Ao contrário da retórica ambígua dos trotskistas — e da linha adotada pelo Progressive Labor Party, mesmo antes de se assumirem abertamente contra toda a forma de luta nacional —, a opressão nacional não afeta apenas os trabalhadores da nação oprimida. Estaline assinalou, referindo-se à situação em que a questão nacional se apresenta, na sua essência, como uma questão camponesa:
As nacionalidades oprimidas são geralmente oprimidas não apenas enquanto camponeses ou enquanto pequenos artesãos e trabalhadores urbanos, mas também enquanto nacionalidades, ou seja, enquanto trabalhadores de um determinado Estado, com uma determinada língua, cultura, modo de vida, costumes, hábitos. O duplo fardo da opressão tende inevitavelmente a revolucionar as massas trabalhadoras das nacionalidades oprimidas e a impeli-las à luta contra a principal força opressora — o capital. (Estaline, “A Revolução de Outubro e o Problema das Camadas Intermédias”, vol. 5, p. 352.)
Este é exatamente o caso dos Estados Unidos na atualidade; e esta tendência para a revolução torna-se tanto mais forte quanto os povos Negros e do Terceiro Mundo dentro dos Estados Unidos são, esmagadoramente, não pequenos produtores ou comerciantes, mas sim trabalhadores assalariados — membros de pleno direito da classe operária única dos EUA.
Ignorar as desigualdades que continuam a separar os trabalhadores brancos dos trabalhadores do Terceiro Mundo, negar a opressão nacional e a luta nacional dos povos oprimidos — eis o núcleo da linha trotskista do Progressive Labor Party. Segundo a perspetiva idealista deste grupo, os trabalhadores já estariam unidos, já organizados nos mesmos sindicatos; por conseguinte, qualquer forma de organização autónoma de trabalhadores — em qualquer circunstância — seria considerada reacionária, por supostamente dividir a classe e fomentar a lealdade à nação, ou mesmo à burguesia da sua nação, em detrimento da solidariedade de classe. O pressuposto central deste argumento é a crença de que a unidade revolucionária da classe operária pode ser construída com base na desigualdade e na opressão nacional. Ora, o contrário é que é verdade: só através da luta contra a desigualdade e contra todas as formas de opressão nacional é possível forjar essa unidade.
Como assinalámos anteriormente, a questão nacional nos Estados Unidos encontra-se agora numa terceira fase, em que volta a ser uma “questão particular e interna do Estado” — mas numa base completamente nova. A questão nacional nos Estados Unidos é hoje uma questão proletária. A luta dos povos do Terceiro Mundo contra a discriminação e as demais formas específicas de opressão de que são alvo é simultaneamente uma luta nacional e uma frente avançada da luta de classes no seu conjunto.
Como Lenine insistia, aquele que não combate a opressão nacional não é apenas um não-socialista — não é sequer um democrata (burguês). Lenin responde também ao argumento segundo o qual a luta contra a opressão nacional dividiria a classe operária. Ele compara essa posição, como mencionado anteriormente, à questão do divórcio:
Os reacionários opõem-se à liberdade de divórcio; dizem que a questão deve ser ‘tratada com cuidado’ e declaram ruidosamente que tal liberdade conduzirá à ‘desintegração da família’. Os democratas, no entanto, consideram que os reacionários são hipócritas e que, na realidade, estão a defender a omnipotência da polícia e da burocracia, os privilégios de um dos sexos, a mais vil opressão das mulheres. Acreditam que, na prática, a liberdade de divórcio não causará a ‘desintegração’ das famílias, mas, pelo contrário, irá fortalecê-las sobre uma base democrática, que é a única base possível e duradoura numa sociedade civilizada.” (Lenine, O Direito das Nações à Autodeterminação, Vol. 20, p. 422)
Lenine, naturalmente, concorda com os democratas e salienta que o proletariado é, de facto, a única classe verdadeiramente democrática na sociedade moderna; é a que mais consistentemente luta pelos direitos democráticos — especialmente para as nacionalidades oprimidas e para as mulheres — porque os seus interesses são os que mais profundamente se realizam através da conquista plena dessas liberdades. Assim, nos Estados Unidos de hoje, as lutas contra a opressão nacional não dividem a classe operária nem impedem a sua luta contra o capital — pelo contrário, impulsionam-na grandemente e contribuem para romper as divisões no seu interior.
