Sociologia Vulgar

Mikhail Alexandrovich Lifschits

1971


Fonte: Traduzido para o espanhol por Víctor Antonio Carrión Arias. Sociologia Vulgar apareceu originalmente de forma reduzida no tomo 5 da terceira edição da Grande Enciclopédia Soviética (1971), sendo reeditado no Dicionário Filosófico Enciclopédico (1983). Sua versão completa foi publicada no tomo 2 das Obras Escolhidas em Três Tomos de Mikhail Lifschits (1986). Em espanhol foi publicado como parte do livro Liberdade da Personalidade (2010). Essa tradução tem permissão da editora Edithor e do tradutor Víctor Antonio Carrión Arias.
Tradução do espanhol: Marcelo José de Souza e Silva(1)
HTML: Fernando A. S. Araújo.
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A sociologia vulgar – simplificação dogmática do método marxista, principalmente no campo da história, da crítica artística, da teoria da arte, da literatura e outras formas de consciência social. Em um sentido mais amplo – é o entendimento abstrato do marxismo, o que leva à perda de sua riqueza autêntica e a conclusões políticas falsas, “caricatura do marxismo”(2), de acordo com a expressão de V. I. Lenin. O termo sociologia vulgar é usado na imprensa soviética desde o início da década de 1930, porém é um fenômeno conhecido desde muito antes. Ainda durante a vida de Marx e Engels, ao movimento da classe trabalhadora se uniram muitos representantes semi-instruídos da intelligentsia burguesa, que viram no marxismo um método fácil para resolver todos os problemas históricos e contemporâneos prescindindo do estudo independente dos fatos. “Se há algo certo é que eu não sou marxista”(3) – disse Karl Marx(4) sobre tais seguidores de suas afirmações. As cartas de Engels da década de 1890 (A. J. Bloch, W. Borgius, F. Mehring, C. Schmidt, H. Starkenburg, P. Ernsts e outros) dão testemunho de que, a seu critério, a vulgarização da teoria do materialismo histórico havia alcançado proporções alarmantes(5).

A sociologia vulgar é um problema que tem relação com a influência das ideias e sentimentos da democracia pequeno-burguesa. Já é assim no anarquismo de M. Bakunin e S. Netchaev ainda amorfo, porém possuindo grande potencial como força social focada a distender de modo grosseiro o entendimento materialista da história. Daí à crítica bakuninista da cultura como vaidade antiquada, vinculada ao modo de vida da classe proprietária, ou a transformação das ideias sociais em simples meios de combate social. Outro exemplo de caricaturização do método de Marx e Engels – o artigo de P. Tkachov da segunda metade da década de 1860, no qual o chamado materialismo econômico se combina com a teoria utilitarista de Bentham(6).

O fato mais importante na pré-história da sociologia vulgar é a propagação na literatura da socialdemocracia internacional de critérios positivistas. A herança de Marx e Engels foi pervertida, em grande medida, por sua mistura com o positivismo e, às vezes, com o neokantismo. Não se deve negligenciar que inclusive os trabalhos de Plekhanov, bem distantes da vulgaridade, haviam influências de elementos da sociologia burguesa da segunda metade do século XIX (Michels, Taine e outros). Daí o entendimento unilateral da história da cultura como uma longa fila de estados psicológicos socialmente condicionados, que surgem com semelhante fatalidade como a macieira produz maças e a pereira – peras. O problema da comensurabilidade destes produtos históricos Plekhanov deixou em suspenso (lógica formal, domínio artístico, direito moral). Muito inferior à obra de Plekhanov foi a vasta literatura sociológica, próxima ao marxismo legal e à tendência menchevique na socialdemocracia(7).

As tendências, mais próximas ao menchevismo, encontraram expressão em uma extensa literatura primordialmente de caráter popularizador. Igual ao ocidente, os representantes particulares dessa literatura não merecem maior referência, exceto o historiador N. Rozhkkov, autor de um estudo muito original em seu tipo sobre o escritor russo do século XIX, V. Pereverzev. A influência do método sociológico marxista se reflete em obras científicas além dos limites do movimento socialdemocrata. O curso de história da literatura russa de V. Keltuial (1906-1911) pode servir de exemplo típico, e no ocidente, a obra filosófica de A. Eleutheropoulos (1900). Em ambos os casos, diante de nós temos a vulgarização do entendimento materialista da história.

A reação aos pecados oportunistas da socialdemocracia foi o ascenso do anarcosindicalismo(8), exposto no campo da sociologia pelo conhecido pensador francês G. Sorel. Característico dessa corrente é o rechaço do critério objetivo da verdade na história e o passo a uma análise sociológica partindo da ideia da subjetividade total do ponto de vista de classe (teoria do mito social)(9). Na Rússia, a sociologia vulgar de tipo ultra-esquerdista foi representada pelo grupo de A. Bogdanov (“Вперёд”(10)). À corrente de Bogdanov, de forma mais ou menos próxima, se junta o grupo de historiadores e panfletários, que desempenharam um papel muito grande, embora nem sempre positivo, em propagar o marxismo – M. Pokrovski, V. Friche, V. Shuliátikov. “Shulliátikovada” – termo criado por G. V. Plekhanov para caracterizar tal sociologia vulgar no campo da história da filosofia (1909). A transformação dos fatos históricos da cultura espiritual em simples símbolos de diferentes grupos sociais e relacionado a este relativismo, definitivamente um rechaço à verdade objetiva, é claro, que era algo alheio a Plekhanov, mas ele não sabia como solucionar essa questão, esta permanecendo fora dos limites da dialética história objetiva, somente resolvida pela teoria leninista do reflexo.

