Solução Imediata Para os Problemas do Povo

Luiz Carlos Prestes

Julho de 1946


Primeira Edição: Informe político apresentado à III Conferência Nacional do PCB em Julho de 1946.
Fonte: Problemas Atuais da Democracia, Editorial Vitória, 1947, pág: 417-456.
Transcrição e HTML: Fernando A. S. Araújo
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Camaradas

Reunimo-nos hoje em Conferência Nacional de nosso Partido em momento dos mais decisivos para a democracia no mundo e em nossa terra, para o futuro da humanidade e o progresso do Brasil.

É esta III Conferência que realiza nosso Partido após o já distante III Congresso de que nos separam mais de 17 anos, dos quais não menos de 16 foram dos mais duros e difíceis em nossa vida de quase completa clandestinidade, semelhante somente, em rigor, extensão e brutalidade, à de que foram vítimas nossos irmãos comunistas lá do Japão militarista, feudal e fascista.

Dificuldades várias, inerentes ao momento histórico que atravessamos, ao próprio processo de formação e crescimento de nosso Partido e às dificuldades práticas as mais diversas, levaram o C. N. a transferir para ocasião mais oportuna a convocação do IV Congresso cuja falta se pretende em parte sanar com a reunião desta III Conferência Nacional.

Nosso objetivo é fazer o balanço crítico e autocrítico do trabalho realizado nos 3 anos que nos separam da Conferência anterior, reexaminar objetivamente a situação mundial e nacional a fim de que possamos confirmar ou corrigir nossa linha política e decidir das tarefas imediatas a realizar.

Camaradas!

Há 3 anos realizava-se na clandestinidade, em plena guerra e ainda sob os rigores da ditadura e de sua polícia, a II Conferência Nacional do nosso Partido que teve a tarefa gloriosa de bem caracterizar a guerra contra o fascismo, chamando-a de «guerra de libertação dos povos», e em conseqüência de fazer o apelo histórico — tão difícil naquelas circunstâncias — à união de todos os brasileiros, à «União Nacional em torno do Governo», à mobilização para a guerra, e em apoio às forças expedicionárias em organização.

Dessa guerra de libertação, guerra justa e progressista saímos vitoriosos ao lado dos povos que no mundo inteiro lutaram contra o fascismo e graças à vitória, realizamos hoje após um ano de vida legal para o nosso Partido, em condições tão diferentes daquelas de 1943, este conclave nacional que pelo próprio número de delegados presentes nos diz quanto cresceu o nosso Partido e nos ajuda também a avaliar o caminho andado desde os subterrâneos da vida ilegal a que estávamos obrigados até às condições novas em que hoje atua o nosso Partido.

Aqui estamos reunidos para planificar a continuação da luta do nosso povo contra os remanescentes ainda vivos do fascismo, contra o imperialismo em que se apóia ou a quem serve, contra o feudalismo que constitui sem dúvida a base econômica principal em que repousa.

Aqui estamos reunidos para examinar o caminho andado e consolidar o trabalho realizado. Onde estamos? Para onde vamos? Qual o rumo a seguir? Quais as tarefas mais imediatas a realizar? Estas, entre muitas, as principais interrogações para as quais precisamos de respostas claras e tão justas quanto possível. São estas respostas que de nós espera o Partido, são essas respostas que nos hão de ajudar para prosseguir vitoriosos à frente do proletariado e do povo na luta titânica contra o atraso, a miséria e a ignorância, contra as sobre vivências do fascismo, pela democracia e pelo progresso do Brasil.

I - Situação Internacional

Há apenas um ano, terminava na Europa e poucos meses depois no Continente Asiático a segunda grande carnificina guerreira do século. É indispensável ainda, para uma melhor compreensão das vicissitudes dos dias de hoje, o estudo aprofundado daqueles terríveis acontecimentos e particularmente o exame cuidadoso das causas que os determinaram. E nada melhor para isso do que as magistrais palavras de Stalin às vésperas das últimas eleições gerais da URSS:

«Seria um erro pensar que a guerra veio acidentalmente ou foi o resultado de erros de alguns estadistas. Embora esses erros existam, a guerra surgiu, na realidade, como resultado inevitável do desenvolvimento das forças políticas e econômicas do mundo, na base do monopólio capitalista.

Nós, os marxistas, declaramos que o sistema capitalista da economia mundial traz em si elementos de crise e de guerra, que o desenvolvimento do capitalismo não segue um curso firme para frente, mas prossegue através de crises e catástrofes.

O desenvolvimento desigual dos países capitalistas leva, com o passar do tempo, a fortes distúrbios nas relações de produção, e os grupos de países que fazem fronteiras entre si, inadequadamente providos de matérias primas e mercados de exportação, procuram, geralmente, alterar essa situação, mudar a posição em seu favor, por meio da força armada. Como resultado desses fatores, o mundo capitalista se divide em dois campos hostis e a guerra é o resultado.

Talvez a catástrofe da guerra pudesse ser evitada, se houvesse possibilidade de uma redistribuição periódica das matérias primas e dos mercados entre os países, de acordo com suas necessidades econômicas, por meio de decisões pacíficas e coordenadas. Mas isto é impossível sob o atual desenvolvimento da economia capitalista. Assim, como resultado da primeira crise surgida na economia capitalista mundial, veio a primeira grande guerra; a segunda grande guerra foi o resultado da segunda crise».

Acentuando essa origem constante das guerras no mundo capitalista, conseqüência inelutável do desenvolvimento capitalista, é o próprio Stalin, no entanto, quem, logo a seguir, nos mostra a diferença entre a primeira e a segunda guerra mundial.

«Isto não significa, naturalmente, que a segunda grande guerra tenha sido uma cópia da primeira. Ao contrário, a segunda guerra apresentou um caráter radicalmente diferente da primeira. Devemos ter em mente que os principais países fascistas, antes de atacarem os países aliados, tinham abolido em casa os últimos resquícios das liberdades democráticas burguesas, estabelecido um cruel regime de terror, violado os princípios da soberania e liberdade das pequenas nações ao adotar a política de conquista de outras terras, e anunciado ao mundo que lutariam pela dominação do globo e pela implantação do regime fascista nos quatro cantos da terra Assim, com a conquista da Tchecoslováquia e da parte central da China, os Estados eixistas demonstraram que estavam preparados para executar suas ameaças, à custa da escravização dos povos amantes da liberdade.

Em vista destas circunstâncias, a segunda grande guerra, contra as potências do Eixo, foi bem diferente da primeira grande guerra, assumindo desde o princípio um caráter antifascista e libertador, e tendo como um dos seus objetivos o restabelecimento das liberdades democráticas.

A entrada União Soviética na guerra contra as potências do Eixo só poderia fortalecer o caráter antifascista e libertador da segunda guerra mundial».

O Verdadeiro Caráter da Segunda Guerra Mundial

Estas palavras que nos dizem do caráter antifascista e libertador da segunda guerra mundial desde o seu início, devem servir principalmente para corrigir certas formulações esquemáticas bastante generalizadas a respeito da diferença do caráter da guerra antes e após o 22 de junho de 1941, data do início do ataque nazista à URSS, o que enriquece sem dúvida a nossa experiência, e nos ajudará a ser mais cuidadosos no exame dos acontecimentos.

O caráter da guerra não mudou da noite para o dia com o ataque nazista à União Soviética, se bem que tivesse sido justo naquele primeiro período da guerra acentuar o seu lado reacionário, já que o essencial era então desmascarar a agitação política mentirosa das classes dominantes.

Em seu discurso de 31 de outubro de 1939, com palavras aparentemente opostas às de Stalin, Molotov desmascarava os reacionários franceses e ingleses que pretendiam se utilizar do caráter libertador da guerra contra Hitler para falar em democracia e arrastar seus povos à aventura guerreira que tinha por fim entregá-los a Hitler:

«Não se pode dar o nome de uma luta pela Democracia àquela que se inicia desterrando o Partido Comunista da França, que prende os deputados comunistas do parlamento francês; que opõe obstáculos às liberdades políticas na Inglaterra ou que recusa abandonar a opressão nacional na Índia.»

Sim, porque se a guerra contra o nazismo era, desde seu início, uma guerra de libertação, só tinha esse caráter para os que de fato lutassem contra Hitler e não para os reacionários muniquistas que estavam de fato ao lado do nazismo e para os quais só interessava, portanto, o lado imperialista da guerra. O que é certo é que antes do ataque nazista à URSS, era em geral justo acentuar o caráter imperialista da guerra a fim de armar os povos contra os governos reacionários que em nome da democracia pretendiam levá-los à aventura para mais facilmente entregá-los à dominação nazista, como aconteceu na França. Algo parecido se tentou ultimamente em nosso Continente com a política de Braden, procurando arrastar nossos povos, em nome da democracia, contra o chamado nazi-peronismo, na aventura de uma guerra imperialista, por nós oportunamente desmascarada.

Ao insistirmos agora sobre as possibilidades de paz no mundo, ao insistirmos em que a luta pela paz exige de todos nós a convicção científica de que a paz é possível, senão para sempre pelo menos por um longo período, torna-se mais do que nunca necessário atentar para aquelas palavras de Stalin que vimos de citar sobre a origem comum das guerras no sistema capitalista. A sobrevivência dos trustes e monopólios, a sobrevivência do imperialismo, significa nova crise em gestação e nova guerra que só poderá ser evitada pela final substituição do sistema capitalista.

A vitória militar sobre o fascismo foi conseqüência, antes e acima de tudo, da ação unificada de todos os povos amantes da paz e da democracia. A própria guerra criou as condições necessárias a essa colaboração estabelecida nas grandes Conferências de Moscou, Teerã e Ialta, e finalmente consolidada pela atuação unificada das forças armadas empenhadas na luta contra os exércitos de Hitler. Tornou-se uma realidade enfim a colaboração dos dois grandes estados capitalistas — Estados Unidos e Grã Bretanha — com o poderoso Estado socialista — a União Soviética. Este o fato novo criado pela própria guerra e que já foi suficientemente estudado pelo nosso C. N. em sua reunião plenária de janeiro último. O que é certo é que com o fim da segunda guerra mundial foram conquistadas as condições necessárias para a paz no mundo.

«Entramos realmente numa nova época. Terminou o período da guerra e começou o período de desenvolvimento pacíficos. (Stalin).

O imperialismo saiu sem dúvida enfraquecido da guerra.

