As Lutas dos Moradores e a Constituição de 1976

Amadeu Lopes Sabino, Saúl Nunes, e Luis Felipe Sabino

1977


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ANEXO II

COMUNICADO N.º 9 DA COMISSÃO DE MORADORES DA QUINTA DOS CEDROS

No interesse de uma ampla informação de todos os moradores deste bairro em particular e de todos os habitantes de Linda-a-Velha em geral vem a comissão de moradores informar o seguinte:

Realizou-se no passado dia 28 de Julho uma reunião da comissão de moradores em que estiveram presentes a grande maioria dos moradores em luta e ainda dois advogados da Associação de Inquilinos Lisbonenses que têm acompanhado o nosso processo de luta contra a especulação das rendas de casa. Nessa reunião os moradores foram informados pelos advogados que estavam esgotadas todas as possibilidades judiciais dos processos em tribunal, dado que o Tribunal da Relação de Lisboa tinha confirmado as sentenças de despejo decretadas pelo tribunail de Oeiras.

Face a esta situação ficou decidido marcar um plenário de moradores com vista a tomar decisões sobre a luta, tendo ficado aprovado a data de 30 de Julho. Como compareceram poucos moradores, o plenário não se realizou em virtude de este não poder ser deliberativo para as decisões que se tomassem. Assim, tornou-se a marcar um outro plenário para o dia 6 de Agosto, ao qual foi dada publicidade à semelhança do que já se tinha feito para o anterior. Mais uma vez o plenário não se realizou em virtude de este não poder ser deliberativo para as decisões que se tomassem. Assim, tornou-se a marcar um outro plenário para o dia 6 de Agosto, ao qual foi dada publicidade à semelhança do que já se tinha feito para o anterior. Mais uma vez o plenário não se realizou por falta de comparência de grande número de moradores.

Nestas circunstâncias e postos perante as informações dos advogados, os lotes 14, 15, 16, 17, 18 reuniram com os seus delegados de lote, e dado que a forma de luta adoptada estava nitidamente a voltar-se contra os moradores, resolveram pois, sem no entanto abdicarem de lutar pela redução das rendas de casa, resolveram, dizia-se, contactar com os senhorios, pagando a renda contratual e o atrasado, em prestações que vão até ao fim do ano.

É evidente que a mesma legislação que permite 111 a libertação dos criminosos da PIDE bem como a dos indivíduos implicados em intentonas reaccionárias, não pode servir os interesses dos moradores; serve sim os interesses dos senhorios e principalmente dos construtores capitalistas que se aproveitam da conciliação, e não só, das entidades governamentais, para levarem a cabo os seus planos de restauração das suas «antigas liberdades». É assim que só no mês de Junho as rendas no distrito de Lisboa aumentaram de 3,3%, o que perfaz em 12 meses a quantia de 39,2% de aumento; é assim aliás que em Carnaxide já pedem por duas casas assolhadas a «módica» quantia de 3.900$00. Até agora não se viu que o 1.º Governo constitucional tenha publicado legislação que ponha cobro a este estado de coisas, mas fala já o Ministro da Habitação em descongelar as rendas de casa.

Foi este o motivo que levou estes moradores a tomarem a decisão de contactar com os senhorios e a determinar que a comissão não tenha outra alternativa para a resolução deste problema. Nesse sentido devem pois os lotes ainda em luta reunir e, através do seu delegado de lote, resolverem o problema contactando com os senhorios.

Esta mesma solução é também aplicada para os moradores com processo em tribunal, chamando a Comissão a atenção dos moradores para que, organizados na nossa Comissão, se leve a cabo uma ampla campanha de mobilização da população 112 de Linda-a-Velha para impedirem eventuais despejos que possam vir a ter lugar, bem como para a recolha de fundos necessários para ajudar a pagar parte das custas dos processos em tribunal. Os moradores poderão consultar todas as informações referentes a estes processos na sede da Comissão.

A conciliação dos governos provisórios não permitiu a aplicação de legislação imediata que proibisse os despejos até à revogação da legislação do arrendamento urbano. Este governo promete (?) a revogação desse código, bem como a participação burocrática, através de legislação das comissões de moradores, na resolução do problema habitacional local. Vejamos...

Ora todas estas questões implicam a participação através da discussão democrática de todos os moradores deste bairro. É pois dever de todos os moradores participarem activamente no trabalho da Comissão de Moradores tendo em vista a resolução de alguns dos problemas do bairro. Se já conseguimos a luz, o alcatroamento do bairro, os caixotes do lixo, etc. porque não agora um parque infantil, uma cooperativa de consumo, um infantário? Tudo isto só poderá avançar se todos os moradores participarem nas reuniões das sextas-feiras, na sede da Comissão de Moradores.

Linda-a-Velha, 19 de Agosto de 1976

A COMISSÃO DE MORADORES DA QUINTA DOS CEDROS


Inclusão: 24/04/2020