Depois da Revolução de Outubro, a rápida e amplíssima propagação do marxismo e sua aclimatação como concepção dominante do mundo por uma parte da velha intelligentsia fez da sociologia vulgar um fenômeno massivo, percebido na prática e que representava um sério perigo para a cultura socialista. Formas particularmente perniciosas adotaram uma demagogia baseada no abuso da noção de luta classista no campo da formação cultural. Não há dúvida que na década de 1920 teve grande influência o entendimento de experiência de classe e cultura proletária, deixado pela escola de Bogdanov(11). A sociologia vulgar frequentemente trouxe consequências risíveis, caricaturescas, mas, ao mesmo tempo, destrutivas. Basta recordar a teoria da extinção da escola, cujo um dos partidários foi, por exemplo, M. Pokrovski. No campo da história russa, a sociologia vulgar frequentemente se limitou a subverter os esquemas oficiais da historiografia anterior, “recheando de política o passado”. Segundo este ponto de vista, Dimitri, o Impostor, e Mazepa eram os representantes das forças revolucionárias de sua época, e o valor progressista das reformas de Pedro(12) sofria uma negação radical. Em geral, tudo vinculado com a tradição nacional e o velho estado era condenado de antemão pela fraseologia revolucionária.

No início da revolução, e depois novamente nos anos críticos dos primeiros planos quinquenais(13), a sociologia vulgar foi, em geral, ambiente nutritivo para diferentes movimentos esquerdistas, que rechaçavam a herança da velha cultura. As formas extremas da negação ultra-esquerdista adotaram, algumas vezes, um caráter fantasioso – da pregação da destruição dos museus à teoria da dissolução da arte na produção e na própria vida (LEF)(14). A sociologia vulgar frequentemente se fundiu com as conclusões destrutivas das correntes modernistas(15) ou deu seu apoio a algumas destas. Assim, por exemplo, se considerava quase irrefutável que a corrente em pintura mais consonante com o proletariado “organizado” era, acima de tudo, o cubismo(16). A pintura de cavalete foi negada em nome do monumento. Os gêneros literários, herdados da velha sociedade, eram postos em dúvida; houve teorias da extinção da tragédia e comédia. As tendências mais moderadas da sociologia vulgar consideravam a velha cultura como um grande cemitério de procedimentos formais, que o proletariado vencedor podia usar para seus propósitos utilitários, observando para isso a proverbial precaução.

Em total contradição com a elevação espiritual das massas trabalhadoras, as quais a revolução outorgou via livre aos tesouros da arte mundial, a sociologia vulgar fez seu propósito secreto ou explícito denunciar os escritos e artistas do passado como servos das classes dominantes. A partir deste ponto de vista, cada obra de arte era um ideograma codificado de um dos grupos sociais que lutavam entre si por um lugar sob o sol. Por isso a tarefa do artista proletário devia consistir na expressão detalhada da psicoideologia de sua classe, sendo esta mais organizada, saudável, ativa e otimista que qualquer outra.

Dali, as inumeráveis definições risíveis, lançadas pela sociologia vulgar sobre os clássicos literários, convertendo Pushkin em ideólogo da nobreza empobrecida ou latifundiário aburguesado; Gogol, no pequeno nobre fidalgo; Tolstói, em representante da nobreza média, apegada à alta aristocracia, e outros mais. Consideravam firmemente que, na verdade, os dezembristas(17) não defendiam os interesses do povo e sim a causa dos latifundiários, interessados no comércio do pão. As pitadas de verdade, contidas em semelhante sociologia, finalmente eram convertidas em absurdos, grandiloquentes e beligerantes.

O fanatismo ingênuo da sociologia vulgar era uma parte da inevitável consequência do protesto espontâneo contra todo o velho, exagero da negação revolucionária, própria de qualquer revolução social profunda. Nesta se manifestou também o baixo nível cultural das massas e o insuficientemente entrelaçamento marxista da intelectualidade, sua capacidade de oferecer uma explicação científica e verdadeira partidária, uma valorização comunista dos complexos fenômenos da cultura mundial. As tarefas do pensamento marxista eram grandes e extensas, surgiram frente a isso em toda sua dimensão imediatamente no dia seguinte da revolução. Inclusive Engels testemunhava o insuficiente aperfeiçoamento dos aspectos mais concretos da análise materialista do fenômeno social, isso, é claro, não podia ser de outro modo em condições de luta revolucionária. Alguns dos difíceis problemas do materialismo histórico não foram resolvidos pelos herdeiros mais próximos de Marx e Engels, não obstante o talento e erudição de propagandistas do marxismo, como Lafargue, Mehring e Plekhanov. O nível superior de resolução dessas questões, postulado na teoria e prática leninista, tampouco foi suficientemente compreendido. As fórmulas habituadas da literatura socialdemocrata emendadas no espírito da ultra-esquerdista “filosofia de luta” (tipo Volski) gozaram de ampla difusão na imprensa. Neste sobretom foi digna surpresa com que brilhantemente A. V. Lunacharski resolveu os problemas da análise marxista da criação artística, apesar de que ele também, voluntária ou involuntariamente, fez grandes concessões à sociologia vulgar.

Por outro lado, seria um erro considerar a vulgarização do marxismo como uma simples deficiência na cultura marxista, o fervor em razão de alcançar um belo propósito. Muitos representantes da sociologia vulgar não eram vulgares, ao contrário, eram refinadíssimos; o método rústico sociológico-vulgar era para eles algo que os saciava, a classe de filosofia, que adotavam consciente ou inconscientemente. A sociologia vulgar – um fenômeno que não é pessoal, e sim histórico. Uma mistura de ideias burguesas, influência da psicologia daquelas forças sociais que tomaram parte na revolução, porém, para si e a sua maneira, a psicologia do pequeno sujo, a que Lenin considerava um grande perigo para a genuína cultura proletária, para o marxismo(18). A uma vez poderosa sociologia vulgar se esgotou em meados da década de 1930. Permaneceram em silêncio os mais notáveis representantes, frequentemente pessoas talentosas e, de qualquer maneira, consequentes. As gigantescas mudanças sociais e políticas que ocorreram nessa época na União Soviética, tornaram impossível a manifestação direta das ideias do democratismo pequeno-burguês e os remanescentes da psicologia do pequeno sujo, que não eram muito numerosas, assumiram formas completamente diferentes.