Após tantos anos de guerra que se seguiram aos negros anos da ascensão do fascismo no mundo inteiro, vivemos hoje, após a derrota dos exércitos nazistas, num mundo em condições novas, no qual a correlação de forças sociais se modificou a favor da democracia. São os povos da Europa que criam afinal seus próprios governos populares e nacionais e, simultaneamente, levam a efeito reformas agrárias realmente capazes de liquidar as bases feudais do fascismo, e tratam de abolir o domínio dos monopólios e trustes que juntamente com os Bancos e comércio externo vão sendo nacionalizados. Outro fator importante nessa correlação de forças favorável à democracia, está no despertar da consciência de classe de camadas cada vez mais amplas do proletariado, especialmente daquele que participou ativamente na guerra, e cuja conseqüência mais importante está na unificação das forças do proletariado, já agora alcançada na poderosa Federação Mundial dos Sindicatos, organizada em Paris pelos representantes de mais de 70 milhões de trabalhadores, ainda há poucos dias reunidos em Moscou.

São ainda os povos nacionalmente oprimidos e explorados pelo imperialismo, os povos coloniais e semicoloniais, especialmente aqueles que mais de perto sentiram a guerra e suas conseqüências, que se levantam contra seus opressores e lutam com energia cada vez maior pela própria emancipação. São particularmente os povos asiáticos que tendo lutado contra o invasor japonês, na Malaia, na Indonésia, na Indochina, nas Filipinas, na China, não se mostram agora dispostos a admitir a substituição de um opressor por outro, do imperialismo japonês pelo não menos bárbaro e voraz imperialismo inglês, ianque ou francês.

E, finalmente, como fator decisivo dessa correlação de forças sociais favorável à democracia, está o crescimento sem dúvida notável em força e prestígio do glorioso Estado socialista. A guerra contra o nazismo foi a prova definitiva para a União Soviética, e serviu para demonstrar a superioridade do socialismo sobre o capitalismo. Apesar de todos os golpes, do sacrifício inaudito de milhões de seres humanos, da destruição material causada pelas hostes nazistas em terras soviéticas, o que é certo é que a União Soviética retorna rapidamente ao ritmo anterior de seu desenvolvimento econômico, enfrenta sem receio o problema da desmobilização de seus exércitos e já realiza com sucesso um novo plano qüinqüenal de proporções inéditas.

Os Focos Fascistas no Mundo e a Agressividade do Imperialismo Ianque

A derrota militar do nazismo e o conseqüente avanço da democracia no mundo não nos deve levar, no entanto, a conclusões falsas a respeito do desaparecimento do fascismo. Este ainda sobrevive moral e politicamente em focos tão perigosos quanto a Espanha de Franco e Portugal salazarista; sobrevive nos exércitos nazistas não dissolvidos nas zonas alemãs ocupadas pela Grã-Bretanha, nos restos da Gestapo poupados ainda por ingleses e norte-americanos, na farsa dos julgamentos de Nuremberg, nos duzentos mil homens organizados e armados do fascista polonês General Anders, nas tropas japonesas ainda organizadas em diversos pontos do continente asiático. O fascismo ainda sobrevive à derrota dos exércitos de Hitler junto a todos os governos reacionários das colônias e semicolônias, como acontece aqui conosco e em quase todos os países latino-americanos. O fascismo ainda sobrevive no mundo porque é poupado, ajudado e estimulado pelos elementos mais reacionários do capital financeiro, especialmente inglês e americano. Na Alemanha fazem ingleses e americanos esforços por dividir a classe operária, e as eleições prematuras no Japão não visam senão o mesmo fim de poupar e conservar os restos fascistas.

Todos esses focos fascistas são conservados como base de operações iniciais das aventuras guerreiras do imperialismo. Neles já se apóiam os provocadores de guerra nas suas repetidas investidas contra a colaboração das Nações Unidas, cuja unidade tentam romper por meio de manobras e provocações sucessivas. Nesse sentido é cada vez mais evidente a agressividade imperialista e cada vez mais cínica a atitude seus agentes, diplomatas, jornalistas, etc.

O imperialismo busca novos mercados e necessita cada vez mais levar a extremos a exploração e a opressão das copias e semicolônias. Só a União Soviética, entre os três grandes, coloca-se ao lado dos povos fracos que lutam liberdade, que resistem à exploração dos monopólios, que lutam pela emancipação nacional. Só a União Soviética, grande potência não-imperialista, toma posição firme contra a restauração do fascismo e do militarismo na Alemanha e no Japão, ajuda os povos na criação de seus próprios governos nacionais e populares, não só na Europa como entre as colônias do imperialismo. A URSS não tem problemas internos a resolver, nem crises em perspectiva. As manobras divisionistas dos provocadores de guerra visam evidentemente o ataque à URSS antes da eclosão da próxima crise capitalista em acelerado processo de gestação.

O imperialismo ianque, por ser o que saiu mais forte da guerra, particularmente se destaca pela sua agressividade bem como pela brutalidade e cinismo de seus métodos não fazendo mais questão nem mesmo de salvar as aparências na sua preocupação de dominar o mundo — o mundo capitalista ao menos — de qualquer maneira e o mais rapidamente possível. Foi o que compreendeu Churchill, que, apesar de toda a sua «dignidade» e «altivez» britânicas, logo se ofereceu para colocar o Império Britânico a reboque do imperialismo ianque numa cruzada santa pelo domínio do mundo pela «raça superior» dos anglo-saxões... Na verdade, o acordo financeiro de dezembro de 1945 pelo qual recebeu a Grã Bretanha dos Estados Unidos créditos que somam a 4,4 bilhões de dólares, evidencia a superioridade do imperialismo ianque sobre o inglês, que dificilmente vencerá na luta atual pelos mercados, quando a maioria dos países necessitam de créditos para comprar o indispensável.

A verdade é que os Estados Unidos vão retardando a desmobilização de seus soldados e conservam ainda hoje em armas mais de 1.200.000 homens espalhados por 56 países, verdadeiros postos avançados do imperialismo, alguns deles a 6.000 milhas da Metrópole. O Presidente da República conserva ainda poderes de guerra e, conforme disse Eugene Dennis em discurso recente, está em condições de mobilizar 12 milhões de homens da reserva num prazo de 30 dias. A intervenção do imperialismo ianque é ainda das mais claras e descaradas, tanto nas Filipinas e em Porto Rico, como também na China, onde provoca e alimenta a guerra civil e tudo faz para impedir a unificação de seu povo. Segundo informações recentes, dispõem-se os norte-americanos a organizar um exército de um milhão de homens para Chiang Kai Chek.

Explica-se, no entanto, a agressividade do imperialismo ianque, sua atividade guerreira cada vez mais ostensiva, pelo próprio desenvolvimento realmente vertiginoso de sua produção industrial. Mais do que nunca precisam os grandes trustes e monopólios ianques dominar o mundo, encontrar mercados para a produção crescente, seja de que maneira for, inclusive, naturalmente, a guerra.

Basta anotar que de 1940 a 1944 foram investidos 25 bilhões de dólares em novas fábricas e equipamentos. Em 1944, dobrou o valor dos bens e serviços produzidos em 1940, e em 1945, subia de mais de 50% sobre o ano anterior. A energia elétrica produzida aumentou de 73%. A capacidade de produção do operário aumentou de 1940 a 1944 em nunca menos de 30% a 50%. Tudo isso determina uma capacidade de produção realmente fabulosa para a indústria americana, que por outro lado, cada vez mais se concentra nas mãos de umas 60 famílias, ou, mais precisamente, em oito grandes grupos, como «Cleveland Group», «Goodyear, Tire & Rubber Co.», «Republic Steel», «Inland Steel», etc., salientando-se principalmente a família Du Pont e o grupo «Morgan-First National Bank», todos fazendo grandes negócios, vendendo a altos preços, com grandes lucros e, portanto, necessitando cada vez mais de novos campos de atividade em que possam empregar suas riquezas acumuladas.

O caminho é semelhante, em proporções maiores, ao daquela mesma prosperidade que levou o capitalismo à crise geral de 1929. Ainda agora no Boletim de Abril do «The National City Bank of New York» se repetem as mesmas expressões entusiásticas sobre a marcha dos negócios:

«O ânimo nos círculos do comércio de mercadorias, no que concerne à perspectiva das vendas, dificilmente poderá deixar de ser de regozijo. Nos algarismos fenomenais acusados pelo comércio e no ímpeto de incrementar-se a produção a despeito de todos os obstáculos, percebem-se as influências que sempre têm prevalecido para salvar os negócios do estado de confusão e perturbação».

E adiante, assegura ainda:

«A despeito dos transtornos neste país e no Exterior, a pressão ascendente revela um poder imenso. Pode ser ela refreada e talvez paralisada, prematuramente, mas não reprimida totalmente».

Ao que parece a crise de falta de trabalho que chegou a ser prevista pelos organismos oficiais do governo norte-americano e que o «Herald Tribune» de New York de 28 de Outubro de 1945 dizia ser calculada em 10.500.000 pessoas para Abril último, foi até agora evitada e não parece mesmo que possa estar próxima. O mesmo Boletim já citado do City Bank declara categórico:

«Todos os acontecimentos que se desenvolveram desde o início do ano, fizeram ressaltar a procura insaciável de mercadorias e a capacidade dos compradores de pagar tudo quanto possam obter. Continuaram a ser pagos os vencimentos a indivíduos, a despeito das reduções na produção bélica e das greves, até um grau que poucos julgaram possível».

Isto se deve certamente, de um lado, à luta vigorosa do proletariado por melhores salários e, de outro, à evidente demora com que vai sendo feita a desmobilização e a recuperação industrial.

Enquanto o proletariado luta por uma solução progressista para a crise em perspectivas, através a elevação ponderável de salários e a baixa dos preços, lutam de seu lado os trustes e monopólios pela solução contrária, donde a necessidade urgente de buscar novos mercados no exterior e novos campos de investimento para seus capitais. Daí a luta pela restauração do feudalismo e do fascismo no Oriente europeu, pelo controle completo, político e econômico, da China, por manter a exploração da América Latina. Daí as contradições agravadas com o imperialismo inglês que o capital financeiro ianque tenta dominar pelo crédito, bem como vencer, se necessário, pela força, a fim de penetrar nas zonas de influência monopolista britânica, do bloco esterlino, consideradas indispensáveis à expansão das exportações americanas, como é o caso da Argentina em nosso Continente.