E, nesta fase inicial do desenvolvimento do atual movimento operário, é necessário, em muitos casos, que os povos do Terceiro Mundo — incluindo os trabalhadores — constituam organizações políticas de massas separadas, mesmo quando se encontram filiados nos mesmos sindicatos que os trabalhadores brancos, a fim de promover a luta contra a opressão nacional como parte crucial da luta geral contra o capitalismo monopolista dos EUA.
É verdade que, desde que o marxismo consolidou uma base de massas no seio da classe operária, e foi formado, sobre essa base, um único partido Marxista de toda a Rússia, Lenine e Estaline defenderam a fusão dos trabalhadores de todas as nacionalidades nesse partido único e nas mesmas organizações de massas. Em Marxismo e a Questão Nacional, Estaline aponta os efeitos nefastos da existência de organizações separadas (incluindo sindicatos) para os trabalhadores judeus e outras nacionalidades oprimidas: os trabalhadores acabavam por se opor mutuamente às respetivas lutas, chegando mesmo a fazer trabalho de espiões ou de fura-greves (scabbing) uns contra os outros.
Mas, nesse mesmo panfleto, Estaline assinala que, nas fases iniciais do movimento operário, a organização dos trabalhadores segundo linhas nacionais desempenhava um papel diferente:
Mesmo antes de 1897, os grupos social-democratas (Marxistas) ativos entre os trabalhadores judeus propunham-se criar uma ‘organização especial de trabalhadores judeus’. Fundaram tal organização em 1897 com a unificação que deu origem ao Bund. Isto ocorreu numa altura em que a social-democracia russa, enquanto corpo organizado, praticamente ainda não existia. O Bund cresceu e expandiu-se de forma constante, destacando-se cada vez mais sobre o pano de fundo sombrio da social-democracia russa desses tempos. (...) Vieram depois os anos 1900. Um movimento operário de massas surgiu. A social-democracia polaca cresceu e atraiu os trabalhadores judeus para a luta de massas. A social-democracia russa cresceu e atraiu os trabalhadores do Bund (Estaline, Marxismo e a Questão Nacional, Vol. 2, p. 346, ênfase no original)
Embora a situação nos Estados Unidos não seja exatamente a mesma, a lição geral mantém-se válida. À medida que a luta da classe operária se desenvolve, inspirando-se na luta dos povos do Terceiro Mundo — e em especial dos trabalhadores do Terceiro Mundo —, e à medida que, através desse processo, os trabalhadores brancos se juntam em número crescente aos trabalhadores do Terceiro Mundo para combater tanto a opressão nacional como a de classe, desenvolver-se-á a base para a unificação da classe operária no seu conjunto, a fim de formar organizações de massas multinacionais, independentes e capazes de enfrentar as direções sindicais corruptas — atuando tanto no interior dos sindicatos, como membros ativos, como fora das suas estruturas organizativas.
No momento atual, apoiamos e contribuímos para a construção de organizações de massas do Terceiro Mundo, tanto entre os trabalhadores do Terceiro Mundo como, sobretudo, nas comunidades desses povos. Simultaneamente, trabalhamos para construir a unidade multinacional do proletariado, através da luta ativa contra o capital monopolista; e, onde existe base para essa unidade, para erguer organizações de massas multinacionais, especialmente no seio da classe trabalhadora. Mantemo-nos ao lado de Lenine e Estaline na defesa da necessidade de um único Partido Comunista multinacional do proletariado, como direção do movimento revolucionário, e da unidade da classe operária no seu todo enquanto força revolucionária dirigente.
Resumindo este ponto: o caminho para essa unidade, e para o desenvolvimento de um verdadeiro partido de vanguarda do proletariado, passa pela intensificação da luta contra a opressão nacional como parte integrante da luta de classes, combinando formas nacionais e multinacionais de organização e combate, e forjando assim a base política e organizativa da unidade proletária, em aliança com os demais sectores dos povos do Terceiro Mundo. Essa aliança constitui o núcleo sólido da Frente Única para derrubar o imperialismo dos EUA e estabelecer a ditadura do proletariado, colocando o poder nas mãos do povo oprimido e abolindo de uma vez para sempre todas as formas de opressão nacional e de classe.