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Os esquemas da sociologia vulgar se correspondem com aquelas propostas ideológicas que, em condições dadas, aparecem espontaneamente e independentemente do desejo das próprias pessoas. O específico neste tipo particular de pensamento se remonta à época do velho materialismo, limitado pelo horizonte da sociedade burguesa. Dali sua degeneração em positivismo na segunda metade do século XIX (um dos típicos representantes desse positivismo foi Taine, criador da primeira “sociologia da arte”). Se deixamos de lado a fraseologia de classe, vemos na própria base da sociologia vulgar o entendimento abstrato das ideias de benefício, interesse, conveniência. Em seu desenvolvimento unilateral, essas ideias são típicas do clima moral da era burguesa. Toda superfície “ideal” da vida espiritual nos apresenta puras ilusões, que esconde propósitos secretos ou inconscientemente egoístas. Todo o qualitativo-específico, todo o infinito é reduzido à ação de forças elementares em um entorno limitado. Falta dizer que esse entendimento da história universal, em geral, não tem a ver com o materialismo dialético de Marx e Engels.

Na década de 1920 um teatro encenou Don Juan de Molière. De acordo com a intenção do diretor, a razão para a morte do famoso folião não devia ser o fantasma do comandante, e sim o disparo da multidão de campesinos sublevados. Certamente os fantasmas não existem, porém neste trabalho editorial, a obra de arte foi vítima da crítica racionalista das superstições no velho espírito do ateísmo burguês. Outro direto converteu o pensativo Hamlet em um astuto, forte e desavergonhado político, sedento de poder e que cria nas massas uma mitologia a seu serviço com a ajuda de um fantasma imaginário. Este movimento desde o velho esquema racional-utilitário ao culto contemporâneo da força, imediatamente nos assinala outro manancial da sociologia vulgar. Em nossos dias, essa noção, internamente vinculada com o horizonte da sociedade burguesa, sobreviveu grandes mudanças. E, atualmente, se apresenta na forma de filosofia e sociologia irracionalista do século XX.

Na verdade, o princípio básico da sociologia vulgar consiste na negação da verdade objetiva e absoluta não somente no sentido literal, cognitivo da palavra, mas sim também no sentido de verdade da moral e estética – quer dizer, a negação do bom e belo. Esta posição filosófica torpe, em específico, não pode evitar abusar dos conceitos de classe ou camada, pois a sociologia vulgar está obrigada a isso para existir. A fórmula marxista de que a existência determina a consciência torna-se aqui um conveniente meio para suprimir a consciência da consciência(19), para transformá-la em produto espontâneo do meio social e interesse de classe. A partir do ponto de vista da sociologia vulgar, todas as formas históricas de consciência são igualmente cegas, condicionais e prisioneiras de seu horizonte social. Existe diferença entre estas, porém esta não se mede por seu reflexo da realidade, nem pelo conteúdo do desenvolvimento histórico, expresso em umas ou outras etapas ou formas da vida espiritual. Seu critério principal – vitalidade do grupo social, que se consolidou na própria consciência coletiva (de acordo com a terminologia da escola de Durkheim), expressando-se de modo mais ou menos vigoroso. Todas as culturas e estilos possuem igual valor. Somente é possível compará-las por meio de uma certa classe de diagnóstico social (termo cunhado pelo fundador da “sociologia do conhecimento” alemã de Mannheim). Um grupo social é mais saudável e forte que outro, um ascende, outro cai, um escritor que expressa a ideologia da classe mais forte é mais valioso que outro.

A ideia do desenvolvimento progressivo não é alheia à sociologia vulgar, porém no sentido puramente quantitativo formal – sendo alheia ao âmbito de parâmetro como verdade objetiva, justiça social e perfeição artística (veja os signos do florescimento da arte na sociologia de V. Friche). Tudo é bom para sua época, sua classe. Como substituto do critério objetivo de valor, a sociologia vulgar recorre à ideia abstrata da luta do novo e velho (é mal o que é antiquado, bom o que é novo), e também as analogias tipológicas e as antíteses do formalmente similar ou diferente em cada um dos estilos e culturas. Estas eram, por exemplo, a analogia entre a cultura “monumental-organizada” do Antigo Egito e o socialismo em W. Hausenstein e V. Friche, a troca permanente de formas “abstratas” e “orgânicas” em Bianchi Bandinelli, o paralelismo entre a estética comunista e o estilo romântico da alta idade média em Francastel e Roger Garaudy.

Assim, no fundamento da sociologia vulgar reside o relativismo histórico do pensamento burguês do século XX, eliminando o conteúdo objetivo da verdade, o bom e o belo em nome da análise puramente formal das muitas posturas espirituais e sistemas ideológicos. Uma das fontes mais importantes da sociologia vulgar na Rússia foi a influência dos esquematismos sociológicos de Avenarius e Petzoldt, através de Bogdanov e seus seguidores(20). A experiência coletiva ou a consciência de classe era colocada no lugar da verdade, todo o resto – somente é realismo ingênuo. Mas, ao dar este salto do sujeito-personalidade ao sujeito-classe, a sociologia vulgar não se aliena da filosofia idealista, submetida à crítica por Lenin em seu conhecido livro contra os machistas russos(21). Se apesar de tudo, alguma partícula de conteúdo objetivo era admitida pelos vários representantes da sociologia vulgar, o era unicamente através do ecletismo, inerente a tendências similares. De fato, os resíduos de realidade em suas análises da consciência social desempenham um papel secundário em comparação com as “lentes de classe” (segundo a expressão de A. Bogdanov), esse ângulo visual específico, que outorga a toda ideologia seu caráter condicional.