A Ofensiva do Imperialismo Ianque Contra a América Latina

Na América Latina cresce de maneira significativa a pressão do Capital ianque em luta pela exploração cada vez mais impiedosa das grandes massas trabalhadoras e pelo predomínio político e militar absoluto. Medidas vão sendo postas prática com o objetivo de levar à completa destruição a incipiente indústria dos países do Continente, através não só da livre concorrência, com a denominada política de portas abertas, contra quaisquer tarifas de proteção, como também através do cambio do dólar, fixado segundo os interesses dos grandes Bancos norte-americanos. Mas a pressão é também exercida no terreno político através de tentativas repetidas visando a divisão do movimento operário, a cisão das centrais sindicais, inclusive a CTAL, através da luta sistemática contra os Partidos Comunistas, como centro que são de organização das forças democráticas, pela formação de novos partidos demagógicos e «socialistas» como instrumentos eficientes de provocação e de preparação de golpes militares sempre que se torne necessário quebrar a resistência dos governos ou impedir que prossiga um dado processo democrático. E, como vemos, os golpes se sucedem, na Venezuela, na Colômbia, Paraguai, Bolívia, Costa Rica, Guatemala, etc., e se sucedem também as provocações de cunho evidentemente imperialista, como no Chile e aqui mesmo em nossa terra contra nosso Partido e seus dirigentes, como aconteceu em Março último.

No momento pesa, porém, sobre os povos latino-americanos, ameaça maior — o denominado pacto hemisférico, que significa na verdade a supressão da soberania nacional dos povos do Continente, e, na prática, a subordinação completa de suas forças militares e nacionais ao comando norte-americano. Esse o verdadeiro conteúdo do projeto apresentado pelo Presidente Truman ao Congresso dos Estados Unidos, projeto que como se diz, visa somente «tornar uniforme a organização, os métodos de instrução e o aparelhamento» das forças militares de todo o Continente. Serão as bases militares permanentes, as missões de instrução cada vez maiores, os soldados do imperialismo, enfim, a ocupar nosso território para melhor defesa dos interesses dos grandes trustes e monopólios, para arrastar nosso povo como carne para canhão em suas aventuras guerreiras, especialmente contra a União Soviética, contra o proletariado revolucionário, contra os povos que lutam por sua emancipação. O bloco pan-americano como o deseja o imperialismo ianque significará na verdade a colonização total dos povos do Continente.

Favorável à Democracia a Correlação Mundial de Forças

Mas, a correlação das forças sociais no mundo inteiro é ainda tão favorável à democracia que toda a agressividade imperialista esbarra impotente diante da força dos povos que lutam pela paz e pelo progresso. Não são somente os povos soviéticos que estão atentos e sempre prontos a desmascarar as provocações contra a paz, contra a organização das Nações Unidas, contra a colaboração das duas democracias capitalistas com a grande democracia socialista. Todos os povos lutam com energia crescente pela democracia e vão alcançando sucessos memoráveis, como na Grã-Bretanha, com a derrota do Partido Conservador, na França, na Iugoslávia, na Checoslováquia, na Itália, etc. É o povo espanhol que continua a lutar em condições as mais adversas contra o tirano Franco e ajuda assim com seu heroísmo a mobilização de massas que exige do Conselho de Segurança da ONU medidas práticas contra Franco.

É o povo da China, da Indonésia, do Egito, da Índia, são os povos árabes, a lutarem todos pela democracia e pela paz, contra os provocadores imperialistas.

Aqui em nosso Continente é o heróico proletariado norte-americano a lutar em greves memoráveis contra a exploração imperialista, são os povos latino-americanos que, guiados por seus partidos proletários de vanguarda, avançam no caminho da democracia, desmascarando os provocadores imperialistas e defendendo com habilidade cada vez maior as posições conquistadas, como aconteceu em Cuba, por exemplo, e aqui mesmo em nossa terra.

No mundo inteiro a correlação de forças ainda é favorável à democracia. A paz, portanto, é ainda possível se todos os povos souberem por ela lutar sem desfalecimento, defendendo com energia e denodo as conquistas democráticas contra os arrancos desesperados dos restos fascistas ainda sobreviventes no mundo.

II - Situação Nacional

Passemos agora à análise dos acontecimentos nacionais e ao balanço crítico da atividade de nosso Partido e de seus organismos dirigentes, especialmente de sua Comissão Executiva, como principal responsável pela aplicação da linha política aprovada pelo C. N. em suas diversas reuniões.

Nos informes políticos aprovados pelo C. N. em suas reuniões — de Agosto de 1945 e Janeiro do corrente ano — já foi suficientemente analisada a situação nacional até àquela última data e apreciada, do ponto de vista crítico, a atividade de nosso partido no cenário político nacional, especialmente a partir da Conferência Nacional de Agosto de 1943, cujas decisões foram também examinadas e corajosamente criticadas. O assunto merecerá certamente a atenção desta Conferência, mas como está suficientemente explanado nos informes políticos acima referidos e consta resumidamente das teses em discussão apresentadas pelo C N., a ele não voltaremos, tomando Janeiro último, data da mais recente reunião plenária do C N., como ponto de partida da análise que nos cabe agora fazer.

A Marcha da Democracia em Nossa Terra

Dizíamos em Janeiro último, depois de nos referirmos às grandes vitórias de nosso povo durante o ano de 1945, memorável sem dúvida nos anais da democracia em nossa terra:

«A marcha no caminho da democracia não tem sido certamente das mais fáceis, nem poucos os retrocessos a registrar. O certo é porém, que nessa marcha, o sentido predominante tem sido no ano que agora finda, o da democracia, de retrocesso e de perdas sucessivas de posições importantes para os remanescentes do fascismo em nossa terra».

Poderemos afirmar a mesma cousa a respeito dos seis meses já passados do ano em curso? É evidente, sem dúvida, a diferença entre um e outro período, entre as grandes vitórias populares de 1945 com a anistia, a reconquista das liberdades civis, a legalização de nosso Partido, a convocação da Assembléia Constituinte, com os gigantescos comícios da campanha eleitoral, com o sucesso das eleições de 2 de Dezembro, a diferença entre essa Marcha acelerada no caminho da democracia e o que se vem passando no correr deste ano, que tem sido fundamentalmente de luta em defesa das posições alcançadas, em defesa das consistas democráticas de 1945.

O fascismo desesperado não alcançou, no entanto, até agora, nenhuma vitória decisiva, e os debates sucessivos desses meses de luta têm sem dúvida servido para enriquecer as forças da democracia que se consolidam, melhor se organizam e ganham maior flexibilidade e experiência justamente assim, ao fogo dos debates com inimigo ainda tão poderoso e insidioso capaz de todas as manobras e provocações, no seu desespero de vencido, de fera acuada em luta de vida ou morte por suas últimas posições.

Mas essa própria luta desesperada é conseqüência por sua vez da força de nosso Partido que se torna, cada vez mais o verdadeiro dirigente da política nacional, graças ao acerto de sua linha política, às suas ligações com as grandes massas e à energia e decisão com que luta em defesa da democracia. De cada embate com as forças da reação, com os agentes do imperialismo, de cada provocação fascista, tem saído o nosso Partido vitorioso, com suas forças revigoradas, com as suas fileiras mais estreitamente unidas, mais seguro e consciente de suas grandes responsabilidades. E é por isso que podemos afirmar sem receio que apesar das provocações fascistas, das restrições em crescimento ao livre exercício das liberdades civis, apesar das ameaças continuadas à legalidade de nosso Partido e à atividade das organizações operárias, apesar das violências policiais em crescimento, seria errôneo falar agora em retrocesso na marcha da democracia em nossa terra. Nessa marcha o sentido predominante é ainda o da democracia e os fascistas serão afinal completamente batidos se soubermos agir com firmeza, mas igualmente com prudência e serenidade. É o que aconselhava Lenin, em Junho de 1917, quando o governo de Kerensky proibia as manifestações pacíficas dos trabalhadores nas ruas de Petrogrado:

«O proletariado — escrevia Lenin — a isto poderá responder com o máximo de prudência, de tranqüilidade, de organização, sem se esquecer no entanto que o tempo das manifestações pacíficas está ultrapassado».

Isto, em 1917, numa época revolucionária, porque nos dias de hoje, os arreganhos policiais, as restrições aos direitos civis, a proibição de comícios, serão forçosamente passageiros se o proletariado souber responder aos fascistas no poder com esse máximo de prudência, de tranqüilidade e de organização aconselhados por Lenin. E nesse sentido tem insistido a C. E. em documentos sucessivos, alertando o Partido após cada provocação fascista ou manobra imperialista.

Evitar os Desvios na Aplicação da Linha do Partido

Em documento de 2 de Março de 1946, dizíamos por exemplo:

«A C. E. aconselha, mais uma vez, o acatamento à decisão das autoridades constituídas, a fim de que não seja dado nenhum pretexto aos que querem arrastar o país ao caos e à guerra civil».

Em 25 do mesmo mês, em documento denunciando as provocações imperialistas, era ainda reafirmada

«a orientação política do PCB de luta por ordem e tranqüilidade».

Finalmente, em documento de 6 de Maio de 1946, após nova onda de provocações policiais insistia a C. E.:

«A situação exige de todos os comunistas o maior cuidado contra as provocações, simultaneamente com a máxima firmeza, energia, resistência, coragem e audácia na luta em defesa da democracia e dos direitos fundamentais do cidadão».

E dizia a seguir, ainda no mesmo documento, atualizando a crítica já feita à passividade, pelo C. N., em sua reunião plenária de Janeiro:

«O acatamento às decisões do governo não deve significar submissão passiva às ordens arbitrárias da polícia, contra as quais devemos protestar por todos os meios legais, de forma a esgotar todos os recursos antes de aceitá-las e contra elas fazendo uso de formas de luta cada vez mais altas e vigorosas».

Estas palavras talvez não tenham sido ainda bem compreendidas por todo o Partido, pois são muitos os indícios da persistência em nossas fileiras daquela passividade criticada pelo C. N. em sua reunião plenária de Janeiro último.

«Este desvio oportunista na realização prática de nossa linha política dificulta também nossa ligação com as massas e, se foi até poucas semanas atrás, de menor importância, já agora precisa ser corrigido com rapidez se quisermos prosseguir na altura de nossa missão histórica de dirigentes do proletariado e de todo o nosso povo em sua marcha para o progresso e para a democracia».

