O PCP e a Luta pela Reforma Agrária

Partido Comunista Português


REALIZAR A REFORMA AGRÁRIA ENTREGANDO A TERRA A QUEM A TRABALHA
Programa do P.C.P.


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[In Programa do PCP, aprovado no VII Congresso (Extraordinário), 20 de Outubro de 1974]

Apesar das contradições existentes entre os monopólios industriais e bancários e os grandes agrários (quanto aos preços dos produtos agrícolas e dos produtos industriais, quanto à posse das «indústrias subsidiárias da agricultura», quanto ao crédito, etc.), estes ligaram-se intimamente ao capital financeiro.

A política do governo fascista na agricultura foi sempre a política de defesa dos interesses dos latifundiários e dos grandes capitalistas contra as restantes classes laboriosas dos campos.

Os baixos salários e o desemprego durante grande parte do ano tornaram cada vez maior a miséria dos assalariados rurais. A fixação de preços não compensadores aos pequenos agricultores; a atribuição da direcção do mercado e dos preços dos produtos agrícolas aos grandes senhores da terra que estavam instalados nos Grémios, Juntas e Federações; o peso esmagador dos impostos; os empréstimos usurários que muitas vezes dão lugar à expropriação das terras; a situação desvantajosa e a inferioridade dos pequenos agricultores no que respeita a máquinas, a gado, a adubos, a técnica e a crédito — colocam a pequena lavoura na impossibilidade de concorrer com a grande e provocam inexoravelmente a sua ruína e liquidação. Centenas de milhares de pequenas explorações agrícolas desaparecem no tempo da ditadura fascistas. A proletarização dos pequenos agricultores verifica-se rapidamente.

A situação de miséria e de dificuldade das classes laboriosas dos campos resulta, em larga medida, da divisão da propriedade existente. No conjunto nacional, enquanto grandes senhores da terra possuem milhares e mesmo dezenas de milhar de hectares, meio milhão de assalariados agrícolas não têm um palmo de terra e cerca de trezentos mil pequenos agricultores têm terra insuficiente (por vezes dispersa em muitas minúsculas courelas) para prover ao sustento das respectivas famílias. Há grandes proprietários que têm mais terra que dezenas de milhares de pequenos agricultores tomados em conjunto. As 2600 maiores explorações agrícolas (3% no total das explorações) detêm mais terras do que as 780 000 menores (97% do total das explorações).

O país encontra-se dividido em duas grandes zonas diferenciadas onde existem apenas algumas regiões discordantes: predomínio da muito grande propriedade no Sul, predomínio da pequena propriedade no Norte. Mas, mesmo na zona Norte, com a expropriação dos pequenos produtores, a situação evolui para o predomínio de grandes proprietários de pequenos prédios que cultivam estes directamente ou os dão de renda e parceria.

Os pequenos proprietários, em vias de ruína e de proletarização, são confinados numa superfície agrícola cada vez mais reduzida. A concentração da propriedade continua a acentuar-se.

Com o «emparcelamento» nas regiões de pequena propriedade, os grandes lavradores têm pretendido arrebatar as melhores terras aos pequenos proprietários, centralizá-las nas suas mãos e criar explorações agrícolas de maior dimensão e mais rentáveis.

Com o «parcelamento» e a «colonização» nas regiões de latifúndio, facilitando a criação de pequenas explorações insuficientes para manter os que nelas trabalham, os grandes agrários têm pretendido, além da criação de uma classe-tampão entre os grandes lavradores e os proletários, atrair e fixar mão-de-obra a baixo preço junto dos atrasados latifúndios, hoje sujeitos a cultura extensiva, e transformar estes em grandes explorações capitalistas com maiores investimentos de capital e mais altos rendimentos.

Com o «repovoamento florestal» no Norte, o governo fascista arrebatou numerosos baldios ao uso dos pequenos cultivadores e apressou a sua ruína. Com a «reconversão agrária» no Sul, o governo fascista pretendeu entregar o monopólio da cultura de trigo aos grandes lavradores, consumar a liquidação da pequena lavoura, sacrificar a cultura cerealífera ao fornecimento de madeira como matéria-prima a monopólios industriais portugueses e estrangeiros.

Com as «leis de arrendamento» no tempo da ditadura estabeleceram-se prazos mínimos, suficientes para incitar o pequeno rendeiro a fazer melhoramentos, mas insuficientes para poder tirar deles os benefícios.

A política fascista conduziu a agricultura a uma crise sem precedentes, de que os grandes agrários procuravam sempre sair sacrificando ainda mais o proletariado rural e os pequenos e médios agricultores. Em resultado desta crise, o país tornou-se cada vez mais dependente da importação dos produtos agrícolas do estrangeiro.

O capitalismo desenvolveu-se rapidamente nos campos. Apesar do atraso geral da agricultura e das sobrevivências de formas semifeudais de exploração (parcerias, rendas por quotas parciárias, pagamento em géneros, etc.), as relações capitalistas de produção predominam já largamente. Os assalariados rurais constituem quase dois terços da população agrícola activa.