Para a sociologia vulgar, em vez do reflexo da realidade, mais ou menos verdadeiro, profundo, contraditório, porém objetivo, está o esquema do equilíbrio ou desequilíbrio entre o sujeito histórico e seu ambiente. O desequilíbrio pode ser resultado da pressão pela vitalidade da jovem classe, que dá origem ao romanticismo revolucionário, olhando para o futuro; ou surgir da putrefação prejudicial do grupo social, ao qual são inerentes os ânimos de letárgica contemplação e decadência. Não é necessário dizer, este esquema, inspirado por Avenarius e Petzoldt, nunca poderia abarcar a riqueza da história concreta da cultura. Necessariamente, ordinariamente o horizonte burguês se junta aos moldes vulgares do marxismo dogmático da época da II Internacional, segundo os quais todos os conflitos históricos se reduzem, em geral, à luta da burguesia progressista em ascenso contra a aristocracia agonizante e a pequena burguesia, apegada ao passado. Dessa abstração surge o lugar comum da sociologia vulgar, vinculado ao tradicional desejo menchevique de a burguesia liberal por cima do campesinato, confundindo a forma reacionária das utopias campesinas e seu conteúdo de vanguarda (coisa brilhantemente expressada no tratamento da complexa figura de L. Tolstói), atribuindo a toda crítica ao capitalismo o ser ideia reacionária, a incompreensão das profundas contradições do progresso social e o desenvolvimento desigual da cultura mundial, a ausência de todo sentido de realidade no tratamento de representantes tão grandes da literatura como Shakespeare, Balzac, Pushkin, de quem sua posição histórica não pode se limitar a ser defesa do feudalismo decrépito, nem apologia das novas formas burguesas de vida social. Em geral, a postura de luta em duas frentes, que constitui o substrato verdadeiro do desenvolvimento artístico da humanidade e está vinculada à presença na sociedade de uma terceira força – o povo, se considera segundo a sociologia vulgar impossível ou reacionária.

Outra característica importante da sociologia vulgar consiste em que, seguindo a filosofia burguesa posterior à Nietzsche, coloca em primeiro plano a vontade e não a consciência. Semelhante à maioria das tendências filosóficas do ocidente contemporâneo, a sociologia vulgar está impregnada de ativismo radical. Sua classificação das diferentes posturas sociopsicológicas (Standortgebundenheit da consciência social, segundo a terminologia alemã contemporânea), em aparência tão objetiva, contém em si o princípio de autoafirmação irracional deste sujeito histórico. Dali a grande influência na sociologia vulgar da escola de Riegl e Worringer, com sua teoria da vontade artística(22). Então, é preciso dar a essa vontade direção social (no lugar de racial como em Worringer). A autoafirmação de classe torna-se o ponto de partida de toda a teoria da sociologia vulgar. Naturalmente, esse subjetivismo habitualmente é revestido com fraseologia partidária (por exemplo, à maneira de Malraux e Francastel, para Roger Garaudy, o princípio partidário na pintura requer a deformação dos objetos reais, as formas realistas das imagens, criadas na época do Renascimento e vinculadas a essa perspectiva, somente são expressão da vontade classista da burguesia, aspirando sua supremacia). O próprio conceito de luta de classes nas ideias de pedestres da sociologia vulgar, não é marxista, e sim burguês. Está muito mais próximo à luta zoológica agónica do forte e débil de Nietzsche, das formas sociais isoladas de Ludwig Gumplowicz – da teoria do grupo formal de Simmel, von Wiese, e incontáveis sociólogos americanos, estudam o comportamento do zoon politikon(23), o animal político no sentido literal da palavra. A sociologia vulgar converte a luta de classes em batalha mortal de forças sociais egoístas(24) pela menor picada, alheia a toda a contradição de classes fundamental de cada época.

Inquestionavelmente, o materialismo de Marx e Engels criou pela primeira vez o terreno científico para a análise objetiva e histórica da consciência social. Mas isso não significa que toda consciência é para eles o produto cego de interesses limitados de classe. Marx reconhece o limite relativo, mas real, entre os componentes ideológicos das classes dominantes e a livre produção espiritual da formação social específica(25). Esta última sempre está vinculada por “fios invisíveis com o corpo do povo”. Consequentemente, a diferença entre os genuínos pensadores, científicos, artistas, de um lado, e os descartáveis sicofantas das classes parasitárias, de outro, existe, apesar de que Pushkin foi um poeta nobre, e Diderot e Helvetius expressavam o ascenso da democracia burguesa. Por este motivo sua atividade se relaciona à herança infinitamente valiosa da cultura mundial, nesta se reflete não a luta pela divisão dos espólios no topo da pirâmide social, e sim a contradição radical entre as massas populares, cujos interesses, afinal de contas, coincidem com os interesses da sociedade em geral, e a classe alta parasitária, mestres temporários da sociedade, submetidos à forma de propriedade privada e poder dados.

Para Marx e Lenin não há luta de classes fora do espectro do movimento para a sociedade comunista. Esta trilha através do antagonismo das forças sociais, leva ao desenvolvimento de muitos interesses pequenos e particulares, mas este, contudo, é a trilha para a destruição das classes e ao genuíno, verdadeiro destino humano. Sua necessidade sempre foi percebida ou pressentida pelos melhores representantes da cultura mundial na forma de ideal social, frequentemente contraditório, algumas vezes paradoxal, mas sempre tendo suas raízes históricas reais. O pecado original da sociologia vulgar consiste justamente em que esta, de fato, não pode vincular o conteúdo absoluto da vida espiritual do povo com seu aspecto relativo temporal e limitado, o que também não desempenha um papel somente negativo. A resolução dessa questão só é possível sobre a base da teoria leninista do reflexo, sua dialética na história do conhecimento, como continuação do desenvolvimento da obra de Hegel e Marx.