Esta a crítica justa e oportuna naquela ocasião. Hoje, precisamos chamar a atenção para um desvio em sentido contrário que poderia vir a se manifestar em nossas fileiras, desvio esquerdista dos mais perigosos no momento que atravessamos e que teria como conseqüência movimentos avançados para o momento e para o nível político das massas trabalhadoras, greves e movimentos que facilitariam a ação desagregadora dos inimigos do proletariado, sempre atentos na obra de separar o proletariado de sua vanguarda. Já houve mesmo companheiros, que contra a realidade objetiva do meio em que atuam, quiseram criar artificialmente «formas de luta mais altas e vigorosas», concorrendo assim para separar o Partido da massa ainda não comunista e incapaz de compreender lutas superiores ao nível de sua própria consciência política. O perigo está em sermos arrastados pela paixão diante das provocações fascistas, em tentar a estas responder de qualquer maneira, saltando etapas, o que significaria o abandono do leninismo pelo aventurismo esquerdista, conseqüência muitas vezes, de tendências carreiristas, dos que temem parecer oportunistas ou covardes. A todos convém recordar neste instante célebres palavras de Stalin, em 1927, criticando o erro esquerdista:

«que toma sua própria consciência e compreensão pela consciência e a compreensão das massas de milhões de operários e camponeses. A oposição tem razão quando diz que o Partido deve marchar para a frente. É esta uma tese corrente do marxismo, sem a observância da qual não existe nem pode existir um verdadeiro Partido Comunista. Entretanto esta não é mais do que uma parte da verdade. A verdade inteira consiste em que o Partido não só deve marchar para a frente, como também «arrastar atrás de si» as grandes massas. Marchar para a frente sem arrastar as grandes massas significa, de fato, ficar desligado do movimento, ficar atrás do movimento. Marchar para a frente, separando-se da retaguarda, não sabendo levar atrás de si a retaguarda, significa cometer um excesso capaz de fazer fracassar o movimento de avanço das massas, durante um determinado período de tempo. A direção leninista consiste precisamente em que a vanguarda saiba arrastar «atrás de si» a retaguarda, em que a vanguarda marche para a frente sem se separar das massas. Mas para que a vanguarda não possa afastar-se das massas, para que a vanguarda possa conduzir efetivamente atrás de si as grandes massas, para isso se requer uma condição decisiva, e esta é precisamente que «as massas mesmas se convençam por sua própria experiência da justeza das indicações, diretivas e palavras de ordem da vanguarda».

A desgraça da oposição consiste precisamente que não reconhece esta simples regra leninista de direção das grandes massas, não compreendendo que o Partido só, o grupo de vanguarda só, sem o apoio das grandes massas, não se acha em condições de fazer a revolução, que a revolução «se faz», no fim de contas, pelas massas de milhões de trabalhadores.» (J. Stalin — O Marxismo e o Problema Nacional e Colonial — Pág. 317 — Editorial Vitória).

Estas palavras devem nos ajudar a fazer um profundo exame crítico e autocrítico dos movimentos grevistas mais recentes a fim de por a nu os desvios que se tenham manifestado na aplicação da linha política de nosso Partido. Se devemos combater intransigentemente o oportunismo dos que em nome de «Ordem e Tranqüilidade» se deixam ficar de braços cruzados, igual deve e precisa ser nossa luta contra o desvio esquerdista, hoje o mais perigoso, sem dúvida. Combater o esquerdismo é combater o aventureirismo, a influência pequeno-burguesa em nossas fileiras, eliminar os restos do golpismo e do tenentismo, de influências estranhas emnosso meio.

As condições objetivas são favoráveis à democracia, ao despertar político das massas. À sua vanguarda cabe evitar provocações, não se adiantar às massas, mas simplesmente

«dar forma e dirigir as ações espontâneas das massas» (Stalin).

Não cedamos um passo na luta em defesa das conquistas democráticas, mas evitemos as provocações e os excessos e as antecipações exageradas que possam servir de pretexto àqueles que tudo fazem contra a vida legal de nosso Partido, que deve ser defendida até o último extremo, por ser justamente a maior das conquistas democráticas de nosso povo.

A Reação Tenta Anular as Conquistas Democráticas do Ano Passado

É certo que se sucedem a partir justamente do início do atual governo, os golpes e manobras reacionárias visando anular as grandes conquistas democráticas de 1945. Já em Janeiro, antes do início do novo governo, mostrávamos o «caráter tremendamente reacionário das forças políticas agrupadas por trás da candidatura vencedora». Esses restos do fascismo são constituídos pelos mais heterogêneos elementos sociais, desde os militares reacionários que, por se haverá comprometido com o nazismo, lutam ainda desesperados pelos postos e posições, até os políticos das classes dominantes e agentes descarados do imperialismo, como esse Pereira Lira, por exemplo, ou esse senhor J. C. Macedo Soares, ligado aos Jesuítas e ao Vaticano.

Como era de esperar, todos os reacionários e os remanescentes do fascismo em nossa terra trataram logo de se agrupar em torno do novo Governo e tudo fazem para consolidar suas posições visando barrar o processo da democratização em que nos encontramos. Sucedem-se por isso as provocações contra o movimento operário e particularmente contra nosso Partido e todas as armas vão sendo utilizadas, das mais insidiosas às mais cínicas e estúpidas, sempre com o mesmo objetivo de eliminar as grandes conquistas democráticas de nosso povo. E à medida que falham as provocações e se desmoralizam as armas da mentira, da infâmia e da calúnia passam os fascistas em desespero de causa, aos processos mais drásticos das brutalidades policiais, do assassínio em praça pública, com o fito de atemorizar as camadas populares menos esclarecidas e, assim, afastá-las da influência educadora da propaganda de nosso Partido e de sua atuação eminentemente organizadora em defesa da democracia.

O que é certo é que se acentuam as tendências reacionárias do atual governo que, incapaz de encontrar qualquer solução para os graves problemas econômicos e sociais da hora que atravessamos, compromete-se cada vez mais com os restos do fascismo e perde rapidamente o limitado apoio popular com que poderia contar.

Agrava-se a Situação das Grandes Massas

Agrava-se efetivamente a situação das grandes massas trabalhadoras cujos salários perdem, com rapidez, cada vez maior, o poder de compra capaz de assegurar o baixo nível de vida habitual. Além da carestia dos preços cada dia mais altos para todos os artigos de consumo popular, sofrem hoje as camadas mais pobres das populações urbanas novas e surpreendentes restrições com a falta ou escassez dos artigos os mais comuns e indispensáveis à sua já mísera alimentação. De outro lado, no interior do país, as grandes massas camponesas sofrem com a diferença cada dia maior entre os preços de venda dos produtos agrícolas, em geral tabelados, sujeitos a mil restrições e impostos escorchantes, ao açambarcamento inevitável, às dificuldades cada vez maiores no sistema de transporte, e os preços pelos quais conseguem adquirir os artigos industriais indispensáveis e até mesmo os produtos agrícolas especializados e protegidos, como o açúcar, e os derivados da indústria pastoril, como o charque. Essa contradição é principalmente sensível no interior de S. Paulo, onde maior já é a penetração capitalista na agricultura e mais generalizadas as trocas monetárias e o contacto do camponês com o mercado.

Tudo indica que prossegue a ritmo crescente o processo da inflação, apesar das boas intenções deflacionistas do Sr. Ministro da Fazenda e de tudo quanto já escreveu contra a inflação o atual diretor do Banco do Brasil. Segundo os dados mais recentes, o atual Governo após uma breve resistência de dois meses, já retomou como era inevitável, o caminho das emissões. É claro que os remédios estritamente financeiros são impotentes e que medidas econômicas, políticas e sociais de caráter muito mais profundo já se tornam necessárias, tanto mais quanto não podem ser eliminados os «déficits» orçamentários que tendem, ao contrário, a crescer, nem diminuíram os saldos da balança comerciai com o fim da guerra, como supunham os economistas da classe dominante. O mais grave, no entanto, é que a própria tendência deflacionista do Governo determina uma geral restrição do crédito que tem como conseqüência desastrosa a diminuição da produção, além de precipitar o processo de acumulação de riqueza. Para diminuir os saldos cada vez maiores da balança de comércio, suspende o Governo a exportação de tecidos a pretexto de ser a produção inferior às necessidades internas, o que determinará a perda de mercados e a provável precipitação da crise de super-produção de tecidos no país. Quanto à lei sobre a taxação dos lucros extraordinários é simplesmente irrisória, tanto pela insignificância da taxa, como pelo próprio processo de determinação dos chamados lucros extraordinários, que fica na verdade a critério dos contribuintes. Finalmente, a criação da Comissão Central de Preços nada trouxe de novo e como as organizações idênticas que a precederam servirá somente, apesar de seu caráter eminentemente policial, para registrar, oficialmente, nos momentos em que for necessário acabar com o câmbio negro de um ou outro produto, às sucessivas altas de preços.

A Verdadeira Causa das Greves

Esta a situação econômica que explica suficientemente surto grevista que, iniciado em 1945, prossegue pelos meses do corrente ano. O foco principal das greves se encontra naturalmente em São Paulo e em seguida na Capital do país. Mas os movimentos vão pouco a pouco surgindo em todo o país apresentando sempre, como reivindicação principal o aumento de salários, geralmente conquistado, se bem que em proporção quase sempre bem inferior à reivindicada pelos trabalhadores em greve. Como fato novo, a confirmar o que já dissemos sobre a agravação da crise no interior de São Paulo, devem ser registradas as primeiras greves de trabalhadores rurais, tão insuportáveis se vão tornando as condições de vida nas grandes fazendas. Estes movimentos merecem especial estudo por todo o Partido, assim como as grandes greves de São Paulo, especialmente o notável movimento do heróico proletariado de Santos que já teve em boa parte cunho político, além das recentes greves da Leopoldina e da Light no Rio de Janeiro, e os movimentos grevistas no Rio Grande do Sul, nas minas de carvão e na Viação Férrea do Estado.

A reação, particularmente a camarilha fascista enquistada no governo, tratou de aproveitar as greves para arrancar do Executivo, utilizando ainda a Carta de 1937, nova legislação terrorista e não tem poupado esforços no sentido de envolver o nosso Partido em novas e crescentes provocações, a pretexto de ser o instigador dos movimentos grevistas e com a falsa alegação, trazida à baila com freqüência, de que prepara uma greve geral insurrecional. É o que diz, por exemplo, com a maior desfaçatez em recente relatório o Sr. Oliveira Sobrinho:

«O rápido progresso do Partido Comunista do Brasil e o espantoso desenvolvimento do seu programa de ação, que outro não pode ser senão fazer do parque industrial de São Paulo, convulsionado por uma greve geral, o trampolim para o assalto ao poder e a implantação da ditadura bolchevista no país».