O desenvolvimento do capitalismo na agricultura representa o agravamento da situação da população trabalhadora: baixos salários e desemprego durante grande parte do ano para os assalariados; ruína, miséria e expropriação para os pequenos agricultores. Esta situação leva todos os anos muitas dezenas de milhar de proletários rurais e pequenos agricultores arruinados a procurarem trabalho nas cidades ou a emigrarem para o estrangeiro.

Nada fazendo para minorar a difícil situação da população trabalhadora nos campos, o governo fascista votou aldeias ao abandono. Faltam habitações condignas, caminhos, água, luz, assistência médica, escolas, etc.

Não é possível a construção de um regime democrático em Portugal sem alterar radicalmente a política agrária, sem eliminar o domínio da agricultura pelos grandes agrários, sem entregar grande parte da terra cultivável (hoje nas mãos de um pequeno grupo parasitário) a quem a trabalha.

A realização da Reforma Agrária e de uma política agrária que defenda os interesses da população laboriosa dos campos é um objectivo central da revolução democrática e nacional.

Para atingir este objectivo, são fundamentais as seguintes medidas:

  1. — Expropriação dos grandes latifúndios e das grandes explorações agrícolas capitalistas, cujas dimensões para efeito de expropriação serão determinadas por lei, tendo em conta a natureza do terreno, os tipos de cultura, o valor do produto e o peso relativo das várias camadas do campesinato em cada região. Em todos os outros casos, respeito pela propriedade privada da terra.
  2. — Entrega aos assalariados rurais e aos camponeses pobres (proprietários, rendeiros e parceiros) das terras expropriadas. Divisão e distribuição, nuns casos, da terra para ser explorada individualmente ou em cooperativas e estabelecimento, noutros casos, da exploração directa pelo Estado, tendo em conta a vontade das massas camponesas.
  3. — Elevação dos salários e garantia de trabalho para os assalariados rurais, tornando-lhes extensivas as conquistas sociais do proletariado industrial. Jornada de 8 horas.
  4. — Extinção de formas semifeudais de exploração, como foros e parcerias nas suas diversas modalidades, e entrega àqueles que a trabalham e a título de propriedade plena das terras presentemente exploradas em tal regime. Reforma do regime de arrendamento. Anulação das dívidas usurárias.
  5. — Restituição ao uso dos povos respectivos das terras baldias e outras usurpadas pelo Estado fascista e grandes agrários.
  6. — Auxílio do Estado aos pequenos agricultores, estimulando a formação e desenvolvimento de cooperativas agrícolas, concedendo créditos a juro módico, fornecendo máquinas em boas condições e sementes e gados melhorados, facilitando seguros e a aquisição e transporte de adubos, insecticidas e fungicidas, prestando assistência técnica e autorizando a instalação de indústrias subsidiárias para laborar os produtos agrícolas das próprias cooperativas.
  7. — Melhoramento das condições gerais de vida nas aldeias pela electrificação, construção de estradas e escolas, abastecimento de água, instalação de postos médicos, etc.
  8. — Desenvolvimento da indústria de adubos químicos e máquinas agrícolas, realização de obras de rega, electrificação rural, fomento pecuário, florestação, defesa da natureza, melhoramento das vias e meios de transporte, construção de silos, adegas e lagares e criação de parques de tractores e máquinas agrícolas, para utilização em boas condições pelas cooperativas e pelos agricultores individuais.
  9. — Liquidação da especulação, do parasitismo comercial e dos monopólios de compra, de distribuição e venda de produtos agrícolas, pecuários e florestais pelos grandes industriais e pelos grandes agrários. Liquidação completa dos Grémios, Federações e Juntas. Reorganização do aparelho comercial dos produtos agrícolas, pecuários e florestais na base da colaboração do Estado com as cooperativas de agricultores, de forma a garantir preços remuneradores aos produtores sem sobrecarga dos consumidores.
  10. — Alargamento das isenções de impostos aos camponeses pobres, estabelecimento de um sistema progressivo da contribuição predial rústica e dos rendimentos reais da exploração agrária, segundo o princípio: «paga mais quem mais tiver».

Com a realização da Reforma Agrária só terão a perder os latifundiários e grandes capitalistas e terá a ganhar toda a população trabalhadora dos campos.

A realização da Reforma Agrária e de outras medidas que beneficiarão directamente os proletários rurais e a grande maioria dos camponeses permitirá elevar o seu nível de vida, salvar da miséria e da ruína os pequenos agricultores e transformar a atrasada agricultura portuguesa numa agricultura progressiva e florescente, base indispensável de uma vida desafogada para todos os portugueses e de uma economia nacional próspera e independente. Permitirá também eliminar o poder dos latifundiários e grandes capitalistas da agricultura, que constituem uma base social da reacção e do fascismo.

continua>>>
Inclusão 29/05/2019