Em completa contradição com o vasto horizonte da filosofia da história, postulada no marxismo, a sociologia vulgar dá à consciência social um caráter puramente técnico, neutro em relação com a verdade objetiva do mundo. As formas de consciência são, para ela, simples instrumentos de luta. São signos, hieróglifos das forças sociais dadas. Estas não convencem o povo a resolver um conteúdo de realidade objetiva, e sim agem sobre a massa hipnótica, sugestivamente, subordinando-a à sua vontade de poder. A prática da sociologia vulgar na União Soviética criou, em seu tempo, numerosos exemplos de redução da história da literatura a lutas de boxe de diferentes camadas sociais. Contudo, o mesmo critério sobre a consciência social, que a considera como produto da condicionalidade, meio externo de associação e subordinação do povo, é factível sem usar terminologia classista.

A sociologia vulgar se liga plenamente ao pensamento burguês do século XX. Basta recordar as diferentes teorias de socialização e comunicação, onde as formas de consciência são neutras em relação à verdade objetiva, instrumentos para alcançar propósitos determinados. Na teoria de Kenneth Burke, a arte serve para a subordinação da sociedade ao poder de um grupo social específico, com a ajuda de ações semiótico-volitivas, enaltecendo aos olhos do povo os verdadeiros objetivos particulares da hierarquia social ao vesti-las com sua aura sacra. Para Gehlen, a pintura rupestre dos povos primitivos era uma imagem disciplinaria (Zuchtbilder). Para Collingwood, a obra de arte assegura a sobrevivência do grupo social. Os seguidores de Freud e Jung, veem na arte uma imagem para descarregar a tensão social, agradando à massa oprimida com a ajuda da enantiodromia(26); permutação simbólica de cima a baixo, por exemplo, em saturnálias(27) e carnavais. Nas teorias sociológicas deste tipo, desempenha um grande papel a magia como exemplo de influência ativa na consciência das massas, tomada da sociedade primitiva e transferida a toda a história da cultura. Linhas acima já falamos disso, que as pitadas de verdade inseridas em tais observações sociológicas adotam perfis grosseiramente exagerados e velam o profundíssimo conteúdo da vida espiritual da sociedade como espelho do mundo objetivo, da realidade infinita.

Sendo que no lugar do reflexo da realidade, se coloca o princípio subjetivo da vontade e ação sobre a psique alheia, o principal interesse da sociologia vulgar transferida da obra de arte para sua percepção. Como simples símbolo da obra de are, é condicional. Seu valor muda dependendo do receptor, cada época e cada meio social impõe ao ler nas entrelinhas seu juízo particular. Assim, o verdadeiro criador do quadro não é o artista, e sim o espectador. Posto que os pontos de percepção social condicionada não correspondem, a própria comunicação, como compreensão mútua, torna-se um problema insolúvel. Ou a obra de arte e qualquer outro fenômeno da cultura espiritual tem núcleo objetivo e o preserva através de todas as trocas na percepção (dado que em sua base reside um modelo real), ou a ciência social perde todo critério e não pode caracterizar, por exemplo, o fato literário de qualquer outro dispositivo, seja esta criação grafomania(28), imprensa sensacionalista ou literatura oficinesca.

Em suas formas mais consequentes, a sociologia vulgar rechaça a distinção entre a criação do gênio humano e o produto médio da comunicação social. Este, na qualidade de produto simbólico médio, é inclusive mais típico. Daí não somente a controvérsia da sociologia vulgar contra o “método biográfico”, aspiração a criar a história da arte sem artistas, mas também a exigência direta de estudar não as obras excepcionais, mas sim a produção média. No ocidente esse ponto de vista foi defendido pelo conhecido historiador do pensamento social francês Grutjoizen. Na União Soviética houve um período quando nos museus se posicionou a denominada exposição marxista. Mediocridades como o mais tipicamente representativo da consciência de classe média, esmagando nas paredes dos museus os grandes mestres.

É difícil traçar uma divisão estática entre a vulgarização do marxismo e a sociologia burguesa comum. Existem muitos esboços intermediários e transacionais. Também existem no meio da abstração sociológica aquele que expressa somente a estreiteza do horizonte burguês e o conteúdo real das obras científicas, ambos realizados em nome do “método sociológico”. Livros de muitos autores e cientistas talentosos como W. Hausenstein, A. Hauser, F. Antal, Bianchi Bandinelli, P. Francastel, em geral de grande utilidade, não ultrapassam o âmbito da sociologia vulgar. Certamente, a palavra vulgar em seu sentido de menosprezo não é muito apropriada. Menos ainda é para o livro de V. Pereverzev sobre Dostoiévski; um dos melhores estudos sobre a criação do escritor, embora de marxismo real, no espírito de Marx e Lenin, não tem muito mais que o livro de V. Rózanov, frontalmente hostil ao marxismo embora não carente de interesse. O herói da Guerra Civil Espanhola, o comunista inglês Christopher Caudwell é o autor da conhecida obra Ilusão e Realidade (1937), onde em uma combinação surpreendente, se encontram mesclados princípios de materialismo histórico com a antropologia de Carl Jung. Como são possíveis semelhantes contradições, é outra questão, porém aí estão. A literatura sociológica comprometida com o marxismo, frequentemente engloba grande material histórico, considerado a partir de qualquer ponto de vista novo (tal como a investigação de E. Zilsel sobre o conceito de “gênio”, os trabalhos de Conford e Welsford sobre o elemento do cômico, a “sociologia do renascimento” de A. von Martin). Contudo, a limitação em conjunto do método sociológico não marxista sempre vem à tona. E isso é compreensível – a maior proximidade ao problema do estudo científico da vida espiritual da sociedade, plantado por Marx, maiores requerimentos, e, mais agudamente, é sentida toda unilateralidade.

No que diz respeito à sociologia vulgar no sentido estrito da palavra, com toda sua variedade de formas transicionais, ela segue sendo a transcrição burguesa do entendimento materialista da história, o reflexo do marxismo na literatura burguesa. A aplicação unilateral de algumas teses de Marx foi a causa principal da renovação da sociologia burguesa em nosso século. É indiscutível a influência do marxismo em sociólogos tão destacados como Max Weber ou Durkheim, sem mencionar muitos outros. Após um novo batismo nesta fonte, as mesmas ideias, pervertidas por sua mescla com opiniões falsas, retornam à literatura marxista – eis aqui a essência do processo, repousando na base da sociologia vulgar.