Como se vê o policial fascista abandona por completo a realidade objetiva, a luta evidente e incessante dos comunistas por ordem e tranqüilidade, não toma conhecimento dos discursos parlamentares dos representantes comunistas, para transmitir ao Governo o fruto amargo de sua imaginação de policial e fascista, já que não é capaz de apontar um só fato em abono de suas atrevidas asserções.

A Reação Visa Afastar o Partido das Grandes Massas. A Firme Posição Antiimperialista do PCB

E das palavras, tratam os fascistas de passar aos atos, ao movimento aparatoso de forças com que se pretendeu intimidar o heróico proletariado santista, às violências e arbitrariedades de 1.º de Maio em quase todo o país, à chacina premeditada do Largo da Carioca, ao bárbaro espancamento dos grevistas da Light, ao assassínio de comunistas como já aconteceu em Pau D'Alho e mais recentemente em Macaé.

O objetivo da reação é evidente. Pretende intimidar as grandes massas politicamente menos esclarecidas para separá-las da vanguarda e assim impedir ou retardar a unificação do proletariado e o processo de União Nacional.

Nesse sentido, agem os fascistas de completo acordo com o imperialismo e quase sempre sob a orientação e direção imediata dos agentes do capital financeiro mais reacionário, explorador e opressor dos povos, do capital colonizador, especialmente o norte-americano, sem dúvida o mais diretamente interessado.

A firme posição antiimperialista do nosso Partido, sua luta conseqüente pela emancipação política e econômica de nosso povo, sua persistência na luta pela paz e pela democracia, tem como conseqüência mais imediata e visível, a tentativa desesperada de todos os fascistas e reacionários no sentido de unificar o maior número possível de homens e correntes políticas em «união sagrada» contra o comunismo e mais diretamente contra a legalidade do Partido, que é constante e cada vez mais ameaçada. A orientação imperialista dessa campanha anticomunista se fez principalmente sentir durante o mês de Março, depois que nosso Partido desmantelou o plano guerreiro de Braden com seu Livro Azul, conforme constatou a Comissão Executiva em sua nota de 25 de Março de 1946, alertando a nação «contra o perigo crescente das provocações reacionárias, dentro e fora do nosso país, que visam nos arrastar a uma guerra imperialista contra a Argentina e contra a União Soviética. A liquidação de nosso Partido torna-se assim cada vez mais indispensável ao imperialismo ianque para que possa mais facilmente prosseguir em seus planos guerreiros, de avassalamento do Continente e, mais particularmente, para que possa dominar o Brasil, enfraquecer o governo, dele arrancar as concessões que almeja no terreno econômico, político e militar, até arrastá-lo, sem qualquer resistência, em suas aventuras guerreiras.

E não por acaso as bases militares continuam ocupadas, aumentam os efetivos das missões militares e novos esforços são feitos pelos agentes do imperialismo no sentido de impedir a unidade do movimento operário.

Essa campanha anticomunista do imperialismo toma ainda forma política com as tentativas feitas pelos elementos mais reacionários dos diversos Partidos da classe dominante no sentido de ser alcançada a «união sagrada» contra o comunismo. Mas a própria composição heterogênea daqueles Partidos, agrupações sem consistência orgânica — «partidos de véspera de eleição», como confessou um dirigente udenista — sem programa, sem qualquer unidade de doutrina, em constante processo de recomposição, torna quase impraticável a união sagrada anticomunista. Aqueles grupos políticos acabam sempre por se recompor segundo a velha forma de «partido do governo e partido da oposição», conforme a distribuição dos postos de governo pelas camarilhas ou oligarquias estaduais e municipais. Aquela «união sagrada» é particularmente difícil nessa época de despertar político das massas, de atividade legal para o Partido do proletariado e, portanto, de rápido desmascaramento dos demagogos que se passam para o fascismo. Foi esta justamente a previsão já feita pelo C. N. em sua reunião de Janeiro último, e os seis meses decorridos a confirmaram. Foram até agora mal sucedidos os esforços do fascista Macedo Soares e é evidente que a coalizão partidária de que tanto se vem falando ultimamente, para se tornar viável, já teve de abandonar de início o cunho anticomunista dos primeiros entendimentos secretos. Segundo afirmam governistas e oposicionistas, todos receosos de ver diminuir a base social em que se apóiam, a união ou a coalizão a que pretendem agora chegar será democrática, visa acelerar a votação do projeto constitucional e não tem por objetivo a perseguição a nenhum partido de esquerda, conforme revelações recentes do próprio Sr. Macedo Soares que já se esqueceu, ao que parece, de suas declarações anteriores contra a vida legal do Partido Comunista.

A Composição Reacionária da Assembleia Constituinte e a Tentativa de Formação da «União Sagrada» Contra o Partido

Todas essas vacilações entre a reação e a democracia manifestam-se principalmente na Assembléia Constituinte, que justamente por isso perde cada vez mais a confiança das grandes massas. Depois de renunciar voluntariamente à própria soberania com a adoção de um regimento que a subordinou ao poder executivo, legalizou a Assembléia Constituinte, pelo voto da maioria, a famigerada carta para-fascista de 1937 e, dessa maneira, só não se desmoralizou de todo porque a tribuna parlamentar sempre serve aos homens dignos e aos verdadeiros representantes do povo como arma poderosa em defesa da democracia e contra os desmandos do poder.

A composição reacionária da Assembléia já se manifestou também no projeto de Constituição ora em debate, que conserva a velha forma presidencialista da ditadura do Poder Executivo, poder absoluto de um só homem eleito por voto majoritário e, portanto, pelas oligarquias dominantes no interior do país e naturalmente interessadas na conservação do «status quo» do monopólio da terra, do latifúndio medieval e da exploração de nosso povo pelo capital estrangeiro. Pelo mesmo motivo faltam ao projeto dispositivos que permitam a um governo progressista fazer dentro da lei, constitucionalmente, as reformas mais urgentes e capazes de abrir novas perspectivas de progresso para o país e de bem-estar para o povo. O projeto constitui assim uma espécie de camisa de força preparada pelos elementos mais reacionários da classe dominante, interessada em impedir as modificações estruturais já inevitáveis nas relações de produção e de propriedade para que o Brasil possa progredir. Outras objeções estão assinaladas no voto da fração comunista contra o projeto e em discursos nossos parlamentares sobre matéria constitucional. Convém notar, no entanto, que, apesar de tudo isso, o projeto em debate já significa um passo adiante sobre a carta parafascista de 1937, o quanto basta para alarmar os elementos mais reacionários da classe dominante e particularmente a camarilha fascista enquistada no governo que já se movimenta no sentido de alcançar modificações para pior, não sendo estranha a essas intenções aquela mesma «união sagrada» a que já nos referimos e particularmente a atividade política do Sr. Ministro da Guerra, em prol da denominada coalizão que, como tem sido declarado, visa apressar a elaboração constitucional na base de acordos sobre a redação de artigos e emendas julgadas indispensáveis à «defesa das instituições», o que em linguagem popular significa a ordem feudal e imperialista, policial e fascista já indispensável à oligarquia dominante.

Essa a ameaça que pesa sobre a Nação — a de uma Carta Constitucional ainda pior ou mais reacionária que o projeto em debate, ameaça contra a qual deve e precisa lutar o proletariado e todo nosso povo para alcançar a Constituição Democrática e progressista que tanto almeja.

Continuamos a Lutar Pela União Nacional

Nessa emergência em que reacionários e fascistas enfraquecidos e desesperados tentam levantar a cabeça e aproveitar os postos que ainda ocupam no aparelho estatal para reorganizar suas forças a fim de tentar barrar o processo democrático no país, o nosso Partido prossegue firme e conseqüente em sua luta pela União Nacional, em defesa da democracia, por uma Constituição democrática e progressista e por medidas práticas e imediatas contra a carestia e a inflação. Nossa posição frente ao Governo não se modificou, continua a mesma, já proclamada em Janeiro último, de «apoio franco e decidido aos seus atos democráticos», infelizmente cada vez mais raros, «de luta intransigente, se bem que pacífica, ordeira e dentro dos recursos legais, contra qualquer retrocesso reacionário». O essencial é desmascarar a camarilha fascista enquistada no governo e mobilizar as grandes massas para que exijam sua expulsão dos postos que ocupam e isto sem dúvida vem sendo feito com sucesso pelo nosso Partido, como já o sentiram os Lira, Negrão de Lima, Macedo Soares, Alcio Souto, etc., sucessivamente derrotados em suas provocações e, cada vez mais ameaçados de perder as posições a que se agarraram com unhas e dentes. Nossos esforços pela união nacional não nos levaram ainda a nenhuma união formal com outros partidos políticos, se bem que já se venham repetindo com maior freqüência nos últimos meses, especialmente no trabalho parlamentar, as oportunidades de ação unificada particularmente com a UDN e mais freqüentemente ainda com políticos independentes que participam em número crescente de nossas lutas em defesa da democracia. A união formal de nosso Partido com os da classe dominante é ainda difícil, dada a composição heterogênea desses últimos e devido às posições decisivas que em geral ainda ocupam em seus organismos dirigentes conhecidos reacionários, declaradamente anticomunistas. É o que explica, aliás a posição suicida de tais partidos, incapazes até agora de qualquer posição firme em defesa da democracia contra os arreganhos policiais e fascistas. Para as necessidades demagógicas basta a esses senhores continuar o ataque ao ditador deposto, silenciando e chegando mesmo a tentar justificar as brutalidades policiais da atualidade, a pretexto de evitar provocações ou então do já batido e desmoralizado «fantasma comunista». Foi assim que tanto a UDN como o PTB, pelos seus dirigentes, aproveitaram a chacina policial de 23 de Maio para dirigir novos ataques ao nosso Partido, pretextando defender a tese da capitulação diante da reação, sob pretexto de evitar provocações, mas na verdade insistindo no velho erro de uma tática desmoralizada que já levou aqui em nossa terra à vitória da reação em 10 de Novembro de 1937. Com partidos que assim procedem é realmente difícil qualquer unidade formal, pelo menos enquanto não se der a necessária depuração, enquanto os acontecimentos sob a pressão da luta de massas não levarem a uma mais nítida polarização de forças políticas, isto é, ao desmascaramento e final isolamento dos elementos mais reacionários, dos agentes do imperialismo, que em maior ou menor grau ainda exercem influência na direção dos diversos partidos políticos da classe dominante.

