Sobre o Partido Comunista da Polônia(1)

J. V. Stálin

3 de julho de 1924


Primeira Edição: Discurso pronunciado na reunião da Comissão Polonesa da Internacional Comunista(2) realizada a 3 de julho de 1924.
Fonte: Problemas - Revista Mensal de Cultura Política nº 58 - Junho de 1954.
Transcrição e HTML: Fernando A. S. Araújo, Outubro 2008.
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CAMARADAS!

Não tenho material suficiente para falar com a firmeza com que se manifestaram aqui alguns oradores. Não obstante, na base dos materiais que consegui entretanto colher, e na base dos debates que aqui se verificaram, formei uma opinião definida, que desejaria transmitir-vos.

Não há dúvida de que o Partido Comunista da Polônia passa por uma situação anormal. É fato que no Partido da Polônia há uma crise. Isso foi reconhecido por Valetski, e vós todos também o reconhecestes; isso está patente, uma vez que aqui se constatou uma discórdia dentro do Partido da Polônia entre dirigentes práticos que são membros do C. C. e os líderes do C. C.. Há mais. O próprio Comitê Central do Partido da Polônia, nos plenos que realizou em dezembro do ano passado e em março deste ano, reconheceu, em suas resoluções, o caráter oportunista de toda uma série de suas ações, e as condenou sem rodeios. Parece que nada mais há a acrescentar Tudo isso comprova — repito — que inegavelmente existe uma crise no Partido Comunista da Polônia.

Onde está a causa dessa crise?

A causa está em alguns pecados oportunistas na atividade prática dos lideres oficiais do Partido Comunista da Polônia.

Permiti que cite alguns exemplos que comprovam essa situação.

A QUESTÃO «RUSSA» — Alguns camaradas poloneses afirmam que essa questão, como questão de política externa, não tem séria significação para o Partido da Polônia. Isso não é verdade. A questão «russa» possui decisiva significação para todo o movimento revolucionário, tanto no Ocidente como no Oriente. Por que? Porque o Poder Soviético na Rússia é a base, o baluarte, o refúgio do movimento revolucionário de todo o mundo. E se nessa base — isto é: na Rússia — o Partido e o poder começassem, a vacilar, isso significaria que todo o movimento revolucionário no mundo inteiro sofreria profundo abalo.

Por ocasião dos debates que entre nós se travaram no P.C. (b) da URSS, verificaram-se vacilações no Partido. A oposição, fundamentalmente oportunista, orientou sua luta contra o Partido no sentido de abalá-lo e enfraquecê-lo — isto é: no sentido de enfraquecer o próprio Poder Soviético, porque nosso Partido é um Partido governante e é o princípio dirigente básico do poder estatal. É natural que as vacilações dentro do P.C. (b) da Rússia poderiam levar, no futuro, a vacilações e ao enfraquecimento do próprio Poder Soviético. Por sua vez, as vacilações do Poder Soviético significariam um dano para o movimento revolucionário em todo o mundo. Justamente por isso é que divergências dentro do P.C. (b) da Rússia e, em geral, a sorte do mesmo não podem deixar de ter relação direta com os destinos do movimento revolucionário de outros países. Por esse motivo é que, embora constituindo uma questão externa para a Polônia, a questão «russa» é um problema de primacial importância para todos os Partidos Comunistas inclusive para o Partido Comunista da Polônia.