Há algo paradoxal com o fato de que o método da sociologia vulgar é principalmente aplicável a si mesmo. Este sonho coletivo real, reflete a forma de vida inerente ao meio social dado. E não somente porque a falsa sagacidade da sociologia vulgar converte toda a história da cultura mundial em lixeira do bazar de grupos sociais egoístas, imergindo os picos do espírito humano na atmosfera moral utilizada pelo sociólogo vulgar. Uma falha central neste sistema consiste no fato de que contém em si a justificação para a desigualdade entre as pessoas.

Suponhamos que toas as formas de vida espiritual são somente ideologia (falsa consciência) – termo de Marx e Engels, aceito por Mannheim, Horkheimer, Hauser, e por outros sociólogos ocidentais, mas incorretamente interpretado por eles. Se é assim, então onde está a garantia de que o quadro histórico, derrubado pela caneta dos sociólogos, não seja também precisamente essa falsa consciência, essa condicionalidade pura? Para sair desse círculo vicioso, nossos sociólogos devem fazer uma exceção para sua própria consciência, convertendo-a em superideologia, metaconsciência(29). Na literatura sociológica ocidental contemporânea, existem muitas intenções de fundamentar essa desideologização do sociólogo, mas todos estes só podem causar um sorriso. Se o ponto de partida é justo, então a contradição é insolúvel. Se não é assim, é necessário reconhecer a possibilidade do conteúdo absoluto no pensamento humano.

Ao mesmo tempo, a questão tem seu lado prático. A exceção feita por um sociólogo para sua própria consciência dá início à divisão das pessoas em estratos. Alguns são produto cego de seu meio e da ação de diferentes meios de comunicação, como são a literatura, pintura, cinematografia, televisão e outros poderosos instrumentos de controle de consciências alheias, outros permanecem nos bastidores e controlam a massa de almas simples. Estes são os tecnocratas, behavioristas, engenheiros em relações humanas, sociólogos – para abreviar, sacerdotes egípcios, que estão acima da sociedade.

Não falemos já da depravação moral deste critério, simplesmente anotemos que ele, na verdade, encarna o sonho coletivo, a utopia infantil dos pequenos sujos, que receberam seu diploma. Obras similares aos livros sensação dos Foucault’s ou McLuhan’s, confirmam o início de uma época de supremacia do meio sobre o conteúdo, as condicionalidades sobre a realidade, atestam que o rechaço ao princípio de verdade objetiva que reside no fundamento de todos os escalões históricos da cultura leva à grande derrota da consciência social. Como o modernismo na arte, a sociologia vulgar é o ópio da intelligentsia.

Infelizmente, devido a numerosas causas fundamentais durante os últimos anos, tropeçamos com sua revigoração, e além disso, em duas formas não coincidentes, mas capazes de se aproximar. Por um lado, nos documentos literários da “nova esquerda” do Ocidente é frequente encontrar o elemento do entendimento abstrato da luta de classes e a revolução como negação nua das formas tradicionais. Por outro lado, a chamada revolução cultural, o qual nos expõe esse modelo de demagogia social, no qual desempenha um papel muito importante a repulsão pela literatura clássica e a herança cultural em geral. Ali onde verdade, moral e arte são simples meios, carentes de valor objetivo independente, onde a luta de classes é rebaixada a teoria vulgar da violência, não havendo mais obstáculos morais para o culto a um poder resistente. Para isso basta a situação de uma minoria instruída, com pretensões de controlar a consciência das massas, coisa não muito difícil de entender.


Notas de rodapé:

(1) Possui graduação em farmácia pela UFPR e é mestre em educação pela UFPR. Participa dos Grupos de Pesquisa: Núcleo de Pesquisa Educação e Marxismo (NUPE-Marx/UFPR), na linha Trabalho, Tecnologia e Educação; e Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva (NESC/UFPR), na linha Estudos Marxistas em Saúde. Contato: marcelojss @ gmail.com - página pessoal: https://sites.google.com/site/marcelojss/home (retornar ao texto)

(2) [Vladimir I. Lenine. Sobre a Caricatura do Marxismo e o “Economismo Imperialista”. Lisboa: J. Bragança, 1974. – M.S.] (retornar ao texto)

(3) [Essa frase se encontra na carta de Engels a E. Bernstein de 2-3 de novembro de 1882. Nela Engels critica Bernstein por não tomar um contato mais próximo com a realidade francesa, limitando-se a emitir juízos baseados em fontes escassas: “Não parece que tenhas outra fonte, que dizer, outra à parte de Malon de segunda mão [Benoît Malon – M.S.], para sua reiterada afirmação de que na França o ‘marxismo’ sofre de acentuada falta de apreço. Agora, isso que se conhece como ‘marxismo’ na França, certamente é, em seu conjunto, um produto peculiar; a tal ponto que Marx uma vez disse a Lafargue: ‘Ce qu´il y a de certain c´est que moi, je ne sui pas Marxiste’”. – Edithor] (retornar ao texto)

(4) Karl Marx e Friedrich Engels. Cочинения [Obras], t. 35. Moscou: Editora Literatura Política, 1955, p. 324. (retornar ao texto)

(5) [Na carta de Engels a Conrad Schmidt de 5 de agosto de 1890 ele disse: “Além disso, há hoje um conjunto [de pessoas] para quem a concepção materialista da história serve de pretexto para não estudarem história. [...] A palavra «materialista» [materialistisch], na Alemanha, serve, em geral, a muitos escritores jovens de simples frase com que etiquetam, sem ulterior estudo, tudo e mais alguma coisa, isto é, colam esta etiqueta e, então, crêem ter resolvido a coisa” (Friedrich Engels. Carta a Conrad Schmidt (em Berlim), 05 de agosto de 1890. In: Karl Marx e Friedrich Engels. Obras Escolhidas. Lisboa: Edições Progresso, 1982). – Edithor] (retornar ao texto)