Essa união, no entanto, das forças, correntes e partidos políticos antifascistas será talvez mais fácil no âmbito estadual, especialmente agora com a aproximação das eleições às Assembléias Constituintes Estaduais e, caso também se realizem, as eleições de governadores de Estado. Nossos Comitês Estaduais devem nesse terreno ser capazes da maior iniciativa a par de grande flexibilidade política, de maneira a bem aproveitar a oportunidade para que novos e decisivos passos sejam dados no sentido da unificação das forças democráticas. O essencial é que essa unificação se faça de fato em defesa da democracia e em prol da solução prática e urgente dos problemas mais sentidos pelas grandes massas trabalhadoras.

Programa Mínimo de União Nacional

Chegamos assim ao nosso programa de União Nacional, ao programa mínimo e imediato de nosso Partido que visa a liquidação definitiva e total do fascismo e da quinta-coluna em nossa terra, simultaneamente com a luta sem desfalecimento pela instauração no País de um regime democrático e progressista. Para tanto, precisamos agora insistir na luta em defesa das conquistas democráticas ameaçadas pela camarilha fascista enquistada no governo. Nesse terreno não podemos ceder um passo sem resistência e sem protesto, por mais que devamos também estar alerta contra as provocações do inimigo.

Acatemos as decisões das autoridades, mas protestemos de maneira vigorosa contra as arbitrariedades policiais e particularmente contra as tentativas ilegais de impedir a livre atividade das organizações operárias e de nosso Partido.

A essa luta em defesa da democracia liga-se naturalmente a que devemos fazer por uma Constituição realmente democrática e progressista. O apoio de massas é nesse sentido indispensável aos representantes democráticos que na Assembléia Constituinte enfrentando os restos do fascismo e da ditadura na luta pela Carta Constitucional progressista que reclamam os maiores interesses da Nação.

A miséria crescente de nosso povo exige ainda a luta incessante e enérgica contra a fome, a carestia e a inflação. Precisamos insistir nas medidas já propostas por nosso Partido desde Agosto do ano passado. É certo no entanto, que outras medidas mais enérgicas já se vão tornando necessárias para resolver praticamente a crise que atravessamos. Nosso Partido que oferece seu apoio ao governo para ajudá-lo a encontrar uma saída progressista para a crise, indica desde Abril último a necessidade de organizar a produção e a distribuição, além de pedir a liquidação completa do segredo comercial a fim de controlar os lucros extraordinários e mostrar necessidade de nacionalizar os bancos, isto é, de entregar a Banco do Estado o monopólio do negócio bancário no país. Entre as medidas que temos proposto, assume, no entanto, importância cada vez maior a que se refere ao aumento já indispensável do salário nominal das grandes massas trabalhadoras. A luta por melhores salários é, no momento, a forma mais eficiente de que dispõe o proletariado para exigir do governo medidas práticas e imediatas contra a carestia e a inflação. O proletariado não pode morrer de fome e na verdade, na medida que lutar com energia por melhores salários, está de fato buscando uma saída pacífica para o descontentamento popular e desarmando os reacionários e fascistas que desejam o caos e a guerra civil, na esperança de liquidar o movimento operário e impedir a consolidação da democracia. Outra medida igualmente por nós proposta e que visa estimular a produção é a relativa à entrega de terras gratuitamente a famílias camponesas nas proximidades dos grandes centros de consumo e das vias de comunicação já existentes. A posse da terra é, sem dúvida, a grande e suprema reivindicação das massas camponesas, mas seria errôneo lançá-la isoladamente, isto é, sem ligá-la às reivindicações menos radicais, mais imediatas e capazes de trazer alguma melhoria aos camponeses em situação sempre difícil e dolorosa. Cabe aos organismos do Partido, estudar e levantar essas reivindicações que variam de Estado a Estado, de Município a Município e até de fazenda a fazenda. O que é certo é que à reivindicação programática pela livre posse da terra devemos juntar as outras por melhores condições de trabalho, melhores contratos de arrendamento, abolição de vales e barracões, pelo maior prazo nos contratos de arrendamento, pela garantia ao camponês de poder reformar os contratos para continuar na mesma terra, se assim lhe convier, pela liberdade de comércio, contra os impostos e fretes elevados, por crédito barato, etc., etc.

Nesse programa de União Nacional precisamos ainda insistir na luta pela paz, por uma atitude mais firme e consequentemente democrática do Brasil no Conselho de Segurança da ONU, pela ruptura de relações com Franco, por uma aproximação maior com a URSS, e todos os governos democratas, contra as guerras imperialistas, por uma política externa que assegure a paz no Continente e permita a livre expansão democrática e progressista da economia de todos os povos latino-americanos. Devemos aplaudir por isso a política externa do atual governo, nesse terreno, resistindo à pressão do imperialismo ianque e insistindo em manter relações diplomáticas com o antigo governo de Farrei—Perón e em convidar a Argentina para a Conferência Pan-Americana a realizar-se. No que toca ao projetado pacto do hemisfério, nossa opinião contrária já foi suficientemente exposta. Nosso Partido não pôde deixar de ser radicalmente contrário a quaisquer tentativas dessa natureza. Com o mesmo nome de política pan-americana, o que se tenta é uma completa inversão da política de «boa vizinhança» de Roosevelt. O bloco pan-americano proposto por Truman é contrário à colaboração das Nações Unidas, à manutenção da paz, portanto, e ao próprio interesse de defesa de nossa soberania e da integridade da pátria.

A defesa nacional exige o estudo prévio dos prováveis inimigos da integridade da Pátria e é bem claro que são os grandes banqueiros ingleses e americanos, por contarem com as forças das duas potências imperialistas, os que de fato nos ameaçam. E dos dois, é justamente o imperialismo ianque o mais perigoso no momento, não só pela sua crescente agressividade, como também por sua maior proximidade. Qualquer «pacto hemisférico» nestas condições, significaria na verdade a entrega do Brasil ao completo domínio do imperialismo ianque, de que passará a ser colônia e instrumento de agressão em suas aventuras nos países vizinhos. São traidores da Pátria os que em nome de uma suposta defesa continental de caráter eminentemente ofensivo, como teve ocasião de declarar o Ministro da Marinha, esquecem de fato a defesa do Brasil. Esse o motivo também da luta continuada e enérgica que devemos fazer contra a cessão em nosso território de bases militares ao imperialismo, pela retirada imediata das forças armadas norte-americanas que ainda pisam o solo brasileiro.

Foi com esse programa democrático e progressista, programa de paz e de luta contra o imperialismo que o nosso Partido se ligou às grandes massas para dirigi-las e impulsioná-las para frente. O nosso movimento de União Nacional avançou sem dúvida e não foram poucas as vitórias assinaladas, não só durante esse primeiro ano de legalidade do partido, como também nos últimos meses de luta contra as provocações fascistas. São de assinalar principalmente as grandes manifestações de Abril em comemoração do primeiro aniversário da anistia e nas quais centenas de milhares de pessoas, ao desagravar os dirigentes de nosso Partido, acusados de crime de traição por desmascararem os provocadores de guerra, os agentes guerreiros do imperialismo, deram ao mesmo tempo uma magnífica demonstração do grau de consciência política já alcançados, sem dúvida, do continuado e paciente trabalho de educação política de massas feito pelos comunistas através de suas organizações e das centenas de organismos de massas que ajudaram a fundar em todo o país, de norte a sul, de leste a oeste, nas cidades e no campo, organismos populares cuja vida alimentam com seu esforço e entusiasmo.

Ligar-se às Grandes Massas para Organizá-las

Essa mobilização de massas, no entanto, por maior que seja o vulto já realmente atingido, está longe ainda do desenvolvimento exigido pela situação do país e a gravidade dos problemas a resolver. Muito ainda nos resta fazer nesse terreno da organização das grandes massas populares, sem o que a União Nacional por que lutamos ficará reduzida a palavra no papel e a marcha no caminho da democracia poderá ser afinal barrada pelos remanescentes do fascismo ou pelos agentes do capital colonizador em nossa terra. Lutar pela União Nacional deve por isso significar para nós, antes e acima de tudo, não poupar esforços no sentido de organizar as mais amplas camadas sociais de nossa população a fim de atraí-las à vida política, à luta por suas reivindicações, à melhor compreensão dos perigos que a ameaçam. Nesse terreno o trabalho realizado pelos Comitês Democráticos e Populares merece especial menção e constitui, sem dúvida, o estudo aprofundado de sua vida e atividade, dos sucessos e insucessos, fonte inigualável de ensinamentos, onde os comunistas poderão aprender o que se deve fazer e o que não se deve fazer para alcançar a união das mais amplas camadas populares, elevar-lhes o nível político e mobilizá-las para a grande luta pela democracia em nossa terra. Muito, quase tudo mesmo, nos resta fazer ainda para mobilizar as grandes massas de jovens e mulheres, parcelas das mais sofredoras de nossa miserável população e por isso mesmo dotadas, como sabemos, de qualidades excepcionais de dedicação e entusiasmo, que sempre se revelam quando organizadas e bem dirigidas.

Nosso Partido começa a dar alguns passos práticos que não poderão deixar de ter significação histórica, no que diz respeito à organização das massas camponesas. A experiência do trabalho realizado entre os camponeses, especialmente em São Paulo, não deixará sem dúvida de ser revelada nesta Conferência, de que precisaremos sair armados para realizar, sem maior demora, a grande tarefa de organizar de fato as massas trabalhadoras do campo, a fim de que possam lutar com sucesso por suas reivindicações e iniciar com vigor a luta pela terra, contra os restos semifeudais que constituem a base econômica do fascismo em nossa Pátria.

Mas nessa luta pela União Nacional, através da organização de massas, destaca-se pela sua importância a organização sindical do proletariado. É pelo nível de desenvolvimento atingido pelas organizações operárias, pelo grau de sua participação na vida pública, que se avalia da vitalidade de qualquer democracia, e o movimento sindical brasileiro, pelo seu baixo nível, é bem um testemunho de nossa incipiente democracia. A consolidação da democracia exige de nossa parte, como vanguarda do proletariado, uma atenção maior pela organização sindical do operariado. As débeis organizações sindicais tuteladas pelo Ministério do Trabalho, corpos sem vida e em geral de nenhum interesse para o proletariado, precisam ser transformadas no menor prazo possível nas organizações de classe livres e soberanas, cônscias de seus direitos e deveres, instrumentos eficientes para a luta, capazes de realmente unir o proletariado e de dirigi-lo vitoriosamente nos embates decisivos contra seus exploradores.