Assim sendo, como os chefes do Partido da Polônia consideraram a questão «russa»? A quem apoiaram? — a oposição oportunista?, ou a maioria revolucionária do P.C. (b) da Rússia? Para mim é claro que no primeiro período da luta dentro do P. C. (b) da Rússia, da luta contra a oposição oportunista, os chefes do Partido da Polônia apoiaram inequivocamente essa oposição. Não vou perscrutar a alma de Varski ou de Valetski; é-me indiferente o que pensava Varski quando redigiu a conhecida resolução do C.C. do P.C. da Polônia a favor da oposição do P. C. (b) da Rússia. Para mim têm importância, antes de tudo, não as intenções das pessoas, mas os resultados objetivos dessa resolução. Quanto a seus resultados objetivos, a resolução leva água ao moinho da oposição. Essa resolução foi um apoio à ala oportunista do P. C. (b) da Rússia. Nisso está toda a questão. No período em que o C.C. do Partido da Polônia tomou essa resolução e a enviou ao C.C. do P.C. (b) da Rússia, representava ele a secção polonesa da oposição oportunista do P.C. (b) da Rússia. Se considerarmos que a oposição no P.C. (b) da Rússia era uma espécie de firma que devia possuir filiais em diversos países, o P.C. da Polônia era então a filial polonesa dessa firma. Nisso se encontra a essência do pecado cometido pelos líderes do Partido da Polônia no tocante à questão «russa». É triste, mas se trata, infelizmente, de um fato.

A QUESTÃO ALEMÃ — Após a questão «russa>, esta questão tem a mais séria significação; em primeiro lugar porque de todos os países europeus é a Alemanha o que está mais maduro para a revolução, e em segundo lugar porque a vitória da revolução na Alemanha é a vitória da revolução em toda a Europa. Se em algum lugar deve começar a explosão revolucionária da Europa, esse lugar é a Alemanha. Só a Alemanha pode tomar a iniciativa nesse sentido, e a vitória da revolução na Alemanha representa a garantia da vitória da revolução mundial.

Todos sabemos que no ano passado se travou no Partido Comunista da Alemanha uma luta entre sua maioria revolucionária e sua minoria oportunista. Todos sabemos até que ponto é grande a significação da vitória da ala esquerda ou da ala direita do Partido Comunista da Alemanha para toda a marcha da revolução mundial. E que se verificou? Nessa luta, a quem os líderes do C.C. do Partido Comunista da Polônia apoiaram? Apoiaram o grupo de Brandler(3) contra a maioria revolucionária do Partido Comunista da Alemanha. É o que agora todos reconhecem — tanto os amigos, como os inimigos. Aconteceu o mesmo que ocorreu com a questão «russa». Se supuséssemos a existência, na Alemanha, de certa firma constituída pela oposição oportunista no Partido Comunista, os líderes poloneses representariam então a filial polonesa dessa firma. E triste, mas contra os fatos nada se pode fazer: temos de reconhecê-los.

O MÉTODO DE LUTA CONTRA A OPOSIÇÃO OPORTUNISTA — Kostrjiéva afirma que eles — isto é: os líderes do C. C. polonês — são, no fundo, a favor do C. C. russo e, talvez, a favor do C.C. alemão em sua composição atual, mas que divergem dessas instituições quanto à questão dos métodos de luta contra a oposição. Como vedes, exigem métodos brandos de luta contra a oposição. São pela guerra contra a oposição, mas por uma guerra que não cause vitimas. Valetski chegou até a exclamar: «Perdão, somos pelo triunvirato!». Devo dizer que ninguém exige que Valetski diga amém a tudo aquilo que faça o C.C. russo. Não sei, aliás, que espécie de «triunvirato» é esse que Valetski tanto apóia.

Esqueceu-se de que ninguém é obrigado a apoiar em tudo o C.C. russo. (Valetski intervém: «Não sou obrigado, mas posso») É evidente que podeis, mas é preciso que se compreenda que uma tal conduta coloca em situação desagradável tanto Valetski como o C.C. russo. O problema não está em se dizer amém, mas em que na Rússia, nas condições da N.E.P., surgiu uma nova burguesia que, não tendo possibilidade de se manifestar abertamente na arena política, se esforça em romper de dentro a frente do comunismo, procurando seus heróis entre os lideres do P.C. (b) da Rússia. Pois bem: justamente essa circunstância é que provoca a formação de tendências oposicionistas dentro do P.C.(b) da Rússia, criando um campo favorável ao desvio oportunista. O problema, portanto, reside em que os Partidos irmãos definam sua atitude sobre essa circunstância e tomem uma posição definida. Aí — repito — é onde está a questão; não em se dizer amém ao C.C. russo.

