além dos impostos, os empréstimos constituem um importante item da receita do Estado capitalista. Com frequência cada vez maior, o Estado burguês recorre aos empréstimos para a cobertura de despesas extraordinárias, sobretudo militares. Uma parte considerável dos recursos conseguidos por meio de empréstimos destina-se ao pagamento, pelo Estado, das encomendas de armamento e equipamento para o exército, que proporcionam imensos lucros aos industriais. Afinal, os empréstimos conduzem a uma elevação posterior dos impostos que recaem sobre os trabalhadores, com o objetivo de pagar os juros e a amortização desses empréstimos. O montante da dívida pública dos países burgueses aumenta continuamente.

O total da dívida pública em todo o mundo cresceu de 38 bilhões de francos em 1825 para 250 bilhões de francos em 1900, isto é, de 6,6 vezes. No século XX, a dívida pública cresceu ainda mais rapidamente. Nos Estados Unidos, em 1914, o total da dívida pública atingiu 1,2 bilhões de dólares, enquanto que em 1938 foi de 37,2 bilhões, ou seja, aumentou de 31 vezes. Na Inglaterra, em 1890, foram pagos, a título de juros de empréstimos, 24,1 milhões de libras esterlinas e, em 1955/1956, cerca de 600 milhões; nos Estados Unidos, em 1940, foram pagos, a título de juros de empréstimos, 1 bilhão de dólares, enquanto que, em 1955/1956, foram pagos 6,9 bilhões de dólares.

Uma das fontes de receita do orçamento estatal no capitalismo é a emissão de papel-moeda, realizada com frequência particularmente durante as guerras. Provocando a inflação e a alta dos preços, a emissão de papel-moeda transfere ao Estado burguês parte da renda nacional as custas da redução do nível de vida das massas populares.

Desse modo, o orçamento estatal nas condições do capitalismo serve como instrumento do Estado burguês para a exploração adicional dos trabalhadores e para o enriquecimento da classe dos capitalistas, o que reforça ainda mais o caráter improdutivo e parasitário da utilização da renda nacional.

O sistema capitalista de distribuição da renda nacional, expressando os insolúveis antagonismos de classe da sociedade burguesa, acarreta inevitavelmente o atraso relativo do poder aquisitivo das massas em face da produção que se amplia. Esse atraso do consumo popular e as dificuldades da realização capitalista são condicionados pela contradição fundamental do capitalismo — pela contradição entre o caráter social da produção e a forma capitalista privada de apropriação — e encontram sua manifestação clara nas crises econômicas periódicas de superprodução.


Notas de rodapé:

(68) K. Marx, O Capital, vol. II, 1955, p. 352. (retornar ao texto)

(69) V.I. Lênin. Para a Caracterização do Romantismo Econômico, Obras, vol. II, p. 144. (retornar ao texto)

(70) V.I. Lênin. Acerca da Chamada Questão dos Mercados, Obras, vol. I, p. 71. (retornar ao texto)

(71) K. Marx, O Capital, vol. I, 1955, p. 496. (retornar ao texto)

(72) V.I. Lênin, Ainda Sobre a Questão da Teoria da Realização, Obras, vol. IV, p. 71. (retornar ao texto)

(73) K. Marx, Libras, Shillings, Pence, ou o Orçamento de Classe e a Quem Ele Serve, K. Marx e F. Engels, Obras, vol. IX, 1958, p. 64. (retornar ao texto)

(74) V.I. Lênin, O Militarismo Atuante e a Tática Antimilitarista da Social-Democracia, Obras, vol. XV, p. 169. (retornar ao texto)

(75) V.I. Lênin, Acerca do Registro Estatal, Obras, vol. V, p. 309. (retornar ao texto)

Inclusão 26/03/2015