Se a linha que nega a luta nacional é extremamente destrutiva, não menos perigosa é a linha segundo a qual a unidade da classe operária como força revolucionária dirigente seria inatingível. Os que defendem esta posição afirmam que os trabalhadores brancos, enquanto conjunto, beneficiam tanto dos “privilégios da pele branca” que, de facto, apoiam o imperialismo dos EUA. No Red Papers 2, abordámos a questão desses supostos “privilégios da pele branca”, e salientámos que tais “privilégios” — os pequenos benefícios que muitos trabalhadores brancos recebem em troca de uma vida inteira de exploração e opressão — são migalhas que os próprios trabalhadores brancos acabarão por rejeitar. Tal acontecerá à medida que a sua consciência de classe se elevar através da luta, e graças ao trabalho paciente e determinado dos Marxistas-Leninistas que participam e lideram essa luta. Para muitos, a “linha da pele branca” serve de disfarce pseudo Marxista para o seu desprezo pela classe trabalhadora — tanto dos povos do Terceiro Mundo como branca — e, em última instância, para o seu medo da ditadura do proletariado.
Na sua forma mais extrema, esta posição reduz a luta revolucionária a uma visão idealista de uma guerra mundial — uniformemente desenvolvida e idêntica em toda a parte — travada por um povo do Terceiro Mundo sem classes contra a “América branca” (“Honky America”) — que inclui não apenas a burguesia dos EUA como inimiga, mas também os trabalhadores (brancos, evidentemente; o facto de que a maioria das pessoas do Terceiro Mundo são trabalhadores nem sequer é considerado neste apocalipse romântico). Negar a existência das classes e da luta de classes, independentemente da intenção subjetiva, é, objetivamente, alinhar-se com a burguesia e promover a ideologia burguesa. Isto, naturalmente, é compreensível no caso dos nacionalistas burgueses. Mas é imperdoável para os Marxistas.
Para um Marxista — representante do proletariado e, portanto, da luta mais consequente contra todas as formas de opressão — o princípio fundamental é a questão de classe: a vitória da revolução proletária para construir o socialismo e o comunismo. Embora Lenine tenha denunciado como filisteus e chauvinistas aqueles que recusavam lutar contra a opressão nacional, expôs com igual firmeza como “democratas burgueses” aqueles que colocavam a questão nacional acima da questão de classe. “Marx não tinha dúvidas quanto à posição subordinada da questão nacional em comparação com a ‘questão operária’”, escreveu Lenine. E Lenine foi ainda mais longe, tanto na teoria como na prática. Insistiu que:
Se um Marxista ucraniano se deixa dominar pelo seu ódio, perfeitamente legítimo e natural, aos opressores grã-russos, a tal ponto que transfere sequer uma parcela desse ódio — ainda que apenas sob a forma de afastamento — para a cultura proletária e a causa proletária dos operários grã-russos, então esse Marxista terá caído no nacionalismo burguês. (Lenine, “Observações Críticas sobre a Questão Nacional”, Vol. 20, p. 33, ênfase no original)
E quando os imperialistas e nacionalistas burgueses procuraram eleger “governos nacionais” nas regiões fronteiriças da Rússia, em oposição ao recém-estabelecido Estado soviético, Lenine, Estaline e as massas de operários e camponeses de todas as nacionalidades da Rússia não se deixaram enganar pela falsa bandeira da “autodeterminação” hasteada por esses reacionários. Esses “governos” burgueses colocavam-se no caminho da revolução proletária; defendiam a manutenção da exploração e da opressão. Foram esmagados. E a unidade dos operários das nações oprimidas com os da nação grã-russa, baseada na luta comum contra a desigualdade nacional, tornou isso possível.
Mas há quem diga que os EUA são diferentes, que essa unidade não pode ser construída. Esta visão baseia-se numa análise incorreta da história da luta pela libertação Negra nos Estados Unidos, desde o período da escravidão. Provavelmente a influência mais forte nesse sentido é a posição formulada por W.E.B. Du Bois, particularmente no seu livro Black Reconstruction in America (Reconstrução Negra na América).
Como resposta à propaganda difamatória que os “eruditos” burgueses e autores de manuais escolares espalharam para desacreditar o povo Negro e a sua luta pela libertação, Black Reconstruction é de grande importância. Mas como análise científica e rigorosa da questão, revela-se insuficiente. Du Bois desmonta completamente a ideia de que o povo Negro foi “o único na história do mundo... a tornar-se livre sem qualquer esforço próprio”; de que “embora os Negros estivessem agora livres, eram também ignorantes e incapazes de se governar a si próprios”; de que “pensando que a escravidão significava trabalho e que a liberdade significava apenas ócio, o escravo, uma vez liberto, inclinava-se a experimentar a liberdade recusando-se a trabalhar”; e de que “nos estados exauridos, já amplamente ‘punidos’ pela desolação da guerra, o governo dos Negros e das suas patrulhas de carpetbaggers(6) e scalawags(7) sem escrúpulos foi uma orgia de extravagância, fraude e incompetência repugnante.” (Trechos de manuais escolares públicos da década de 1930, citados por Du Bois em Black Reconstruction).