Para isso é indispensável acelerar a sindicalização das grandes massas, empregar todos os recursos para convencê-las das necessidades de se filiar aos sindicatos para, de dentro deles, transformá-los naquilo que devem e realmente precisam ser para o proletariado.

Se não avançarmos rapidamente na organização sindical do proletariado, precária será a união nacional e praticamente impossível a consolidação da democracia.

A grande obra iniciada pelo MUT que tanto alarmou a reação determinando as medidas policiais já postas em prática e as novas e crescentes arbitrariedades do Ministério do Trabalho contra as direções sindicais mais eficientes, honestas e fieis aos interesses operários, precisa não só continuar, mas ganhar novo e acelerado ritmo, através da intensificação da, luta pela liberdade e autonomia sindical, pela independência do movimento operário, pela sua rápida unificação regional e nacional, pelo reforçamento e estreitamento dos laços políticos e orgânicos com o movimento operário independente da América do Norte e do mundo inteiro.

Precisamos sair desta Conferência dispostos a empreender uma campanha decisiva pela organização das mais amplas camadas sociais de nossa população, suficientemente armados para conseguir entrar em contato com as massas populares que se acham ainda distanciadas de nós, dispostos a vencer definitivamente os restos do sectarismo que tanto têm dificultado nosso empenho unitário, mais hábeis e flexíveis na busca e adoção de novas formas de organização, especialmente para as mulheres e os jovens, mais cuidadosos e pacientes no estudo das reivindicações realmente capazes de mobilizar as grandes massas camponesas e de levá-las à organização, mais ativos na luta pelos interesses mais imediatos do proletariado. Nesse sentido, a campanha eleitoral que se avizinha, se for por nós convenientemente utilizada, brindar-nos-á com a melhor oportunidade para alcançar sucessos decisivos na grande tarefa de organizar o povo para a luta em defesa da democracia e em prol do progresso do Brasil. Nesta Conferência devemos por isso fazer balanço aprofundado de nossa experiência eleitoral, das causas que nos levaram a vitórias e insucessos, dos erros e debilidades de nosso trabalho nas últimas eleições. As próximas eleições estaduais constituirão por isso um teste definitivo para todos os organismos de nosso Partido, dirão de sua atividade e muito especialmente de sua capacidade de se ligarem às grandes massas, do grau portanto de sua justa compreensão da linha política do Partido, dirão se os comunistas já conseguiram, enfim, romper com o sectarismo para se tornarem os verdadeiros dirigentes da massa que reclamam os interesses do Partido e da luta que dirige pela União Nacional, pela ampliação e consolidação da democracia em nossa terra.

A organização das mais amplas camadas sociais de nosso povo, acima de diferenças de classe, de crenças religiosas, de ideologias políticas, assegurará a União Nacional e a marcha para adiante no caminho da democracia. Será o povo organizado a grande força capaz de desbaratar os contra-ataques e as provocações dos remanescentes do fascismo combalidos e desesperados mas, por isso mesmo, cada vez mais agressivos e perigosos. A união «por baixo» das grandes massas trabalhadoras em seus locais de trabalho, nos sindicatos, nas ligas camponesas, nas associações diversas, nos bairros e ruas facilitará a obra política de aproximação dos partidos, a união «por cima» de seus dirigentes, não para cambalachos ou acordos reacionários, mas realmente para a luta em defesa da democracia e do progresso.

É aquela união «por baixo», a organização das grandes massas trabalhadoras, apesar do baixo nível em que ainda se encontram, muito aquém do reclamado pelo momento histórico que atravessamos, é justamente aquela união das mais amplas camadas populares a grande força que, dirigida pelo proletariado mais avançado, organizado em seu Partido de classe, tem na verdade conseguido desmascarar e bater as provocações fascistas dos últimos meses, e assegurado assim a marcha para adiante de nosso povo no caminho da democracia. Vitórias essas que criam por sua vez condições novas cada dia mais favoráveis à União Nacional de todos os brasileiros, desde o operário e o camponês até o patrão progressista, que sente a ameaça da concorrência imperialista, que almeja o progresso nacional; desde o analfabeto até o intelectual mais culto que chega a compreender a missão histórica do proletariado na sociedade capitalista; união enfim de todos, homens e mulheres, jovens e velhos, crentes ou não, de todas as classes ou ideologias políticas. É nesse processo de união que se desmascaram os reacionários, os anticomunistas de profissão que, em nome da defesa da democracia, aconselham ao povo a capitulação, a submissão, o ficar de braços cruzados, passivos e conformados, diante das arbitrariedades policiais e dos arreganhos fascistas.

A correlação de forças sociais no mundo continua favorável à democracia. Aqui em nossa terra a reação fascista dos últimos meses é bem um indício de fraqueza e desespero. Continuará sendo batida pelas forças da democracia se estas souberem se manter firmes e intransigentes, se bem que prudentes e tranqüilas, a fim de evitar provocações e choques violentos, e o caos e a guerra civil que só interessam ao fascismo.

«Foi assim, disse-o a C. E. em nota de 6 de Maio último, que vencemos até agora as provocações policiais e fascistas contra a legalidade de nosso Partido e será seguindo os mesmos preceitos, de forma cada vez mais consciente e organizada, que venceremos as vagas de provocações que ainda virão até a definitiva liquidação dos restos do fascismo e a garantia e consolidação da democracia em nossa Pátria».

III - O Nosso Partido

A luta de nosso povo pela paz, pela consolidação da democracia, pelo progresso do Brasil, e especialmente pela solução dos grandes problemas da revolução democrático-burguesa, exige cada vez mais o reforçamento político, ideológico e orgânico de nosso Partido. Sem Partido, vanguarda organizada da classe operária, impossível será não só a vitória da Revolução, como, desde logo, a derrota dos reacionários, dos inimigos internos e externos de nosso povo, a realização da União Nacional, a aplicação do programa imediato que reclamam os interesses nacionais.

Liquidar com o Sectarismo em Nossas Fileiras

Grandes foram as vitórias de nosso Partido durante esse ano de vida legal e evidente a confiança que nele depositam as grandes massas trabalhadoras. Graças principalmente à justeza de nossa linha política conseguimos despertar, organizar e atrair à vida política ativa as grandes massas até então desorganizadas e passivas. Nosso Partido manteve-se firme e audaz à frente das grandes massas trabalhadoras e soube, sem dúvida, dirigi-las sem vacilações, alcançando vitórias sucessivas no caminho da paz, da consolidação da democracia e da liquidação dos restos do fascismo no Brasil.

Por quase todo o país foi, sem dúvida, notável o crescimento quantitativo do Partido. Seus efetivos já são hoje muitas vezes superiores aos daquele pequeno Partido da ilegalidade e já não pode haver dúvida que marchamos sem retrocessos no caminho do grande Partido de massas reclamado pelo C. N. desde sua reunião plenária de Agosto de 1945. Não quer isto dizer, no entanto, que já tenham sido liquidados os restos de sectarismo em nossas fileiras, nem que já tenhamos conseguido fazer de nossos quadros dirigentes comunistas realmente na altura do Partido grande e legal, do «partido de novo tipo» reclamado pelos mais altos interesses de nosso povo e do progresso do Brasil.

São grandes os males causados ao Partido pelo sectarismo, pela auto-suficiência daqueles que se supõem senhores de toda a verdade e negam-se por isso a aprender na grande escola das massas. Sectários são os enfatuados, aqueles que vivem a bater no peito seu «glorioso» passado revolucionário, seus anos de prisão e os sofrimentos que não conhecem os novos, o homem comum e pacato, que só agora, como dizem eles, têm coragem de se aproximar do Partido.

Sectários são os que muitas vezes se negam ao trabalho atencioso e modesto e substituem o verdadeiro trabalho junto às massas pelo gesto ou pela pose revolucionária capaz de assustar as massas menos esclarecidas e ainda temerosas. Sectários são os que receiam o «abandono» da linha revolucionária», porque confundem «linha revolucionária» com «gesticulação» sem maior conteúdo, substituem a ação pela frase vazia. Sectários são os que supõem poder dirigir as massas pelos mesmos métodos com que se dirige um pequeno grupo dentro do partido. Sectários são os que não têm cabeça para pensar, que vivem a repetir as mesmas palavras de ordem, a mesma tática, os mesmos processos, que aceitam como modelos válidos para todos os casos. Sectários são os que pensam ganhar as massas com simples apelos de uma propaganda abstrata e formal, por incapacidade de levantar as reivindicações mais sentidas de cada setor ou camada social ou, então, de lutar por elas. Sectários são os que vivem preocupados com a sorte do Partido, descobrindo perigos por toda parte e por isso sempre contrários à política de massas ou de frente única.

Sectários são os que não aceitam na prática nossa atual linha política, que temem pelo futuro do Partido com a entrada em suas fileiras de tanta gente que não conhece o marxismo, de tanta gente ainda não provada na luta e que poderá amanhã, em momento decisivo, trair ao Partido. E daí o mal enorme que causam ao Partido com o seu sectarismo, dificultando a formação e a educação de novos quadros, a promoção aos postos de direção dos verdadeiros dirigentes de massas. Sectários, enfim, são os que não confiam no povo, em sua inexaurível força criadora e que se encontram assim em posição justamente oposta à do verdadeiro comunista, definido por Mao-Tse-Tung, como aquele que por confiar no povo a ele une suas forças e não conhece por isso nem dificuldades insuperáveis, nem inimigos invencíveis, torna-se, sim, invencível ele mesmo.

Acabar com o sectarismo em nossas fileiras é pois, tarefa precípua ao próprio crescimento quantitativo e qualitativo de nosso Partido.