Quanto ao método suave que Kostrjiéva propõe, devo dizer que não resiste à menor crítica. Kostrjiéva é pela luta contra a oposição oportunista, mas por uma luta que não provoque o descrédito dos líderes da oposição. Em primeiro lugar, porém, a História não conhece uma luta que não haja causado algumas vítimas. Em segundo lugar, é impossível vencer a oposição quando não se leva em conta que a vitória acarreta o solapamento da autoridade dos líderes da oposição; de outra forma, teríamos que nos abster de qualquer luta contra a oposição. Em terceiro lugar, uma vitória integral sobre a oposição é a garantia única contra a cisão. A prática partidária não conhece outras garantias; é prova disso toda a história do P C (b) da Rússia.

Já no período de pré-guerra, a social-democracia alemã, quando ainda era ortodoxa, travou luta contra o oportunismo com o mesmo método suave de que Kostrjiéva fala aqui. Com isso, obteve apenas a vitória do oportunismo e tornou inevitável a cisão.

O P. C. (b) da Rússia travou luta contra o oportunismo empregando o método do isolamento decisivo dos lideres oportunistas e conseguiu que o marxismo revolucionário vencesse e o Partido adquirisse uma extraordinária coesão.

Penso que as lições que o P.C. (b) da Rússia nos dá, devem ser instrutivas para nós. O método de luta recomendado por Kostrjiéva não passa de um vômito do oportunismo social-democrático. Traz em si o perigo de cisão no Partido.

FINALMENTE O PROBLEMA DA DIREÇÃO PARTIDÁRIA — Onde está o traço que caracteriza o desenvolvimento dos Partidos Comunistas do Ocidente no momento atual? Está no fato de esses Partidos abordarem a fundo o problema da reorganização do trabalho partidário sob um novo aspecto — o revolucionário. Não se trata de aceitar um programa comunista e de proferir palavras-de-ordem revolucionárias. Trata-se da reorganização do trabalho diário do Partido, de sua atividade no sentido de que cada passo do Partido e cada uma de suas ações levem, naturalmente, à educação revolucionária das massas, à preparação da revolução. Aí reside — no momento presente — a essência do problema, e não na aprovação de diretivas revolucionárias.

Prukhniak leu ontem aqui toda uma série de resoluções revolucionárias aprovadas pelos líderes do C. C. polonês.

Leu essas resoluções com ar vitorioso, supondo que a direção no Partido se limita à elaboração de resoluções. Não lhe vem à mente que a elaboração de resoluções é apenas o primeiro passo, o início do trabalho de direção no Partido. Não compreende que a base da direção consiste não na elaboração de resoluções, mas em seu cumprimento, em sua execução prática. Em vista disso, em seu longo discurso esqueceu-se de nos informar sobre o destino dessas resoluções; não considerou necessário comunicar se essas resoluções foram cumpridas, e em que medida, precisamente, foram postas em prática pelo Partido Comunista da Polônia. Entretanto, é justamente no cumprimento das resoluções e diretivas que se encontra a essência do trabalho de direção partidária. Contemplando Prukhniak, lembrei-me de um funcionário soviético comum que responde a um inquérito da Comissão de Revisão. «Foi cumprida qualquer diretiva?» — pergunta a Comissão de Revisão. «Foram tomadas providências!» — responde o funcionário. «Que providências foram essas?» — pergunta a Comissão de Revisão. «Demos ordens!» — responde o funcionário. A Comissão de Revisão exige um documento. Com ar vitorioso o funcionário apresenta uma cópia da ordem. A Comissão de Revisão pergunta: «E que fim teve a ordem? — foi cumprida?; precisamente quando?». O funcionário arregala os olhos e declara: "Ainda não recebemos informações.". A Comissão de Revisão — é evidente — chama esse funcionário à responsabilidade. Justamente dessa espécie de funcionário soviético foi que Prukhniak me fez lembrar quando lia, aqui, com ar vitorioso, resoluções revolucionárias sobre cuja execução «não recebeu informações». Isso não é dirigir um Partido, mas uma farsa de direção. Quais são as conclusões?