Contudo, Du Bois comete o erro crucial de apresentar o escravo como um “trabalhador Negro”, simplesmente um proletário super explorado. A escravidão, afirma, era apenas uma forma extrema de exploração capitalista — ou seja, diferente apenas em termos quantitativos, e não qualitativos, do sistema de exploração nos estados do Norte. Daí decorre o erro fundamental da análise de Du Bois sobre a Reconstrução. Ele vê esse processo como uma experiência de “ditadura do trabalho”, ou mesmo de “ditadura do proletariado”. Este erro reflete o facto de que, embora a Black Reconstruction contenha algum material político quasi-Marxista, não é uma análise Marxista consequente e sofre por causa disso.
A sua perspetiva é mais próxima da pequena burguesia Negra — ou, mais precisamente, da burguesia nacional Negra em ascensão mas suprimida. Para esta classe de pequenos produtores — e para a intelligentsia a ela associada — os interesses do “trabalho” (que vê através dos seus próprios olhos e projeta à sua imagem) são idênticos, seja o “trabalhador” um assalariado, um agricultor ou até um pequeno capitalista que explora o trabalho assalariado. Por isso, Du Bois confunde os governos da Reconstrução, de carácter democrático-burguês, com uma ditadura da classe operária. Uma nota de rodapé que Du Bois acrescenta ao título do décimo capítulo do seu livro torna esta confusão muito clara:
O histórico do trabalhador Negro durante a Reconstrução oferece uma oportunidade para estudar de forma indutiva a teoria Marxista. Chamei inicialmente a este capítulo ‘A Ditadura do Proletariado Negro na Carolina do Sul’, mas foi-me chamado à atenção que isso não seria correto, uma vez que o sufrágio universal não conduz a uma ditadura real até que os trabalhadores utilizem os seus votos de forma consciente para se libertarem do domínio do capital privado. Havia sinais de tal objetivo entre os Negros da Carolina do Sul, mas este estava sempre ligado à ideia, comum na época, de que a única saída real para um trabalhador era ele próprio possuir capital. (Du Bois, Black Reconstruction in America, capítulo 10, que acabou por intitular “O Proletariado Negro na Carolina do Sul”)
Essa “ideia da época” decorre do facto de que, na Carolina do Sul e no Sul em geral (durante a Reconstrução), os governos estaduais não eram ditaduras proletárias, mas governos democrático-burgueses, cujo motor era a pequena burguesia — comerciantes, agricultores, artesãos e artífices — em desenvolvimento tanto entre Negros como brancos, numa aliança temporária com a grande burguesia do Norte. Afinal, se no Sul estivesse a ser construída uma ditadura do proletariado, seria difícil explicar o apoio — ainda que hesitante — por parte da ditadura do capital no Norte.
O preconceito de classe de Du Bois e o erro que dele decorre impedem-no de compreender corretamente a traição à Reconstrução. Ele resume-a da seguinte forma:
Longe de se orientar para qualquer conceção de ditadura do proletariado, ou de entregar o poder quer nas mãos do trabalho, quer nas mãos dos seus representante, o novo plano (do governo federal) consistia em concentrar num representante do capital um novo e vasto poder, destinado a dominar o governo dos Estados Unidos. (Du Bois, ibid., p. 583.)
E, no final do livro, Du Bois recai profundamente no idealismo e na metafísica. Afirma que os sulistas não compreenderam “que uma classe trabalhadora viva nunca pode perder o seu poder político e que tudo o que fizeram em 1876 foi transferir esse poder das mãos do trabalho para as mãos do capital, onde permanece concentrado desde então”. Esta “transferência de poder” para longe da “classe trabalhadora” foi possível, segundo Du Bois, porque o “proletariado” branco no Sul (constituído sobretudo por pequenos agricultores e artesãos) se uniu ao capital branco com base na raça (ou nacionalidade), em vez de se unir ao “proletariado Negro” com base na solidariedade de classe. E assim tem sido desde então, de acordo com esta interpretação da história. (Ver os dois últimos capítulos de Black Reconstruction in America).