Reforçar a Democracia Interna do Partido

E para tanto não dispomos de outro caminho senão o da prática da democracia interna, o da prática honesta e sincera, correta e séria, não tendenciosa nem superficial da crítica e da autocrítica bolchevique em todas as instâncias do Partido. A própria vida legal do Partido, sua linha política atual, exigem mais do que nunca a prática da democracia em suas fileiras. É esta uma condição essencial para o seu desenvolvimento, como aliás, de qualquer organização política popular. Bem sabemos que não é possível a existência de nosso Partido sem a mais completa unidade de vontade e ação dos seus membros, mas essa vontade comum, essa unidade de ação juntamente com a disciplina de ferro que faz nossa força, ao contrário de excluir, supõe e exige a crítica, a livre discussão, o choque de opiniões dentro do Partido. Nossa disciplina consciente e voluntária é inseparável, portanto, da verdadeira democracia, da livre discussão através da qual, se feita com profundidade e honestidade de propósitos, seria sempre possível descobrir as causas dos erros e dos insucessos, as raízes do sectarismo e do oportunismo, as quais, postas a nu, acabarão sempre por revelar a influência de ideologias estranhas ao proletariado, que, assim, descobertas, poderão ser mais facilmente eliminadas.

Que as bocas se abram pois, para acabar com o sectarismo, para assegurar ao Partido sua marcha para frente no caminho do grande Partido de massas que exigem os mais altos interesses de nosso povo e do progresso do Brasil.

Se soubermos acabar com o sectarismo em nossas fileiras verificaremos o quanto foi lento até agora o crescimento de nosso Partido. São dezenas e centenas de milhares de brasileiros de todas as classes sociais que ainda hoje buscam a organização política onde, como homens livres, possam realmente lutar contra a miséria crescente, contra o atraso e a ignorância, pela paz e a democracia. E não é esta a linha política do nosso Partido?

Que seja bem-vindo em nossas fileiras todo aquele que queira dar conosco um passo ao menos, no caminho da democracia. Quanto maior o número de membros do Partido mais fácil e rápida será a educação política das grandes massas e mais eficiente sua mobilização em defesa da paz e da democracia.

É indispensável, no entanto, que ao recrutamento se siga a real estruturação dos novos membros nos organismos do Partido, para que todos sintam desde logo a força da organização e recebam as tarefas capazes de interessá-los cada vez mais pelo Partido. Infelizmente, as debilidades orgânicas do Partido, já acentuadas pelo C. N. em sua reunião de Janeiro de 1946, ainda estão longe de ser liquidadas na maioria dos Estados e Territórios. É evidente que a estruturação orgânica do Partido não acompanha o ritmo do crescimento dos seus efetivos. A vida celular, com raras exceções, ainda deixa muito a desejar, o que dificulta sobremaneira qualquer trabalho de massas e torna praticamente impossível a direção dos movimentos grevistas, votados assim ao malogro, como se tem verificado ultimamente.

Nossos Comitês, dos Distritais até os Estaduais e Territoriais, e inclusive o Metropolitano, não estão em geral na altura das tarefas que deles exigem o Partido, o movimento operário e o nosso povo. Falta em geral capacidade de comando à maioria dos quadros mais velhos do Partido que não sabem também planificar o trabalho e organizar as secretarias, além de revelarem pouca audácia na promoção de novos quadros e falta de confiança na base do Partido. A própria estrutura orgânica do Partido não é muitas vezes conhecida, as circulares de organização não são realmente aplicadas, as comissões de organização dos Estaduais têm em geral vida precária e pouco ou.nada ajudam, assim, às secretarias de organização na tarefa de estruturar o Partido, de controlar a execução das tarefas, de selecionar os quadros e orientar sua formação e de assegurar as finanças indispensáveis à vida do partido.

As grandes debilidades já assinaladas na vida celular se manifestam em todos os trabalhos de massa, mas especialmente na atividade sindical, que continua muito aquém das necessidades do proletariado na hora que atravessamos, constituindo já no momento o ponto talvez mais fraco e perigoso de toda a atividade de nosso Partido.

Nossas células não dirigem ainda a atividade sindical de seus membros, e nos Comitês do Partido não se dá ainda ao trabalho sindical a importância que merece — erro dos mais graves que poderá arrastar o proletariado às mais sérias derrotas e que precisa ser corrigido com urgência a bem da consolidação da democracia e efetiva liquidação do fascismo em nossa terra. Só uma sólida organização sindical do proletariado poderá garantir a defesa da democracia e impedir a volta da reação fascista.

Cresce, sem dúvida, a influência de nosso Partido nos meios rurais e para ele se voltam em busca de apoio e orientação as grandes massas camponesas que sofrem cada vez mais com a agravação da crise. O ritmo de crescimento do Partido no campo não acompanha, no entanto, essa rápida evolução das condições objetivas e são poucos os CC. EE. que dedicam real atenção ao problema da construção do Partido nas zonas rurais, assim como ao da organização das grandes massas camponesas que constituem o aliado principal do proletariado na Revolução. Essa subestimação do trabalho no campo necessita ser vencida com rapidez e para isso será de grande importância tornar o quanto antes conhecida a experiência sobre trabalho realizado em São Paulo, Pernambuco, Ceará e Minas Gerais (Triângulo) onde já se fez algo de prático nesse terreno.

São grandes ainda as debilidades de todo o Partido em outros setores de seu trabalho de massa. Isso se deve, sem dúvida, como já ficou assinalado, à pouca vida e atividade das células do Partido, à maneira burocrática, mecânica ou esquelética com que as bases aplicam a linha política, ao sectarismo, à falta de iniciativa e à incapacidade de organização dos comunistas, especialmente dos responsáveis pela direção das células. Não cresce, como seria de desejar, o número de Comitês Populares e, estes, mesmo quando numerosos, em raras exceções são realmente organismos amplos de massa e de luta pelas reivindicações econômicas e políticas do bairro ou do local de trabalho. As mesmas debilidades se fazem sentir no trabalho de massas feminino e juvenil, malgrado o afluxo notável de mulheres e de jovens às fileiras do Partido. Ao que parece os jovens se fazem velhos ao entrar no Partido e as mulheres pouco ou nada se interessam no sentido de estudar as reivindicações mais sensíveis das mulheres não-comunistas e organizá-las para a luta.

As Tarefas de Propaganda e Educação

Entre as grandes tarefas do nosso Partido estão as da educação política de nosso povo e do proletariado, a da divulgação eficiente de nossa linha política e da elevação do nível ideológico e político de todo o Partido, e da formação e educação de quadros dirigentes na altura das necessidades crescentes.

Foi grande, sem dúvida, durante esse ano de vida legal, o crescimento de nossa imprensa, mas seu nível político ainda se conserva muito baixo, além de faltar-lhe com raras exceções, a necessária vivacidade e o indispensável conhecimento dos problemas locais ou regionais que não são em geral apreciados segundo uma justa aplicação de nossa linha política. A própria «Tribuna Popular» ainda não vive suficientemente os problemas de nosso povo e desconhece quase por completo os específicos do povo carioca. A atividade de nossas editoras precisa ainda ser melhor planificada e orientada segundo as reais necessidades de cada momento, segundo a linha política do Partido. E por parte de todos os organismos do Partido, dos CC. EE. às células, é indispensável encarar com mais seriedade o problema da indenização do material de divulgação que for sendo vendido.

Escolas do Partido, junto aos CC. EE., já se vão tornando necessárias, a exemplo do que vem fazendo a Comissão Executiva e grande atenção precisa ser dada por todo o Partido a uma programação séria de cursos rápidos e práticos por meio de palestras e conferências. A formação e educação de dirigentes estaduais exige a maior atenção da Comissão executiva e sua secretaria especializada.

Quanto à formação e educação de novos quadros, é tarefa das mais importantes no momento e cujo atraso precisa ser vencido com energia, decisão e audácia. O crescimento numérico do Partido exige cada vez mais novos quadros dirigentes, e a própria situação objetiva, com o evidente aprofundamento dos choques de classes no país, está também a reclamar à frente de todo o Partido, de seus Comitês Estaduais e Municipais, de suas células mais importantes, homens firmes, comunistas conscientes, capazes de se orientar sozinhos, de isolados, aplicar a linha do Partido, em condições enfim, de sentir, compreender ou resistir a qualquer viragem.

As condições objetivas, exigem, enfim, que melhore com rapidez o nível político e ideológico de todo o Partido. O próprio crescimento do Partido vai depender cada vez mais da justa aplicação pelos organismos de base da linha política, condição primeira de todo trabalho de massas, assim como da capacidade de organização dos comunistas.

A Necessidade de Direções Firmes e o Reforçamento da Luta Pela União Nacional

Especialmente à frente dos CC. EE. e Metropolitano, são cada vez mais necessárias direções firmes e enérgicas que compreendam com nitidez o caráter da Revolução no Brasil, conhecedoras de todos os problemas econômicos, sociais e políticos da respectiva circunscrição, politicamente experientes, capazes enfim de dirigir o Partido sozinhos, sem vacilações e de fazerem com os diversos Partidos e correntes políticas os necessários entendimentos em todos os terrenos, particularmente no eleitoral, nas eleições se avizinham.

Precisamos, enfim, de um Partido capaz de lutar conscientemente pela União Nacional, a mais ampla e sólida, a União nacional que reclamam os reais interesses de nosso povo, União para o progresso, contra a reação e o fascismo, união sob a hegemonia do proletariado e não a falsa união dos oportunistas e liquidacionistas que desejam colocar o proletariado a reboque da burguesia e a serviço dos demagogos «salvadores» e dos generais golpistas. Contra os manejos dos reacionários, só a ação unida de todos os patriotas, poderá assegurar a marcha para o progresso e a consolidação da democracia. União Nacional sob a hegemonia do proletariado capaz de lutar pela solução pacífica dos grandes problemas nacionais, mas firme e enérgica em defesa da democracia.

Camaradas!

Desta Conferência devemos todos sair com uma clara e nítida consciência da linha política de nosso Partido. Daqui havemos de sair perfeitamente convencidos da justeza dessa linha política e em condições de aplicá-la sem vacilações e de transmiti-la a todo o Partido com clareza e precisão. Daqui devemos sair cônscios de nossas responsabilidades e prontos a aplicar sozinhos, onde quer que nos encontremos, sejam quais forem as dificuldades, a linha política do Partido às condições específicas de cada lugar e momento.

Desta conferência devemos todos sair dispostos a melhor organizar o Partido, e dele fazer a arma poderosa, bem ligada às grandes massas operárias e populares, o instrumento capaz de assegurar a marcha de nosso povo ao caminho da democracia e do progresso.

Trabalhemos, pois, camaradas!
E lutemos sem desfalecimento em defesa da democracia!
Pela Independência do Brasil!
Por uma Constituição Democrática e Progressista!
Por um Governo de confiança nacional!
Por uma grande e poderosa CGTB!
Viva a união democrática dos povos do Continente!


Inclusão 28/09/2011