(6) [Utilitarismo: doutrina filosófica de Jeremy Bentham, para a qual o critério da moralidade radica no proveito que um ato proporcione, o sujeito da ação é o indivíduo, portanto o que resulta em prazer e satisfação a nível individual é moral. Bentham era hostil à revolução francesa e às revoluções independentes do início do século XIX. Em sua opinião, o conceito de “direitos do homem” era uma abstração carente de realidade, por isso não existem a justiça ou a igualdade, somente o indivíduo que persegue seu interesse egoísta – Edithor] (retornar ao texto)

(7) [Menchevismo: uma das frações do Partido Operário Socialdemocrata da Rússia (a outra fração era o bolchevismo) que surgiram das divergências no segundo congresso do partido em 1903. A fração menchevique agrupou os elementos de direita do POSDR, favoráveis a uma reforma gradual do regime czarista – Edithor] (retornar ao texto)

(8) [Anarcosindicalismo ou sindicalismo revolucionário: tendência política surgida na França ao final do século XIX, foi determinante na ação política da CGT (Central Geral dos Trabalhadores) e em suas divergências com o Partido Operário Francês, pois era então uma organização de corte reformista. Segundo a concepção de Georges Sorel, o sindicado é o órgão não somente para melhorar a vida dos trabalhadores, mas também o gérmen da nova sociedade e instrumento da revolução, a qual se chegará graças ao mito sindicalista da greve geral. Na concepção de Sorel, o mito da sua força instintiva e emocional à elite revolucionária. Sorel concordava com Bernstein em seu rechaço à dialética marxista, segundo ele, a teoria marxista não teria valor algum como análise científica, mas sim como imagem mitológica útil para inspirar aos revolucionários – Edithor] (retornar ao texto)

(9) [Por exemplo, Georges Sorel em sua obra A Decomposição do Marxismo, de 1902, escreve: “No penúltimo capítulo do primeiro volume de O Capital não resta dúvida alguma sobre o pensamento de Marx – é aqui que descreve a tendência geral do capitalismo por meio de fórmulas que seriam, de modo frequente, facilmente refutáveis, se as aplicar ao pé da letra aos fenômenos atuais... [os trabalhadores] não devem tomar esse texto letra por letra, pois estamos na presença disso que chamei mito social e diante de um vivamente colorido, que dá uma ideia muito clara de mudança, mas para além de certos detalhes que não se pode falar como um fato histórico previsível”. – Edithor] (retornar ao texto)

(10) [Вперёд (Vperiod): “Para a frente”, fração formada em 1908 por integrantes da fração bolchevique do Partido Operário Socialdemocrata da Rússia, entre esses se destacam Bogdanov, Alexinski, Lunachraski. Sua valoração da derrota da revolução de 1905 os levou a questionar o materialismo dialético e abraçar o positivismo, em especial a filosofia de Ernst Mach. A fração Вперёд desaparecia no início da década de 1910, porém vários de seus integrantes continuaram ativos na Пролеткульт (Proletkult) ou Cultura Proletária, organização que logo realizaria uma obra educativa destacada nos primeiros anos da revolução soviética – Edithor] (retornar ao texto)

(11) [A esta tendência corresponde o artigo Dialética à Luz da Teoria Moderna do Conhecimento (1908) de Y. Berman: “Se as normas do direito têm como objetivo sustentar e preservar um sistema socioeconômico dado, então as normas do pensar devem ter como objetivo último a adaptação do organismo a seu meio”. – Edithor] (retornar ao texto)

(12) [Se refere ao czar Pedro I, também chamado Pedro, o Grande, executor da modernização da Rússia no século XVII – Edithor] (retornar ao texto)

(13) [Plano quinquenal: planificação dos objetivos e tarefas econômicos nos próximos cinco anos. Esta prática econômica foi usada pela primeira vez na URSS, segundo decisão adotada no XV Congresso do Partido Comunista (bolchevique) que ocorreu de 2 a 19 de dezembro de 1927; o primeiro plano quinquenal foi executado de 1928 a 1932. Os planos quinquenais foram peça chave do acelerado processo de industrialização da economia soviética – Edithor] (retornar ao texto)

(14) [LEF: sigla em russo de Frente de Esquerda das Artes (Леви Фронт Искусств), agrupamento artístico ativo durante os anos 1922-1928 na URSS. Entre seus integrantes se destacavam Vladimir Maiakovski, Osip Brik e Serguéi Tretiakov – Edithor] (retornar ao texto)

(15) [Modernismo: da palavra francesa modernisme, Mikhail Lifschits define assim: “corrente principal da arte burguesa na época de declínio... A fé antiga nas ‘verdades eternas’ muda na ilusão inversa da falsa consciência; na relatividade... (...) O destino da arte expressa a drástica contradição da civilização burguesa contemporânea; a supremacia da grande massa de trabalho humano inerte abstrato sobre o mundo dos valores de uso concretos e os trabalhos qualitativamente diferentes das pessoas, vinculados à arte de épocas passadas” (Mikhail A. Lifschits. Modernismo. In: Большая Советская Энциклопедия [Grande Enciclopédia Soviética], t. 14. 3.ed. Moscou, 1974). – Edithor] (retornar ao texto)

(16) [Cubismo: corrente pictórica surgida no início do século XX, cujos maiores expoentes são Pablo Picasso e Georges Braque – Edithor] (retornar ao texto)