É, evidentemente, verdade que um fator significativo na traição à Reconstrução foi a divisão criada, com base no chauvinismo nacional (a crença na superioridade dos brancos e na inferioridade dos Negros), entre agricultores e trabalhadores brancos e Negros. Mas a visão que transparece de Black Reconstruction é que, no essencial, a situação do povo Negro nos Estados Unidos permaneceu inalterada desde a escravatura – com a breve exceção de cerca de dez anos durante a Reconstrução. Esta perspetiva estática apresenta um proletariado Negro super explorado, condenado à mesma servidão pelo ato chauvinista de traição do proletariado branco, que continua a vender não apenas os seus próprios interesses, mas também a liberdade dos trabalhadores Negros, em troca de um “acordo de cavalheiros” chauvinista com o capital branco.
É igualmente esta a imagem que Du Bois oferece para explicar a desintegração da unidade branco-Negra no Movimento Populista das décadas de 1890 e do início de 1900. Mais uma vez, é certo que a traição aos agricultores Negros pelos populistas brancos – enganados por oportunistas como o advogado sulista ambicioso Tom Watson – foi um fator-chave na dissolução do Movimento Populista, que, no seu auge, uniu vários milhões de pequenos agricultores, Negros e brancos, com base numa luta política comum (sobretudo no plano eleitoral), ainda que não em plena igualdade social.
Contudo, mais uma vez, o Movimento Populista era um movimento da pequena burguesia, uma classe instável constantemente pressionada e fragmentada pela crescente dominação do capital monopolista. Não era um movimento do proletariado – a classe do futuro, a mais forte da história, tanto ideologicamente como organizacionalmente, e também em número.
A base de classe dos populistas é evidente no seu programa. As suas reivindicações centravam-se na dissolução dos monopólios, na propriedade pública dos caminhos-de-ferro (que exploravam os pequenos agricultores através da cobrança de preços exorbitantes pelo transporte das suas mercadorias), entre outras medidas. Trata-se, claramente, de um programa da pequena burguesia. Lenine salientou uma vez que o proletariado se opõe ao capital monopolista de forma mais consequente do que qualquer outra classe; mas opõe-se não através da exigência de dissolver os “trusts”, mas sim avançando através deles e para além deles, rumo à socialização da propriedade de todos os meios de produção, sob o controlo de um governo dirigido pela classe trabalhadora.
Além disso, existe uma diferença absoluta entre a burguesia norte-americana em ascensão durante a Reconstrução – quando se expandia rapidamente e começava a desenvolver monopólios – ou na época do Movimento Populista – quando consolidava o capital monopolista e emergia como uma grande potência imperialista – e a situação atual, em que há muito se tornou a mais poderosa força imperialista, encontrando-se agora em posição defensiva por todo o lado, sendo expulsa de país após país e desafiada em todas as frentes.
Nas condições atuais, a capacidade da burguesia para subornar setores da classe trabalhadora com os superlucros do imperialismo, impedindo assim a unidade das suas vítimas exploradas e oprimidas, encontra-se já em processo de erosão. Por isso, a burguesia recorre cada vez mais à repressão terrorista. Se hoje as consequências, para o proletariado, de não construir uma unidade multinacional na luta contra o imperialismo norte-americano são maiores do que nunca, a base material para construir essa unidade e levar até ao fim a luta pelo derrube do imperialismo é também mais sólida do que alguma vez foi.
Se a posição defendida por Du Bois em Black Reconstruction fosse correta, então os mais de cem anos decorridos desde a Guerra Civil teriam constituído um longo período de estagnação, ou mesmo de retrocesso efetivo, para o povo Negro(8).
Contudo, apesar da traição à Reconstrução, a derrota do sistema esclavagista representou um avanço histórico para o povo Negro e para todos os povos oprimidos e explorados dentro dos Estados Unidos, como Marx e Engels salientaram à época. Foi neste período que se desenvolveu a nação Negra e, simultaneamente, que teve lugar o crescimento da indústria em larga escala e do proletariado moderno nos Estados Unidos.
Ao longo dos últimos cem anos, apesar de toda a tortura da opressão semicolonial e semifeudal, a nação negra manteve a sua luta pela emancipação. A própria tendência do capitalismo moribundo norte-americano para desintegrar a nação Negra – expulsando-a das terras agrícolas e dispersando-a pelos grandes centros industriais – representa também um avanço importante para o povo Negro, que volta a ocupar as primeiras linhas da luta de classes, mas agora sobre uma base completamente nova. Se a derrota do sistema esclavagista e a emancipação do povo Negro da escravatura mercantil significaram a ascensão temporária da burguesia – e não, de imediato, da classe trabalhadora – a emancipação do povo Negro hoje significa a derrota da burguesia e o fim de todas as formas de escravatura nos Estados Unidos.