Chega-se às seguintes conclusões:

Primeiro — Sou decisivamente contrário a que na próxima discussão partidária na Polônia se estabeleça um divisor-de-águas entre o ex-Partido Socialista da Polônia e a ex-Social-Democracia Polonesa. Isso seria perigoso para o Partido. O ex-Partido Socialista da Polônia e a ex-Social-Democracia Polonesa há muito que se fundiram em um só partido, lutam em comum contra os latifundiários e a burguesia poloneses, e dividi-los agora, novamente, em suas duas antigas partes seria cometer o mais profundo erro. A luta deve ser travada não de conformidade com a velha orientação do P.S.P. e da S.D.P., mas de conformidade com a nova orientação de isolamento da ala oportunista do Partido Comunista da Polônia. Na completa vitória sobre a ala oportunista é que se encontra a garantia contra a cisão, e o penhor da coesão do Partido.

Segundo — Sou decididamente contrário à chamada mutilação — isto é: sou contrário a que sejam afastados do C.C. alguns de seus membros. Em geral sou contrário a que se mutile o C. C. por iniciativa de cima. Devemos ter em mente que, em geral, uma operação cirúrgica realizada sem uma necessidade particular deixa no Partido um mau sedimento. Que o próprio Partido Comunista da Polônia reorganize seu C.C. em seu próximo Congresso ou Conferência. Não é admissível que não surjam novos chefes em um Partido em crescimento.

Terceiro — Presumo que as propostas práticas apresentadas por Unchlikt são inteiramente justas. Seria de todo racional que se elegesse um único centro político e prático, constituído de membros do atual C.C. polonês, em vez do Bureau de Organização e do Bureau Político, que se separaram um do outro.

Manifestaram-se aqui dúvidas com relação aos conhecimentos teóricos e à experiência partidária dos novos líderes que a luta revolucionária na Polônia fez surgir. Penso que essa circunstância não pode ter uma significação decisiva. Houve casos no P.C. (b) da Rússia em que à frente de imensas organizações provinciais se encontravam operários portadores de uma insuficiente bagagem teórica e política. Entretanto, esses operários se revelaram líderes melhores do que muitos intelectuais privados da necessária sagacidade revolucionária. É inteiramente possível que nos primeiros tempos as coisas não venham a andar de todo harmoniosamente no que se refere aos novos lideres, mas isso não constitui uma desgraça, pois se tropeça a primeira e uma segunda vez, mas depois se aprende a dirigir o movimento revolucionário. Jamais caem do céu líderes consumados. Somente no decurso da luta é que eles se formam.


Notas de rodapé:

(1) O MIA também possui este mesmo texto conforme publicado nas Obras de Stálin editadas pela Editorial Vitória. (retornar ao texto)

(2) A Comissão Polonesa foi formada no V Congresso do Komintern, realizado em Moscou de 17 de junho á 8 de julho de 1924. J. V. Stálin foi membro das Comissões mais importantes do Congresso e Presidente da Comissão Polonesa. A resolução sobre a questão polonesa proposta pela Comissão foi aprovada unanimemente na primeira sessão do Pleno Ampliado do Comitê Executivo do Komintern, a 12 de julho de 1924. (retornar ao texto)

(3) — O grupo de Brandler foi um grupo oportunista de direita no Partido Comunista da Alemanha. Empreendendo uma colaboração sem princípios com os dirigentes da social democracia alemã, Brandler e seus seguidores contribuíram para a derrota da classe operária da Alemanha por ocasião dos acontecimentos revolucionários de 1923. O V Congresso do Komintern (1924) condenou a linha capitulacionista do grupo de Brandler. Por decisão do V Pleno Ampliado do Comitê Executivo do Komintern a 4 de abril de 1925, o grupo de Brandler foi proibido de intervir nos problemas do Partido Comunista da Alemanha e de participar dos trabalhos do Komintern. Em 1929 Brandler foi excluído das fileiras do Partido Comunista por sua atividade fracionista. (retornar ao texto)

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Inclusão 12/10/2008