(17) [Dezembristas: revolucionários russos da primeira metade do século XIX; em 26 de dezembro de 1825 tentaram sublevar as tropas de São Petersburgo procurando destronar o czar e proclamar a república. O czar Nicolás I procurou manter a maior parte das tropas a seu favor e sufocou a revolta. Os líderes mais ilustres do movimento (Pável Pestel, Konstantin Riléiev, Serguéi Muraviov-Apóstol, Piotr Kajovski e Mikhail Bestúzhev-Riumin) foram executados e outros cento e vinte implicados seriam deportados à Sibéria. Os principais ideólogos do movimento advogavam pela abolição da monarquia e do regime de servidão, assim como pela imediata instauração das liberdades democráticas na Rússia, filosoficamente eram partidários do materialismo e influenciaram nas posteriores gerações de revolucionários russos – Edithor] (retornar ao texto)

(18) Ver: Vladimir I. Lenin. Заседание вцик 29 апреля 1918 [Encontro de 29 de abril de 1918 do Comitê Executivo Central]. In: Cочинения [Obras], t. 36. 5.ed. Moscou: Editora Literatura Política, 1967, p. 264. (retornar ao texto)

(19) [Na polêmica de Mikhail Lifschits contra a sociologia vulgar e o modernismo, o conceito de “consciência da consciência” é de transcendental importância; para compreendê-lo, é indispensável captá-lo no contexto da melhor tradição do pensamento soviético, essa grande obra nos campos da filosofia e psicologia destinada a esclarecer e aprofundar os problemas da teoria do reflexo, a consciência e a atividade. Um exemplo notável é a obra científico-filosófica do psicólogo Serguéi Leonidovich Rubinstein, que em sua obra O Ser e a Consciência (1957, p. 264) explica: “A concepção mecanicista da dependência das ações do homem em relação às condições externas, segundo a qual essas condições determinam diretamente as ações aludidas, torna implícita a ideia de que essa dependência passa através do homem – sujeito das ações – como através do vazio; o sujeito é excluído da cadeia dos acontecimentos, não participa em sua determinação”. Em oposição a tal concepção mecanicista, Rubinstein objeta: “Na verdade, o sujeito, suas ações conscientes, se incluem ao longo dos acontecimentos, em sua determinação”. Quer dizer, o sujeito é determinado pelas condições prévias, porém, este, por sua vez, determina suas ações presentes e, ao fazê-lo, se “determina a si mesmo”. – Edithor] (retornar ao texto)

(20) [Para maior aprofundamento, consultar as obras de Vladimir Lenin Materialismo e Empiriocriticismo, de Georgi Plekhanov Materialismo Militante, e de Franz Mehring Kant, Dietzgen, Mach e o Materialismo – Edithor] (retornar ao texto)

(21) [Machistas: seguidores do cientista e filósofo austríaco Ernst Mach – Edithor] (retornar ao texto)

(22) [Para Alois Riegl, a vontade artística (Kunstwollen) se fundamenta em: “Toda vontade do ser humano está dirigida para uma configuração adequada de sua relação com o mundo. A vontade artística plástica regula a relação do ser humano com a aparência das coisas, enquanto ela é perceptível pelo sentido: nele se expressa a maneira como o ser humano, em cada caso, quer que se dê forma ou cor às cosias” (Industria da Arte na Era Romana Tardia). – Edithor] (retornar ao texto)

(23) [Termo de Aristóteles, usado no livro de Política. Significa, literalmente, animal social ou animal político, fazendo referência ao ser humano, que, segundo ele, possui a capacidade natural de se relacionar politicamente, ou seja, criar sociedades e organizar cidades – M.S.] (retornar ao texto)

(24) [No caso da Teologia da Libertação e teorias afins, este ponto de vista é base para postular as organizações sociais como sujeitos egoístas em nada diferentes de uma empresa privada: “... a proclamação de que o Reino chega prioritariamente aos ‘pobres’, quer dizer, aqueles aos quais a sociedade submete a qualquer tipo de marginalização. E não como um novo particularismo, e sim totalmente ao contrário: como o único modo de assegurar a universalidade para todos, pois é óbvio que somente começando por baixo é possível universalizar de verdade, rompendo a cadeia de privilégios. Princípio tão fundamental e irrenunciável para nós os cristãos e cristãs como extraordinariamente difícil de colocar em prática e pleno de armadilhas ideológicas e resistências egoístas” (Revista Cristianismo e Sociedade, n. 128, pp. 51-52). – Edithor] (retornar ao texto)

(25) Ver: Karl Marx. Теории прибавочной стоимости [Teorias da Mais-Valia]. In: Karl Marx e Friedrich Engels. Сочинения [Obras], t. 26. Moscou: Editora Literatura Política, 1955, p. 280. (retornar ao texto)

(26) [Segundo Carl Jung, enantiodromia é “o aparecimento, especialmente em sucessão temporal, do princípio oposto inconsciente. Este fenômeno característico se dá em quase todos os locais onde uma direção extremamente unilateral domina a vida consciente, de modo que se forma no tempo uma posição oposta inconsciente dotada de força idêntica, a qual se exterioriza primeiro pela inibição do rendimento consciente e, mais tarde, pela interrupção da direção consciente” (Os Arquétipos e o Inconsciente Coletivo). – Edithor] (retornar ao texto)

(27) [Saturnália: festa da Antiga Roma em honra a Saturno (deus da agricultura); era uma grande festa popular celebrada de 19 a 25 de dezembro, na qual se trocam presentes e se realizava um grande banquete público festivo – Edithor] (retornar ao texto)

(28) [Na Europa o termo grafomania designa os escritos que recorrem ao excesso de palavras e termos rebuscados para encobrir sua falta de conteúdo – Edithor] (retornar ao texto)

(29) [O prefixo meta implica que o conceito é de uma ordem superior ou vais mais além do normal, portanto, metaconsciência é uma consciência que se está uma escala mais acima do ordinário; a introdução de tal noção pressupõe a consciência ordinária como incapaz de ascender à essência dos fatos, como inevitavelmente limitada por fatores internos ou externos – Edithor] (retornar ao texto)

Inclusão 29/06/2014